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Esse eh o Baracy
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Rafael Baracy
25 anos
Assessor Parlamenta
Gestor de Politicas Públicas de Juventude
Professor de história com RPG em sala de aula
Presidente da Associação Gaúcha de RPG
Diretor internacional de RPG em POA e Fpolis
Coordenador da Juv. do Campo Majoritário do PT em SC
Coordenador de juventude em Fpolis
Realmente, eu não durmo muito.
Conheça a história do RPG e onde ele pode ser utilizado neste mesmo sitio
Saiba mais sobre politica, o PT e a Articulação Unidade na Luta també neste sitio. Veja mais fotos minhas no endereço: http://www.oocities.org/br/baracy/fotos.html
E...não, o cara a direita no desenho não sou eu
Mas bem que poderia ser!
Confira o meu cheklist de Mage Knight em:
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Cara de pau
Nome: Rafael Baracy
baracy@yahoo.com.br, baracy@pop.com.br
E-mail:
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Qual é o objetivo da política

Qual é o objetivo da política?

Em pauta: a política. O conceito em si é polêmico. Não poderia ser diferente: a política expressa os diversos interesses em conflito na sociedade. O "árbitro" deste jogo é – ou deveria ser – o povo (essa entidade abstrata que significa tudo e nada).

A política nutre-se da polêmica: os vários interesses econômicos, sociais etc., se manifestam através da disputa de idéias e propostas em permanente colisão e negociação. Já Aristóteles, em sua obra Política, afirmou que "o fim da política não é viver, mas viver bem". A idéia que temos hoje de que a política é a luta constante pelo bem comum, pela justiça, o bom governo etc., remonta à tradição aristotélica, à filosofia política de Platão e ao pensamento cristão medieval.

Observamos, por exemplo, que estas idéias fundamentam a ação pastoral da Igreja em diversos setores. Em teoria, esta maneira de conceber a política é prescritiva, isto é, indica o ideal (como deveria ser bom governo, uma sociedade justa e igualitária etc.).

Esta é uma bela idéia que alicerça a ação de milhares de pessoas por este Brasil afora. Militam em movimentos sociais, associações, sindicatos, partidos e pastorais. Estas pessoas constroem uma utopia, dedicam sua vida à construção de um ideal traduzido na busca incessante do bem-comum. Como vemos, nem tudo cheira a podridão no reino da política. Devemos reconhecer que, concordemos ou não com suas ações idéias e propostas, ainda existem os idealistas, os que consagram boa parte do seu precioso tempo (pois que na vida, o que passou, passou!) à coletividade.

É verdade que muitos são animados por necessidades prementes e bem concretas (como por exemplo, comer, morar, trabalhar na terra etc.). Mas também é verdade que sonham um sonho: o sonho de uma sociedade onde as mazelas sociais presentes em nosso no cotidiano e que ferem as nossas mentes e corações, sejam superadas.

Pois que, em meio à insensibilidade de nossos governantes e da elite brasileira diante das questões sociais, ainda há pessoas que se sensibilizam com o olhar desesperançado do trabalhador consternado ante a falta de perspectivas. Estes idealistas são os que ainda se sensibilizam diante do olhar de uma criança num acampamento de trabalhadores sem-terra, ou numa rua qualquer do espaço urbano, pedinte ou em grupo cheirando cola ou utilizando drogas, com suas energias vitais esvaindo-se, num cortejo fúnebre à morte antecipada.

Deixemos as chagas que a nossa sociedade alimenta momentaneamente de lado. Afinal, esse quadro sombrio, que teimamos em perpetuar, é para muitos, natural, sem qualquer relação com a política. Voltemos ao idealismo dos que buscam o bem-comum em sua práxis política. Embora sejam imprescindíveis, esses homens e mulheres padecem de uma teoria ingênua sobre a política.

Se a política é, como afirmamos, essencialmente a oposição e luta entre interesses diferenciados e antagônicos, então, a idéia de política como a busca incessante do bem-comum é um projeto irrealizável nos marcos da própria existência da política. Como nos ensinou o florentino renascentista Maquiavel, política é sobretudo a arte de conquistar, dominar e manter o poder político.

Pensar na superação dos interesses econômicos particularistas, individualistas e egoístas, ou seja, na predominância do coletivo sobre a lógica que anima nossa sociedade significa, em última instância, imaginar a utopia da não-política, em outra palavras, a sociedade onde a política e o Estado não sejam mais necessários.

Enquanto a política se fizer necessária, seus fins serão tantos quanto os objetivos que os grupos econômicos e políticos se coloquem. E isso, de acordo com a época histórica e as circunstâncias nas quais os sujeitos políticos representativos destes interesses atuam. A política não tem fins estáticos e perpetuamente definidos.

Nessa concepção, o bem comum, a justiça, o bom governo etc., são meios ideológicos ou pura retórica de que se servem tanto os idealistas quanto os grupos econômica e politicamente dominantes em nossa sociedade que, permanentemente, procuram nos fazer acreditar que seus interesses específicos são nossos interesses. Vivenciamos isto através da ilusão do Estado enquanto guardião dos interesses comuns, como se este fosse neutro no jogo político entre as classes e grupos sociais.

Desmistificar a ilusão democrática da política e do Estado como agentes do bem comum, parece-nos um bom começo. Polêmico, é verdade. Mas que seria da política se não pudéssemos polemizar! Suprimir o pensamento divergente foi – e ainda é – o sonho dos ditadores de ontem e dos que estão por aí, de plantão, disfarçados sob as máscaras de democratas de última hora.

Até que ponto a política é compatível com a ética? A política pode ser eficiente se incorporar a ética? Não seria puro moralismo exigir que a política considere os valores éticos?

Quando se trata da relação entre ética e política não há respostas fáceis. Há mesmo quem considere que esta é uma falsa questão, em outras palavras, que ética e política são como a água e o vinho: não se misturam. Quem pensa assim, adota uma postura que nega qualquer vínculo da política com a moral: os fins justificam os meios.

O ‘realismo político’, ou seja, a busca de resultados a qualquer preço, subtrai os atos políticos à qualquer avaliação moral, entendendo esta como restrita à vida privada, dissociando o indivíduo do coletivo.

Esta concepção sobre a relação ética e política desconsidera que a moral também é um fator social e como tal não pode se restringir ao santuário da consciência dos indivíduos. Em outras palavras, embora a moral se manifeste pelo comportamento do indivíduo, ela expressa uma exigência da sociedade (um exemplo disso é a adoção dos diversos "códigos de ética"). Ou seja, não leva em conta que a política nega ou afirma certa moral e que, em última instância, a política também é avaliada pelo comportamento e entendimento moral das pessoas. Aliás, se a política almeja legitimidade não pode, entre outros fatores, dispensar o consenso dos cidadãos — o que pressupõe o apelo à moral.

Há também os que, ingenuamente ou não, adotam critérios moralizantes para julgar os atos políticos. Por conseguinte, condicionam a política á pureza abstrata reservada ao ‘sagrado’ espaço da consciência individual. Estes imaginam poder realizar a política apenas pelos meios puros.

O moralismo abstrato concentra a atenção na esfera da vida privada, do indivíduo. Portanto, aprisiona a política à moral intimista e subjetiva deste. Ao centrar a atenção na esfera individual, o moralista julga o governante tão-somente por suas virtudes e vícios, enfatizando suas esperanças na transformação moral dos indivíduos.

Ao agir assim reduz um problema de teor social e coletivo a um problema individual. No limite, chega à conclusão de que as questões sociais podem ser solucionadas se convencermos os indivíduos isoladamente a contribuírem, por exemplo, dividindo sua riqueza como os desafortunados.

O resultado é catastrófico: o moralista angustia-se porque a política não se enquadra nos seus valores morais individuais e termina por renunciar à própria ação política. Dessa forma, contribui objetivamente para que prevaleça outra política.

De um lado o ‘realismo político’; de outro, o moralismo absoluto. Nem tanto mar, nem tanto terra. A política e a moral, embora expressem esferas de ação e de comportamento humano específicas e distintas, são igualmente importantes para a ação humana no sentido da transformação social.

Política e moral são formas de comportamento que não se identificam (a primeira enfatiza o coletivo; a segunda o indivíduo). Nem a política pode absorver a moral, nem esta pode ser reduzida à política. Embora sejam esferas diferentes, há a necessidade de uma relação mútua que não anule as características particulares de cada uma. Portanto, nem a renúncia à política em nome da moral; nem a exclusão absoluta da política.

Mas, ainda fica a pergunta inicial: é possível a ética na política? Para uma resposta mais abrangente é preciso analisar as diferenças entre ética e moral (conceitos que usamos de forma indistinta).

Ética e moral

Em nosso cotidiano enfrentamos problemas morais e éticos. Por exemplo: devo cumprir a promessa que fiz ao meu amigo, embora venha a perceber que fazê-lo me causará prejuízos? Sempre devo dizer a verdade ou há ocasiões em que a mentira não apenas se faz necessária como será benéfica ao meu interlocutor? Devo persistir numa ação que moralmente é valorada como boa, mas cujas conseqüências práticas são extremamente prejudicais a outrem? Se cumpro ordens posso ser julgado do ponto de vista moral? Se meu amigo colabora com o inimigo devo denunciá-lo?

A questão ética é, portanto, uma questão prática que extrapola a política — no sentido restrito da política institucional. É interessante como se exige ética na política e, muitas vezes, no âmbito da vida privada, procedemos de forma anti-ética. Aliás, determinados casos políticos onde se alardeia a exigência da ética, nada tem a ver com esta: são, em suma, meros casos de polícia.

Esta relação direta com a realidade dos indivíduos contribui para o entendimento comum que assemelha ética à moral e toma uma pela outra. Um bom exemplo desta confusão conceitual está na expressão já consolidada no vocabulário as diversas profissões: os códigos de ética. Na verdade são normas, regras procedimentos, que configuram, digamos, um código de moral. Observemos que mesmos os partidos políticos têm os seus códigos de ética!

Ética tem origem no grego ethos, que significa modo de ser. A palavra moral vem do latim mos ou mores, ou seja, costume ou costumes. A primeira é uma ciência sobre o comportamento moral dos homens em sociedade e está relacionada à Filosofia, isto é, pergunta-se sobre a fundamentação última das questões. Sua função é a mesma de qualquer teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. A segunda, como define o filósofo VÁZQUEZ (1992), expressa "um conjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regulam o comportamento individual dos homens".

O campo da ética é diferente da moral: enquanto tal não lhe cabe formular juízos valorativos, mas sim explicar as razões e proporcionar a reflexão. A moral pressupõe regras de ação e imperativos materializados em realidades históricas concretas. A moral antecede à própria ética, é normativa e se manifesta concretamente nas diferentes sociedades enquanto resposta às suas necessidades. Sua função consiste precisamente me regulamentar as relações entre os indivíduos e entre estes e a comunidade, contribuindo para a estabilidade da ordem social.

A moral não é natural. Pelo contrário, resulta da ação do homem enquanto ser social, histórico e prático. Como fato histórico, a moral corresponde aos diversos estágios da evolução da humanidade. A ética acompanha este desenvolvimento sem se reduzir à moral. No entanto, ambas se confundem porque a ética parte de situações concretas, isto é, dos fatos e consequentemente da existência da moral.

Explicitado as relações e diferenças entre ética e moral, retomemos o fio da meada: é possível a ética na política? Se seguirmos o itinerário da política, dos gregos à modernidade, verificaremos que não há resposta simples nem única. De um lado, a exigência da ética enquanto componente da política expressa o desejo da sua moralização. Como a moral é essencialmente uma forma de comportamento relacionada com a consciência individual, seus critérios chocam-se com a esfera da política enquanto atividade coletiva. A política pressupõe ainda confrontos e conflitos entre interesses de grupos opostos e antagônicos, o que potencializa ainda mais o choque com os imperativos morais do indivíduo.

Na política não é apenas o interesse individual que está em jogo, mas também os interesses de grupos e coletivos expressados pela ações dos indivíduos. É verdade que muitas vezes aquilo que aparece como algo pertinente à coletividade, de fato mascara o interesse pessoal e carreirista do político que pede seu voto e que faz o discurso do bem comum.

Mas, mesmo este político está preso aos interesses dos grupos que financiam sua eleição e, de certa forma, precisa mediatizar seu interesse egoísta com aquele do grupo social do qual faz parte ou do qual depende financeiramente para dar vôos políticos mais altos. Além do mais, nem que se resuma à mera retórica, ele necessita aparentar ser o que não é: um defensor dos anseios coletivos, do bem-estar social da coletividade .

Por outro lado, a moralização da política recoloca uma antiga problemática: a relação entre o público e o privado. Foram os gregos na antigüidade que inventaram o espaço da política enquanto expressão da vontade coletiva, isto é, enquanto esfera da ação humana que submete a vontade arbitrária e privada do poder pessoal do governante às instituições públicas. Dessa forma, cunharam a distinção entre a autoridade pública — expressão do coletivo — e autoridade privada — identificada com o déspota, o chefe de família. A condição da política é justamente a ausência do despotismo.

Os fins justificam os meios?

Com Maquiavel a política atinge a maioridade e é concebida enquanto esfera autônoma da vida social. A política deixa de ser pensada a partir da ética e da religião. Neste sentido, Maquiavel representa uma dupla ruptura: com os clássicos da antiguidade greco-romana e com os valores cristãos medievais. A política deixa de ser pensada apenas no contexto da filosofia e se constitui enquanto um campo de estudo independente, com regras e dinâmica livres de considerações privadas, morais, filosóficas ou religiosas

Em Maquiavel, a política identifica-se com o espaço do poder, enquanto atividade que na qual se assenta a existência coletiva e que tem prioridade sobre as demais esferas da vida humana. A política funde-se com a realidade objetiva, com os problemas concretos das relações entre os homens: deixa de ser prescritiva — em torno de uma abstração moral e ideal — e passa a ser vista como uma técnica, com leis próprias, atinente ao cotidiano dos indivíduos.

Para Maquiavel a política deve se preocupar com as coisas como são, em toda sua crueza, e não com as coisas como deveriam ser, com todo o moralismo que lhe é subjacente. Ao libertar a política da moral religiosa, Maquiavel explicitou seu caráter terreno e transformou-a em algo passível de ser assimilado pelos comuns dos mortais.

Isto teve um preço. Não por acaso seu nome virou adjetivo de coisa má. Maquiavelismo virou sinônimo de uma prática política desprovida de moral e de boa fé, um procedimento astucioso e velhaco. De fato, o florentino nada mais fez do que demonstrar a hipocrisia da moral da sua época, isto é, mostrar como, por trás de uma moralidade que justificava a dominação dos senhores feudais e da senhora feudal, a Igreja Católica, a política era cruel e friamente praticada através de meios nada cristãos: traições, assassinatos, guerras etc.

A política explicitada e descrita em sua obra com dezenas de exemplos retirados da história mais se assemelha ao inferno dantesco do que ao paraíso prometido aos pobres camponeses, desde é claro, que eles se conformassem com a exploração e a situação de miséria em que viviam. Ontem como hoje a recompensa ao conformismo está no pós-morte, no além.

Maquiavel não introduziu as práticas amorais na política. A despeito de toda a moralidade, o ‘maquiavelismo’ que lhe imputam já se fazia presente antes dele escrever sua obra mais polêmica: O Príncipe.** Quem ler este livro sem levar em consideração e estudar minuciosamente o contexto histórico no qual ele escreveu, não aprenderá nem fará justiça ao seu autor.

Com Maquiavel cai por terra a falácia da política enquanto busca da justiça, do bem comum etc. A fraseologia cristã-medieval fundada na moral religiosa mascara o fundamento da política e do Estado: a manutenção do poder político em torno das classes dirigentes em cada época histórica. Conquistar e manter o poder: eis em síntese a finalidade essencial da política. É neste sentido que Maquiavel cunha sua famosa e mais polêmica frase: "Os fins justificam os meios."

Muito já foi dito e escrito sobre esta assertiva. E ela permanece atual. Em primeiro lugar, é difícil não reconhecer que há uma relação entre fins e meios. Como diria um revolucionário russo: "É preciso semear um grão de trigo se se quiser obter uma espiga de trigo".

Há uma relação dialética entre fins e meios, no sentido de que há uma interdependência entre ambos. O problema é o que a afirmação maquiaveliana encerra em si: o que se pode e o que não se pode fazer para atingir determinado fim? Se o fim é justo, todos os meios justificam-se?

Esta questão não pode ser satisfatoriamente respondida sem equacionarmos outra que se coloca a priori: o que justifica o fim? Ora, a realidade social na qual vivemos está longe de assemelhar-se ao paraíso ou à harmonia positivista da ordem e progresso. A ordem se mantém a ferro e fogo, isto é, a partir da ocultação ideológica das relações e mecanismos de exploração e pelo uso do aparato repressivo estatal, sempre que se faz necessário.

Por outro lado, este século, se pensarmos filosoficamente e não apenas do ponto de vista tecnológico, enterrou a ilusão positivista — mas também iluminista e a leitura evolucionista marxista — de que a humanidade marcharia sempre numa direção progressista. Duas guerras mundiais, o nazismo, o fascismo, o stalinismo, as ditaduras de esquerda e de direita etc., negam qualquer idéia no sentido de uma evolução linear positiva

Mesmo de um ponto de vista essencialmente capitalista, o progresso é um fracasso pois que toda a riqueza produzida com o desenvolvimento tecnológico está concentrada cada vez mais em mãos de poucos, aumentando o fosso entre ricos e pobres — e não precisa ser marxista para verificar que a miséria aumenta no mundo, que a desigualdade cresce e que as mazelas sociais atingem até mesmo os países mais poderosos.

Assim, a questão dos fins está relacionada à questão política-social. Porém, se entendemos a política enquanto conflitos de interesses entre grupos e classes sociais, a justificação dos fins diz respeito às opções que fazemos quanto ao projeto político. Evidentemente adotar uma ou outra opção justificará este ou aquele fim. Numa sociedade onde impera a desigualdade e as relações de dominação e exploração entre as classes e grupos sociais, os fins não são universais, como também não o é a moral.

Justificado o fim pelo projeto social que assumimos, podemos então discutir se os fins justificam os meios. Há uma tradição, que começa com o próprio Maquiavel, que responde afirmativamente (quanto a este é preciso esclarecer que ele se refere ao Estado e não aos procedimentos morais individuais). Se pensarmos na ação política concreta seria ingenuidade, própria de um moralismo abstrato desligado de contextos históricos concretos, imaginarmos que tanto a direita quanto a esquerda não justificou os meios utilizados pelo fim perseguido.

Esta análise nos coloca diante de problemas concretos. Partindo do pressuposto que os fins buscados são diferentes, pode a direita e a esquerda utilizar dos mesmos meios? Quem luta pela liberdade pode usar recursos ditatoriais, repressivos? Quem respeita a vida humana pode adotar procedimentos de tortura assassinatos etc., em nome do objetivo político? O que diferencia uma ditadura de esquerda de outra de direita? O terrorista que luta pela liberdade de seu país justifica os meios que utiliza e que, invariavelmente, vitima inocentes?

Os fins justificam os meios, é verdade. Mas apenas na medida em que estes meios não entram em contradição com os fins almejados. Quer dizer, nem tudo é permitido! Só é aceitável aquilo que contribui para que se atinja o fim e que não represente a negação deste. Toda a experiência do ‘socialismo real’ expressa a comprovação histórica de que não basta proclamar certos fins — por mais justos que sejam — é preciso encontrar os meios adequados.

Não se constrói uma nova sociedade utilizando-se os mesmos recursos predominantes na velha estrutura social. Os marinheiros de Kronstadt, os camponeses da Ucrânia e os trabalhadores oprimidos por um Estado e um partido que governou ditatorialmente em seu nome que o digam. Neste caso, os fins já são outros e muito diferentes dos enunciados. Dialeticamente, os meios também mudaram e justificam-se pelos fins ora em pauta. Maquiavel tinha razão...

 

 

 

 

 

 

Balzac e Maquiavel:

Curso de História e Moral para Uso dos Ambiciosos

"O sucesso é a razão suprema de todas as ações, quaisquer que sejam elas. O fato não é pois mais nada por si mesmo, consiste inteiramente na idéia que os outros formam a seu respeito." (Honoré de Balzac)

A ambição, define o Aurélio, é o desejo veemente de alcançar aquilo que valoriza os bens materiais ou o amor-próprio (poder, glória, riqueza, posição social, etc.); exprime um desejo ardente de alcançar um objetivo de ordem superior. Na tradição judaica-cristã, a sofreguidão em possuir bens materiais ou mesmo o intenso desejo carnal pela mulher se inscreve entre os maiores pecados que o ser humano pode cometer:

"Não cobiçarás a casa do teu próximo, não desejarás sua mulher, seu servo, nem sua serva, nem seu boi, nem seu jumento, nem coisa alguma que pertença a teu próximo." (Ex. 20,17)

"Todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério." (Mt., 5, 28)

Vivemos numa sociedade onde prevalece desejo ardoroso de consumir bens materiais e simbólicos. A todo momento somos estimulados a querer algo, a possuí-lo. Os padrões sociais são balizados pela ostentação, pela indumentária, por aquilo que temos. Vivemos numa sociedade do TER, na qual o SER encontra-se asfixiado. A sociedade não perdoa a ingenuidade dos que não fazem um bom curso de ambição. Os vencedores são os que tiram as maiores notas.

O consumismo e a erotização são faces da mesma moeda. As mercadorias substituem as relações entre as pessoas: não só estas são tratadas como mercadorias – que podem, portanto, serem compradas, vendidas trocadas etc., conforme o poder econômico – como, as próprias mercadorias assumem características humanas.

Que me perdoem os cristãos antigos e novos, mas numa sociedade que excita diuturnamente seus membros a consumirem e verter erotismo, é impossível não transgredir a lei sagrada. Do jeito que vai, o anjo rebelde reivindicará uma reforma da lei ou o seu reino ficará diminuto para tantas almas cujos corpos desejam outros corpos e vêem em máquinas e outros objetos a personificação dos corpos cobiçados.

Mas deixemos tema tão escabroso de lado e voltemos à ambição. Honoré de Balzac, em Ilusões perdidas (1978), desenvolve uma crítica corrosiva do autor de O Príncipe. Os personagens balzaquianos, o ambicioso Luciano e o maquiavélico cônego, travam um diálogo muito instrutivo. Começa o padre ensinando-nos que há sempre duas histórias: a oficial e a que se ensina ad usum Delfhini, ou seja, a mentirosa; a historia expurgada dos textos que possam confundir a mente, portanto, impróprias para o uso do filho do rei, o Delfim.

A história ensinada nas escolas, ontem como hoje, é, em geral, uma coleção de datas e fatos, que nada esclarece sobre as verdadeiras e vergonhosas causas dos acontecimentos. De que nos serve saber que Joana d’Arc existiu?, pergunta o cônego. De que nos serve conhecer os resultados das ações dos grandes homens e mulheres se não conhecermos os meios que utilizaram? Vejamos, a título de ilustração, um trecho deste elucidativo diálogo:

– Não estudou os meios pelos quais os Médicis, de simples negociantes, chegaram a grão-duques de Toscana?

– Um poeta, na França, não tem obrigação de ser um beneditino – disse Luciano.

– Pois bem, meu jovem, eles se tornaram grão-duques como Richelieu se tornou ministro. Se tivesse procurado na história as causas humanas dos acontecimentos, em vez de aprender-lhes de cor as etiquetas, o senhor obteria preceitos para a sua conduta. De que acabo de tomar ao acaso na coleção de fatos verdadeiros, resulta a seguinte lei: Não veja nos homens, e principalmente nas mulheres, senão instrumentos; mas não deixem que eles o percebam. Adore como ao próprio Deus aquele que, colocado acima do senhor, lhe pode ser útil, e não o abandone até que ele lhe tenha pago bem caro a sua servidão. No comércio do mundo, seja em suma, duro como o judeu e vil como ele: faça pelo poder o que faz ele pelo dinheiro. Mas também, preocupe-se tanto com o homem que caiu como se ele jamais tivesse existido. Sabe por que deve proceder assim?... O senhor quer dominar o mundo, não é? Pois é preciso começar por obedecer ao mundo e estudá-lo bem. Os sábios estudam os livros, os políticos estudam os homens, seus interesses, as causas geradoras dos seus interesses, as causas geradoras de suas ações. Ora, o mundo, a sociedade, os homens tomados em seu conjunto são fatalistas: eles adoram o acontecimento. Não sabe por que lhe faço esse pequeno curso de história? É que o julgo de uma ambição desmedida...
– Sim, meu padre!

