Era uma Vez um Rato...

Michael Morgan
(publicado em Euro-Ataxia/Newsletter - julho/2001)

As noticias do último mês de fevereiro de que duas equipes francesas de pesquisadores da ataxia de Friedreich haviam obtido êxito na criação de camundongos "nocaute" não foram suficientemente divulgadas. Mas, de fato representam uma nova etapa no desenvolvimento de intervenções terapêuticas eficazes e de tratamentos medicamentosos na ataxia de Friedreich, porque agora temos uma inestimável ferramenta de pesquisa, a qual nos permitirá uma ampliação no estudo da patologia da enfermidade e a realização de testes em larga escala. Em resumo, estamos um passo mais próximos ao objetivo final de deter a ataxia de Friedreich.
Mas, primeiro, precisamos perguntar por que é tão importante o desenvolvimento de um rato - ou realmente de qualquer animal modelo -, e, segundo, por que isto era tão difícil de ser alcançado na prática?
Algumas pessoas ainda ficam surpresas ao saber que a pesquisa original em ataxia de Friedreich ocorreu com a utilização de fermento. De fato, o simples modelo de fermento tem demonstrado sua importância como ferramenta de pesquisa científica em várias ocasiões. Mas não há muitas coisas que possam ser feitas com o fermento, este é o problema. Nenhum processo de neurodegeneração ou de cardiomiopatia pode ser analisado utilizando-se o fermento - ambos vitais na investigação da ataxia de Friedreich - isto elimina definitivamente o fermento. Deve-se então utilizar um animal mamífero com estrutura similar a do homem, e o melhor candidato para isto é o camundongo. A vida não é tão ruim assim para os ratos de laboratório. Pode ser curta, mas não há o risco de um fim horrível por envenenamento ou despedaçamento pelo gato do vizinho. Qualquer norma a respeito de proteção de animais considera de vital importância os experimentos que utilizam ratos. Para analisar a eficácia de medicamentos você precisa usar a estrutura de um mamífero, e isto quer dizer o rato. Agora com o modelo "nocaute" de rato disponível torna-se possível experimentar seriamente drogas tais como o idebenone.
Claro que os mesmos investigadores tentaram criar ratos "nocaute" antes. Infelizmente, as criaturas morreram dentro de períodos muito curtos de vida fetal. A razão disto era realmente bastante simples: sem nenhuma frataxina, a vida é insustentável. Nós com ataxia de Friedreich temos baixos níveis de frataxina em nossos corpos, mas não absolutamente nenhuma. Assim, o problema que desafiava os investigadores era como limitar a quantidade de frataxina presente no rato, uma espécie de aproximação com "sintonia-fina" que permitisse suficiente frataxina para assegurar a sobrevivência, mas não o suficiente para evitar sérias perdas em áreas específicas que o cientistas desejavam estudar. A solução hipotética foi gerar modelos de ratos condicionados para a ataxia de Friedreich em que 100% de "nocautes" (onde a quantidade de frataxina a partir do nascimento variasse de normal a zero) pudesse ser alcançada tão somente em tecidos selecionados: no coração e músculo no rato de MCK, ou no coração, neurônios e fígado no rato de NSE. A pesquisa está tentando ajustar além disto, criando ratos que tenham frataxina "nocaute" somente nos neurônios.
Como dito acima, o sucesso no desenvolvimento de um modelo de rato é um passo de crucial importância que agora clareia o caminho para a experimentação de drogas em mamíferos e que esperançosamente deve ser a última fase antes de testes em seres humanos. O modelo também tornará possível derivar modelos celulares e cultura de células que, por sua vez, tornarão possíveis novos procedimentos na identificação de medicamentos. As experiências com novas drogas serão mais eficazmente executadas em culturas de células de mamíferos (as drogas não penetram tão prontamente em células de fermento, devido a sua espessa parede protetora). E assim, o desenvolvimento da ataxia de Friedreich do rato modelo nos leva um pouco mais próximos do nosso objetivo final: transformar a ataxia de Friedreich de uma enfermidade intratável para tratável.


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