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EUGÉNIO DE ANDRADE

(1923)


Adeus

Como se houvesse uma tempestade
escurecendo os teus cabelos,
ou se preferes, a minha boca nos teus olhos,
carregada de flor e dos teus dedos;

 como se houvesse uma criança cega
aos tropeções dentro de ti,
eu falei em neve, e tu calavas
a voz onde contigo me perdi.

 Como se a noite viesse e te levasse,
eu era só fome o que sentia;
digo-te adeus, como se não voltasse
ao país onde o teu corpo principia.

 Como se houvesse nuvens sobre nuvens,
e sobre as nuvens mar perfeito,
ou se preferes, a tua boca clara
singrando largamente no meu peito.

 


A Paixão

Levanto a custo os olhos da página;
ardem;
ardem cegos de tanta neve.
Faz dó esta paixão pelo silêncio,
pelo sussurro do silêncio,
pelo ardor
do silêncio que só os dedos adivinham.
Cegos, também.

 


Os Animais

Vejo ao longe os meus dóceis animais.
São altos e as suas crinas ardem.
Correm à procura duma fonte,
a púrpura farejam entre juncos quebrados.

 A própria sombra bebem devagar.
De vez em quando erguem a cabeça.
Olham de perfil, quase felizes
de ser tão leve o ar.

 Encostam o focinho perto dos teus flancos,
onde a erva do corpo é mais confusa,
e como quem se aquece ao sol
respiram lentamente, apaziguados.

 


Março voltou

Março voltou, esta
ácida loucura de pássaros
está outra vez à nossa porta,
o ar

 de vidro vai direito ao coração.
Também elas cantam, as montanhas:
somente nenhum de nós
as ouve, distraídos

 com o monótono silabar do vento
ou doutros peregrinos.
Já sabeis como temos ainda restos
de pudor.

 e pelo mundo
uma enorme, enorme indiferença.

 


Não, não encontro o retrato.

Não, não encontro o retrato.
Estavas de perfil, a luz de cinza
caía-te dos braços,
da casa próxima o fumo

 subia devagar os últimos degraus
do outono, um cachorro
saltava no terreiro, não tardaria
a escurecer.

 Estavas de perfil, a mão acompanhando
no regaço a rosa que te dei.
Deixa-a ficar e ser,
a mão, rosa também.

 


Donde vêm?

Donde vêm?
De que rosto, de que estrela?

 Apenas uma arde no vento.
As outras, fico a ouvi-las
escorrer da pedra.

 Apenas uma em silêncio brilha.
As outras mordem
um coração de homem.

 Só prometido à terra.

 


Foto e poemas extraídos de Poesia e prosa, O Jornal/Limiar, Lisboa, 1990.



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