Neste diálogo, o cônego balzaquiano assume-se como discípulo de Maquiavel. Neste caso, o nome do florentino adjetiva a atitude dos que pautam sua vida pela cobiça, sem preocupação com qualquer fogo sobrenatural. Luciano, o ambicioso fracassado, é criticado por ter sido humano demais, isto é, por ter deixado que seus sentimentos atrapalhassem sua ascensão, por ter sucumbido ao moralismo. Seu pecado não foi ambicionar, mas não fazê-lo com a devida intensidade.

Em Ilusões perdidas, maquiavelismo tem significação pejorativa. Como nos ensina o Aurélio, esta palavra também expressa uma atitude política desprovida de boa-fé, um procedimento astucioso, velhaco, traiçoeiro, dissimulador. Numa palavra: maquiavélico.

Balzac reafirma o mito do judeu rico e o que poderíamos denominar tipo ideal weberiano do avarento, tão bem representado pelo Pai Grandet noutra de suas obras magistrais: Eugénie de Grandet. Recordemos esse autor clássico escreve no século XIX, quando o espírito burguês encanta a sociedade mercantilizando as relações humanas. Mas é diferente na atualidade?

A Moral

Não há moral. O que determina o bem e o mal é o resultado. Seja vitorioso, torne-se poderoso, rico etc. e todos os seus atos desonrosos serão esquecidos. O importante não é a prática ou o que você é, mais a imagem que fazem da sua pessoa. "Esconda o avesso da sua vida", afirma o padre, ao ambicioso Luciano.

Mesmo que você não se suporte diante do espelho - material e/ou da sua consciência - mostre-se belo para o exterior. Discrição: eis a palavra chave; ou como diremos nos meios políticos, a palavra-de-ordem do ambicioso. Adote-a como sua, ensina-nos o sacerdote. E, para que não fiquem dúvidas, vejamos seu argumento:

"Os grandes cometem tantas covardias como os miseráveis; mas cometem-nas na sombra e fazem ostentação das suas virtudes: permanecem grandes. Os pobres exercem suas virtudes na sombra e expõem suas misérias ao sol: são desprezados."

Seja verdadeiro e sincero, mostre-se como você é e será ridicularizado e desprezado. Aparente ser o que você não é; atue na escuridão e não deixe que a luz seja suficiente para tornar a obscuridade do seu ser inteligível ao outro e você será respeitado, elogiado e bajulado. Tudo reside na fórmula: dissimule.

Balzac revela os desígnios ocultos em relação ao mito da moral e da virtuosidade da justiça. O que é moralmente condenável e justo? Acaso o ladrão é mais culpado do que o indivíduo que, por irresponsabilidade política e administrativa, atira à miséria dezenas e centenas de famílias? Será o governante cuja política econômica aprofunda a exclusão social e favorece os que vivem na sombra menos culpado que o ladrão que rouba um indivíduo ou uma família?

"Os juízes, condenando o ladrão, mantém a barreira entre pobres e ricos", afirma Balzac. Na verdade, os grandes roubos - como os escândalos - tendem a ser acobertados porque expressam apenas deslocamentos de fortunas. Há a privatização do dinheiro público. A estratégia é abafar um escândalo com um novo escândalo. Transferem-se fortunas de forma lícita - dentro das normas legais - ou por maneiras ilícitas. O efeito é o mesmo: deslocamento de fortunas. As fraudes, os grandes roubos etc., não colocam a sociedade em risco. Envolve gente graúda, tubarões. Os bagrinhos têm que garantir a sobrevivência, não têm tempo e condições para se preocupar com a dilapidação do bem público. Acompanham estarrecidos. Uma minoria se organiza e tenta influir sobre a maioria para colocá-la em movimento contra este estado de coisas. Mas, não é fácil.

O modelo que prevalece é o dos que tem sucesso e... propriedades. Enriquecer! Este é o grito de guerra de todas as torcidas. Feito isso, pode-se permitir o "luxo da honra". Só quem ousa pode atingir o topo. E ousar é saber usar os meios certos nos momentos adequados.

Maquiavel diria que o príncipe deve saber usar os vícios e as virtudes, a bondade e a maldade, a paz e a violência: é preciso ser ter a força do leão e a astúcia da raposa: saber agir como homem e como animal. O padre balzaquiano, que é maquiavélico, diz que devemos agir como o jogador: saber dissimular e esconder o jogo. O jogador que é franco, é um péssimo jogador: só perderá. O exímio jogador "não somente oculta o seu jogo, mais ainda trata de dar a entender, quando está certo de ganhar, que vai perder." O segredo é a lei suprema: é imprescindível ocultar os meios.

Os fins justificam os meios! Quanto maquiavelismo nesta frase pronunciada há séculos sem qualquer referência com o contexto histórico em que foi escrita - e, na maioria dos casos, descontextualizada em relação à totalidade da obra. Não deve nos surpreender o fato de maquiavelismo e maquiavélico terem adquirido o status de adjetivo e substantivo.

Pode realmente haver boa-fé na política? A exemplo do ambicioso balzaquiano, o objetivo do político não é o sucesso? Também ele não é avaliado pelos resultados? O político deve observar a moral ou agir como o jogador?

Uma rápida leitura de O Príncipe, modelo para os ambiciosos de todo parecem comprovar a analogia. Mas, de qual ambição nos fala Maquiavel: do indivíduo que almeja a riqueza ou mesmo o poder para o deleite pessoal ou aquela ambição que move os homens mais ilustres na história humana, indivíduos que almejam construir algo que transcenda a finitude da vida? No contexto do renascimento italiano, esse ente duradouro que sobrevive ao seu criador e é legado às gerações futuras, é o Estado. O objetivo de Maquiavel é o estabelecimento de um poder capaz de garantir a ordem social.

A política e a moral pertencem a domínios diferentes da práxis humana. O sujeito da política é a coletividade, a Pólis. Na esfera da ação política o que importa é a certeza, os efeitos e a fecundidade dos resultados. O criador de cidades terrenas, condutor de homens e do Estado, é julgado pelo sucesso ou fracasso e não por considerações morais cristãs. Seu lema é: fazer o que é necessário, a fim de aconteça o que se objetiva. Sua ética é a da responsabilidade - como definiria Max Weber.

O sujeito da moral é o indivíduo. Sua ética é a do dever pela convicção. A moral individual adota como preceito fazer o que deve ser feito, independente do que possa acontecer. Pouco lhe importa as conseqüências dos seus atos, os resultados: o essencial é a certeza do dever cumprido. O que vale é a pureza das intenções, o que pressupõe a coerência entre a intenção e a ação. Ages com justiça e deixa o resto nas mãos de Deus. Na esfera individual a moral cristã apresenta-se como própria do homem de fé, do sábio profeta, cujos olhos estão postos na cidade celeste. Porém, os homens não são anjos celestiais e a política, enquanto esfera de ação coletiva, é o reino de interesses genuínos e espúrios.

Pode o condutor de homens e construtor do Estado pautar suas ações pela ética da convicção? Os antigos falavam em bem comum, bom governo, justiça, etc. Outros, como Thomas More, em Utopia, imaginaram sociedades onde o homem finalmente alcançaria a felicidade. Expressam uma concepção política prescritiva destituída de vínculos com a realidade nua e fria. Há muito que os reis e governantes deixaram de ser avaliados por suas virtudes e/ou vícios, mas por sua eficácia - Ricardo II, de Shakespeare, é uma bela ilustração desta forma de julgar o governante.

A política pauta-se por interesses conflituosos e antagônicos concretos e pela ação de homens de carne e osso. Sua moralidade não é a do dever pelo dever. Aquilo que é visto como imoralidade é, na verdade, uma inversão do moralismo sacrossanto: o que move a política é busca de resultados concretos e não imaginários (embora a imaginação também cumpra um papel importante, principalmente quando codificada em Ideologia).

Balzac e outros anti-maquiavélicos invertem Maquiavel: trazem para a arena do privado o que foi pensado tendo como referência uma entidade superior aos indivíduos - e mesmo ao governante. A perspectiva de Maquiavel é histórica pois é balizada pela necessidade da constituição do Estado que, nas condições do seu tempo, significava a unificação da Itália. Ora, esta é uma tarefa gigantesca, acima das forças de homens normais e de quaisquer considerações de cunho moralista.

O príncipe capaz de dar cabo dessa tarefa pode tudo? Ele pode usar do bem e do mal, dos vícios e das virtudes e da violência conforme considerar necessário. Contudo, há limites: não abusar dos direitos dos súditos, garantir a segurança e a estabilidade, não ser odiado pelo povo - embora seja prudente ser temido. Se o príncipe colocar suas ambições pessoais acima do Estado, poderá ficar em maus lençóis. A ambição do príncipe não é a que se reduz à mesquinhez do indivíduo privado: ele é o criador e provedor de instituições.

Se há um bem para Maquiavel, este diz respeito ao estabelecimento da ordem temporal. Maquiavel foi um ambicioso à maneira do que hoje chamamos de cidadão - construtor e mantenedor do Estado. Sua ambição maior era servir à República de Florença e contribuir para a unificação da Itália - não por acaso será reabilitado pelos italianos no século XIX. Também não é um acaso que ele tenha morrido pobre e desprezado pelos políticos da sua época.

Maquiavel era bastante pessimista quanto à natureza humana:

"Quem quiser praticar sempre a bondade em tudo o que faz está condenado a penar, entre tantos que não são bons. É necessário. Portanto, que o príncipe que deseja manter-se aprenda a agir sem bondade, faculdade que usará ou não, e cada caso, conforme necessário." (O Príncipe, cap. XV)

Se somos ambiciosos por natureza - o homem lobo do homem, como diria Hobbes -, é preciso um poder que garanta a ordem social. Este poder é o Estado: Principado ou República em Maquiavel; Leviatã em Hobbes. Num e noutro caso, a estabilidade da ordem social deve ser mantida. Hoje, essa ordem é a dos privilégios, a que protege os campeões em ambição, a que faculta as condições para os deslocamentos das fortunas.

De qualquer forma, não culpemos Maquiavel pelos ambiciosos do nosso tempo. Pois, se como escreveu Balzac no século XIX, "a nossa sociedade não mais adora o verdadeiro Deus, mas o bezerro de ouro", ou seja, se a "política só leva em conta a propriedade", a culpa não é do florentino.

O Marxismo no Brasil: múltiplas trajetórias, utopias, decepções e contribuições

História do Marxismo no Brasil (Volume V), organizado por Marcelo Ridenti e Daniel Aarão Reis Filho, trata dos partidos e organizações dos anos 1920-1960. Nos seis capítulos que compõem O livro, aborda-se, de maneira sucinta, a história das esquerdas marxistas no Brasil: o Partido Comunista do Brasil (PCB), o trotskismo, o Partido Socialista Brasileiro (PSB), a Organização Revolucionária Marxista-Política Operária (ORM-POLOP) e a Ação Popular (AP).

Inicialmente, Marcos del Roio analisa a atuação dos comunistas, nas décadas de 1920-1940. Trata-se dos primeiros passos do Partido Comunista: as dificuldades objetivas e subjetivas em se firmar enquanto organização política autônoma dos trabalhadores; as debilidades teóricas, próprias da nossa exígua tradição marxista (ao contrário dos congêneres europeus – onde, em geral, os partidos comunistas surgiram de cisões da social-democracia –,o comunismo brasileiro deita raízes no anarquismo, com o partido se constituindo a partir da conversão de militantes libertários, influenciados pela Revolução Russa, ao bolchevismo); a interferência do movimento comunista internacional, através do Bureau Sul-Americano, que resultou no afastamento do grupo dirigente original (Astrogildo Pereira,Octávio Brandão e Cristiano Cordeiro), abortando os esforços, particularmente de Octávio Brandão, em formular uma teoria da revolução brasileira; e, as relações conflituosas com o positivismo, o liberalismo e o prestismo. O período analisado pelo autor abrange as origens, consolidação e o quase aniquilamento do Partido Comunista, vítima da onda repressiva durante o Estado Novo getulista.

Segundo a tradição egípcia, existiu uma ave mitológica que vivia por séculos e, mesmo queimada, ressurgia das cinzas. Esta ave maravilhosa é conhecida como Fênix. Seu nome passou a ser usado enquanto sinônimo de persistência, tenacidade, referência às pessoas e instituições que sobrevivem às mais duras provas. Assim foi o Partido Comunista em vários momentos da sua história. Nos idos dos anos 1940, renascido das cinzas, tal qual a Fênix, o partido cresce excepcionalmente, tornando-se um partido de massas, com considerável influência sobre a política brasileira. Este período, marcado pelos estertores do regime varguista, o final da II Guerra Mundial, e a reconquista da liberdade e da democracia no Brasil, termina com o golpe militar de 1964. Nesta fase o PCB conquistou a legalidade, e perdeu-a, cassado no clima da fria; teve inflexões à esquerda e à direita, oscilando entre uma política de colaboração e alianças de classes a uma retórica esquerdista e revolucionária para, nos anos 50, com a Declaração de Março, se definir pelo caminho pacífico da revolução brasileira. Todo este percurso tortuoso é analisado por Daniel Aarão Reis Filho.

Da aurora de todos os sonhos (a redemocratização do Brasil a partir de 1945), à longa noite sombria (iniciada com o despotismo militarista de 1964), o PCB se bateu entre reforma e revolução. Este é o mote deste segundo capítulo. É um período que, guardada as devidas proporções conjunturais e históricas, nutre semelhanças com o processo de lutas sociais de finais de anos 70 e inícios dos anos 1980, com a reconquista das liberdades democráticas, o crescimento do movimento sindical e popular e o surgimento de uma organização política dos trabalhadores, que se afirma como novidade, mas que também incorpora a herança histórica do passado pecebista e das esquerdas marxistas.

No terceiro capítulo, Dainis Karepovs e José Castilho Marques Neto resgatam a trajetória dos trotskistas brasileiros, das origens aos anos 1966. O trotskismo se caracterizou por historicamente se restringir a pequenos agrupamentos sem inserção de massas, em geral composto por intelectuais e estudantes. Contudo, o trotskismo também se caracteriza por sua radicalidade e capacidade de interpretar a realidade social brasileira. Segundo os autores, isto permitia aos trotskistas "observar e enunciar realidades que escapavam a outras organizações políticas contemporâneas." O trotskismo contribuiu ainda para romper com o monolitismo do partido único, dando um caráter pluralista à historia do movimento operário e fornecendo chaves teóricas para a discussão dos impasses e derrotas dos projetos da esquerda. (pp. 103-04)

As raízes do trotskismo brasileiro estão nas polêmicas e enfrentamentos no seio do Partido Comunista da União Soviética e na III Internacional. A derrota de Leon Trotsky, o profeta assassinado, determinou a reconfiguração do movimento comunista internacional com a formação da Oposição Internacional de Esquerda e, posteriormente, a IV Internacional. É neste contexto que Mário Pedrosa e outros militantes assumem a tarefa de construir a alternativa trotskista no Brasil. Os autores analisam as contribuições e dificuldades desta primeira geração de trotskistas e das posteriores: suas formulações teóricas, a difícil convivência com os comunistas do tronco pecebista e seus embates internos, influenciados pela conjuntura nacional e pelas polêmicas no interior da IV Internacional.

Chegamos ao capítulo 4, escrito por Margarida Luiza de Matos Vieira. A autora estuda a contribuição do Partido Socialista Brasileiro, no período 1947-1965. um primeiro elemento que chama a atenção é que o PSB não se afirmava como um partido marxista, embora influenciado pelo pensamento de Karl Marx e de outros teóricos marxistas. O PCB reconhecia esta contribuição e se pretendia um espaço aberto a todos que desejassem lutar por uma sociedade fundada no socialismo e na liberdade. No PSB, mescla-se o socialismo democrático, desvinculado da tradição stalinista, com um socialismo inspirado no pensamento de Rosa Luxemburgo, e uma concepção liberal sobre o Estado e a sociedade.

Analisando o programa do PSB, sua prática política e sua trajetória, a autora conclui que o mesmo se constituiu num "partido-semente", agitador de uma nova concepção política e cultural que deu base a um projeto de cidadania coletiva que, ao contrário dos projetos dos liberais orgânicos e mesmos dos comunistas, combinava as dimensões políticas e sociais da democracia." (pp. 181-82)

Também aqui, é possível verificar semelhanças com o Partido dos Trabalhadores, em especial na fase da sua formação e nos primeiros anos. Em ambos confluíram várias vertentes do pensamento social. Também o PT assumiu-se como alternativa ao marxismo oficial do PCB e ao trabalhismo e, especialmente a partir do seu VI Encontro Nacional, no clima da queda do muro de Berlim, assumiu a democracia como centro da sua política, propugnando um resgate do socialismo democrático. Como o PSB do período estudado na obra, o PT terminou por enfatizar a estratégia eleitoralista, reservando para o socialismo o lugar das calendas.

A radicalização do movimento social nos anos 1960 gerou condições propícias para o surgimento de uma esquerda desvinculada tanto da tradição stalinista quanto da alternativa trotskista atuante à época, o Partido Operário Revolucionário (POR). Nesta conjuntura, acrescenta-se mais um ingrediente: o crescimento da esquerda católica, em especial no movimento estudantil. É neste contexto que surgem as duas organizações políticas analisadas, respectivamente, por Marcelo Badaró Mattos e Marcelo Ridenti: a POLOP e a AP.

Para a formação da POLOP convergiram militantes descontentes com o reformismo do PCB, setores radicalizados da Juventude Socialista do PSB (Guanabara), parte da Juventude Trabalhista (em Minas Gerais) e outros marxistas independentes. Em sua formação inicial participaram militantes destacados na política e na intelectualidade brasileira: Theotônio dos Santos, Moniz Bandeira, Ruy Mauro Marini, Juarez Guimarães, Emir e Eder Sader, Michel Lowy e Eric Sachs, mais conhecido pelo pseudônimo de Ernesto Martins. A POLOP também é reflexo de uma dissidência a nível internacional, que se distanciara tanto do stalinismo quanto do trotskismo. Neste sentido, seus militantes bebem em fontes luxemburguistas e no pensamento de autores poucos conhecidos no Brasil, como Brandler e Talheimer.

O autor do capítulo sobre a POLOP, intitula-o, apropriadamente, Em busca da revolução socialista: a trajetória da POLOP (1961-1967). Com efeito, a ORM-POLOP é a primeira organização marxista, depois dos trotskistas, que apresenta uma análise da revolução brasileira contestatória à concepção etapista hegemonizada pelo stalinismo e propõe um Programa Socialista para o Brasil. O autor analisa esta contribuição para o debate no seio das esquerdas, suas origens, composição, inserção nos movimentos sociais e faz um breve balanço.

O caso da Ação Popular é singular. Trata-se da síntese construída nos anos 60 entre o marxismo e o cristianismo. O estudo das origens da AP, suas propostas e sua trajetória peculiar nos ajuda a compreender subjetividades, potencialidades e contradições de projetos societários construídos historicamente. As relações entre religião e política, ou mais precisamente, entre religião e marxismo, permanecem como um mistério a ser desvendado: até que ponto a política é sacralizada? Até onde podemos falar em secularização da religião num sentido político?

O estudo desta experiência nos ajuda a entender esta difícil relação que, diga-se de passagem, não se restringe ao Brasil: esquerda católica e marxismo se mesclam em toda a América Latina. Retornando com força com força nos anos 1980, a partir da atuação das pastorais e Comunidades Eclesiais de Base fundadas na teologia da libertação, e também devido à experiência da revolução nicaragüense, é um fenômeno que mantém atualidade.

Neste capítulo, o autor também analisa as influências das revoluções cubana e chinesa e a tensão vivenciada pelos militantes da AP entre um humanismo cristão em vestes marxistas e a plena adesão ao ideário marxista, cujo significado pode ser medido por quem experimentou crises religiosa, pois, em última instância, trata-se da negação, não apenas da religião, mas da própria idéia de Deus. Crise semelhante vivenciaram os comunistas quando na década de 1950, tiverem que romper com o mito de Stalin, a partir das denúncias dos seus crimes. A questão é emblemática: nestes casos pode-se falar em superação plena da religião ou seria o caso de pensarmos num sacerdócio racionalista e secular, fundado em símbolos e na militância marxista. Com isto, sugerimos temas indicados pela leitura; o objetivo do autor, é claro, é analisar a experiência política da AP, das suas origens à sua completa dissolução nos anos 1980.

Sabemos que boa parte dos militantes da AP terminaram por abraçar a idéia de que o partido do proletariado é único e, nos debates do período, pareceu-lhes que este partido era o Partido Comunista do Brasil (observemos que vários dirigentes deste partido são originários da AP). Os organizadores da História do Marxismo anunciam que o próximo volume da História do Marxismo tratará, entre outros temas, do Partido Comunista do Brasil. Está ótimo! Porem, em nossa singela opinião, o presente volume, pelo período abordado, seria o espaço mais apropriado, pois, forneceria um quadro mais abrangente das esquerdas até os anos 1960.

Sabemos que a História do Marxismo é uma longa história. Quando, nos anos 1980, o prestigiado historiador Eric J. HOBSBAWM organizou a História do Marxismo, em âmbito internacional, abriu-se a possibilidade de compreensão desta história sem os maniqueísmos, sectarismo e dogmatismos presentes na trajetória dos marxistas. Como escreveu HOBSBAWM, prefaciando o primeiro volume da série:

"Comecemos pelo pressuposto evidente de que a História do Marxismo não pode ser considerada como algo acabado, já que o marxismo é uma estrutura de pensamento ainda vital e sua continuidade foi substancialmente ininterrupta desde o tempo de Marx e Engels". (1983: 13)

Um projeto com esta amplitude só teria sucesso se partisse do princípio de que o marxismo deve ser tratado no plural, como também os temas e os autores devem respeitar este pluralismo. Neste sentido, o correto é mais correto nos referirmos aos marxismos e não propriamente ao marxismo, no singular. Como bem salientou Carlos Nelson Coutinho:

"Ao admitir o fato real do pluralismo nas investigações marxistas, não se está admitindo um relativismo vulgar ou um ecletismo anticientífico. O que está é se constatando outro fato real: que também no interior do marxismo, a busca da verdade não pode fugir à explicitação ampla e democrática de um debate aberto, de um livre confronto de idéias." (Id., da apresentação)

Tudo isto parece óbvio, não fosse a tradição sectária, dogmática e autoritária presente no movimento comunista. Não por acaso, o próprio Marx recusou a alcunha de marxista. Não esqueçamos que nos tempos sombrios as divergências eram superadas de uma forma abominável: pelo aniquilamento físico (Trotsky e os militantes dos POUM, durante a guerra civil espanhola, são exemplos clássicos desta triste memória histórica). Tempos em que se proibia a amizade, namoro ou qualquer tipo de aproximação com os inimigos da classe operária, ou seja, os trotskistas. Prevalecia a lógica da política amigo-inimigo.

Portanto, um dos aspectos mais relevantes desta História do Marxismo no Brasil, desde o seu primeiro volume, é o tratamento pluralista dos temas, seguindo a trilha aberta pela obra organizada por Hobsbawm. O leitor mais jovem ou menos afeito à política marxista, no passado e no presente, pode até mesmo considerar natural tamanho pluralismo. Mero engano! Em outros tempos não muito longínquos, uma obra com estas características seria impensável e impraticável. Recordo-me por exemplo, das dificuldades que tive quando, nos anos 1980, encetei a saborosa aventura de escrever a História das Tendências no Brasil. À época, ainda sob o rescaldo da ditadura militar, este era um tema tabu: muitos se recusaram a falar sobre ele; outros nutriam uma desconfiança política-ideológica (afinal, era um jovem sem militância nas organizações tradicionalmente vinculadas ao marxismo); desconfiança no tocante à segurança (ainda se tentava superar os insuperáveis sofrimentos da ação repressiva e da clandestinidade). A todas estas dificuldades, perfeitamente compreensíveis, juntava-se a exígua disponibilidade de fontes bibliográficas.

Em compensação, o raiar da liberdade aguçou o espírito da nova geração sedenta de saber; uma geração sem militância nas organizações tradicionalmente vinculadas ao marxismo e que estavam sujeitas a um anticomunismo velado ou explícito, seja no interior de organizações como o PT, em movimentos pastorais ligados à Teologia da Libertação, no movimento sindical e social em geral. Nunca esqueço os conselhos para que me afastasse de determinado indivíduo, porque este cometia o grave pecado de ser comunista.

