Pesquisa da SCA8: Atualização

Laura P W Ranum, PhD
University of Minnesota
(publicado em Generations/NAF - dezembro/2001)

Este é um resumo da pesquisa patrocinada pela NAF no ano 2000.

Em 1999 relatamos a descoberta do gene causador da SCA8. Desde então houve muito progresso na compreensão da genética da SCA8. A SCA8 é um caso singular entre os genes das ataxias devido a ser causada por uma repetição CTG em vez de uma repetição CAG. Além disso, a genética da SCA8 é mais complexa do que as das outras ataxias. Para entender melhor a SCA8 estamos estudando as características clínicas e genéticas da doença em mais de 30 famílias com SCA8 ao redor do mundo. Estas famílias estão nos ajudando a melhor compreender algumas das complexidades desta condição. Além disso, estamos produzindo um camundongo modelo da doença para aprendermos precisamente como a expansão CTG causa danos neuronais às células. O patrocínio da NAF nos permitiu iniciar os experimentos transgênicos enquanto nossa concessão do National Institutes of Health para a SCA8 estava sendo revista. A seguir um resumo do que aprendemos sobre a genética da SCA8 e nosso progresso na geração de um camundongo modelo da doença.

Clonagem rápida: armadilha genética eficiente...
Nosso laboratório desenvolveu um método mais rápido para isolar genes de ataxia chamado clonagem rápida. Para melhor entender como funciona a clonagem rápida, é importante entender alguns conceitos genéticos básicos. Os genes representam o projeto de nossas características, como cor do cabelo, cor dos olhos e altura. Possuímos mais de 30.000 genes e juntos eles comandam o desenvolvimento e as funções do nosso corpo. Quando um gene é alterado, a informação genética é modificada e pode causar problemas ao desenvolvimento e às funções do corpo. Os genes são constituídos de quatro compostos, denominados abreviadamente A, C, G e T. Os padrões formadores destes quatro compostos constituem uma seqüência de DNA. A clonagem rápida pode ser usada para isolar regiões do DNA contendo uma expansão da repetição da seqüência de DNA, identificadas como causadoras de várias formas de ataxias hereditárias.
Uma analogia que podemos fazer é a da expansão de repetições encontradas em genes de ataxia como sendo uma "agulha no palheiro", e nosso método de clonagem rápida um "ímã poderoso", capaz de isolar a "agulha" ou a expansão da repetição diretamente, sem a necessidade de procurar por todo o feno. Este método é diferente dos métodos genéticos tradicionais porque permite que os genes causadores da doença sejam individualmente isolados. Utilizamos esta técnica para isolar os genes da SCA7 e da SCA8.

Procurando uma repetição CAG, encontramos uma repetição CTG...
Quando começamos nossa pesquisa por genes de ataxia usando o método de clonagem rápida, estávamos procurando repetições CAG expandidas, porque essa era na ocasião a causa de outras SCA (SCA1, SCA2, SCA3 e SCA6). Porém, em vez de encontrar na SCA8 uma repetição CAG, encontramos uma expansão de repetição CTG! No princípio não pensamos que a repetição CTG fosse a causa da ataxia. Embora as repetições CTG e CAG possam parecer semelhantes, elas são biologicamente muito diferentes. Levou muito tempo para nos convencermos de que de fato a repetição CTG era a causa da ataxia. Denominamos o novo gene de ataxia descoberto de SCA8.

A genética da SCA8 é complexa...
Concluímos que a repetição CTG da SCA8 causa ataxia devido ao fato de que todos os membros das sete gerações de uma família com ataxia tinham repetição CTG expandida. Faremos referência a esta família como a família MN-A. Na família MN-A, os indivíduos com maiores expansões (110 ou mais repetições) tendem a desenvolver ataxia, enquanto os membros da família MN-A com menos do que 100 repetições tendem a não desenvolver a doença. Quando observamos o DNA de pessoas da população em geral, sem ataxia, quase todas (mais de 99%) tem entre 16 a 50 repetições CTG [no gene SCA8].
Embora o comprimento da repetição CTG na família MN-A seja claramente representativo, indicando se um indivíduo desenvolverá ou não ataxia, o número CTG de indivíduos afetados pode diferir muito entre diferentes famílias. Estas diferenças podem em parte ser devidas a uma pequena série de repetições CTA no DNA que são encontrados muito próximas à repetição CTG no gene SCA8. De fato, a maioria dos testes laboratoriais para SCA8 contém a combinação CTG e CTA em vez de somente CTG. O número CTA não varia de pessoa para pessoa dentro de uma família, mas é diferente entre famílias, e pode afetar o número CTG que determina o desenvolvimento de ataxia em uma família específica. Mais adiante a pesquisa com outras famílias afetadas com SCA8 mostrou que os indivíduos com ataxia tinham repetições variando de 71 até mais de 800 repetições CTA/CTG combinadas, embora a maioria dos indivíduos afetados tenha de 80 a 250 repetições CTA/CTG combinadas.

