Cantar de Vero Amor

Cecília Meireles

I

ASSIM aos poucos vai sendo levada

a tua Amiga, a tua Amada!

E assim de longe ouvirás a cantiga

da tua Amada, da tua Amiga.

Abrem-se os olhos - e é de sombra a estrada

para chegar-se à Amiga, à Amada!

 

Fechem-se os olhos - e eis a estrada antiga

a que levaria à Amada, à Amiga.

 

(Se me encontrares novamente, nada

te faça esquecer a Amiga, a Amada!

 

Se te encontrar, pode ser que eu consiga

ser para sempre a Amada Amiga.

II        

E assim aos poucos vai sendo levada

a tua Amiga, a tua Amada!

 

E talvez apenas uma estrelinha siga

a tua Amada, a tua Amiga.

 

Para muito longe vai sendo levada,

desfigurada e transfigurada.

 

Sem que ela mesma já não consiga

dizer que era a tua profunda Amiga.

 

Sem que possa ouvir o que tua alma brade:

que era a tua Amiga e que era a tua Amada.

 

Ah! do que disse nada mais se diga.

Vai-se a tua Amada - vai-se a tua Amiga!

 

Ah! do que era tanto, não resta mais nada...

Mas houve essa Amiga! mas houve essa Amada!

São Paulo, janeiro 1964

                                                         

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