Minha geração, em sua maioria, desconhecia a História do Marxismo. E os marxistas não contribuíam muito para se fazerem conhecer. Reduzidos às organizações sobreviventes do ciclo ditatorial apegavam-se em demasia a uma retórica que dificultava a aproximação dos que ainda não haviam se iniciado nos mistérios da militância em tendências. Tratava-se de marcar posição, ocupar as trincheiras e fazer valer suas verdades. Este clima favorecia o sectarismo, mas não anulava os movimentos de tentativa de converter as consciências e conquistar novos quadros. Eram verdadeiros assédios às consciências em formação.

Converter-se pressupunha conhecer – sob o risco de se tornar um papagaio, repetidor de fórmulas e discursos políticos memorizados pelas leituras fáceis e a doutrinação dos líderes. E mesmo os não convertidos, pouco a pouco, se deram conta de que era preciso conhecer os marxistas, ainda que com o objetivo de melhor combatê-los. Num e noutro caso, o ato de conhecer estava vinculado ao agir, à militância.

Embora a época atual testemunhe, para muitos, a crise das utopias e o interesse acadêmico prevaleça sobre a curiosidade militante, pensamento que se faz ação, a obra História do Marxismo no Brasil é uma contribuição fundamental a quem deseje conhecer a trajetória dos partidos e organizações de inspiração marxista. Hoje, quando o Partido dos Trabalhadores governa cidades e Estados e se credencia para dirigir o país, torna-se fundamental retomar e aprender com a história. A História do Marxismo também cumpre este papel. Seja por objetivos acadêmicos, seja por desígnios militantes, é essencial conhecermos o nosso passado histórico.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fundação legal do PT no Colégio Sion (10 de fevereiro de 1980)


Raul Pont: O ano de 1980 iniciou-se promissor para o Movimento Pró-PT. Apesar da descrença dos parlamentares que, inicialmente, afirmavam sua simpatia pelo projeto, o PT vai se consolidando no país como proposta autônoma e enfrentando a nova Lei Orgânica dos Partidos, feita na medida para fortalecer a organização partidária de cima para baixo, a partir do Congresso Nacional. Em janeiro circula o anteprojeto do Manifesto a ser aprovado na fundação oficial do Partido.
Em 10 de fevereiro, atendendo a uma convocação da Comissão Nacional Provisória, reuniram-se, no Colégio Sion, em São Paulo, representantes do Movimento Pró-PT de 17 Estados brasileiros, já representando articulações regionais que escolhiam democraticamente suas coordenações estaduais e já tomavam iniciativas para campanhas de filiação, alugar sedes, produzir boletins e ampliar o movimento para os municípios do interior do País.
Nesta oportunidade foram coletadas as 101 assinaturas exigidas pela Lei Orgânica dos Partidos em vigor para encaminhar o pedido de registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral.


Paulo Skromov: O primeiro ato de fundação de um partido legal era simplíssimo, demais. Ficamos até assustados com a bobagem que parecia ser - quer dizer - você reunir 101 pessoas. Era isso que exigiam, para começar a registrar o partido, assinando um manifesto político que contivesse as idéias do partido.
Como uma maneira de ampliar o partido nesse momento, a gente ofereceu assinatura de fundadores a pessoas que nós não pretendíamos incorporar ao partido, mas que tinham importância na sociedade para os explorados, para os oprimidos, e que tinham sensibilidade para as aspirações populares. E foi um sucesso. Nós conseguimos levar pessoas extremamente representativas e hoje muitas delas se orgulham de serem fundadoras do partido, com justa razão, porque nos ajudaram a dar esse passo importante.
Aí, formalizamos o Movimento pelo PT. A lei exigia que se pusesse um P na frente, se não exigisse, não teríamos fundado o PT, teríamos continuado com Movimento pelo PT, porque achávamos que ainda era o Movimento. Tanto que o MDB também foi obrigado a por um P na frente e ficou PMDB. Para nós, em vez de colocar Partido do Movimento pelo PT - ficava muito esquisito - a gente eliminou o M e ficou PT.
Essa foi uma fundação formal, ela tem sua importância, acabou marcando a nossa história, acabou sendo definidora de um novo momento que foi a deflagração da legalização, mas o que deflagrou de fato a legalização foi a reunião de 13 de outubro de 79. Foi lá que tiramos a decisão de fazer a reunião de fundação.


Raul Pont: Foi um momento histórico de reencontro de militantes de várias gerações que tinham lutado contra o regime militar, mas também contra o reformismo dos PCs tradicionais e o populismo de Getúlio Vargas e do PTB: misturavam-se com a geração dos anos 68-69, com os intelectuais e professores universitários que resistiram ao regime militar e com a nova vanguarda sindical, que se construíra na luta e que fora criada pelo "milagre brasileiro", pelo recente desenvolvimento do capitalismo brasileiro.


Paul Singer: Essa reunião no Colégio Sion foi um momento emocionante. Houve três grandes figuras antigas, por assim dizer, que batizaram o PT: o Mário Pedrosa, um importantíssimo intelectual, trotskista, do Partido Socialista; o Sérgio Buarque de Holanda e o Apolônio de Carvalho. Pessoas com 70, 80 anos de idade, com uma longa folha corrida de atuação política e intelectual...
Eu me lembro que Mário Pedrosa fez um discurso dizendo: "Vocês vão deixar todas as suas bíblias fora. Vocês vão entrar no PT sem bíblia, sem dogmas. Nós vamos todos aprender juntos um novo bê-a-bá". Isso foi dito por um homem que tinha sido um dos grandes ideólogos da esquerda não-estalinista no Brasil. Foi muito impressionante. Ele estava certo. Ele morreu em 1980 e disse isso alguns meses antes de morrer. Ele percebeu que o PT que estava se fundando era extremamente heterogêneo, que tinha de haver uma grande boa vontade para que essa heterogeneidade não levasse a uma sectarização.
Essa era a grande oportunidade histórica, perseguida durante décadas pela esquerda brasileira, que havia lutado contra o populismo e o reformismo burocratizado e antidemocrático dos PCs brasileiros. Combinavam-se elementos chaves para materializar a organização independente dos trabalhadores, perseguida há décadas por pequenos grupos dissidentes do PC nos anos 30, por revolucionários isolados e, já nos anos 60, pela estratégia da ORM-Polop e pelos grupos que romperam com os PCs nos anos 66-69.
O surgimento do PT era a grande chance de construir aquela alternativa através de um partido amplo, de massas e enraizado nos sindicatos, nos movimentos populares e no meio da juventude.

Divergências na fundação do PT
Avaliações diferentes das perspectivas de
legalização do partido

Perseu Abramo*

A existência, o papel e a importância de grupos originados de organizações de esquerda dentro do Partido dos Trabalhadores passaram a ser, na última semana, um dos tópicos de discussão nos círculos políticos. O tema surgiu durante e após a reunião nacional de fundação do PT, realizada no dia 10, nas dependências do Colégio Sion, em São Paulo.

Convocada para aprovar o Manifesto de Lançamento - cuja primeira divulgação pública se havia dado a 10 de janeiro - e para eleger a Comissão Diretora Nacional Provisória, a reunião só chegou a tratar do primeiro dos dois itens; por consenso dos mil e duzentos presentes à sessão do final da tarde, adiou-se para o Encontro Nacional de 12 e 13 de abril a eleição da Comissão Nacional.

A reunião do dia 10 ressentiu-se de falhas de organização consideradas normais pelos dirigentes, num partido que ainda está nos primeiros passos de sua formação e quase não conta com quaisquer recursos materiais. Por causa disso, e por causa das dificuldades em atender a todos os pedidos de credenciamento, a sessão da manhã começou depois do horário de início previsto.

As dificuldades foram também de natureza política: nem todas as delegações de fora de São Paulo - havia 18 Estados representados - atenderam ao requisito de credenciar um representante para cada grupo de 21 militantes de núcleos, mais os líderes e dirigentes sindicais indicados pelos núcleos ou pelas regiões. O resultado é que, pressionada pelo enorme número dos que não teriam credenciamento, a direção do encontro foi obrigada a admitir todos no recinto dos debates, concedendo direito a voz aos não credenciados; a recomendação de separar fisicamente, dentro do auditório, os credenciados e os não credenciados não foi integralmente respeitada por estes últimos, o que não permitiu diferenciação entre os dois tipos de participantes, nas fases de discussão.

Nas votações das cinco comissões em que se dividiu o plenário, contudo, o critério foi respeitado, e na sessão plenária final, que tornou a congregar os participantes das comissões de trabalho, o critério foi desnecessário, uma vez que as resoluções foram adotadas por aclamação.

PRINCIPAIS DECISÕES

Dirigida pelo coordenador nacional do PT, o líder sindical Jacó Bittar, a mesa foi secretariada pelo senador goiano Henrique Santillo e contou com a presença do deputado fluminense Edson Khair, de Lula, de Paulo Matos Skromov e de outros líderes populares e dirigentes sindicais.

Também sentaram-se à mesa, na parte da manhã, os seis primeiros signatários do Manifesto de Lançamento, muito aplaudido pelo plenário: Mário Pedrosa (fundador do semanário "Vanguarda Socialista" em 1945), Manuel da Conceição, líder camponês do Nordeste; Sérgio Buarque de Holanda, historiador; Lélia Abramo, atriz; Moacir Gadotti, em nome do educador Paulo Freire; e Apolônio de Carvalho, fundador do PCBR.

O final da manhã e quase toda a parte da tarde foram ocupados com discussões acirradas a respeito do Manifesto de Lançamento. Foi no processo dessas discussões que se começaram a delinear com maior nitidez as teses defendidas por militantes originários de algumas organizações políticas e as endossadas pelos principais líderes sindicais e parlamentos do PT.

Foram feitas acusações recíprocas de "obreirismo" e de "linguajar pseudo-radical", de "legalismo" e "parlamentarismo".

Não obstante, no final foi aprovado por consenso, na Comissão de Redação, e por aclamação, no plenário de mil e duzentas pessoas, um Manifesto de Lançamento que não difere muito, no essencial, da sua versão original, mas que contém mudanças de forma no sentido de acentuar a diferenciação entre as classes trabalhadoras e o conjunto da sociedade.

Essas diferenças de forma é que foram abundantemente exploradas pelos jornais das grandes empresas, na semana que passou, e que deram origem a disseminadas preocupações sobre as perspectivas de constituição do PT.

Em relação à Comissão Nacional, a decisão tomada foi a de manter-se a atual Coordenação, provisoriamente, até o encontro de 12 e 13 de abril, quando deverá ser eleita, de acordo com a Lei Orgânica dos Partidos, a Comissão Diretora Nacional Provisória, que deverá solicitar o registro provisório do partido até a realização da Convenção Nacional e eleição da Comissão definitiva. Até 12 e 13 de abril, contudo, deverão ser eleitas, por plenárias estaduais, as Comissões Diretoras Regionais Provisórias, que serão depois referendadas pela Nacional.

"O objetivo fundamental da reunião" - disse Paulo Mattos Skromov, membro da Coordenação Nacional do PT - "é a fundação do partido, sem desprezar nenhum espaço de atuação política dos trabalhadores, e, com esse espírito, nos lançarmos à luta pela legalização do PT. Para isso, estamos hoje abrindo o período preparatório para o Encontro Nacional, com a intensificação de filiação dos militantes, a discussão dos pontos programáticos e estatuários e a adoção dos passos destinados à obtenção do registro no Tribunal Superior Eleitoral".

APRECIAÇÕES DIVERSAS

Entre os próprios líderes e dirigentes do PT, contudo, foram diversas as avaliações sobre a reunião de fundação do partido.

Para alguns, os chamados grupos organizados, que muitos qualificam de "radicais", obtiveram vitórias significativas, principalmente na versão final do Manifesto e no adiantamento da eleição da Comissão Nacional, interpretado pelos que assim pensam como manobra para dificultar ou impedir a legalização do PT. Para outros, o resultado final da reunião, ao contrário, evidenciou que esses grupos são minoritários, levando-se em conta, principalmente, que suas teses não obtiveram o endosso da maioria dos trabalhadores militantes do PT.

O coordenador nacional do PT, Jacó Bittar, fez uma avaliação positiva da reunião, afirmando que ela demonstrou a democracia interna do partido, mas prometeu lutar contra eventuais tentativas de hegemonia por parte dos grupos organizados que não representam a vontade dos trabalhadores. Essa, também, é a opinião de Lula, que acrescentou não estar disposto a fazer o papel de "entregar ao Sistema" esses grupos, embora também não admita a substituição da hegemonia dos trabalhadores, dentro do PT, por facções que não os representem.

Já o deputado federal Airton Soares foi mais contundente nas suas críticas, considerando que a reunião do dia dez não foi democrática e reafirmando que o PT é um partido dos trabalhadores e não uma frente de organizações de esquerda. E o economista Paulo Singer, escrevendo na "Folha de São Paulo" do dia 14, elogiou o espírito democrático da reunião do dia dez e acentuou o caráter de classe do novo partido, que, segundo ele, tem uma originalidade: "…o PT foi iniciado por líderes sindicais, ou seja, parte de figuras representativas da sociedade civil, enquanto os demais partidos em formação foram originados da área política".

Movimento de 18 a 24/02/80

10 de fevereiro de 1980 - significado da data

O dia 10 de fevereiro de 1980 ficou consagrado como a data oficial da fundação do PT.

Contudo, desde o ano de 1978, a proposta de organização de um partido de trabalhadores vinha sendo objeto de acirradas discussões no meio sindical. Com avanços e recuos a idéia foi avançando e várias etapas foram cumpridas ao longo do ano de 1979.

Em 24 de janeiro daquele ano foi apresentada e aprovada a tese elaborada pelos metalúrgicos de Santo André para discussão no IX Congresso dos Trabalhadores Metalúrgicos, Mecânicos e Eletricitários do Estado de São Paulo, realizado em Lins/SP. O IX Congresso, representando mais de um milhão de metalúrgicos, deixava claro que um partido de trabalhadores só teria legitimidade se nascesse de um programa feito pelos próprios trabalhadores, sem interferência dos patrões. Dessa reunião saiu a proposta de organização de uma comissão com representantes de outros estados para discutir o programa e os estatutos do futuro partido.

No dia 1º de maio do mesmo ano, foi dada a público a Carta de Princípios do PT e no dia 13 de outubro, em S. Bernardo do Campo, foi aprovada uma Declaração Política e criada a Comissão Nacional Provisória que iria dirigir o Movimento Pró-PT em todo o território nacional. Nessa reunião estavam presentes, além dos sindicalistas, vários representantes de movimentos sociais e da igreja progressista, intelectuais, militantes de esquerda de variadas posições, que, todos, convergiam para engrossar o movimento pela criação do partido dos trabalhadores.

O dia 10/2/80 ficou marcado como sendo o da fundação do PT, porque na reunião realizada no Colégio Sion cumpria-se uma formalidade indispensável, de acordo com a Lei Orgânica dos Partidos, para que o registro da nova agremiação se tornasse possível: a aprovação do Manifesto, com um mínimo de 101 assinaturas, expressando os objetivos e as linhas fundamentais de pensamento que deveriam ser a base da proposta do partido.

Paulo Skromov, membro da Comissão Nacional Provisória do Movimento Pró-PT, conta (ver depoimento publicado abaixo na matéria intitulada "Fundação legal do PT no Colégio Sion"), que a realização dessa reunião chegou a parecer para alguns dos organizadores uma "bobagem". Nas palavras de Skromov, diante da magnitude que o movimento tinha assumido, estendendo-se por todo o país, com milhares de adesões, a reunião de apenas 101 pessoas para assinarem um Manifesto que era exigido pela legislação, parecia muito pouco, uma formalidade sem muita significação.

Contra tal opinião pessimista, o que aconteceu no dia 10 de fevereiro, no auditório do Colégio Sion, foi muito mais do que uma reunião formal. Em primeiro lugar, pelo comparecimento maciço dos representantes de quase todos os Estados (242 delegados, mais de 1.000 participantes) e pela presença de vários convidados, não engajados no movimento mas que foram dar apoio à iniciativa. Mas também, e talvez isso tenha sido o mais importante, pelo clima de congraçamento entre os diversos setores que se dispunham a levar avante o projeto da construção do Partido dos Trabalhadores.

Fora preciso vencer muitas barreiras: as dúvidas quanto à viabilidade do projeto; a divergência de concepções (tanto no movimento sindical como entre os intelectuais); as desconfianças mútuas entre os militantes de esquerda e os ativistas de movimentos sindicais e populares a que se refere Vinícius (ver depoimento de Vinicius Caldeira Brant); os "preconceitos" da parte dos sindicalistas contra "intelectuais", contra parlamentares e contra estudantes, e vice-versa; e assim por diante. Mas, finalmente, a utopia, há longo tempo alimentada por tantos dos antigos militantes de esquerda, de construir um partido amplo, enraizado nos sindicatos, nos movimentos populares, no meio da juventude (ver depoimento de Paul Singer), parecia tomar forma visível, concreta, naquele auditório do Colégio Sion. Víamos ali, lado a lado, militantes de várias gerações que haviam lutado contra os regimes de opressão, professores universitários, representantes de igrejas e dos mais variados movimentos populares e associativos, intelectuais e a nova vanguarda sindical. Todos juntos num objetivo comum.

O entusiasmo gerado por essa percepção foi sem dúvida um dos fatores que concorreram para deflagração das campanhas - de legalização e filiação - que permitiram que, em tempo recorde, todas as exigências da lei partidária fossem cumpridas e o PT pudesse começar sua vida legal.

O objetivo da Fundação Perseu Abramo foi recolher, nesta página, alguns documentos, depoimentos de seis dos signatários da ata de fundação do Partido, transcrições de textos e citações, ilustrando a participação de algumas das milhares de pessoas que foram parte importante dessa história. Acreditamos que todo o material reunido será importante, não só para "o resgate do passado", mas também para permitir uma reflexão sobre o "daqui por diante", contribuindo, assim, para o enfrentamento dos complexos desafios que o nosso partido tem pela frente.

Zilah Wendel Abramo - vice-presidente da Fundação Perseu Abramo.

O manifesto dos 113

Manifesto

O Partido dos Trabalhadores surge da necessidade sentida por milhões de brasileiros de intervir na vida social e política do País para transformá-la. A mais importante lição que o trabalhador brasileiro aprendeu em suas lutas é a de que a democracia é uma conquista que, finalmente, ou se constrói pelas suas mãos ou não virá.

A grande maioria de nossa população trabalhadora, das cidades e dos campos, tem sido sempre relegada à condição de brasileiros de segunda classe. Agora, as vozes do povo começam a se fazer ouvir através de suas lutas. As grandes maiorias que constróem a riqueza da nação querem falar por si próprias. Não esperam mais que a conquista de seus interesses econômicos, sociais e políticos venha das elites dominantes. Organizam-se elas mesmas, para que a situação social e política seja a ferramenta da construção de uma sociedade que responda aos interesses dos trabalhadores e dos demais setores explorados pelo capitalismo.

Nascendo das lutas sociais

Após prolongada e dura resistência democrática, a grande novidade conhecida pela sociedade brasileira é a mobilização dos trabalhadores para lutar por melhores condições de vida para a população das cidades e dos campos. O avanço das lutas populares permitiu que os operários industriais, assalariados do comércio e dos serviços, funcionários públicos, moradores da periferia, trabalhadores autônomos, camponeses, trabalhadores rurais, mulheres, negros, estudantes, índios e outros setores explorados pudessem se organizar para defender seus interesses, para exigir melhores salários, melhores condições de trabalho, para reclamar o atendimento dos serviços nos bairros e para comprovar a união de que são capazes.

Estas lutas levaram ao enfrentamento dos mecanismos de repressão imposto aos trabalhadores, em particular o arrocho salarial e a proibição do direito de greve. Mas tendo de enfrentar um regime organizado para afastar o trabalhador do centro de decisão política, começou a tornar-se cada vez mais claro para os movimentos populares que as suas lutas imediatas e específicas não bastam para garantir a conquista dos direitos e dos interesses do povo trabalhador.

Por isso, surgiu a proposta do Partido dos Trabalhadores. O PT nasce da decisão dos explorados de lutar contra um sistema econômico e político que não pode resolver os seus problemas, pois só existe para beneficiar uma minoria de privilegiados.

Por um partido de massas

O Partido dos Trabalhadores nasce da vontade de independência política dos trabalhadores, já cansados de servir de massa de manobra para os políticos e os partidos comprometidos com a manutenção da atual ordem econômica, social e política. Nasce, portanto, da vontade de emancipação das massas populares. Os trabalhadores já sabem que a liberdade nunca foi nem será dada de presente, mas será obra de seu próprio esforço coletivo. Por isso protestam quando, uma vez mais na história brasileira, vêem os partidos sendo formados de cima para baixo, do Estado para a sociedade, dos exploradores para os explorados.

Os trabalhadores querem se organizar como força política autônoma. O PT pretende ser uma real expressão política de todos os explorados pelo sistema capitalista. Somos um Partido dos Trabalhadores, não um partido para iludir os trabalhadores. Queremos a política como atividade própria das massas que desejam participar, legal e legitimamente, de todas as decisões da sociedade. O PT quer atuar não apenas nos momentos das eleições, mas, principalmente, no dia-a-dia de todos os trabalhadores, pois só assim será possível construir uma nova forma de democracia, cujas raízes estejam nas organizações de base da sociedade e cujas decisões sejam tomadas pelas maiorias.

Queremos, por isso mesmo, um partido amplo e aberto a todos aqueles comprometidos com a causa dos trabalhadores e com o seu programa. Em conse-qüência, queremos construir uma estrutura interna democrática, apoiada em decisões coletivas e cuja direção e programa sejam decididos em suas bases.

Pela participação política dos trabalhadores

Em oposição ao regime atual e ao seu modelo de desenvolvimento, que só beneficia os privilegiados do sistema capitalista, o PT lutará pela extinção de todos os mecanismos ditatoriais que reprimem e ameaçam a maioria da sociedade. O PT lutará por todas as liberdades civis, pelas franquias que garantem, efetivamente, os direitos dos cidadãos e pela democratização da sociedade em todos os níveis.

Não existe liberdade onde o direito de greve é fraudado na hora de sua regulamentação, onde os sindicatos urbanos e rurais e as associações profissionais permanecem atrelados ao Ministério do Trabalho, onde as correntes de opinião e a criação cultural são submetidas a um clima de suspeição e controle policial, onde os movimentos populares são alvo permanente da repressão policial e patronal, onde os burocratas e tecnocratas do Estado não são responsáveis perante a vontade popular.

O PT afirma seu compromisso com a democracia plena e exercida diretamente pelas massas. Neste sentido proclama que sua participação em eleições e suas atividades parlamentares se subordinarão ao objetivo de organizar as massas exploradas e suas lutas.

Lutará por sindicatos independentes do Estado, como também dos próprios partidos políticos.

O Partido dos Trabalhadores pretende que o povo decida o que fazer da riqueza produzida e dos recursos naturais do País. As riquezas naturais, que até hoje só têm servido aos interesses do grande capital nacional e internacional, deverão ser postas a serviço do bem-estar da coletividade. Para isto é preciso que as decisões sobre a economia se submetam aos interesses populares. Mas estes interesses não prevalecerão enquanto o poder político não expressar uma real representação popular, fundada nas organizações de base, para que se efetive o poder de decisão dos trabalhadores sobre a economia e os demais níveis da sociedade.

Os trabalhadores querem a independência nacional. Entendem que a Nação é o povo e, por isso, sabem que o País só será efetivamente independente quando o Estado for dirigido pelas massas trabalhadoras. É preciso que o Estado se torne a expressão da sociedade, o que só será possível quando se criarem as condições de livre intervenção dos trabalhadores nas decisões dos seus rumos. Por isso, o PT pretende chegar ao governo e à direção do Estado para realizar uma política democrática, do ponto de vista dos trabalhadores, tanto no plano econômico quanto no plano social. O PT buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados e nem exploradores. O PT manifesta sua solidariedade à luta de todas as massas oprimidas do mundo.

  • Aprovado pelo Movimento Pró-PT em 10 de fevereiro de 1980, no Colégio Sion (SP), e publicado no Diário Oficial da União de 21 de outubro de 1980.

