(H) ARAS DE SARA (H)
Anibal Beça


Nas areias do Saara sei-me potro
corcel bebendo o fogo do deserto.
Nas almofadas dunas tão macias
me deito ao sono sonho cavalgando.
Arrebatado sigo sem miragens
teu trote gracioso nesse oásis
de ver nas anchas ancas tantas águas
e sei que a minha sede tem abrigo.
Sedento garanhão de antiga arábia
no solo de Israel lua de alfanje
brilha na tenda a estrela de Davi.
Iluminada alcova ardendo em sândalo
a sarça da paixão demove intrigas
e rega no seu vinho nossos corpos.



BOLERO DAS ÁGUAS

Anibal Beça


O passo no compasso dois por quatro
acode meu suplício de afogado
afastando de mim sedento cálice
em submerso bolero de águas tantas.
A sede dança seca na garganta
curtindo signos, fala ressequida
para a língua de couro, lixa tântala,
alisando palavras rebuçadas.
Quanto alfenim no alfanje que se enfeita
para montar as ancas de égua moura.
Lábia flamenca lambe leve as oiças,
é rito muezin ditando a dança:
no dois pra cá me levo em dois pra lá,
nas águas do regaço vou-me e lavo-me.


DIONYSIO

Anibal Beça


Ungido para o fado e a nova festa
Meu carnaval profano já celebra
As quarentenas dívidas da carne
Na cela de costelas das mulheres.
Como devasso réu, confesso fauno,
No vinho das delícias me declaro
Sem culpa e sem pecado original
Pois nessa pena sou igual a tantos.
Já disse certa vez em cantoria:
De nada me arrependo e reconfirmo
Agora que o meu tempo é só de gozo.
A vida que me dou não dá guarida
Nem guarda desalentos de tristeza
Somente na alegria é que me morro


ESPELHO

Anibal Beça



O que sobrou de mim são essas sombras
Sobrada sobra, cinza dos minutos,
Que me alimenta os ossos da memória.

Nessa voragem vaga, um mar de calma
Lambendo vem a pressa em que me aposto
Na duração que escorre nessa arena.

Do fim regresso fera não domada
Ao mesmo pouso de ave renascida
Para o sol da surpresa nas janelas
Escancarando um solo transmutado.

De baixo para cima é que renovo
As vestes da sintaxe que componho
Clara inversão da jaula das palavras
Para fechar sem chave a minha sina.

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Para fechar sem chave a minha sina
Clara inversão da jaula das palavras
As vestes da sintaxe que componho
De baixo para cima é que renovo.

Escancarando um solo transmutado
Para o sol da surpresa nas janelas
Ao mesmo pouso de ave renascida
Do fim regresso fera não domada.

Na duração que escorre nessa arena
Lambendo vem a pressa em que me aposto.
Nessa
voragem, vaga um mar de calma

Que me alimenta os ossos da memória.
Sobrada sobra, cinza dos minutos,
O que sobrou de mim são essas sombras.




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