Pedro Persone
cravista & fortepianista
HIP - Historically Informed Performance



Alguns pensamentos para uma Performance Historicamente Informada.



Num mundo que cada dia mais e mais a música "antiga" ocupa espaços na mídia, salas de concertos , salas de estudos, enfim, é objeto da atenção dos estudiosos, faz-se necessário que, no Brasil - a exemplo do que já acontece normalmente na Europa e EUA - tenhamos uma abordagem "historicamente informada".
Antes de mais nada devemos entender as aspas acima!
Por música "antiga" entendemos toda a música feita antes de nosso tempo. A música de nosso tempo nos é contemporânea. Se pararmos para uma pequena reflexão, veremos que cerca de 90%da música apresentada hoje em manifestações públicas no meio erudito e, portanto, "antiga".
Por "performance historicamente informada" (HIP - Historically Informed Performance) entendemos uma execução baseada nas mais recentes pesquisas musicológicas, onde o executante conhece a vida e obra do autor bem como seu estilo - as entrelinhas e signos -, a estética de sua época, as formas e dedilhados por ele utilizados, quais os instrumentos possíveis para tal obra, fatores sociais e psicológicos bem como sua formação musical e educacional - incluindo o embasamento filosófico.
Dentro da denominação antiga podemos perceber que há uma preferência por aquela música feita nos séculos XVII e XVIII. Esta afirmação pode ser confirmada pela simples freqüência a concertos ou verificando as estatísticas das grandes empresas de gravação. Estas dedicam grande porcentagem de seus registros a obras dos períodos acima citados, ou seja a música barroca e clássica tem, praticamente, "sustentado" o setor erudito de tais empresas.
Uma vez que tanto interesse tem sido demonstrado, acreditamos que estamos no ponto ideal para abordarmos a música de tais períodos segundo uma ótica musicologicamente informada, ou seja, conhecendo as regras, as ferramentas, as técnicas com as quais trabalhavam os autores; mais ainda: quais fatores sociais, pessoais, limites técnicos e instrumentais, como era o pensamento da época, a linha filosófica, etc. Só assim poderemos nos aproximar um pouco daquilo que seriam as intenções dos compositores. Sabendo suas intenções poderemos afirmar que estamos próximos de uma interpretação "autêntica". Dai tendo tal conhecimento, se é nossa vontade, podemos romper os limites e nos deliciarmos com uma interpretação exclusivamente pessoal, nossa. Entretanto saberemos com o que e por que rompemos. Do contrário nem poderemos discutir…
Outro fator que mostra a importância, ou melhor a necessidade urgente deste conhecimento é o seguinte: Até décadas recentes a música composta depois das gerações de Vivaldi, Telemann, Rameau, Händel, Bach e Scarlatti era vista como parte continua e viva de uma tradição em salas de concertos, de óperas, conservatórios e mesmo em casas por instrução oral e escrita. A música do período clássico era vista como o inicio do "repertório standart". A performance da música do classicismo não requeria uma pesquisa especial ou entendimento além daquele oferecido por escolas de música. Assim, a música de Glück, Haydn, Mozart, Beethoven e Schubert - por sua familiaridade a aparente ausência de instrumentos estranhos (claro, não tinhamos aqui uma cornamusa ou uma viola in tromba marina) ou notações enigmáticas (não se usava comercialmente uma tablatura e nem era mais a época de préludes non mesurés) - não despertava a necessidade (sentida por interpretes e pesquisadores da música dos períodos anteriores) de engajar-se na pesquisa sobre práticas de performance histórica.
Esta complacência era ajudada e encorajada por uma poderosa tradição oral. Por exemplo, muitos dos pianistas do século XX podem dizer que estudaram com aquele aluno de um aluno de Czerny que estudou com Beethoven que estudou com Haydn que era amigo Mozart. Conhecemos cantores que estudaram com representantes da tradição do "Bel Canto" clamando por traçar sua linhagem artística um século e meio antes de Mozart, com Caccini.
Entretanto a razão nos mostra que mesmo tendo sido continuamente manejado geração após geração, este patrimônio não permaneceu imutável! Pelo contrário, está muito claro - atestado pela própria humana vaidade - que cada geração modificou o que recebeu da geração de seus professores até que a maneira de tocar a música do período clássico tenha se tornado irreconhecível.
A música clássica para piano é conhecido e apresentada em instrumentos (piano moderno) com surpreendente força ou debilidade, sobrecarregadas de fraseados impróprios e articulações estranhas ao estilo dessa música e, principalmente, aos instrumentos para os quais tal música foi composta.
É para sanar essa desinformação - e para que intérpretes modernos não tenham mais o benefício da ignorância - que estamos propondo a divulgação da Performance Historicamente Informada no Brasil. Nosso objetivo, é, então, apresentar todo um conhecimento musicológico associado à prática de interpretação. Com isso poderemos enriquecer o conhecimento musical dos alunos e profissionais que tiverem a oportunidade de trabalhar segundo essa ótica. Assim poderemos estar na vanguarda da interpretação correta, segundo as intenções dos compositores. (Pedro Persone, 2 de Janeiro de 2000)



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