 

 

Trabalho e Política

Ruptura e tradição na organização política dos trabalhadores (Uma análise das origens e evolução da Tendência Articulação – PT)

Introdução

A irrupção das massas trabalhadoras no cenário político do século XIX gerou as condições necessárias para o surgimento dos partidos operários de massas, socialistas e social-democratas. Neste momento, os trabalhadores ultrapassam ao âmbito da organização sindical e economicista, voltando-se para a construção de organizações de cunho político. Os caminhos são vários e indicam relações diferentes e contraditórias entre os sindicatos e os partidos.

No caso inglês, por exemplo, a organização política, o Partido Trabalhista, surge vinculada e submetida à organização sindical. Já os alemães construiriam uma forte organização social-democrata que estabeleceu uma relação conflituosa e de equilíbrio com o movimento sindical. Onde o sindicalismo era fortemente influenciado pelo anarquismo, a organização política, o partido político, teve mais dificuldades de se implantar.

No Brasil, a experiência anarco-sindicalista, aliada à realidade objetiva e subjetiva da classe trabalhadora em suas origens, predominou por muito tempo. Os diversos partidos surgidos em finais do século passado, e nas primeiras décadas deste, não conseguiam se firmar enquanto organizações com fortes vínculos com os trabalhadores. Em geral, reduziam-se a pequenos grupos intelectualizados da classe média e não resistiam à evolução do tempo.

Um marco neste processo foi a fundação do Partido Comunista, seção brasileira da Terceira Internacional. É interessante observar que esse partido forma-se no bojo da influência da Revolução Russa de 1917 e, inclusive, com a conversão de vários anarquistas à forma de organização bolchevique e comunista.

Esta forma organizativa firmou-se entre os trabalhadores e, pelo menos até 1964, a despeito das suas cisões e dos concorrentes, manteve a hegemonia no movimento social organizado. A fragmentação da esquerda marxista no período posterior ao golpe militar, por seus erros de análise e de estratégia, mas também devido à intensa repressão da qual foi vítima, gerou um vácuo ocupado pelo surgimento de uma nova vanguarda de sindicalistas e de militantes de base, cuja referência foi o ABC paulista. Novamente, colocou-se em pauta a construção do partido político dos trabalhadores. Contudo, esse novo tem a influencia do que considera velho e incorpora sua herança.

Portanto, a formação do PT e da Articulação 113 atualiza um debate já muito antigo: a necessidade de os trabalhadores se organizarem em partidos políticos e suas relações com as demais formas de organização sindical e popular. A experiência da organização política dos trabalhadores tem aqui sua continuidade. Por outro lado, também fornece os elementos para a análise das possíveis rupturas com a tradição inaugurada com os grandes partidos social-democratas europeus.

A Articulação: origens, caráter e influência política

Tendência majoritária, a Articulação (ART) é a face do PT. Sua política, suas teses, sua prática social e partidária dão o tom ao partido. Detentora do controle da direção partidária, com o domínio da máquina burocrática, a maioria dos parlamentares e dos prefeitos, a ART é a principal responsável pela práxis petista, por suas formulações estratégicas, concepção de socialismo e modelo de partido. Não é exagero afirmar que a evolução do PT se confunde com sua trajetória.

Essa influência política determinante tem raízes na própria constituição do PT. O elemento essencial para a formação do PT foi a participação dos sindicalistas. [1] Com efeito, os dirigentes sindicais expressam um dos pilares de sustentação do PT, que lhe dá um caráter de massa. O prestígio dos sindicalistas reflete essa relação – principalmente pelo carisma de lideranças como Lula. Essa base sindical é constituída por diferentes categorias e setores econômicos – com destaque para os metalúrgicos do ABCD. [2] A militância da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), também contribuíram para o crescimento e a consolidação do PT no meio rural. [3] No III CONCUT, 94,1% dos delegados rurais declararam preferência pelo PT.

A ART é a principal porta de entrada para o novo contingente de trabalhadores que desperta para a luta política e para muitos dos que decidem assumir a militância partidária. Ela incorpora a maior parte dos militantes que não passara pela experiência do pré-64. [4]

A expressividade de suas lideranças, contribui decisivamente para que ela se torne depositária da combatividade e do desejo de participação política de uma geração sem militância orgânica anterior ao PT. Outros fatores, como a linguagem pouco acessível e a ausência de um método mais adequado para o trabalho de massas utilizado por determinados agrupamentos e organizações de esquerda, bem como o sentimento anticomunista arraigado em todos estes anos, também contribuem para o seu predomínio.

Destaca-se ainda o fato de essa esquerda, vinculada à tradição marxista, encontrar-se fragilizada pela crise instaurada com a sua derrota no pós-64. Além do mais, a ART, devido à sua prática política pragmática, responde de forma mais positiva às necessidades imediatas da nova geração. Sua composição heterogênea proporciona a flexibilidade organizativa mais adequada às características desta vanguarda emergente.

A ART surge em 1983. Em seu primeiro manifesto público, o Manifesto dos 113, defende um PT de massas, de luta e democrático. Durante a maior parte da sua existência, expressa um aglomerado de personalidades e posições políticas diferentes unificadas na defesa do projeto de construção do PT enquanto partido estratégico.

Quando da sua formação tem duplo objetivo: 1º) combater as posições dos que ameaçam diluir o PT numa "frente oposicionista liberal como o PMDB" ou daqueles que se deixam "seduzir por uma proposta "socialista" sem trabalhadores, como o PDT"; e, 2º) combater as Tendências organizadas que, em sua avaliação, mantém uma prática ambígua em relação ao PT, ora concebendo-o como um partido tático, ora intentando transformá-lo numa organização à sua semelhança, com política e métodos marxistas e/ou leninistas. (VIANA, 1991: pp. 121-23).

Para a ART, a esquerda organizada não se submete à democracia do PT mas sim a comandos paralelos que priorizavam a divulgação das suas posições em detrimento daquelas do partido. Neste momento, a ART não se vê como uma das Tendências do partido. Numa simbiose que descarta a contribuição das demais forças políticas, ela se coloca como a única autenticamente petista – os outros seriam os que usavam duas camisas. Sua constituição inaugura o período da bipolarização interna: ela, de um lado; do outro, uma frente composta pelos setores minoritários (as Tendências). Ambas se caracterizam pela heterogeneidade. O petismo transforma-se em sinônimo de engajamento militante na ART.

Majoritária e hegemônica, sua força oculta sua vulnerabilidade. Primeiro, porque sua heterogeneidade dificulta a formação de um núcleo dirigente com uma estratégia definida (as formulações a que chega são mediadas pela necessidade de atender aos diversos interesses coletivos e individuais). Segundo, porque há uma disparidade entre a cúpula e a base (em termos de recursos, acesso às informações, formação política etc.). A base não participa da formulação política, apenas ratifica e lhe dá sustentação.

Conseqüentemente, a maioria configurada é superficial, sua unidade é frágil e aparente. Os embates teóricos e a experiência adquirida tendem a desenvolver o espírito crítico da base, que pode se transformar em rebeldia e pressão sobre a cúpula, o que acentua a tensão existente em seu interior.

Uma das formas de superação dessa tensão se dá pela emergência de setores dissidentes e o posterior rompimento – além dos casos individuais. A dissidência, em geral, surge como manifestação de descontentamento e revolta. De repente, o mecanismo que sustenta as posições majoritárias – de delegação de poder à Comissão Executiva Nacional e de confiança na liderança do núcleo histórico, os sindicalistas – se torna insuficiente. A base passa a exigir a democratização das discussões e decisões e se mostra favorável às propostas consideradas inadmissíveis pela direção. É a "revolta dos bagrinhos". [5]

A reação das suas lideranças é diferenciada: alguns dirigentes reforçam a pressão dos liderados e incorporam as críticas; outros adotam uma postura autodefensiva. De qualquer forma, esse processo pressiona a ART a aprofundar as definições políticas e organizativas, isto é, a se assumir enquanto Tendência interna do PT. Na prática, a ART se remodela, constituindo-se, no período que antecede o 5º EN, numa corrente política em torno de Lula e dos sindicalistas, com a participação de setores vinculados à Igreja progressista e incorporando quadros marxistas oriundos da corrente O Trabalho (OT).

A formação dessa corrente insere-se no esforço de consolidar um núcleo dirigente. [6] Na prática, isso significa fechar os espaços para os setores que defendem uma política mais branda e conciliadora e para aqueles politicamente não confiáveis abrigados sob o guarda chuva da ART.

Esse processo reflete o crescimento da esquerda nos anos 80, cujo auge será precisamente o ano de 1989; e, expressa o esforço político em forjar um maior grau de homogeneidade e de elaboração teórica. Por outro lado, revela a crescente influência dos dirigentes com formação marxista no interior da ART. Esses quadros são originários do PCB e PC do B – e das suas cisões. Suas referências ideológicas são: a revolução cubana, a China e, em certa medida, outros países no Leste Europeu, como a ex-Alemanha Oriental (RDA).

Formados predominantemente no caldo cultural stalinista, romperam com o reformismo e a teoria da revolução por etapas e, em sua maioria, abraçaram, desde o início, o projeto de construção do PT como partido estratégico – inclusive como fundadores da ART.

Os laços com Cuba induziram à identificação de parcela destes marxistas com o castrismo. Seria este o núcleo dirigente da ART? De fato, parte expressiva dos quadros que organizam a ART provém da experiência da luta armada, em particular dos setores vinculados à ALN. [7] Por isso, concretizou-se a idéia da existência de um grupo castrista organicamente estruturado no interior da ART. [8] Mas, além desses, há outros militantes formados em outras vertentes da tradição marxista: Eder Sader [9] e Marco Aurélio Garcia (POLOP), Luiz Gushiken e Vito Letizia (de formação trotskista) etc. [10]

Rui Falcão pondera que não se pode falar na existência de um marxismo orgânico na ART. [11] Mas também constata a influência do marxismo: presente na noção da luta de classes, no conceito de revolução e do Estado, na idéia do acúmulo de forças etc. Essas questões, embora não fossem colocadas conceitualmente, "davam margem à leitura que se fez do período e algumas avaliações de conjuntura e propostas que tiveram o seu cume no 5º Encontro de 1987, quanto o PT pela primeira vez fez uma leitura mais criteriosa da sociedade brasileira", disse.

Pomar concorda que não se configurou um núcleo marxista organicamente estruturado como Tendência na Articulação. No entanto, enfatiza o papel dos marxistas. Para ele, esses setores constituem-se nos principais responsáveis pelas formulações políticas e teóricas que a ART consolida nessa fase. [12] A elaboração das suas teses para o 5º EN, por exemplo, tem uma influência decisiva dos militantes vinculados a essa tradição: José Dirceu, Rui Falcão, Wladimir Pomar, entre outros.

Eles não precisam se constituir enquanto Tendência pois a própria estrutura orgânica e a feição heterogênea da ART favorecem sua atuação. Soma-se a isso a experiência prática-teórica acumulada e o respeito que conquistaram junto às lideranças sindicais, especialmente de Lula.

A atuação desses setores é fundamental para que prevaleça a proposta de construção da ART enquanto Tendência. Mas as dificuldades para consolidar esse processo são enormes: a ART mantém o caráter de um condomínio entre diferentes grupos em disputa por mais espaço e poder; a relação da direção com a base permanece ambígua, com desvios cupulistas; e há uma ala contra a sua configuração enquanto corrente permanente e centralizada. Além de tudo, a necessidade de manter a hegemonia no partido constitui uma força oposta ao esforço de delimitação e depuração da base política: para garantir a maioria torna-se necessário estabelecer alianças à direita no espectro partidário.

Isso restringe a obtenção de um grau de homogeneidade mínimo e necessário que possibilite a unidade – sua coesão é dada pelo peso da direção nacional, sobretudo por Lula. Essa diversidade favorece os movimentos de dispersão e a irrupção da rebeldia – de forma individualizada ou organizada. Por outro lado, expressa uma diferença fundamental em relação aos modelos monolíticos de partidos.

Nessa fase, as divergências internas e o descontentamento da base se manifestam com maior intensidade. Setores dirigentes, predominantemente em São Paulo, são favoráveis à dissolução das Tendências e contra a sua regulamentação [13] ; outros defendem o reconhecimento explícito do direito de tendência, inclusive da ART. Às vésperas do 5º EN, realizado em dezembro de 1987, em Brasília, a Comissão Executiva Nacional, composta unicamente por membros da ART, aprova o reconhecimento formal do direito de tendência e descarta a tese da proporcionalidade. [14]

Essas posições, referendadas pelo Diretório Nacional, com maioria da ART, são comunicadas aos seus delegados através de várias reuniões paralelas. Os argumentos e o peso dos dirigentes não são suficientes para evitar que a ART se divida sobre o tema. [15]

Esta polêmica reflete a insatisfação da base e de dirigentes da própria ART diante dos métodos adotados pela maioria. A exigência da democratização interna e a crítica ao hegemonismo resulta na unificação dos setores dissidentes, que impulsionam a formação da Vertente Socialista (VS). [16] Por outro lado, impõem a necessidade de a ART repensar seu papel e a forma de atuação, redefinindo sua estrutura organizativa e sua política.

Já no início de 1988, sua Coordenação Nacional [17] reconhece a nova realidade e lança um documento como subsídio para seu I Seminário Nacional. Nesse documento, os dirigentes máximos da ART reconhecem que a "reflexão partidária tem sido muitas vezes improvisada e superficial" e que sua prática política carece de "planejamento e operacionalidade". [18] Eles observam que o crescente prestígio do PT não se traduz em "incremento da organização partidária e da militância petista" e propõem que a ART se organize com o objetivo principal da "afirmação do PT como Partido estratégico da revolução brasileira". (ARTICULAÇÃO NACIONAL, 1988, p. 03)

O Seminário Nacional é precedido da organização de seminários estaduais. Nos estados a realidade da ART corresponde à diversidade de origens e trajetórias políticas dos seus militantes. Essas diferenças se expressam também em posicionamentos divergentes, que geram vários problemas políticos e de relacionamento.

A coordenação provisória, ciente dessa situação, aconselha a realização de plenárias conjuntas, que objetivem superar as dissensões internas. Na impossibilidade de isso ocorrer, os representantes dos diversos setores são convidados a participar do Seminário Nacional. A coordenação decide ainda visitar os estados, em missão de paz. [19]

A realização dos encontros estaduais possibilita uma amostragem das realidades regionais da ART. Em São Paulo, por exemplo, os militantes observam os seguintes aspectos: desconhecimento da maioria em relação às resoluções do 5ºEN e falta de discussão sobre elas; defasagem entre a direção e os quadros intermediários e a base; levantam a necessidade de aprofundar o debate sobre a relação entre o programa democrático e popular e o socialismo; e cobram uma maior participação dos sindicalistas – que não estariam construindo o partido.

Em Minas, o seminário ocorre nos dias 16 e 17 de abril, com a participação de 115 pessoas, representantes de 19 municípios. Também nesse caso, observa-se a dificuldade de inserção dos dirigentes sindicais no cotidiano do partido (constata-se, por exemplo, a ausência destes na secretaria sindical). [20]

No Rio de Janeiro, a ART funciona inicialmente através da Secretaria Sindical do PT, que aglutina os esforços para a atuação junto à CUT. Esvaziada, "por falta de discussão e iniciativas conjuntas", ela é reorganizada em fins de 1986, basicamente por sindicalistas. Neste ínterim, alguns se afastam e formam outras articulações. O mosaico carioca acusa divergências quanto à política de alianças e a estrutura partidária. [21]

No Espírito Santo, a ART encontra-se dividida em dois setores que se distanciam a partir da luta social no campo. Um setor aglutina-se em torno dos trabalhadores rurais sem terra; no outro despontam os sindicalistas rurais. A ART só consegue a unidade em torno de questões imediatas. Nesse encontro, os participantes chegam a um acordo, formando uma coordenação provisória composta por lideranças dos dois grupos.

Em Santa Catarina, a ART toma corpo com a preparação da Plenária Estadual de abril de 1986. Em 1988, incorpora os militantes que haviam rompido com a Tendência O Trabalho e discute o reingresso dos militantes autonomistas. Embora domine de forma quase absoluta [22] , a ART enfrenta problemas quanto à composição da direção executiva. Outra dificuldade, considerada a principal, diz respeito à "falta de consciência política dos militantes da necessidade de se articular" e, por outro lado, ao "acúmulo de tarefas" dos dirigentes – duplicidade de cargos na direção partidária e na ART. [23]

Além das dificuldades apontadas, a ART se divide em torno de questões como: assumir-se ou não como Tendência; Tendência de massas ou de quadros; funcionamento e tipo de centralismo que deve adotar. Essas questões estão intimamente relacionadas a temas mais gerais como a estratégia, a concepção de partido, a relação com as demais Tendências etc.

O I Seminário Nacional da Articulação realiza-se nos dias 23 e 24 de abril, em Cajamar (SP). [24] Na convocatória, a Coordenação Nacional sugere que os estados escolham como representantes preferencialmente aqueles militantes que foram delegados no 5º EN. Participa a nata da ART, seus melhores e mais expressivos quadros dirigentes. O perfil dos participantes fornece uma amostra do grau de implantação dessa corrente nos Estados, sua composição e características. (ARTICULAÇÃO NACIONAL, 1988b)

Conforme os dados, a maior representação concentra-se no eixo Sul/Sudeste (somam 39 membros num total de 71). Na região Centro Oeste, destaca-se Goiás e Distrito Federal (com 12 dos 14 participantes). No Norte/Nordeste, o destaque é para o Pará. Esses números acompanham o grau de implantação do partido e seu crescimento eleitoral nos diversos estados.

Quanto às profissões, predominam aquelas ligadas à atividade predominantemente intelectual: setor de serviços e o funcionalismo público. O quadro sugere um alto grau de qualificação educacional. Nas profissões ligadas ao trabalho fabril, devemos considerar a profissionalização dos quadros pelo partido ou seu deslocamento para a atividade parlamentar. É sintomático a exígua participação feminina.

A estatística sobre o tempo de militância confirma uma das características da ART já apontadas anteriormente: de ser o pólo aglutinador e ancoradouro político preferencial para nova vanguarda que surgiu a partir de 1978/80. Observamos que os com militância até 10 anos perfazem mais de 54,5%. Considerando que, em geral, os quadros dirigentes têm mais tempo de militância, os números corroboram a novidade que o PT representa enquanto espaço de atuação política. É um partido preponderantemente jovem: 63% dos partícipes têm até 35 anos.

A ART expressa a realidade partidária: seu caráter, sua composição, seu discurso e sua prática, sua estratégia etc. Nesse momento ela se coloca enquanto guardiã do partido. Seu objetivo é garantir a aplicação das resoluções do 5ºEN e "assegurar a plena execução das definições fundamentais do Partido, superando os obstáculos e as indefinições" que o entrava. (ARTICULAÇÃO NACIONAL, 1988b, p. 05)

Para cumprir esse objetivo de forma eficaz, ela procura superar a fase dispersiva anterior e atuar de forma mais orgânica, com um funcionamento permanente e cotidiano. Nesse aspecto, recusa o caráter de uma articulação "apenas de quadros". Mas, também não se restringe a ser "uma articulação de massas", cujos limites possam "ser confundidos com os do próprio partido". Seu critério de participação exige "um mínimo de acúmulo de discussão política". Seu desafio é superar a dicotomia entre ser de quadros e de massas.

A ART decide se estruturar desde o nível municipal até o nacional (através de plenárias, coordenações etc.). Recusa os mecanismos de centralização e subordinação típicos de qualquer organização e advoga a "adesão por solidariedade" e "pelo compromisso político de seus integrantes". [25]

Seu objetivo é se diferenciar das demais Tendências. Mesmo se configurando como mais uma Tendência no espectro petista, procura desvencilhar-se deste termo – ao menos no sentido que ele adquiriu pela prática dos grupos políticos presentes no PT.

As palavras nunca estão isentas de significado político-ideológico. Na luta interna petista, Tendências eram os outros, os que estavam do outro lado. [26] Ora, o outro só existe em função do interlocutor. Mesmo assumindo-se como Tendência, isto é, como uma entre outras forças políticas que disputam propostas e posições internamente ao PT, a ART mantém o preconceito e a unilateralidade que caracterizou esse conceito na fase bipolar. [27]

Esse discurso pertencia ao passado que o 5º EN tornara obsoleto. A época da dualidade entre a ART, de um lado, e a esquerda organizada do outro, se expirava. Ela se renderia às evidências da nova realidade: numa atitude inédita, convida representantes da minoria para participarem da Executiva Nacional. É um indício da aceitação da tese da proporcionalidade. [28]

Esse seminário contribui para coesionar a ART. Ele representa uma tentativa de superar a fragmentação presente em vários estados. Aliás, uma das tarefas da Coordenação Nacional eleita [29] é justamente garantir e estimular a busca da unidade.

Porém, permanecem problemas como a contradição não resolvida entre a centralização do poder de decisão na CEN e o papel cada vez mais consultivo desempenhado pelo DN. Isso se reproduz na própria ART, no relacionamento entre a sua Coordenação Nacional e os níveis regionais/locais. Suas relações internas tendem a uma centralização, gerando distorções antidemocráticas. Soma-se a isso o fato da sua direção nacional se confundir com a CEN e, assim, diminuir o papel e a intervenção da própria ART como Tendência petista.

A Articulação dos 113, a despeito dos seus limites e dificuldades, cumpriu um papel fundamental para que o PT superasse a crise desencadeada logo após as eleições de 1982 e resgatasse seus princípios originais. Agora, estão presentes as mesmas questões, só que num novo patamar.

Os desafios expostos pela evolução da realidade política, econômica e social brasileira, do partido e da própria ART, exigem definições políticas e orgânicas mais precisas. O primeiro desafio é avançar na formulação de um projeto estratégico mais preciso. A ART se põe, então, o objetivo de responder a essa realidade. Para ela, o ponto de partida é a defesa da estratégia democrática e popular e a plena execução das resoluções do 5º EN.

A Articulação e a estratégia do PT

O Partido dos Trabalhadores dá seus primeiros passos situando-se numa perspectiva socialista. Em linhas gerais, seu projeto político é, nas origens, marcadamente anticapitalista. Desde os primeiros documentos e manifestações, o PT defende a construção de uma sociedade socialista, genericamente apresentada como uma sociedade sem explorados nem exploradores. [30] Mesmo genérica e propensa a ambigüidades, essa definição de socialismo distancia-se tanto da social-democracia clássica quanto do stalinismo. Ainda que essa concepção tenha como fundamento basicamente a negação de modelos, é uma referência para a maioria das forças presentes em seu interior. [31]

Paralelamente à referência anticapitalista, o PT desenvolve a crítica contundente à política eleitoreira e de manipulação das massas, praticada pelos partidos tradicionais e pela esquerda reformista. Diferentemente destes, o PT concebe a ação parlamentar na perspectiva da luta social, subordinada ao objetivo de organização e luta das massas exploradas e da elevação da consciência política dos trabalhadores. [32] Pluralista e democrático em sua gênese, o PT se define como um partido de massas, crítico à interpretação estreita e dogmática do partido de quadros.

Expressão do ascenso do movimento de massas, ele incorpora tanto as suas energias positivas e virtudes quanto as debilidades. Essa identificação com o movimento popular e sindical combativo propicia a sua consolidação e determina o seu caráter de massas – mas especificamente, sua forma orgânica de massas.

O crescimento do partido impõe desafios que exige a superação das formulações genéricas. Falta-lhe uma definição estratégica mais precisa, o aprofundamento da concepção de socialismo etc. O 5º EM sintetiza o acúmulo teórico e prático, constituindo-se num marco em seu processo de construção.

É neste encontro que se delineia o projeto político estratégico, e é nele que a discussão sobre o tema do socialismo se torna mais efetiva. Além disso, esse encontro fixa novas diretrizes para a atuação dos petistas no movimento sindical e popular; avança na questão da organização partidária; assume o debate sobre as Tendências em seu interior; e, além de lançar a candidatura Lula para a Presidência da República, aprova a orientação geral para as eleições do ano seguinte.

