Data de
publicação: 18-11-2003
Estudo
sobre água revela má gestão em Portugal
Portugal está entre os países europeus com pior gestão dos recursos hídricos,
segundo um relatório da World Wildlife
Fund for Nature (WWF) sobre
a qualidade e quantidade de água em 23 países, publicado hoje. O perfil
português foi traçado pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN).
Durante dois meses, uma equipa de quatro membros da LPN fez o
levantamento do estado dos recursos hídricos e zonas húmidas a nível nacional,
mais especificamente sobre os impactes da agricultura.
"Outros países apresentaram resultados sobre os sectores
industrial e doméstico, mas o nosso prazo era demasiado curto para os
estudar", explicou ao PUBLICO.PT Sofia Parente, da LPN e coordenadora do
estudo.
O relatório - entregue à WWF em Março
deste ano - seguiu as metodologias da organização internacional que pediu o
estudo de uma bacia hidrográfica. A escolhida pela LPN foi a do Guadiana por
causa dos impactes da barragem de Alqueva.
A questão dos transvases foi um dos maus
exemplos da gestão portuguesa dos recursos hídricos. "O assunto é omisso
no actual Plano Nacional da Água [aprovado pelo Decreto-lei nº 112/2002, de 17
de Abril]", criticou Sofia Parente, tanto mais
que o transvase previsto do rio Guadiana para o Sado
tem contornos preocupantes. "Este terá impactes muito significativos em
ambas as bacias hidrográficas, como por exemplo, a propagação da poluição do
Guadiana - oriunda dos lagares de azeite - para o
Sado", explicou.
Segundo a LPN, a qualidade das águas subterrâneas desta bacia é
"muito deficiente", registando violações dos níveis de magnésio,
sódio e nitrato. "A fraca qualidade das águas deve-se a descargas pontuais
não tratadas, especialmente das agro-indústrias, e
pela poluição difusa da agricultura e pecuária".
Outro dos maus exemplos detectados foi a aplicação da directiva
europeia Nitratos. "Só foram declaradas três zonas vulneráveis e estas são
muito restritas e não protegem os aquíferos já contaminados, como é o caso de
Beja e duma zona do Ribatejo", continuou.
A LPN deu também nota negativa à falta de integração e
desarticulação entre a gestão das zonas húmidas e a gestão dos recursos
hídricos e à centralização do processo de implementação da Directiva-Quadro
da Água (DQA, Directiva 2000/60/CE, de 26 de Junho) no Inag
- Instituto da Água, sem activar os mecanismos de
participação pública.
Como bom exemplo, a LPN refere "a resposta aos impactes
causados pela construção do Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva".
Uso não regulado e poluição entre principais problemas
europeus
O uso não regulado, a poluição e a falta de integração da gestão
da água nos outros sectores continuam a ser uma realidade na maior parte dos
países europeus, apesar da aprovação da DQA em 2000, concluiu a WWF. A
organização coloca a Itália, Grécia e Espanha entre os piores gestores da água.
A WWF lamenta que se privilegie "o aumento da disponibilidade
de água [através de grandes barragens], em detrimento de uma gestão eficaz da
sua procura". O estudo critica a falta de medidas para controlar o uso da
água pela agricultura, sector responsável por 87 por cento dos consumos. "A
maior parte da água utilizada na irrigação não é medida nem paga [...],
revelando uma enorme assimetria nas medidas de controle
e tributação aplicadas aos utilizadores".
A DQA é um "instrumento adequado para a inversão da
tendência, mas ainda falta um longo caminho a percorrer até se vislumbrarem os
primeiros resultados". Para tal, a WWF defende que os países europeus
"vão ter de mudar radicalmente o modo como a gestão da água é
efectuada" para cumprir os requisitos da DQA. Este documento requer a gestão
integrada e participada dos rios, lagos, zonas húmidas, estuários, zonas
costeiras e águas subterrâneas, "o que ainda não é uma realidade em
Portugal", segundo a LPN.
Segundo Sofia Parente, o estudo da WWF pretendeu ainda aferir até
que ponto estão os países prontos para a transposição da DQA. A LPN lamenta que
o "envolvimento activo da sociedade civil esteja a ser, uma vez mais,
adiado para uma fase do processo em que as decisões mais importantes já foram
tomadas".
O relatório final estará acessível no sítio da LPN nos próximos
dias.
Fonte: Público
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