PSICANALÍTICA
André Koehne
da Academia Caetiteense de Letras
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  Rasimandra tinha um ônus sobre sua cabeça, e do qual jamais conseguiria se libertar. Não, não era seu nome retirado da mente megalomaníaca e sádica do pai, mas o fato de não ter jamais conseguido estabelecer os parâmetros cognitivos da nova processualística estrutural que há anos tentava estabelecer para definir os casos omissos, sub-reptícios, dos estigmas neo-junguianos.
   Imbuída de que ainda necessitava de tempo para deslindar tão vital e importante questão, partia para as meditações transcendentais do guru
Arrozinho, sem atinar que sua teoria das civilizações sublunares era uma forma de sustentar um simplório embusteiro.
   Rasimandra, "Mandrinha" para os íntimos e todos os que a conheciam (ninguém se sentia à vontade chamando alguém por um tal nome), formara-se na Faculdade de Psicologia fundada por Isaías Alves para "
formar boas donas de casa" e que lhe proporcionara a abertura de sua vida e visão para um mundo que, quanto mais o olhava menos compreendia. Entretanto, como todos os psicanalistas, ostentava aquele ar professoral e superior dos que já compreenderam todos à sua volta, aliado ao olhar vago de quem nunca compreendeu a si mesmo...
   Penetrara nos primórdios que levaram Freud a parir Jung e a enlouquecer Reich, evoluindo para os psicanalistas americanos, cujos nomes nem é bom citar - permeando tudo isto com boa dose de esoterismo blavatskiano, muitos baseados nas tertúlias sob as frondosas mangueiras da célebre faculdade de São Lázaro, depois um tanto de ácido para compreender a liberação mental, uma coca vez em quando e, claro, fogo no sutiã, este símbolo arcaico da submissão feminina ao jugo heterossexual machista da nossa primitiva sociedade pseudo-patriarcal.
   Odiava a falta de pacientes e o descrédito da psicanálise nos tempos atuais, causada desde que a psiquiatria passou a receitar pílulas de lítio aos psicóticos maníaco-depressivos, ansiolíticos aos estressados, e Woody Allen resolveu comer a enteada...
   Rasinandra não sabia, mas talvez o melhor, o maior caso de sua vida, fosse ela própria. Junto com a crise da psicanálise, Rasimandra, psicóloga, foi junto, filha de um tempo maluco chamado fim do século XX.
   Meu Deus, como gostaria de salvá-la...