Ainda nesse encontro, se esboça um dos elementos fundamentais para a formulação da estratégia e a definição da política de alianças: a caracterização da sociedade brasileira. Segundo a análise predominante, o desenvolvimento capitalista no Brasil resultou na ampliação da dependência econômica, da "super-exploração e da prevalência do capital monopolista nos segmentos mais importantes". (PT,1987, p. 14)

Esse modelo de desenvolvimento teria produzido uma estrutura de classes complexa em que, ao lado de uma "massa de assalariados heterogênea", coexistem setores sociais e frações de classe com interesses contrários à classe dominante, como os pequenos proprietários e produtores, que são ao mesmo tempo proprietários dos meios de produção e trabalhadores (pequeno produtor agrícola, autônomos, profissionais liberais etc.). Esse setor, na visão do 5º EN, teria grande importância política e social. (PT, 1987, p.15)

Por outro lado, o 5º EN avalia que crescera o poder econômico da burguesia nas últimas décadas e que, conseqüentemente, ela aperfeiçoou sua organização e expandiu os mecanismos de controle ideológico e político da sociedade, ou seja, seu poder de persuasão. Isso seria ainda mais evidente e intenso no setor monopolista da burguesia ligado à indústria de exportação e ao capital financeiro. Ao mesmo tempo, o Estado se modernizara e se fortalecera, tanto como produtor de bens quanto como aparelho coercitivo.

Ainda nesse ponto, o 5º EN constata que o desenvolvimento capitalista no Brasil ocorrera sem qualquer mudança na estrutura agrária, isto é, respeitando o monopólio da terra e promovendo sua concentração; que houvera constantemente o recurso à ação repressiva do Estado para mediar a relação capital-trabalho; que sua integração ocorrera de forma "subordinada ao mercado e ao sistema financeiro do imperialismo". (PT,1987)

Esses elementos seriam a demonstração da incapacidade do capitalismo no Brasil de "incorporar, ainda que minimamente, milhões de pessoas aos frutos do desenvolvimento", o que limita "a possibilidade da burguesia exercer sua hegemonia na sociedade". (PT,1987)

É a partir dessa caracterização da sociedade brasileira que o PT define sua estratégia da alternativa democrática e popular em torno de um programa antiimperialista, antimonopolista e antilatifundiário. Seu objetivo é estabelecer um governo democrático e popular, através da política de acúmulo de forças e de disputa de hegemonia na sociedade.

A implementação dessa política pressupõe uma definição mais precisa dos aliados táticos e estratégicos: a frente democrática e popular e a frente única classista. Pressupõe ainda a realização das seguintes atividades interligadas entre si: 1) a organização do PT como força política socialista, independente e de massas; 2) a construção da CUT e a organização do movimento popular independente; e, 3) a ocupação dos espaços institucionais.

Com essa formulação teórica, o 5º EN rejeita qualquer possibilidade de aliança com a burguesia, reafirma a necessidade da ruptura revolucionária e a estreita articulação do programa democrático e popular com o socialismo. O PT descarta a tese etapista da revolução brasileira porque esta pressupõe a "possibilidade de uma nova fase do capitalismo, uma fase popular". E, o que seria mais grave, cria "ilusões em amplos setores democrática popular‘’. (PT, 1987)

A "conquista do socialismo e a construção de uma sociedade socialista" é, portanto, o objetivo estratégico maior. Essa formulação identifica a existência de dois momentos distintos na luta pelo socialismo: a "tomada do poder político" e, depois, a construção, propriamente dita, do socialismo. (PT, 1987, pp. 10-14)

Mais uma vez, a questão da hegemonia se torna o cerne desta concepção. Na visão do 5º EN, a destruição do sistema capitalista e, conseqüentemente, o início da construção do socialismo, presumem que os trabalhadores se transformem "em classe dominante no poder de Estado, acabando com o domínio exercido pela burguesia". (PT,1987, p.10)

A resolução aprovada observa que, iniciado o processo de construção do socialismo, ainda permanecem diferentes expressões políticas, reflexo da existência, por um período difícil de prever, de diferentes classes e camadas sociais. Aqui, salienta-se o caráter pluralista da sociedade socialista, expresso também na organização de diferentes partidos. A concepção de socialismo esboçada tem um caráter profundamente democrático e pluralista.

O conteúdo socialista das resoluções do 5º EN foi questionado em duas frentes: no front interno, pelas Tendências que viram a estratégia democrática e popular como uma proposta bem comportada de administração do capitalismo. Em outras palavras, um retorno, disfarçado sob retórica revolucionária, às teses etapistas. E ainda, pela crítica à tese do acúmulo de forças.

No front externo, tal estratégia foi tencionada pela prática partidária, voltada cada vez mais para a disputa eleitoral, principalmente após a vitória eleitoral de 1988 e a possibilidade de ganhar as eleições presidenciais em 1989. O PT se vê então diante do clássico dilema dos partidos socialistas: negar o capitalismo e, simultaneamente, administrá-lo. O realismo político, isto é, a necessidade de assegurar a governabilidade de um provável governo democrático e popular explica a tentação reformista que toma conta do partido nesta conjuntura. [33] Embora mantenha a retórica socialista, muito mais para o público interno, prevalece a opção por um programa de governo nitidamente de reformas.

A campanha Lula Presidente representa o maior teste das resoluções do 5º EN. Se por um lado, reforça a política de acumular forças e a perspectiva eleitoral, a revolução pelo voto; por outro, põe a nu os limites e riscos de uma prática política essencialmente direcionada para a institucionalidade.

Nesse contexto, a discussão sobre a tática e a estratégia adquire importância fundamental. A questão da amplitude das alianças políticas, por exemplo, ganha contornos decisivos e polêmicos. Tudo isto se expressa nas disputas e conflitos internos, entre as forças políticas e entre o partido e suas administrações (como na gestão de Luíza Erundina, em Diadema [34] e em Santos).

As conclusões sobre a concepção de socialismo do 5º EN são reafirmadas pelos encontros seguintes. No 7º EN, realizado em 1990, os delegados aprovam a proposta apresentada pelo do DN – o qual, encerrava seu mandato. Predomina uma avaliação positiva sobre as mudanças no Leste Europeu, "ainda que o processo esteja sendo hegemonizado por correntes reacionárias favoráveis à regressão capitalista". [35] (CEN/PT,1990, p. 28) A ênfase recai sobre a ação das massas – embora seja observado a possibilidade da restauração capitalista. Nesse momento, o partido considera que o desfecho desse processo ainda está em aberto e seus contornos dependerão da disputa política e social.

O PT alerta para o uso pela mídia do termo "socialismo real", no sentido de desqualificar qualquer projeto histórico anticapitalista. A resolução adotada precisa que:

"A expressão "socialismo real", em sua generalidade abstrata, desconsidera particularidades nacionais, diferentes processos revolucionários, variados contextos econômicos e políticos etc. Nivela experiências de transformação social heterogêneas em sua natureza e em sus resultados, desqualificando conquistas históricas que seguramente não são irrelevantes para os povos que as obtiveram". (PT, 1990, p. 27)

A resolução sobre o socialismo petista, adotada nesse encontro, é vista positivamente pelo conjunto partidário: ela incorpora, ainda que genericamente, o acúmulo do partido sobre a questão. Mas esse consenso não se estende às avaliações – expostas nas oito teses apresentadas no 7º EN – sobre o Leste Europeu e suas conseqüências. [36] O próprio encontro reconhece esse fato ao concluir que não há acúmulo suficiente que permita uma posição definitiva sobre as experiências socialistas, bem como quanto à questão estratégica, e decide pela continuidade do debate.

O PT reafirma seu compromisso com o socialismo democrático. No plano econômico, esse socialismo supõe um modelo de sociedade organizada a partir da "propriedade social dos meios de produção" (a qual não se confunde com a "propriedade estatal") e que deve ser "gerida pelas formas (individual, cooperativa, estatal etc.) que a sociedade democraticamente decidir". (PT, 1990, p.29)

Essa concepção recusa tanto "a lógica perversa do mercado capitalista quanto o intolerável planejamento autocrático estatal de tantas economias dita "socialistas". Nesse modelo, as prioridades e metas produtivas devem ser definidas pela "vontade social" e não pelos supostos "interesses estratégicos" do Estado. Por outro lado, prevê uma nova organização do trabalho que garanta a gestão democrática no plano de cada unidade produtiva (tendo os Conselhos de fábrica como referência obrigatória); e, no plano geral, através de "planejamento estratégico sob controle social". (PT,1990, pp.29-30)

O 1º Congresso aprofunda a formulação sobre o socialismo petista. Nesse congresso, a rejeição da ditadura do proletariado [37] dará lugar à confirmação da democracia como valor universal e à afirmação do "Estado de direito no qual prevaleçam as mais amplas liberdades civis e políticas". A concepção de socialismo aprovada prevê a "legitimação majoritária do poder político, o respeito às minorias e a possibilidade de alternância no poder". (PT, 1992)

Isso pressupõe o pluralismo partidário e o rechaço à pluralidade restrita aos partidos operários. Em última instância, a democracia socialista que o PT almeja representa a abolição da "distinção entre governantes e governados" e a extinção das "desigualdades de classe e do Estado enquanto aparelho de dominação". (PT, 1992)

Na trilha do 7º EN, o congresso reafirma a crítica à social-democracia. [38] Essa formulação exige a adoção de uma estratégia correspondente. O 1º Congresso consolida a concepção estratégica formulada ao longo desses anos, na qual a disputa da hegemonia adquire um papel central. Essa idéia parte do pressuposto de que o poder político se constrói no cotidiano das lutas.

Conseqüentemente, a construção do poder popular se inicia ainda no âmbito da sociedade capitalista. Acredita-se, portanto, que esse poder tem um caráter limitado pelas instituições dominantes nessa sociedade. Mas pode, em situações políticas específicas, adquirir outro caráter, se expandir e se generalizar, extrapolando tais limites. Essa estratégia reafirma a crítica à concepção do Estado tradicionalmente aceita pelas organizações e indivíduos identificados com as diversas matizes do marxismo. [39]

O 1º Congresso expressa a síntese da evolução teórica do partido, cristalizada na concepção de socialismo democrático e na formulação estratégica. Porém, a retórica revolucionária do discurso petista conflita com sua realidade interna e externa, isto é, com sua composição heterogênea e com a prática social e política. Setores da própria ART principiam a questionar o viés institucionalista que passa a predominar, determinado pelo pragmatismo eleitoral. [40]

Os impactos da crise do socialismo real

Desde sua gênese, o PT apresenta elementos de ruptura com a tradição marxista-leninista, com vários dos ícones e das certezas ortodoxas da esquerda socialista e comunista e com uma visão crítica dos regimes de partido único, procurando se diferenciar tanto do socialismo burocrático forjado pela vertente stalinista quanto da social-democracia contemporânea.

Sem dúvida, comparado à esquerda marxista – em todas as suas vertentes – o PT é inovador: desde a recusa às formulações estratégicas que fundamentam a atuação destas correntes até o modelo leninista de partido. Destoando do comportamento usual entre os marxistas em travar combates homéricos – em certos casos, risíveis – pela representação da continuidade da tradição, o PT não reivindica qualquer legado marxista, leninista., trotskistas ou outros "istas". Enfim, não se coloca como herdeiro nem da II, da III e ou da IV Internacional. [41]

Na verdade, a emergência do movimento social no final dos anos 70 e o surgimento PT representa uma segunda fratura [42] sofrida pela esquerda marxista: uma parte se abre a este processo; outra ignora, passa ao largo ou se coloca frontalmente contra. A vertente marxista que adere ao projeto de constituição do PT é heterogênea. Pessoas como José Dirceu, Rui Falcão, Wladimir Pomar, Marco Aurélio Garcia, Eduardo Jorge, expressam experiências políticas diferenciadas. Suas avaliações críticas e autocríticas sobre seu próprio passado resultam em contribuições e atuações divergentes. [43]

Essas diferenças convergem, desde a formação do PT, numa direção heterodoxa, isto é, com vários elementos críticos ao marxismo oficial da esquerda tradicional e em relação ao chamado campo socialista. Essa formação possibilita que, em seu 6º EN, o PT se antecipe aos acontecimentos no Leste Europeu reafirmando a crítica às experiências burocráticas de construção do socialismo e enfatizando o aspecto democrático do socialismo.

Porém, essa heterodoxia é mediada, desde sua fundação, pelo intercâmbio com outras vertentes marxistas e mesmo com a ortodoxia do socialismo real. Portanto, a novidade que o PT representa é relativa, pois combina continuidade e descontinuidade, ruptura e tradição, o velho integrado no novo. [44]

A despeito da formulação democrática em relação ao socialismo, o PT não fica imune à perplexidade que toma conta da esquerda logo após a queda do muro de Berlim. Não por acaso, o partido não consegue apresentar com nitidez uma proposta de socialismo para o Brasil e é acuado pelas indagações e críticas durante a campanha eleitoral de 1989.

De fato, as relações com os países socialistas sempre foram dúbias: entre a crítica e o elogio. Se de um lado, o PT teve a ousadia de defender o sindicato independente Solidariedade na Polônia, de romper com o Partido Comunista Chinês em 1989; por outro, manteve relações incestuosas com a burocracia governante e dirigente dos partidos comunistas do Leste e cultuou o Partido Comunista cubano e sua liderança, apoiando-os acriticamente.

Com efeito, várias delegações petistas são enviadas para fazerem cursos de marxismo na Alemanha Oriental, cujo partido governante já foi chamado de partido irmão. [45] Um dos grupos de petistas que viaja a esse país, para aprofundar sua formação política, vê-se em situação constrangedora diante dos protestos populares bem diante da sede do partido onde aprendiam o "marxismo real".

As dezenas de militantes, selecionados por vínculos políticos e pessoais, que vão aprender marxismo na pátria de Marx são quadros políticos vinculados à corrente majoritária. Para muitos é a primeira experiência internacionalista e/ou a primeira oportunidade de aprofundamento dos rudimentos teóricos que tinham adquirido nos embates concretos e nos cursos ministrados no Instituto Cajamar – que se tornou o centro, por excelência, de formação política da ART.

Nas salas de aula da ex-RDA, esses quadros políticos – os futuros formadores da base da ART – aprendem um marxismo que, como testemunha Frei Betto, "em nome da mais revolucionária das teorias políticas surgidas, na história, ensinava-se a não pensar". [46] (grifos do original) Nesse país, os nativos são obrigados a aprender a língua russa, tinham uma formação manualesca e assimilavam a história do processo revolucionário na Rússia pela leitura mecanicista da História do Partido da União Soviética, publicada por Stalin em 1938.

A simpatia com o socialismo real também resulta da bipolaridade imposta pela guerra fria. Embora reconheçam os erros e afirmem trilhar um caminho diferente, todos admitem a necessidade de defender as conquistas sociais da Revolução Russa, do processo revolucionário pós-II Guerra Mundial – em alguns casos imposto pelo exército vermelho russo – e de Cuba. [47]

Não se pode afirmar, portanto, que o PT – e a ART – tenham escapado ilesos aos efeitos negativos propagados pelo socialismo real. Nem muito menos que tenham ficado imunes ao desgaste provocado por sua bancarrota. Porém, o impacto é contrabalançado pelos aspectos heterodoxos desenvolvidos em sua trajetória. O PT não sofre cisões por conta do que acontece no Leste Europeu. E, mesmo a divisão da ART, resulta determinantemente de fatores endógenos.

Contudo, a crise ideológica provocada pela desagregação do mundo socialista influencia os rumos da ART, provocando a divisão entre ortodoxos e heterodoxos. [48] "As reações diferenciadas a esse processo contribuíram para acentuar as diferenças internas e agudizar contradições que foram se expressando nas formulações estratégicas e nas posturas concretas no plano tático", frisa Carvalho.(1993, p. 10-11)

Representantes da esquerda da ART, que nesse debate são classificados como ortodoxos, concordam que o impacto do que ocorreu no Leste Europeu influenciou a práxis do partido, contribuindo para fortalecer a estratégia eleitoral:

"Impactados pela velocidade dos acontecimentos no Leste Europeu e pela desenvoltura das iniciativas do bloco capitalista, concentramo-nos na disputa eleitoral de forma quase que exclusiva, como se a realização necessária de reformas político-eleitorais fosse uma espécie de ante-sala ou pré-condição para avançarmos na direção de transformações estruturais na sociedade brasileira". (MANIFESTO, 1993)

A disjuntiva ortodoxos/heterodoxos esteve presente nas origens do PT: na discussão sobre o caráter do partido, na reafirmação ou negação da teoria leninista da organização, na forma de conceber essa teoria e sua relação com o fenômeno PT etc. [49] No momento em questão, representa a vitória dos setores que levam às últimas conseqüências os questionamentos sobre o marxismo e o socialismo.

Confrontada com as demais Tendências petistas, a ART em seu conjunto sempre foi heterodoxa – no sentido lato da palavra. Os diferentes matizes marxistas em seu interior concordam no essencial sobre o papel estratégico do PT e sua construção como partido socialista. Essa divisão diz respeito ao aprofundamento da heterodoxia, de tal forma que os heterodoxos de antes passam a ser considerados demasiadamente radicais e, por conseguinte, ortodoxos.

Mesmo entre as demais correntes, o termo ortodoxo não pode ser aplicado stricto senso a todas. O trotskismo, por exemplo, é herético desde as origens. O desafio à ortodoxia marxista-leninista é mais antigo que o PT. Por outro lado, a ruptura com o passado nem sempre significa negação total dos seus elementos constitutivos e varia de grau conforme a matiz. A heresia trotskista mantém as referências básicas das formulações marxianas. Nesse sentido, ela é ortodoxa. O mesmo se pode afirmar de setores da ART que mantém conceitos tradicionalmente inseridos numa perspectiva marxista.

De qualquer forma, considerado num prisma histórico, podemos afirmar que a maior parte das correntes constitutivas do PT se situa no espectro heterodoxo. Mesmo o ultra-ortodoxismo tem elementos de ruptura com o stalinismo. E mesmo os heterodoxos radicais – muitos deles com um pé no passado ultra-ortodoxo do Partido Revolucionário Comunista (PRC) – reconhecem a atualidade de elementos da tradição marxiana.

No contexto partidário, as avaliações sobre esse tema têm como base as teses apresentadas pela maioria e adotadas pelo partido até o 1º Congresso, ainda que mediadas pelas posições das Tendências minoritárias. Este, expressa a configuração de um novo reordenamento político entre as diversas forças políticas internas ao PT, resultante tanto dos fatores internos relacionados com os desafios colocados pela trajetória petista na conjuntura desses anos, quanto pelo estímulo e desencadeamento dos fatores externos.

Os desdobramentos práticos da estratégia petista

"O ano de 1989 pode ser considerado o "ano do PT". Aquele no qual o partido reuniu as condições objetivas para o seu amadurecimento organizativo e teórico. Não que alcançasse sua plenitude nas duas direções: conseguiu ser testado positivamente em ambas". (FERNANDES, 1990)

São palavras cheias de vida e esperanças escritas pelo saudoso Florestan Fernandes. Não são loas ao vento, mas calcadas numa análise acurada da realidade, que também aponta deficiências e limitações expostas pela práxis política do sujeito analisado, ao olhar atento dos que procuram a essência dos fenômenos sociais. "É preciso não tecer ilusões ou mistificações", alertava Florestan.

O teste é a campanha de Lula à Presidência da República. O partido se credencia organicamente como a principal força de esquerda do país – numa conjuntura internacional desfavorável – e aprofunda suas definições políticas enquanto partido socialista e de massas. 1989 representa o auge de um processo gestado nas lutas de resistência contra a ditadura militar; que continua na campanha pelas eleições diretas e na recusa da conciliação de classes configurada no colégio eleitoral e, depois, na república batizada de nova. 1989 é preparado pela abnegação de milhares de indivíduos – uns poucos sob holofotes, a maioria anônimos; uns conscientes, outros tragados pela onda e pelo fascínio da política – indivíduos que, dentro e fora do PT, têm uma utopia.

Em 1988, o PT começa a colher os frutos mais doces desse processo: teve um desempenho eleitoral surpreendente. [50] Os resultados eleitorais confirmam a tendência verificada em 1985: ampliação do perfil do eleitorado para além do proletariado urbano, com o crescimento da sua aceitação em amplos setores da classe média. Ao mesmo tempo, fornecem uma amostra da sua implantação em nível nacional. [51]

A vitória eleitoral de 1988 representa um momento significativo na evolução do partido. A partir de então, sua relação com a ordem institucional burguesa atinge um novo patamar, colocando novos problemas e potencializando outros. É precisamente no âmbito da prática institucional que se verifica a tensão constante entre os objetivos estratégicos afirmados nas resoluções e no discurso dos seus dirigentes e a atuação concreta e imediata.

O PT passa a viver o dilema do êxito eleitoral: seu crescente desempenho nas eleições é acompanhado de um abrandamento do conteúdo programático para torná-lo mais abrangente e digerível; a ênfase no caráter classista e independente da organização e da luta dos trabalhadores é atenuada e diluída pela necessidade de incorporar outros setores sociais e de ampliar as alianças.

Na sua práxis, o PT incorpora o processo histórico vivido pela social-democracia, descrito por Przeworski:

"A classe molda o comportamento dos indivíduos tão-somente se os que são operários forem organizados politicamente como tal. Se os partidos políticos não mobilizam as pessoas como operários, e sim como "as massas", "o povo", "consumidores", "contribuintes" ou simplesmente "cidadãos", os operários tornam-se menos propensos a identificar-se como membros da classe e, conseqüentemente, a votar como operários. Ao estender seu apelo às "massas", os social-democratas enfraquecem a importância geral da classe como determinante do comportamento político dos indivíduos". (PRZEWORSKI, 1989, p. 42)

Ou seja, a manutenção do caráter de classe compromete o êxito eleitoral. Por outro lado, a expansão da política eleitoral, com a transformação do partido da classe num partido pluriclassista, embute o risco de este se converter em apenas mais um partido entre outros, perdendo a especificidade de sua relação com a classe que lhe dá sustentação e, inclusive, o apoio desta – e ainda tende a manter a desconfiança dos setores de classe que pretende conquistar.

Está historicamente comprovado que esses partidos "deixam de ser a organização dos operários como classe, que disciplina os indivíduos na competição entre si contrapondo-se a outras classes". Quando isso ocorre, "é o próprio princípio do conflito de classes – o conflito entre coletividades internamente coesas – que se torna comprometido". (PRZEWORSKI, 1989)

É evidente que o momento histórico da experiência social-democrata guarda enormes diferenças com o período em questão. Mas a história não é feita apenas de rupturas; ela também inclui permanências. O PT pretendeu, em suas origens, representar uma política independente de classe que rompesse os laços que tradicionalmente ligavam as organizações e partidos operários, comunistas e socialistas à política burguesa.

Esse dilema fica ainda mais evidente com as experiências de gestão petista à frente de executivos municipais – e mais recentemente dos governos estaduais. Com efeito, as definições partidárias concebem as prefeituras como instrumentos de apoio à luta dos trabalhadores pelo socialismo e recusa terminantemente uma concepção que se restrinja à ocupação do aparelho de Estado a objetivos meramente administrativos.

No discurso petista, as prefeituras sob seu controle devem atuar sob a orientação do partido, fazendo a ponte entre o particular e o universal, entre o imediato e o estratégico. Em outras palavras, as prefeituras não são governos socialistas locais. Mas só faz sentido administrá-las se isso corresponder às exigências colocadas pela estratégia. [52]

Se por um lado, o triunfo eleitoral constitui um fator importante que impulsiona a candidatura Lula em 1989; por outro os primeiros meses das administrações petistas são desastrosos. [53] Além das dificuldades herdadas dos administradores anteriores (endividamento, cultura política marcada por anos de autoritarismo, clientelismo e corrupção etc.), somam-se outros fatores como: o cerco sistemático da grande imprensa; os vícios administrativos e burocráticos da máquina; ausência de um projeto global; o enfraquecimento e cooptação do movimento popular; a inexperiência ou ausência de quadros políticos etc.