Nem todos com expansão SCA8 desenvolvem ataxia...
Como uma pessoa precisa de somente uma cópia [alelo] da repetição CTG expandida em SCA8 para ter ataxia, esperávamos de início encontrar um claro padrão hereditário dominante quando observássemos a árvore genealógica de uma pessoa com SCA8. Uma árvore familiar dominante mostraria diversas pessoas em cada geração com ataxia e a doença sempre seria passada de pai para filho (com 50% de possibilidades de que cada filho herdasse o gene anormal e desenvolvesse a doença). Todas as famílias não têm claros padrões de herança dominante porque nem todos com expansão da repetição CTG desenvolvem ataxia. O termo genético para este fenômeno é "penetrância reduzida". Embora expansões mais curtas (inferiores a 80 repetições) e expansões muito longas (superiores a 250 repetições) tendam a ser associadas menos freqüentemente com ataxia, temos visto parentes não afetados de pacientes de ataxia com expansões de SCA8 que superam em tamanho os comprimentos das repetições dos indivíduos afetados. Ocasionalmente também são encontradas expansões de SCA8 na população em geral. Porque nem todos que tenham a expansão desenvolvem ataxia, o padrão hereditário da SCA8 pode parecer ser dominante, recessivo ou esporádico. Ainda não entendemos por que algumas pessoas com expansões SCA8 desenvolvem ataxia e outros não, mas outros fatores genéticos ou ambientais podem ser representativos. Esperançosamente, estudos adicionais de famílias SCA8 e o desenvolvimento de modelos de camundongos ajudarão a responder esta questão.

O que causa SCA8?
Como previamente mencionado, a causa genética da SCA8 é diferente de outras SCA. Cinco das SCA são causadas por repetições CAG estendidas do DNA que codificam proteínas (SCA1, SCA2, SCA3, SCA6 e SCA7). A SCA8 não só é diferente por ser causada por repetições CTG (em vez de repetições CAG), mas também porque as repetições ocorrem em uma "área silenciosa" do DNA, que produz uma molécula intermediária do RNA e não uma proteína. A distrofia miotônica é a única outra doença conhecida causada por repetições CTG em uma "área silenciosa" do DNA. Demonstramos recentemente que uma segunda forma de distrofia miotônica (DM2) é causada por uma repetição expandida semelhante (desta vez uma CCTG). Este tetranucleotídeo expandido do DNA está incluído na molécula intermediária do RNA e não no segmento do gene produtor de uma proteína. Há uma crescente evidência de que as distrofias miotônicas tipos 1 e 2 são causadas pela acúmulo da área repetida na molécula intermediária do RNA. As semelhanças entre a mutações da repetição expandida CTG encontradas na SCA8 e DM1, como também a mutação CCTG na DM2, sugerem que a SCA8 possa ser causada por um mecanismo de RNA tóxico semelhante. Estamos testando esta hipótese atualmente em camundongos transgênicos.

Modelo de camundongo da SCA8
Para testar diretamente se a expansão CTG da SCA8 causa ataxia ou não e determinar como a expansão CTG causa a doença estamos gerando um modelo de camundongo próprio. Inserimos o gene humano contendo um número normal de repetições CTG e também um segmento CTG expandido para gerar camundongos e usá-los como modelos de controle da doença. Estas experiências são caras e consomem muito tempo, assim temos satisfação em relatar que estamos indo além das primeiras fases destas experiências, nas quais colocamos as repetições CTG normal e expandida nos camundongos. Estamos agora criando os camundongos para averiguarmos se com o CTG expandido desenvolvem ataxia. Um modelo bem sucedido de camundongo para SCA8 permitirá tratar as questões de como a repetição CTG causa a doença, que não poderiam ser investigadas em humanos. Temos esperança de que um melhor entendimento do mecanismo da doença a nível celular conduza eventualmente a sua cura.


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