Porém, a própria evolução do partido, suas origens, seu programa, seu discurso contra a ordem burguesa, sua concepção de sociedade etc., criam expectativas naturais tanto em sua militância quanto no eleitorado. Sem entrar no mérito dos limites próprios de qualquer administração local dentro de uma realidade global onde imperam valores e métodos capitalistas, e descartando a ingenuidade revolucionária de muitos, a verdade é que várias administrações decepcionam profundamente a base partidária e a população em geral. [54]

O 7º EN reconhece que, via de regra, as prefeituras não conseguem implementar a política do partido e estabelecem uma prática administrativa burocrática e de caráter capitalista, onde os programas pelos quais foram eleitas se tornam peças decorativas. [55] É verdade que vários fatores pressionam as prefeituras em direção à política da eficiência administrativa, ainda que com o custo de negar a utopia dos que pensam ser possível administrar do ponto de vista dos trabalhadores e na senda do socialismo. Porém, ainda na avaliação do 7º EN, tudo isso "não pode obscurecer o fato de que elas (as prefeituras) em sua maioria não tem logrado dar visibilidade à marca democrática e popular que prometemos imprimir, e com a qual, via de regra, a população, e em especial, a nossa base social não tem se identificado". (PT, 1990, p. 62)

Criticadas à direita e à esquerda – em alguns casos, como em São Paulo e Diadema, em conflito aberto com setores petistas e o movimento popular – a resposta das administrações petistas às questões levantadas vai, especialmente em São Paulo, na direção inversa ao conteúdo classista imprimido na campanha eleitoral. O discurso de inversão de prioridades é substituído pelo lema Governar para todos, seguido da tentativa de ampliar as alianças políticas.

Como observa Couto, o ato de administrar obriga o partido a negociar, a modificar sua orientação radical e assumir uma postura mais realista. Paulatinamente, os militantes envolvidos com a administração incorporam uma "ética da responsabilidade, em substituição ao ‘principismo’ da ética da convicção". Nesse processo, as posições anti-estatistas foram substituídas "por uma abordagem bem mais afeita à institucionalidade e à negociação política". [56] Essa prática fortalece o poder de pressão do aparato institucional-parlamentar, condicionando cada vez mais a atuação partidária.

Mesmo inserido no jogo institucional, o PT expressa os interesses e anseios dos excluídos da política burguesa. Nesse sentido, representa uma ameaça. Porém, a prática institucional não é neutra, nem uma via de mão única: ela também é ameaçadora, envolve-o, cobra-lhe determinados compromissos, exige-lhe que aceite as regras do jogo e, assim, o induz à domesticação.

A aceitação da institucionalidade expressa a necessidade de operar as reformas necessárias dentro da ordem. Pode gerar dividendos políticos e garantir ganhos imediatos que fortalecem a luta e a organização dos trabalhadores. Mas, ao mesmo tempo, fortalece tendências que impulsionam o partido a se manter no limite das reformas, a abandonar qualquer projeto de ruptura com o sistema vigente.

Por outro lado, o crescimento eleitoral e do número de filiados é acompanhado por uma inevitável ampliação da máquina partidária. Dezenas e centenas de militantes passam a depender do trabalho no aparelho. Sua sobrevivência econômica e política passa a ser condicionada ao bom desempenho e à fidelidade. [57]

Essa inflexão no âmbito da institucionalidade – ou o mal do êxito, como diria Florestan (FERNANDES, 1991) - produz mudanças significativas no comportamento político dos dirigentes, da militância de base e na relação entre as Tendências em seu seio. Mudanças que afetam o perfil partidário, sua política e relação com os movimentos sociais.

O 1º Congresso, exprime a preocupação com a institucionalização do partido ao admitir que se estabeleceu uma divisão de trabalho entre os militantes envolvidos nos movimentos sociais, os parlamentares e executivos na frente institucional e os dirigentes do aparelho partidário, que passaram a funcionar como uma espécie de "tribunal de última instância" para as disputas entre os petistas. Suas resoluções procuram superar esses problemas, reafirmando a necessidade da combinação da luta social com a luta institucional e a adoção de uma política de alianças que tome em conta os setores excluídos e marginalizados da sociedade. (PT, 1992)

Essa combinação das frentes de lutas insere-se na perspectiva de ganhar a eleição presidencial de 1994 – sendo as eleições de 1992 um momento importante para o acúmulo de forças nesta direção. Almeja-se criar condições mais favoráveis para a conquista do objetivo estratégico: o governo democrático e popular.

Conclusão

Nascido enquanto alternativa de organização política dos trabalhadores inserida na tradição socialista e comunista, embora com inúmeros elementos de ruptura, o PT percorre, num contexto diferente, caminhos semelhantes à social-democracia clássica. Seu dilema, muito bem explicitado pelas disputas no seio da Articulação diz respeito à difícil dialética em ser governo e oposição; em pretender revolucionar a sociedade capitalista e administrá-la segundo o figurino burguês; em pretender defender uma parte da sociedade e administrar para todos; em ser um partido da ordem e contra a ordem.

Essas questões se traduzem em opções políticas cotidianas em diferentes situações: numa greve do funcionalismo, numa ocupação de terra, no relacionamento entre os militantes nos diferentes níveis hierárquicos, no esvaziamento ou controle da máquina partidária, na relação entre o executivo e o legislativo etc.

Essa complexa e contraditória atuação gera não apenas tensões, mas também alegrias e expectativas, frustrações e desesperanças. Se para uns a evolução eleitoral do partido tem um sentido político positivo, gerando perspectivas otimistas e possibilidades concretas e atraentes, para outros, o partido que disputaria as eleições em 1994 já era, a negação da utopia anunciada no início da década de 1980. Então, transformara-se numa alternativa eleitoral – embora de esquerda.

De qualquer forma, as diferentes avaliações sobre essa trajetória, somadas ao enfrentamento entre as diferentes Tendências diante da realidade política e social, abreviam a mutação petista. Já no 1º Congresso verificam-se divergências irreconciliáveis que tornaria insustentável o frágil equilíbrio que amparava a unidade da ART. Após esse congresso a Articulação aprofunda seu processo de desagregação e se desarticula: a Articulação de Esquerda toma forma...

Muitos continuam acreditando no PT enquanto a organização política dos trabalhadores, com independência de classe e um projeto alternativo ao capitalismo. Outros não... De qualquer forma, a presença e importância do PT na sociedade brasileira é inquestionável. Nessa trajetória, e independente de valores de juízo moral, o papel da Articulação foi fundamental.

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[1] Um dado que permite mensurar o peso real desse setor é a composição da direção nacional: a primeira Comissão Nacional Provisória, de 1979, era composta por doze dirigentes sindicais, num total de 16 membros. Entre 1979 e 1981, esse setor sempre foi majoritário na composição da direção. Essa não é uma questão que se resuma aos números. Ainda que tenha diminuído a participação de lideranças de origem sindical na composição da direção petista, sua influência se manteve, por muito tempo, inabalável.

[2] Os dados sobre a preferência partidária dos dirigentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) demonstram sua importância: nada menos que 91% dos delegados que participam do III CONCUT, realizado em 1988, declaram preferência pelo PT (no caso dos metalúrgicos esse número chega a 92,95%). (RODRIGUES, 1990) Outro exemplo que ilustra essa influência no PT reside no campo institucional. Em 1988, o PT elege os prefeitos dos grandes centros industriais (Santo André, São Bernardo, Diadema, na Grande São Paulo; e, o Vale do Aço mineiro), regiões onde o sindicalismo destaca-se.

[3] Segundo os dados da Secretaria Rural Nacional do PT, 40% dos vereadores eleitos pelo partido são trabalhadores rurais, militantes da CPT e MST. Ver: "Pesquisa diz que 40% dos vereadores petistas eleitos são ligados ao campo". (FOLHA DE S. PAULO, 07 dez. 1988).

[4] Não é exagero afirmar que boa parte da militância (da ART) formou-se no período final da ditadura ou mesmo já sob a Nova República, como reconhecem seus dirigentes.

[5] "De repente se quer falar e ser ouvido, um processo que assume logo o caráter de questionamento das direções ou lideranças estabelecidas no partido, em todos os níveis". (VIANA, 1991, p. 06).

[6] Essa necessidade foi assumida, entre outros, por Mercadante: "O PT não um núcleo de direção política e não tem um coletivo que discuta, que elabore, que reflita, que decida. Um partido assim não tem uma política de formação de seus quadros. Portanto, não tem uma estrutura orgânica. Um partido como esse não dirige a si mesmo. (...) Para mim, o centro da crise é a inexistência de um núcleo dirigente. Temos que ser capazes de montar uma articulação no partido capaz de equacionar esse diagnóstico e aprofundá-lo, reconstruindo a direção política do partido". Instituto Cajamar. A relação partido-sindicato. São Paulo, maio de 1988, p. 16.

[7] A Ação Libertadora Nacional (ALN) foi uma das dissidências do PCB, formada no final de 1968, em torno da liderança de Carlos Marighella. Segundo Paulo de Tarso, a ALN sobreviveu até 1983-84. Em sua versão, este coletivo não passava de 20 pessoas. Ver: Eugênio Bucci e Ricardo Azevedo. "Paulo de Tarso Venceslau". (Entrevista) Teoria & Debate 15, ago. de 1991, p. 34.

[8] O castrismo, segundo Pomar, não era homogêneo. Diz ele: "Por exemplo, Paulo Vannuchi e José Dirceu, na época tinham diferenças políticas e de condutas, mas provinham da mesma matriz. Não dá para caracterizar, a não ser pós-fato. Na época, olhando de dentro e tendo participado, não acho que dê prá dividir esses vários setores da Articulação que compunham esse núcleo marxista, alinhá-los em várias correntes ideológicas – castristas, maoístas. Acho que isso tudo se diluiu. O PT e Articulação serviram como solvente para essas forças". (Entrevista ao autor).

[9] No início dos anos 80, Eder Sader foi o principal animador da revista Desvios. Já nesta época, ele enfatiza a necessidade da esquerda repensar seus referenciais teóricos, especialmente o conceito marxista-leninista de partido. Por suas posições heterodoxas, Sader é identificado como o líder de um grupo dentro do PT que ficou conhecido pelo rótulo de autonomista. Marco Aurélio Garcia testemunha como Sader divertia-se com o paradoxo dos que apontavam-no como dirigente de uma organização que eles próprios diziam "ser contra as organizações". Neste momento, Sader e Garcia estavam na contramão da ortodoxia, representada por José Dirceu, Rui Falcão Wladimir Pomar e outros. Sader morreu em 21 de maio de 1988, vítima de AIDS, adquirida numa das transfusões de sangue que era obrigado a fazer devido ao fato de ser hemofílico. Ver: Marco Aurélio Garcia. "Eder Sader – O Futuro sem este homem". Teoria & Debate 04, setembro de 1988, p. 05-10.

[10] Nesse período, o setor que sai do PCB, liderado por David Capistrano, também ingressa na Articulação.

[11] "Tinha pessoas que se reivindicavam desta origem, mas boa parte deles formado pela vulgata marxista que chegou ao Brasil pelo stalinismo", afirmou Falcão. (Entrevista ao autor).

[12] O depoimento de Valter Pomar ilustra bem o peso e a importância política das lideranças políticas vinculados ao marxismo: "Há as mais variadas pessoas que tinham influência sobre Lula ou que tinha um papel importante na estrutura do partido. Paulo Vannuchi, que teve um papel importante como assessor do Lula; o José Dirceu, que cumpriu um papel importante como organizador da própria Articulação durante um bom tempo; Wladimir Pomar, cumpriu um papel importante como ideólogo, autor de textos de resolução, secretário de formação política; e ‘n’ outras figuras. O próprio Rui Falcão. Essas pessoas não eram marxistas apenas porque utilizavam como fundamento as referências marxistas, eram marxistas do ponto de vista militante. Elas buscavam de maneira coerente e lógica e declarada, estabelecer uma hegemonia dentro da Articulação por um conjunto de idéias referenciados na prática comunista, materialista e marxista. Com essa prática plural, cabia, já na época, muita coisa lá dentro. Citei estes três nomes. Não é que eles fossem o núcleo dirigente. Mas o núcleo dirigente da Articulação era um núcleo marxista. Só que isso combinado com aquilo que tem peso dentro do PT como um todo: o sindicalismo e o movimento popular. Exemplo disto, foi a criação do Cajamar: de 86 a 89, a linha hegemônica dos cursos era nitidamente marxista". (Entrevista ao autor).

[13] Na verdade, essa postura não suprime a Articulação. Ela não é vista como uma Tendência, mas sim como uma espécie de um enorme "guarda chuva" onde cabem todos; como um fórum que permite articular diferentes pessoas e posições políticas, em dados momentos da vida do partido. Tinha, portanto, um caráter espontâneo. Segundo Devanir Ribeiro, essa foi a posição que prevaleceu em São Paulo. Em Brasília, durante o 5º EN, seus defensores recuam para não provocar um racha maior da Articulação. Ele reconhece que a atuação do "grupo do Zé" (referência a José Dirceu), foi fundamental para esse desfecho. (Devanir Ribeiro, concedeu-nos esse depoimento em 08 de fevereiro de 1993).

[14] A proporcionalidade se restringe à composição dos diretórios (municipal, estadual e nacional), com a participação de todas as chapas que tivessem o mínio de 10% de votos nos encontros. As direções executivas eram compostas pela chapa mais votada; a minoria não tinha o direito de participar.

[15] A tese da proporcionalidade é derrotada por uma diferença de 35 votos (199 votos contra a sua adoção e 164 a favor). O resultado mostra o grau e a importância dessa polêmica. Essa tese é vitoriosa na maioria dos encontros estaduais. Só não é aprovada no 5º EN porque a Tendência majoritária impôs uma orientação contrária.

[16] Formada oficialmente em seu 1º Encontro Nacional, em Belo Horizonte, nos dias 23 a 26 de março de 1989, a VS é síntese de um movimento crítico às posições da "Articulação dos 113". Ela expressa a confluência de vários setores, destacando-se a corrente política liderada por Eduardo Jorge, Carlos Néder, Roberto Gouveia, Aldo Leite, Adriano Diogo, Anízio Batista, Waldemar Rossi, entre outros.

[17] Essa coordenação é eleita na reunião de 14 de janeiro de 1988, composta por: Luiz Gushiken, Luís Soares Dulci, Gilberto Carvalho, José Dirceu, Avelino Ganzer (pela Articulação Sindical) e por Eugênio Pasqualini (pela Articulação Estudantil).

[18] Como afirma a coordenação: "É consenso entre nós que nossa Articulação apresenta limites. Não podemos mais admitir que uma Articulação com vida episódica, que funcione apenas durante o período que precede as pré-convenções nas diversas instâncias partidárias. (...) Não temos condições de persistir convivendo com uma Articulação inorgânica, onde ninguém sabe direito quem é quem, onde os critérios de pertença não eram explicitados. Não sobreviremos se persistirmos numa prática de desorganização, das discussões "em-cima-da-hora", dos "tiroteios-prá-todo-lado", das contradições não resolvidas". (ARTICULAÇÃO NACIONAL, 1988, p. 2-3).

[19] Nesse esforço de unificação e reestruturação, Djalma Bom, Avelino Ganzer e Luís Dulci realizaram uma reunião com Lula – pois ele não pôde participar da reunião de janeiro, devido a compromissos em Brasília (à época era deputado constituinte). Foi solicitado ao mesmo um maior entrosamento com o cotidiano da Articulação. Lula reafirmou seu compromisso político com a Articulação e prometeu conversar com os demais dirigentes que, como ele, tinham dificuldades em participar mais ativamente das atividades da Articulação. Os participantes não detectam grupos cristalizados no interior da ART.

[20] Nesse estado, a ART era hegemônica: dos cinco deputados estaduais, quatro estavam em seu campo; dos três federais, dois estavam ligados à ART; na capital, Belo Horizonte, havia um equilíbrio de forças (com a ART detendo cerca de 1/3 do diretório). Os participantes não detectam a existência de grupos cristalizados no interior da ART.

[21] A Articulação, nesse estado, fragmentou-se em cinco setores.

[22] No Encontro Estadual obtém 85% dos votos, sendo a única chapa apresentada.

[23] A Articulação estava fragmentada em outros estados como Pará e Goiás

[24] Sua pauta contempla os seguintes itens: 1º) análise da proposta da Alternativa Democrática e Popular, aprovada no 5º EN; 2º) construção partidária e a proposta de organização do PT; 3º) o projeto estratégico do PT e o socialismo; 4º) objetivos, caráter e organização da ART; e, 5º) eleição da Coordenação Nacional. Os três pontos iniciais foram debatidos, consecutivamente, a partir da exposição dos seguintes dirigentes: Rui Falcão (DN), César Alvarez (CEN) e José Dirceu (CEN).

[25] Ora, este centralismo solidário é um sofisma: toda organização política funciona, ao menos em tese, pela adesão voluntária.

[26] Os "outros" também são os que, dentro da Articulação, ousam divergir. É comum o processo de "queimação" política de militantes, também rotulados nos bastidores como pertencentes a esta ou àquela Tendência.

[27] Nesse momento a Articulação ainda mantém o discurso de que ela é a única Tendência a se identificar com o PT. As outras – de forma genérica – não seriam autenticamente petistas. "A Articulação não é uma Tendência como outras existentes no interior do partido (...). A linha política geral da Articulação é na verdade a linha política geral do Partido dos Trabalhadores", afirma sua Coordenação Nacional. (ARTICULAÇÃO NACIONAL, 1988)

[28] A Articulação sugere três nomes: José Genoino, Raul Pont e Eduardo Jorge. Após um processo de negociação, Genoino e João Machado passam a fazer parte da direção máxima (eles eram membros do Diretório Nacional). Eduardo Jorge, que representa a chapa PT pela base, não aceita o convite. Nas negociações a Articulação deixa claro que seu objetivo é acabar com a existência de partidos dentro do PT. Sua tática é simples: incorporá-los.

[29] Os membros da coordenação nacional eleita no seminário são: Luiz Soares Dulci (MG), José Dirceu (SP), Luís Gushiken (SP), Valdi Camarcio (GO), Laerte Dorneles Meliga (RS), Eurides Mescolotto (SC), Gilberto Carvalho (PR), Avelino Ganzer (pela Articulação Sindical) e Eugênio Pasqualini (pela Articulação Estudantil). Mantêm-se todos os membros da coordenação provisória.

[30] "O PT buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores", afirma seu Manifesto de fundação. (CHACON,1985, p. 695-96).

[31] Em 1981, Lula procura responder à indagação que muitos fazem sobre o PT: Qual a sua ideologia? O que ele pensa sobre o socialismo? Do alto da sua autoridade, afirma: "Sabemos que caminhamos para o socialismo, para o tipo de socialismo que nos convém. Sabemos que não nos convém nem está em nosso horizonte adotar a idéia do socialismo para buscar medidas paliativas aos males sociais causados pelo capitalismo ou para gerenciar a crise em que este sistema econômico se encontra. Sabemos também que não nos convém adotar como perspectiva um socialismo burocrático que atende mais às novas castas de tecnocratas e de privilegiados que aos trabalhadores e ao povo. O Socialismo que nós queremos se definirá por todo o povo, como exigência concreta das lutas populares, como resposta política e econômica global a todas as aspirações concretas que o PT seja capaz de enfrentar". (Discurso pronunciado na I Convenção do PT, realizada em 1981)

[32] Seu Manifesto de fundação defende a autonomia da organização política dos trabalhadores: "O PT afirma seu compromisso com a democracia plena e exercida pelas massas. Nesse sentido proclama que sua participação em eleições e suas atividades parlamentares se subordinarão ao objetivo de organizar as massas exploradas e suas lutas". In: (CHACON, 1985, p. 694-95). Essa postura é reafirmada em vários momentos. A Carta Eleitoral de 1982 insere-se nesse esforço de diferenciar a prática petista da experiência dos partidos políticos tradicionais. (Ver: PT, 1982)

[33] A expressão é de Carlos Eduardo de Carvalho, coordenador do Programa de Ação de Governo da FBP. Ver: "Medo (e gosto) de pecar", na Teoria & Debate. 10 de maio, 1990, p. 49-53.

[34] Simões (1992) estuda a experiência da primeira administração petista em Diadema. Esse trabalho é uma referência importante para a análise de um período da história do PT no qual os dilemas apontados eram enfrentados no cotidiano pela militância. As soluções encontradas fortaleceram a estratégia do acúmulo de forças. Por outro lado, evidenciam os limites da resistência política dos setores à esquerda dentro do partido.

[35] Para a maioria dos petistas: "Tais movimentos devem ser valorizados não porque representem em si um projeto renovador de socialismo, mas porque rompem com a paralisia política, recolocam em cena aberta os diversos agentes políticos e sociais, impulsionaram perspectivas democráticas e, em perspectiva, podem abrir novas possibilidades para o socialismo". (PT, 1990, p.28)

[36] Embora nesse momento as divergências apareçam apenas quando confrontadas as Tendências entre si, a evolução dessa discussão explicita a existência de diferenças no interior da Articulação.

[37] Esse é um dos temas polêmicos do congresso. A proposta do Projeto Para o Brasil (PPB) é aprovada devido ao acordo político com a Articulação que prevê a autocrítica da forma como essa questão foi trabalhada na grande imprensa por expoentes do PPB. A formulação do PPB iguala stalinismo e ditadura do proletariado.

[38] "O PT não vê na social-democracia um caminho para a construção do socialismo nem tampouco uma alternativa real aos impasses da sociedade brasileira. (...) A adoção de profundas reformas estruturais necessárias ao Brasil supões uma ruptura radical com a ordem econômica, política e social vigente – o que ultrapassa os limites da proposta social-democrata, que politicamente acredita na neutralidade do Estado e adota no horizonte máximo a luta por reformas no interior do próprio capitalismo", afirma a resolução. (PT, 1992, p. 35)

[39] O texto aprovado afirma: "Para o PT, a conquista do poder político não começa nem termina, e tão pouco se reduz simplesmente à clássica representação simbólica da ‘ocupação do palácio governamental’. Se não visualizamos a conquista do poder como um ‘assalto ao Estado’, tampouco acreditamos que o socialismo virá através de um ininterrupto e linear crescimento das forças e da hegemonia socialista dentro da sociedade, sem que ocorram choques e confrontos internos. Reafirmamos, portanto, que as transformações políticas econômicas e culturais que o Brasil necessita supõem uma revolução social, como a experiência histórica comprovou, inclusive recentemente, até no Leste Europeu". (PT, 1992, p. 37-38)

[40] Lula, por exemplo, já antes do 1º Congresso, afirmava: "Não podemos deixar que o eleitoralismo tome conta do PT. Nós percebemos, nessas eleições, que em alguns lugares o comportamento de certos companheiros na disputa maluca por um cargo não se diferenciou da atitude de membros de outros partidos, tanto nos conflitos internos quanto no tipo de campanha". Lula se referia à eleição de 1990. João Machado e Paulo Vannuchi. "Mãos à obra" (Entrevista: Lula) Teoria & Debate 13, fev. 1991, p.06. Observamos que, em última instância, resoluções congressuais refletem a correlação das forças políticas do organismo que as adotam. No Manifesto aos Petistas, lançado em setembro de 1991, Lula volta ao tema: "O partido precisa ter a coragem de dar um basta a esse tipo de prática, porque abala a seriedade de nossa imagem política". Lula propõe que o partido desenvolva condições para adotar o rodízio entre os parlamentares, de forma que os suplentes possam assumir e adquirir experiência. (SILVA, 1991, pp.15-16).

[41] Guimarães(1990), compara o PT com a noção de partido em Marx no período da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), apresentando elementos comuns como: a noção de independência política da organização dos trabalhadores; a ênfase no caráter democrático e de massas do partido operário; a recusa em estabelecer uma doutrina oficial; a idéia de que os comunistas deveriam participar do partido operário e que não constituem uma força oposta ao mesmo; a fusão da organização com a classe.

[42] A primeira foi o processo de fragmentação no período pós-golpe militar, nos anos 1960-70.

[43] Essa realidade inclui os marxismos das Tendências organizadas. Aqui, nos restringimos às manifestações marxistas na Articulação.

[44] Isso permite, por exemplo, que uns enfatizem os aspectos de ruptura; que outros salientem a relação entre esta e a tradição; ou mesmo, como faz Sokol, que o destaca como "um dos fenômenos mais clássicos, ortodoxos, que surgiram no panorama das organizações políticas que lutam pelo socialismo". Markus Sokol. "De volta para o futuro". Teoria & Debate 13, fev. 1991, p. 39.

[45] Frei Betto nos relata um exemplo do marxismo desse partido irmão. Em janeiro de 1988, nas homenagens a Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, estudantes luteranos portavam cartazes com as clássicas palavras de Rosa: "Liberdade apenas para os partidários do governo, somente para os membros do partido – não importa quão numerosos – não é liberdade. Só é liberdade se for para aquele que pensa diferente". Ao que, a burocracia dirigente, respondeu: "Em nosso país, a liberdade é somente para aqueles que compartilham de nossa filosofia". Como salienta Frei Betto, essa reposta retrata bem "o tipo de concepção que fizera dos fundamentos do partido um simulacro da ditadura". Frei Betto. "O Fim do que foi o Princípio". Teoria & Debate 10, maio 1990, p. 11.

[46] Frei Betto, profundo conhecedor da religião e suas imbricações com a política, fez uma comparação interessante entre esse tipo de formação marxista e a teologia. Escreve ele: "Assim como certos teólogos tridentinos acreditavam que a leitura da Suma Teológica de São Tomás de Aquino era suficiente para aprender teologia, os ideólogos do partido diziam que, uma vez aprendida a lição oficial, não se fazia necessário conhecer outra corrente filosófica e nem mesmo outros teóricos marxistas. Trotsky, Kautsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci, eram nomes que suscitavam repulsa. Aprendia-se o marxismo como se hoje um seminarista estudasse a teologia do Concílio de Trento, ignorando toda a história posterior da Igreja, o Concílio Vaticano II e a Teologia da Libertação". (BETTO, Frei. 1990, p.12).

[47] A rigor, mesmo o trotskismo manteve laços com o socialismo real. É verdade que, como o PT, se trata de uma relação contraditória. Nesse caso, os vínculos têm origens nas próprias formulações de Trotsky sobre o Estado Operário Degenerado e na ênfase que deu à necessidade de defender a URSS.

[48] Segundo o Aurélio, ortodoxo é o indivíduo que professa uma doutrina tida como verdadeira; e heterodoxo é o seu oposto, o indivíduo que questiona essa doutrina, o herético. No universo político os adjetivos nem sempre são assumidos por quem os usa e invariavelmente são aplicados ao outro. Assim, pode ser vantajoso, do ponto de vista da disputa política, chamar o outro de ortodoxo. No período assinalado, esse termo adquire uma conotação negativa e preconceituosa. Deste ponto de vista, é um despropósito utilizar, ao se referir ao acusador, a alcunha de heterodoxo.

[49] Se nos ativermos apenas às forças constitutivas da Articulação, podemos visualizar esta disjuntiva na polêmica com as posições autonomistas, logo superada pela predominância das tarefas concretas de consolidação do PT.

[50] As vitórias eleitorais em três capitais (São Paulo, Vitória e Porto Alegre), nas principais cidades industriais e operárias de São Paulo e no Vale do Aço (MG), indicam um dos fatores que explicam o crescimento eleitoral: sua presença e ligação orgânica com as lutas dos trabalhadores. Também destacam-se a vitória em Ronda Alta (RS), cidade que simboliza a luta e resistência dos trabalhadores sem-terra; e a reeleição em Diadema (SP) e Icapuí (CE), que expressam a aprovação da população às administrações anteriores.Além destas, o PT elege prefeitos nos seguintes municípios: Cardoso, Campinas, Cedral, Conchas, Cosmópolis, Jaboticabal, Piracicaba, Presidente Bernardes, Santo André, Santos e São Bernardo do Campo, todos no estado de São Paulo; Severiano de Almeida (RS); Campo Erê (SC); no Paraná, Salto do Lontra e São João do Triunfo; em Minas Gerais, Amambaí, Ilicinea, Ipatinga, João Monlevade e Timóteo; Jaguaré (ES); Amélia Rodrigues e Jaguaquara na Bahia; e, Janduís (RN).

[51] Além dos prefeitos, o PT elegeu 1032 vereadores em 543 municípios, atingindo todas as unidades da Federação. Sua participação no processo eleitoral atingiu 45,1% do total dos municípios. Evidentemente, devemos considerar que a população brasileira se concentra em determinadas e regiões, nas capitais e grandes cidades. Esses dados foram analisados por Gilney Amorim Viana (MT), Jonas Paulo de Oliveira (BA), Rochinha (PE), Ilário Marques (CE), Marcelo Déda (SE) e Perly Cipriano (ES). Suas conclusões são apresentadas no II Seminário Nacional da Articulação, realizado em maio de 1989. (VIANA, 1991, p. 30-40)

[52] Já em 1982, afirma-se: "A participação do PT nas eleições não nos deve levar a confundir a conquista de executivos estaduais e municipais como sendo a conquista do poder. Mas eles devem servir como alavanca na organização e mobilização dos trabalhadores na perspectiva da construção do poder popular. É uma etapa de aprendizado, de acúmulo de forças, de propaganda em torno de um programa de transformações. De conquista de espaços mais amplos para o fortalecimento da organização política dos trabalhadores, de mais respaldo para as lutas sociais". (PT, 1982)

[53] A ponto de setores do partido avaliarem que o desempenho de algumas administrações petistas – principalmente, na capital paulista – terem atrapalhado a campanha de Lula para a presidência. E, de fato, a imprensa e os adversários exploraram intensamente as debilidades e equívocos do PT no governo local.

[54] Há exceções (como a gestão petista em Porto Alegre). Uma análise mais aprofundada sobre o tema é feita por autores como: COUTO, 1995; SADER, 1992; e, PINHEIRO:1995. A avaliação oficial do partido, resultante da realização de várias reuniões e seminários durante meses, foi publicada pelo Diretório Regional PT/SP, em 1992, com o título O modo petista de governar. (PT/SP, 1992)

[55] "Adotamos muitas vezes o que se batizou de "administrativismo". Estamos tímidos diante dos confrontos e muitas vezes conciliamos. Tentamos governar para toda a população e perdemos de vista nossa base social e política". (PT, 1990, p.59)

[56] Enquanto "partido de situação": "Não bastava mais denunciar, levantar bandeiras, marcar posições e encaminhar as reivindicações dos segmentos sociais a que o partido era ligado - orgânica ou idealmente. Era necessário agora responder, atender a reivindicações, implantar um programa de governo e dar ouvidos a demandas de diversos segmentos sociais, inclusive daqueles identificados com os setores combatidos pelo PT em seu programa e durante toda sua história pregressa". (COUTO, 1995, p.178-79). O partido ao assumir o governo adotara uma "política positiva", deixando de lado a postura meramente oposicionista, isto é, a "política negativa". Couto utiliza conceitos weberianos. A questão a discutir é qual a ótica em que se coloca o positivo e o negativo. (COUTO, 1995, p. 177).

[57] Nesse processo, a existência da organização política se transforma no objetivo final da sua atuação. Isso contribui para a sua moderação e integração à ordem burguesa. Michel (1982), analisa esta dinâmica em relação à social-democracia européia.

Organizado por Rafael Baracy


História do RPG e RPG em sala de Aula
História do RPG e RPG em sala de Aula
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Em meados de 1960, quando os jogos de simulações de batalhas de exército e comando de reinados(War games e Xadres), já não continham as pessoas em casa no inverno severo do hemisfério norte, um rapaz  Jeff Perren, e sua turma tiveram a brilhante idéia de se ater a um ponto específico das batalhas e dos reinos conquistados e a serem conquistados, ou como preferem chamar os acadêmicos, começaram a centralizar o foco, especificamente nos indivíduos que faziam pare do exércitos, soldados, cabos, sargentos, tenentes, comandantes, capitães, generais e reis, seja dentro das infantarias, ou dos pelotões a mais que existem dentro de um exército, seu debates internos, suas razões para estar ali e o quanto isso era importante para eles e até que ponto isso poderia influenciar nas batalhas, daí nasceu as primeiras partidas do que poderíamos esboçar como início do RPG, logo após, próximo de 1968 um jovem, Jeff Perren,se juntou a Ernest “Gary” Gigax, e iniciaram o processo de delineamento das regras de um jogo similar aos war games, porem, que detalhava alguns aspectos necessários para o desenvolvimento de histórias não apenas de batalhas em massa com humanos apenas,mas sim do que eles haviam descoberto como o novo “nicho” de mercado, um jogo onde se interpretava um personagem em um mundo de fantasia mas sem o compromisso de se seguir os preceitos do regime militar, cada um poderia ser um personagem distinto, com “classes de personagem” que se dividiam e mesclavam entre magos, guerreiros, bardos, ladrões, arqueiros e assassinos e se dividiam em raças diversas, como humano, elfo, anão, gnomo, e outras disponíveis nas publicações de J.R.R. Tolkien e o seu inigualável Senhor dos Anéis, mas sempre com o embasamento em fantasia medieval, onde era possível, novamente, se reunir um grupo de amigos em uma casa, longe do frio do inverno ou das possíveis tarde em que não se tem mais nada para fazer no verão.

Na maioria das publicações posteriores, era dada a ênfase a raça dos hobbits, mas por problemas de pressão jurídica e por manutenção de direitos autorais tiveram de mudar o nome da raça dos  pequenos “novos” heróis da fantasia medieval. E mesmo havendo excelentes jogos que reproduziam e ambientavam os antigos períodos medievais ainda não existiam detalhamentos em forma de regas sobre “masmorras e dragões”, magias e outros componentes necessários para o desenvolvimento de aventuras fantásticas com o envolvimento tanto em guerras como em buscas particulares de grupos distintos e com particularidades peculiares, o que era o novo interesse dos jogadores de wargames.

Eram regras que determinavam poderes e dimensões de gigantes, trolls, dragões e feitiços de magia e que foi desenvolvido nos estúdios de Gary o TSR (Regras de Estudos Táticos), criados especialmente para o desenvolvimento de histórias e regras para o ambiente de fantasia medieval em uma cidade pequena em Wisconsin chamado Lake Geneva.E foi com o primeiro título, grosseiramente moldado, o Chainmail, que começou o desenvolvimento dos RPG’s, mas inda eram detalhadas em batalhas, facções ou grupos um tanto quanto grandes para uma pessoa apenas administrar, e não especificamente um personagem para cada um, é então que entra em cena o jovem Dave Wesley, que primeiramente introduziu as regras de interpretação no RPG, é importante salientar que no principio foi desagradável para os outros jogadores de seu grupo, mas ele teve crédito por parte de David Arneson, na época um sócio de Gigax em sua “louca” instituição, ele foi quem deu liberdade para que Wesley quebrasse os limites impostos pelas regras e desenvolvesse melhor a interação particular de cada personagem com o resto do pequeno grupo, que na realidade estava aplicando as regras de Charles A. L. Trotten, que havia escrito, em 1880, "Strategos: The American Game of War", um manual que estabelecia as regras básicas para um complexo jogo de Wargame que fazia largo uso de miniaturas, que visava o aprimoramento dos oficiais do exército em treinamento, e que segundo o próprio Wesley, era a primeira vez que destacava alguém como juiz de miniaturas.

Wesley que era muito apegado as regras de batalha em massa não gostou muito da idéia mas as pessoas que participaram do jogo acharam o máximo e não se detiveram em fazer da vida de Wesley o inferno na terra e conseguiram fazer com que ele desenvolvesse um cenário onde o que importava era o indivíduo do grupo e com um adendo especial, cada um agora tinha uma motivação pessoal, particular, que deveria ser buscada e respeitada pelos jogadores, tínhamos então o a grosso modo, mal lapidado ainda,RPG. Mas ainda assim os jogos de guerra eram mais difundidos e preferidos pelos jogadores de toda a América o que dificultava o desenvolvimento do RPG nos grandes grupos, sendo então jogado apenas em grupos tidos como “de gueto”, que preferiam os detalhamentos de uma batalha homem a homem às grande batalhas em massa.

Mas com a difusão do Senhor dos Anéis essa barreira foi quebrada e mais e mais pessoas passaram a querer viver as batalhas no papel de indivíduos e não mais com grandes pelotões de batalha á seu comando  e na década de 60 surgiu um mercado alternativo e muito rentável para os desenvolvedores e comerciantes de rpg, que era ainda tímido comparado a outras vias de entretenimento, mas que sem dúvida desenvolveu- se de maneira mais do que rápida e completa.

No ano de 1971, com o numero crescente de jogadores de wargames com os dois tipos de regras disponíveis e várias campanhas em andamento, com destaque para a campanha em que os jogadores, usando as regras de Wesley, interpretavam eles mesmos, mas nesse ponto o atual Juiz de regras, Arneson, após ter “sugado” os jogadores para uma batalha de fantasia conhecida como Blackmor, não iria matá-los no jogo, o que remove um dos conceitos primários do RPG, a perda.

Para amenizar isso Arneson mudou as regras e seus jogadores começaram a usar personagens representando alguém diferente deles próprios, e que não iriam mais realizar seus jogos em campos de batalhas mas sim se aventurar por castelos e masmorras.

Juntando esse tipo de aventura com as regras que Gigax vinha desenvolvendo, surgiu uma nova aventura, que viria a se tornar a Campanha de Greyhawk, mais em 1974 e se desenvolveu o que seria a base do primeiro livro de regras para RPG disponível comercialmente em larga escala, o Dungeon & Dragons,  que se desenvolveu e cativou os seus novos jogadores e adeptos de maneira lenta e gradual, como os jogos de guerra mas com um diferencial que prendia mais os jogadores, o rpg permitia que os personagens aprimorassem suas técnicas e avançassem em suas profissões, o que não era possível nos jogos de guerra, mas ainda assim, era jogado com miniaturas, porem com o diferencial de que cada cenário novo que era encontrado ia sendo descrito no momento em que era explorado pelos jogadores alimentando assim a curiosidade dos jogadores e afirmando ainda mais a qualidade criativa do jogo.

Em 1975, foi criado o Tunnels & Trolls ou T&T, como é conhecido, hoje em dia raríssimo, que foi escrito por Ken St André e foi o primeiro e mais significativo adversário do D&D na época, mas ainda assim não perdeu o estigma de segundo lugar e não vingou por muito tempo.

Ainda em 1975, surgiu o que seria considerado a grande promessa do RPG, Empire of the Petal Throne, escrito por M. A. R. Barker, que segundo algumas opiniões, se o jogo tivesse respondido as espectativas possivelmente os jogadores não precisariam ter esperado pelo menos 15 anos para desfrutar de um mundo bem detalhado como o World of Darkness de hoje em dia.

No ano seguinte ao lançamento do T&T, foi a vez do Chivalry and Sorcery, criado  por Ed Simbalist e Wilf Backhaus, mas que era muito complexo em suas regras e recriava a França do século 12.Também não rendeu muita popularidade.

Um dos jogadores de Enerson, Dave Megarry, ficou tão intrigado com o conceito de "dungeon" que ele logo criou o jogo de tabuleiro Dungeon, que foi publicado vários anos depois pela TSR.

Então dessa maneira um companheiro entusiasta de fantasia de Enerson, Gygax havia escrito um conjunto de regras de fantasia que eram compatíveis com as regras do Chainmail (que foi mais tarde publicado como o Chainmail "Fantasy Supplement"), que ele concedeu a Arneson para seu uso pessoal.

Chainmail foi o primeiro e verdadeiro RPG - Role Playing Game, criado por Enerson mas desenvolvido e comerciado por Gigax e seu estúdio, que chamou o jogo de "Fantasy Medieval Wargame", afastou Erneson do projeto e se apropriou do jogo e dos direitos autorais, mas que em 1979, com uma decisão judicial, teve de voltar atrás, e assim o rpg adentrou os anos 80 como fonte de diversão garantida e com outras propriedades psicológicas que vieram a ser descobertas posteriormente, mas temos que abrir um parêntese aqui para nos situarmos melhor na história do RPG e para entendermos melhor o que vamos ler posteriormente, visto que é um fato de suma importância na história do RPG no que diz respeito a sua “influência” sobre os jovens.

Primeiro tropeço


Foi em uma primaverano inicio de agosto de 1979, em Michigan, na Universidade Estadual, onde um rapaz, James Dallas Egbert III ou apenas Dallas Egbert, que fazia parte de um grupo de jogadores de RPG, desapareceu.

Egbert era um rapaz estranho, mas não o estranho que estamos acustumados, com necessidades especiais, ou ainda, aquele que “ficou” estranho depois de conhecer o RPG muito pelo contrário ele já era estranho bem antes de conhecer o RPG, ele era aquele tipo de jovem que entrou muito jovem na universidade, bem antes da maioria dos jovens de sua idade, ou seja, já era estranho antes de ter contato com o RPG, então quando entrou para a faculdade adquiriu novos amigos, todos RPGistas, normal nos campi dos EUA naquela época, quem não fazia parte de irmandades ou fraternidades, tinha grupos de wargames ou RPG, que equivalem aos Diretórios Acadêmicos e Centrais dos cursos e universidades do Brasil, bem como o empenho demandado pela juventude em suas tarefas novas e seus hobbies novos, Dallas não se excluiu da regra, passava horas jogando RPG com seus (únicos) amigos, que se reuniam esporadicamente nas tubulações subterrâneas da universidade para “jogar ao vivo” as partidas mais importantes e que nescessitariam de uma interpretação mais realista, mas por que ele dava tanta exclusividade ao RPG?

Para o período em que ele vivia, e seria assim hoje em dia também, ele podia conviver com outros rapazes sem que fosse importunado por uma peculiaridade de sua personalidade e opção de vida, ele era homossexual.

Agora imaginemos  a situação do rapaz; em Dallas, um estado com severas doutrinas de conduta moral machista, um rapaz jovem, que tem de se afirmar em outros grupos de machos, filho temporão e único de uma família conservadora, que optou por uma vida homossexual, simplesmente um cerco social, para alguém que acabou de sair de seu quarto e da saia de sua mãe.

Mesmo que a carapaça e o escudo que um grupo distinto como o de RPG pudesse fornecer, ele ainda assim não quis mais morar com seus pais em Dallas e resolveu ir morar no Texas com seus colegas, fugindo na verdade de seus pais e da cidade onde ele vivia, e que por seus códigos morais não aceitava pessoas do “tipo” dele, gay.
Foi demais até mesmo para ele, que um dia resolveu sair e se distanciar mesmo de seus amigos RPGistas, e desde então ninguém mais o viu.

Os pais de Egbert em seguida puseram um detetive particular para apurar o caso de seu desaparecimento, mas ele não conseguiu apurar muita coisa, apenas que Egbert tinha um grupo de amigos que gostava muito de RPG, que para o detetive era um jogo estúpido e com assuntos desconhecidos, nada melhor para se dar o caso por encerrado, um jogo desconhecido da maioria do grande público, com pessoas juntas falando de fantasia medieval como se a vivessem em tempo real, e foi isso que aconteceu.

Os pais de Egbert já estavam insatisfeitos com o fato de seu filho ter optado por ir morar longe com rapazes estranhos, e assim ficou fácil para o detetive, ele simplesmente atribuiu a culpa no jogo, recebeu seus honorários e acabou com a ainda não parcamente formada imagem do RPG e dos RPGistas, assim se passaram seis meses e então se descobriu que Egbert havia se matado eventualmente em uma crise depressiva por causa de sua opção de vida. Mas a imagem do RPG ficou então manchada para sempre por conta de falta de competência e ética de um adulto, “profissional”, “maduro” e sem problemas aparentes.



Transição

Do meio para o fim da década de 70 e inicio de 80, um projeto novo com relação ao Dungeon e Dragons foi lançado, vista a procura o jogo começou a ter, eram regras novas e em muitos aspectos revolucionárias onde muitos aspectos da interpretação e trato de apenas um individuo por jogador na partida foram incorporados e se assumia a distancia entre o RPG e os wargames, assim chegamos ao inovado AD&D ou Advanced Dungeons e Dragons.

Durante 6 anos(77-83),  o AD&D imperou quase que sozinho no comercio RPGistico e se afirmou como referencia dos jogos de interpretação de papel, rendendo muito dinheiro aos seus criadores, mas foi então que no ano de 1983 após vários boatos, uns verdadeiros e outros nem tanto, foi lançado uma “promessa” no que diz respeito ao rpg, visto que dispunha a relatar mais mundos ou possibilidades de aventuras do que apenas nos mundos de fantasia medieval,  um RPG que se identificava apenas pela sigla GURPS que significava na época Great Unarmed Role Playing System (Grande Sistema de Interpretação Desarmado) e que passou a ser chamado de Generic Universal Role- Playing System por convenção do grupo de criadores que trabalhava junto com Steve Jackson.

Esse sistema de RPG foi desenvolvido pela Steve Jackson Games, que leva o nome de seu criador, e o seu Módulo Básico é de autoria do próprio Steve Jackson. A primeira edição do Módulo Básico foi editada em 1984 e foi um completo estrondo no mercado de livros de RPG da época, ele trazia consigo uma aventura inicial básica que se chamava "Caravana para Ein Arris", que se passava em um período medieval, mas em seu interior haviam regras detalhadas para se viver uma aventura em qualquer época, dependendo apenas da criatividade de quem estava a frente da aventura.

O sucesso deste novo sistema foi tão grande que os suplementos(livros de referencia para temas específicos), quase que brotaram do chão com mundos e aventuras detalhadas desde os campos da pré história humana, passando por universidades loucas, conspirações mundiais, até outros mundos e realidades, mas mesmo com essa explosão de sucesso e a demanda quase não dando conta, o bom e velho D&D mesmo deixado de lado pela maioria dos jogadores, ainda resistia e residia na casa dos jogadores mais antigos e apegados.
Uma das razões para o sucesso desse novo sistema de RPG, era justamente o fato de ele tornar os fatos nele ocorridos o mais próximo da realidade, ele era genérico porem exato, pode-se dizer que para tudo nele havia um teste, e isso começou a importunar os jogadores, pois com o avanço da idade dos mestres e o seu apego pelas regras que decidem, os jogos de GURPS passaram a se tornar cada vez mais difíceis e entediantes, pois as regras eram muitas e a então criada “regra de ouro”, nem sempre era respeitada ou usada, seja pelos mestres ou pelos jogadores, mas ainda assim o sucesso do sistema ficou e se mantém encravado no coração de quem viveu e teve contato com o GURPS na sua época de ápice até hoje, uma prova disso é o fato de ter em sua coletânea mais de 200 títulos publicados em várias línguas distintas e ainda se fazer presente em muitas mesas e encontros de RPG pelo mundo afora, sendo também usado com freqüência e sucesso, talvez por sua exatidão em escolas que hoje em dia usam o RPG na educação escolar, e teve a terceira edição publicada em 1988.

A edição atual, o Módulo Básico, 3a. edição (revisado) foi publicado em 1994 e possui um apêndice de 18 páginas contendo uma coletânea de novas regras vindas de outros suplementos de GURPS.

Este apêndice substituiu a aventura "Caravana para Ein Arris", e desde então o GURPS permitia que se ambientasse qualquer aventura em qualquer mundo, que se vivesse qualquer filme, e se interpretasse qualquer personagem, existente ou criado pela imaginação do jogador, livros, temas específicos, ficção cientifica tudo era coberto pelas regras do RPG genérico, porem com o tempo e com o aprimoramento do gosto literário dos jogadores para enriquecer as suas histórias com detalhes e passar sempre o desejo de mais um, alguns temas não eram cobertos com tamanha dedicação nos suplementos do GURPS e durante um tempo passaram inclusive a ser repetitivos e maçantes, temas como os dos filmes Star Wars, Jornada nas Estrelas, não podiam ser aprofundados pela Steve Jackson Games, em razão dos altos preços cobrados pelos copright's, ou mesmo H.P.Lovecraft, ou outros escritores mais detalhistas em suas obras, desde então, a sua difusão no meio RPGistico não foi mais a mesma, tendo ficado para trás, e muito, em razão disso.

Essa desaceleração no prestigio se agravou em razão de no final do ano de 1991 e inicio de 1992, no GenCon deste ano, quando o RPG ganhou mais dois filhos, Vampire The Masquerade, o primeiro titulo de um projeto ambicioso e gigantesco, chamado The World of Darkness, criado e escrito no seu inicio por Mark Rein Hagen e publicado pela editora White Wolf, e um outro projeto não tão grande mas também muito interessante chamado Call of Chuthulu, escrito em sua maioria por Sandy Petersen até 1983 quando começaram os jogos teste e então assumido por Lynn Willis até 1992 que conseguiu dar inicio a publicação do projeto que era totalmente baseado nas obras de um escritor chamado H.P.Lovecraft e que perdia então o aspecto artesanal e passava a competir no mercado de publicações RPGisticas, publicado pela editora Chaosium, seu sucesso se deu por, desde 1981, incorporar as histórias de terror e suspense escritas por H.P.Lovecraft até 1937 e que assombravam até o mais inabalável herói da época, escrito e baseado no mito do grande Chutulu, uma criatura mítica, e o Necronomicom, a chave para o chamado desse monstro, os jogadores interpretam investigadores, curiosos, ou mesmo pessoas comuns que acabam um dia se deparando com o que querem ver ou pior, nunca sabendo o que está por trás da cortina da realidade, onde também se podia jogar em várias épocas diferentes, e que sem muito esforço ganhou a simpatia e o carinho dos jogadores de RPG que davam mais importância para o conteúdo da historia contada do que o seu fim por assim dizer.

Mas todo esse sonho realizado e essa paixão encontrada não foram o suficiente para fazer frente ao que vira a ser a realização da adolescência de muitos jovens RPGistas novatos e a dor de cabeça de muitos jogadores já veteranos, pois frente ao sistema de jogo da TSR, que  pedia muitos tipos de dados para a resolução de disputas, o GURPS, tinha regras muito longas e a criação dos personagens era muito detalhista e o sistema da Chaosium que era voltado para um público em especial, amantes dos romances de H.P.Lovecraft, o novíssimo título de RPG da White Wolf: Vampire The Masquerade  fez uma verdadeira revolução no que dizia respeito a dinâmica e a simplicidade dos métodos de narração e interpretação.

Ele tinha o objetivo de levar o drama aos jogadores por meio de histórias dos humanos amaldiçoados pela mais misteriosa e apaixonante das figuras que rondam o inconsciente do ser humano, o imortal vampiro, um tema até que bobo, juvenil, mas com um potencial de dramatização que chamou muito a atenção dos jogadores antigos, inclusive os jogadores de AD&D, que passaram a jogar, elogiar e fazer referencia ao jogo como sendo de excelente dinâmica e conteúdo muito bem elaborado, o sucesso foi tamanho, que, tão logo foi possível, a Steve Jackson Games tratou de adaptar o cenário de Vampiro para o seu GURPS.
Com o sucesso da ambientação Punk-Gótica, como era determinado o cenário do vampiro, um nova gama de jogos temáticos no mesmo mundo foi lançada, Lobisomem, Mago, Aparição, Fadas e seus respectivos caçadores, todos unidos em um mundo de interpretação em comum, o chamado World of Darkness ou Mundo das trevas, como foi chamado em sua tradução aqui no Brasil, onde todos os jogadores deveriam viver as dificuldades de um ser amaldiçoado pelo vampirismo, licantropia, karma, e outros tipos de maldição, em um mundo que era o reflexo do nosso em vários aspectos inclusive no calendário.

O que chamou muito a  atenção de simplesmente todos os jogadores de rpg do mundo, pois se comparados os títulos e mundos criados anteriormente, a realidade do jogador era a seguinte, em AD&D ou GURPS(esse com alguns títulos em exceção), o jogador criava um personagem que deveria se desenvolver durante várias sessões de jogo para se tornar alguém difícil de ser abatido, no sistema do WoD não, o personagem já nascia imortal, com regeneração de danos muito rápida, intangibilidade, invisibilidade, poderes mentais e outros tantos poderes, ou seja já nascia poderosíssimo, porém amaldiçoado.

Mas a questão das maldições foi infelizmente mal administrada ou equilibrada por mestres e jogadores, que passaram a dar menos importância para o tocante ao drama de cada espécie de criatura desgraçada que estavam interpretando e mais ênfase à seus poderes e suas combinações em potencial, dando mais espaço para uma espécie de arena constante nos jogos, desmerecendo o que seria o principal argumento do jogo, o horror pessoal.

Nesse ritmo o RPG foi massificado e saiu das universidades, ganhando o grande público, não só nos EUA, que já sabia o era e sim no resto do mundo.

Depois disso o mercado das editoras de livros de RPG disparou em uma desenfreada luta de publicações chamativas, ou os “caça níqueis”, como eram chamados os Clã Books, HandBooks ou outros livros de suplemento que eram lançados com a finalidade de “melhor ambientar” as aventuras, sem contar com a diversidade de títulos que começaram a aparecer no mercado e seus sistemas de regras que muitas vezes podiam partir de uma moeda a uma calculadora cientifica para determinar o resultado de um simples passo.

Foi então, depois do lançamento do titulo Vampiro, no inicio da década de 90, que começaram a aparecer os reais benefícios e dificuldades relacionadas com o RPG, benefícios inclusive aqui criando autores brasileiros que de tudo fizeram para lançar títulos de RPG, visto que os sistemas internacionais estavam estagnados e apenas em  2000, a empresa que comprou os direitos autorais da TSR, a Wizards of the Coast, resolveu finalmente começar a publicação do jogo que deu inicio ao RPG, o D&D, mas sob os auspícios de outro sistema de jogo, baseado no sistema antigo de regras do AD&D mas completamente inovado no tocante a regras e sistemática de jogo, o sistema D20.

Desenvolvido na Internet por rpgistas e que foi comprado pela wizards com o intuito de torna- lo  um sistema para livre adaptação e não mais cobrar direitos autorais pelo sistema, pois segundo os diretores de Wizards of The Coast foi isso que fez estagnar o mercado RPGistco nos anos 90, segundo eles também não há a necessidade de monopolizar o sistema que tem a simplicidade das regras de vampiro, as características da sistemática de jogo do AD&D, e a promessa máxima para os rpgistas, é um sistema genérico mais simples e cativante do que o GURPS, e que foi comprado para que se retomasse a produção de novos títulos para o RPG mundial, mas inda é cedo para julgarmos o quanto isso fará bem ou mal para o RPG, sendo que o jogo acabou de ser lançado, tem vários títulos e os números já assustam isso é verdade, mas o manual genérico recentemente foi desenvolvido e está para ser lançado, temos que avaliar também o quanto os jogadores estão preparados para ele, se conseguiram se recuperar da década passada com sua turbulência  e que nasceu a problemática juvenil-rpgistica determinada de “As mazelas de 90”.


O Brasil

O Brasil começa relativamente tarde a ter um contato um pouco mais real com o RPG, desde 1985 o RPG se encontra declaradamente em nosso país, mas mesmo assim apenas muito depois disso ele começou a ser traduzido e publicado por aqui.

No inicio, os livros ou xerox dos livros, eram trazidos ao Brasil por alunos que faziam intercambio no exterior e que acabavam conhecendo o RPG nas universidades e traziam seus materiais como podiam para “tentar” continuar a usufruir de seu hobbie com seus amigou, primos ou colegas aqui no Brasil.

Apenas em 1990 uma editora, Devir,  resolveu dar inicio a tradução e distribuição do material RPGístico de maneira efetiva e real, mas ainda receosa do tipo de receptividade que esse jogo teria no mercado, visto que a maioria do material era importado tendo apenas um título em português, o GURPS.

Em seguida a Abril editora consolidou parceria com a TSR e passou a publicar os livros do AD&D, que não foi bem divulgado e em razão disso ficou a mercê de uma tiragem e respaldo muito pequeno, tendo seu publico restrito aos antigos jogadores da versão em inglês, e pequenos grupos que tinham maior interesse no mundo de fantasia- medieval do desenho caverna do dragão que nos versáteis mas complicados ajustes de regras do GURPS, frente a isso, um grupo de jogadores entusiastas criou o primeiro sistema brasileiro de RPG, o TAGMAR, que foi inicialmente publicado pela editora GSA, que pertencia aos autores do jogo.

Produzido por Marcelo Rodrigues, Julio Cezar Jr, Leonardo Nahoum e Ygor Morais, Tagmar, infelizmente foi tachado pelos jogadores brasileiros de cópia barata do sistema da TSR, com baixa qualidade grafia e editorial, e infelizmente não vingou no meio RPGistico brasileiro, tanto por ser desmerecido pela revista que mantinha os RPGistas informados sobre o que havia de novo no mundo RPGistico, mas principalmente por não ter se moldado ao formato de seu companheiro de nacionalidade que chegou um ano depois, O Desafio dos Bandeirantes, que surpreendeu a muitos apresentando uma temática nova, nacionalizada e com um padrão e potencial tão bem arquitetados que inclusive são suporte para o uso do RPG na educação hoje em dia.
Criado por Carlos Klimick, Flávio Andrade e Luiz Eduardo Ricon, Desafio dos Bandeirantes infelizmente foi tachado, assim como seu conterrâneo mais novo de ser um completo plagio nacionalizado do sistema da Steve Jackson Games, o GURPS, e acabou sendo colocado de lado também pelos jogadores.

Depois desses dois, alguns títulos foram lançados no Brasil, todos com excelente material de ambientação, mas muito pobres em conteúdo e objetividade de jogo, relacionando sempre o RPG a temas que beiram o oculto ou sinistro, como o titulo Trevas, que causa polemica nos jogadores por seu sistema e nos pais por sua temática, visto que é direcionado para o publico adolescente e que ainda está em fase de formação de caráter.

Foi então, em 1992 que a  Devir editora, fechou contrato com a White Wolf americana e passou a importar e traduzir os livros do já famoso WoD, que passaram a fazer parte dos novos grupos de RPG que nasciam em todo o país, motivados pela possibilidade de viver aventuras incríveis com politicagem, manipulação, intrigas, violência e sexo, sem censura ou cortes de edição, apenas a divertida possibilidade de ser um herói ou anti-herói como os que aparecem na televisão, que até então era o único meio de distração e que cativava boa parte dos brasileiros e que se mantém assim ainda hoje.

O mercado brasileiro de RPG começou então a exigir cada vez mais e mais títulos em português, coisa que não aconteceu ainda por motivos misteriosos, mas não recebeu resposta imediata e se mantém indo a passos curtos tanto no sentido de diversificação de títulos como na possibilidade de pesquisas em potencial.

Em 1996, chegaram ao Brasil, com o avanço do Wod no mundo, projetos internacionais que visavam o que de mais novo havia em termos de RPG, os Live Actions, mesmo com o RPG ainda em desenvolvimento no país e com um mercado não consolidado.

Os Live Actions eram tipos de RPG’s que se jogava ao vivo, com a interpretação em tempo real e com resultados imediatos e globais, podendo cada ação em uma cidade pequena do Brasil ter repercussão no meio da Alemanha, o que causou um grande atrativo não só aos jogadores mas também a uma parcela da sociedade juvenil que começava a se interessar pelo assunto, as meninas.
Não é novidade que o RPG desde o seu início foi mais atrativo aos meninos, vista a sua propensão à força como dominante das situações, mas ainda assim, com a entrada do WoD no mercado, cada vez mais meninas começaram a se sentir familiarizadas com o ambiente e a se aproximar para jogar,  tornando o RPG não mais uma diversão apenas de meninos e aliviando o coração de muitos pais, que viam seus filhos interpretando criaturas assexuadas durante noites e noites de fins de semana a fio sem sair de casa nem para respirar ou buscar pão.

Houve um período de extrema dedicação por parte de boa parte dos jogadores em cima do sistema de Storyteller, mas mesmo assim com a dificuldade de títulos da língua residente e a precariedade do ensino brasileiro os títulos começaram a ficar cada vez mais e mais escassos ou pouco freqüentes, não que não houvessem centenas de suplementos, haviam, mas a sua maioria em inglês, o que não ajudava muito os jogadores no geral e então começa a decadência do RPG no Brasil, em 2000 já não se jogava RPG com tamanho afinco e tenacidade, apenas alguns grupos que ainda não se abalaram com a perda de qualidade dos RPG’s tradicionais, que foi ao fundo do poço em busca de dinheiro, muito menos com a baixa qualidade dos títulos recentemente lançados também por brasileiros que mais pareciam jornadas constantes ao inferno e sem qualquer embasamento literário em seu conteúdo.

Período esse que passa a se distanciar mas carregar consigo as marcas deixadas pelas mazelas de 90 que passaram a fazer dos RPGistas mais antigos “vigilantes do caminho certo”, por razão de possivelmente ter seu jogo proibido por uma lei federal.

O Brasil recebeu em 1996 mais um título em português, DEMOS Corporation, que visava a interpretação de espiões de uma corporação secreta, bem ao estilo Missão impossível, mas em vista da complicação de se montar um personagem o jogo não vingou nem mesmo nos meios mais reservados e que se diziam jogadores do impopular.

Posteriormente veio O Desafio dos Bandeirantes, muito bem escrito e ambientado, renasceu e passou a ser usado por professores em suas aulas de história, mas também não vingou como fonte de sucesso pois onde se deveria ter sim mais títulos e suplementos, vista a possibilidade de uso na escola, não houve, e também os professores eram tratados como exércitos de um homem só, visto que onde todos se mantinham no método positivista cartesiano, os professores de História passavam a empregar outros métodos como o construtivista e humanista que dificilmente era aceito pelos outros professores e diretores, o que acontecia inversamente com as crianças e as “Tias do SOE”(pedagogas das escolas).

Então, com o apoio de uma revista brasileira que fala sobre RPG, é lançado o titulo Defensores de Tóquio, que vem posteriormente  ser publicado com o formato de um sistema de regras completo e que passa  a ser base de outros títulos, também sem tanta repercussão em seu inicio mas que começam lenta e gradativamente a fazer parte do meio RPGistico brasileiro, cativando os novos jogadores e contribuindo para a disseminação das mazelas, visto que já em Defensores de Tóquio o que se fundamentava era  a possibilidade de se pegar grandes armas e destruir, destruir e destruir, com poderes e mega- robôs, baixando e muito, a qualidade do jogo, criando uma mentalidade de criação de personagens para  a competição e não mais para a diversão coletiva mas sim para estravasar frustrações particulares em pessoas próximas, um dos sintomas das mezelas.

Mas o RPG brasileiro ainda tinha muito a crescer e a se desenvolver e vamos entrar nesse ponto logo a diante, vejamos agora o que foi e como se originaram as Ações ao Vivo.


A magia dos Live Actions


No meio dos anos 90, mais exatamente em 1996 quando os jogos de RPG começaram, no Brasil, a sair de dentro do meios universitários e fins de semana na casa dos primos, varias novas modalidades de jogos de RPG começaram a aparecer, em alguns casos a aventura se desenvolvia com tamanho entusiasmo que os jogadores passavam a não mais interpretar apenas com palavras e sentados à mesa e sim de pé e com interação física para melhor exemplificação das suas atitudes no jogo.

Frente a isso começaram a ser inseridos no meio RPGistico Live Actions ou Ações ao Vivo, como é determinado em português e que começou a ser introduzido no RPG em 1981, por um grupo de universitários americanos em Bulder .

Essa “onda”, começou na região sudeste do país e se alastrou em uma velocidade inimaginável, suportada por uma jogada de mestre da editora White Wolf, que estimulava a realização de teatros-novelas por parte dos Fãs do titulo Vampiro, da mesma editora, que organizou um grande jogo mundial chamado One World by Night, que visava a interação de jogadores em todo o mundo, tendo suas atitudes influencia em pontos muito distantes do local da origem da ação.

Nessa mania entraram quase que todos os jogadores de RPG do Brasil, o que causou um alarde nas cidades americanas que participavam do projeto e viam uma crescente interação e associação dos brasileiros ao projeto, o que ameaçava a hegemonia americana nas decisões e rumos do projeto.

O sucesso foi tamanho que as regras para a interpretação ao vivo, foram detalhadas e ampliadas, bem como estendida aos outros títulos do WoD, criando uma novela mundial e que permitia a interação ao vivo e pela Internet de vários jogadores ao mesmo tempo e também o planejamento de estratagemas que beneficiavam os grupos aliados na novela.

Desde então vários outros projetos passaram a ser criados, alguns individuais e outros ligados a editoras ou grupos de rpg bem organizados.

Infelizmente a ameaça brasileira ao hemisfério norte não teve uma continuidade.Mal organizado desde o inicio, sendo alvo de histórias que iam desde culto a religiões obscuras até roubo por pare se seus organizadores no inicio de sua estruturação.

Porem para mudar isso um novo grupo de jovens se dispôs a organizar o projeto no Brasil mas ainda assim a lentidão na troca de informação e o aparecimento de núcleos privilegiados com relação a criação e aprovação de personagens e histórias passou a desestimular os jogadores e força- los a migrar para outros projetos como que infelizmente já desacreditados em razão do histórico vigente no meio RPGistico de incapacidade organizacional real passaram a viver a margem do primeiro projeto e em eternos altos e baixos, não conseguindo nem alcançar a proporção do primeiro projeto, muito menos ser respeitados com validos e sérios.

Hoje em dia os três projetos ainda existem mas sua operacionalidade e objetividade com relação ao tema RPG ao vivo, não só não é mais levada a sério pelos próprios RPGistas, quando acabaram perdendo espaço para os projetos Livres, que não são atrelados a nenhuma entidade ou novela especifica e podem durar de 1 a 5 capítulos em média.

Bem, com relação a como começou e se desenvolveu o RPG nesses últimos 34 anos e o que ele se tornou para o meio RPGistico, agora vamos partir para as propriedades descobertas nesse jogo que envolve a dramatização sem roteiro, trabalho em conjunto, capacidade educacional, de sociabilização e ainda mais.


Mas afinal, como se joga?

Falamos até agora de como o RPG nasceu e de como ele se desenvolveu, mas afinal, como ele funciona? Como se começa e o que se precisa para dar inicio a uma partida neste jogo que tanto cativa?

Bem, vamos dissecar a partir de agora todos os elementos que compõe este magnífico passatempo.

Material

Sinto muito a quem tem preguiça de ler, mas no RPG se lê e se lê muito!

O principal para uma partida com jogadores novos, principalmente, é um livro ou ainda um “poligrafo” que contenha pelo menos as regras de criação de personagem e algum detalhamento para a resolução de problemas na aventura, ou seja, algo que caracterize um sistema de regras.

Podem ser usados, para resolução de situações complexas, dados, cartas, par ou impar, bem- me- quer- mal- me- quer, ou seja, se tem dados ou não e de que numero de faces.

Sim, no RPG comumente usamos dados para a resolução de situações complexas, como bem sabem os RPGistas, no RPG se usam dados muitas vezes, com mais ou menos faces do que as habituais seis com que estamos acostumados, podendo varias de quatro até mais de cem faces em um único dado.

Os dados, no RPG, podem inclusive representar bem mais do que apenas números para resolução de problemas complexos, eles podem por
exemplo representar fases da lua, ou ainda, cartas e magias, enfim, o que surgir na idéia ou surtir como necessidade de um sistema.

São necessárias também, folhas de papel em branco ou foto copiadas, quando falo em folhas em branco, quero dizer que o mestre pode montar a sua própria ficha para o jogo, independente do sistema.

Também são necessários, lápis e canetas, uma aventura na cabeça, um mestre e claro, alguns jogadores.

Bem, passemos agora aos pontos em que eu não fui muito claro e que precisam de uma certa dose de explicação mais detalhada.



Mestre

O mestre é simplesmente a tomada do jogo, sem ele, basicamente, a aventura não existe, afinal a idéia da aventura é substancialmente dele, o que acontece, quem é bom, mau, quem vai ajudar e quem vai atrapalhar, tudo isso é papel do mestre decidir e arbitrar.

Sim, arbitrar, quando saímos do mundo dos wargames, esse foi um dos pontos de maior discussão, o mestre do jogo seria apenas um contador de histórias ou realmente um árbitro de regras e situações?

Mas este não foi o único ponto polemico que se levantou sobre o mestre e que vamos discutir aqui, inclusive pois este ponto já é vencido, o mestre é o Senhor todo poderoso do jogo, só podendo ser vencido por uma argumentação muito boa com relação a alguma regra ou ainda por sua própria vontade de realizar uma ação na aventura.

O trabalho do Mestre demanda uma pessoa matura, consciente do jogo e experiente, também requer uma certa dose de cultura geral, conhecimento em várias áreas diferentes, ou ainda o mais importante, se dispor a pesquisar sobre vários assuntos diferentes e que podem ser inclusos na aventura eventualmente pelos jogadores.

Conseqüentemente, isto significa que ser o Mestre vai além de apenas ser o mais velho, ou o que conhece mais as regras.

É por isso que não é incomum encontrar alguém de 15, 16 anos mestrando para jogadores de 11 a 17 anos de idade, ou até mais velhos.

Durante a produção deste livro encontrei na Internet uma serie de textos que falavam do papel do mestre na aventura, o que não é de se causar estranheza, visto que são apenas textos que visam  explicar o papel de cada um na aventura, ou no jogo em sites de fãns do jogo.

Mas durante a minha pesquisa achei pontos que acho importante que sejam colocados aqui visto que, por muitas vezes, acharmos que era desnecessário falar sobre responsabilidade para mestres de RPG,afinal é apenas um jogo, acabamos sendo engolidos por uma certa soberba e houve o que houve no meio RPGístico e inclusive no Brasil.

O mestre, também e principalmente, é responsável pelo inicio, meio e fim da aventura, mas o essencial, ele é responsável pelo bem estar e pela saúde mental de seus jogadores.
Sim, os RPGistas mais liberais e novatos que me perdoem, não estou tentando etarizar o mestre, mas sim, informar aos já mestresa sua funçãoe obrigação.

O mestre tem o dever ético e moral de não passar para os jogadores, ainda em formação,conceitos morais e sociais que possam interferirna formação do individuo.

Sim, o mestre deve ter uma conduta ética, durante a partida, no mínimo idônea e não passível de repreenção, seja pelo grupo, seja por um espectador casual.

Sabemos que conceitos éticos muitas vezes são consenso de um coletivo, mas também sabemos que existem leis e uma constituição a respeitar, portanto, aos mestres novos e aos antigos que ainda não se acharam na realidade terrena, fica o lembrete, citar um ritual é diferente de descrevê- lo com detalhes e encorajar uma sessão de jogo o realizando, ou ainda citar um partido ou facção de qualquer gênero incutindo-lhes alcunhas particulares.

Isso com certeza é errado e pode muito facilmente reproduzir episódios como os ocorridos em Dallas nos EUA ou ainda em Ouro Preto em Minas Gerais.

Por tanto cuidado, prudência e respeito ao próximo são também atribuições que um mestre deve ter antes de se auto intitular “Mestre”.

Um exemplo que pode ser estudado com muita cautela tem a ver com o desenvolvimento dos mestres de RPG, pois temos os mestres divididos em gerações, quatro para ser mais exato, três bem definidas e uma que pode se dizer, é a que vai realmente ditar o que ou ainda “que” tipo de RPG vai se estabelecer como base para os jogos de RPG no Brasil a partir deste milênio.

Temos a primeira geração que se constitui em torno do sistema medieval, imperialista e positivista AD&D, que se desenvolveu e cresceu despretenciosamente com a entrada do RPG no Brasil no inicio de 1982, são mestres que realmente usavam o RPG apenas para diversão e não mais do que isso, não se constituía um monopólio de saber em um grupo social jovem ou coisa parecida, realmente foi a mais saudável das gerações de mestres de RPG.

A segunda geração de mestres está diretamente associada sistema GURPS que, apesar de ser um sistema genérico para várias ambientações (fantasia medieval, viagem no tempo, mitologia, espionagem...) - o que facilita a sua divulgação e amplia seu público – mas que se embasa vigorosamente em suas  regras, que são, de um ponto de vista objetivo,  bastante complexas, e na dependência excessiva do resultado dos dados, mas que compõe a “classe” de mestres que teve o mérito de tirar o RPG de dentro dos meios e círculos fechados como universidades e casas de primos e lançar o RPG como uma possibilidade de entretenimento real no Brasil e de maneira muito saudável vistos os temas ainda em mutação e a temática de jogo não estar voltada para ambientações psicologicamente pesadas demais e por lidarem com sistemas de avaliação ingenuamente burguêses e positivistas, onde os excessivos valores neo-liberais fortemente presentes qualificam o sucesso em ações individuais como prêmio pelo empenho pessoal e motivo para premiação máxima.

A terceira geração de mestres de RPG no Brasil vem com o sistema Storyteller, responsável pelo World of Darkness,  que foi mais do que imediatamente traduzido e distribuído no Brasil, logo após o seu lançamento nos EUA em 92 e que atingindo as classes mais populares, sem fazer destinção de gênero, diferente dos outros sistemas que mais chamavam a atenção de garotos e não de garotas, pode-se dizer que o aparecimento de “Mestras” de RPG ou “Mestres Fêmeas se dá depois do aparecimento do sistema Storyteller.

O seu conjunto de regras é muito compacto e de fácil assimilação bem como os recursos para a criação do personagem, tornando assim o seu poder de argumentação  mais importante do que o rolamento de dados. Pode-se dizer que este é um sistema realista em demasia e que pode passar conceitos de certo e errado com mais facilidade e objetividade para os jogadores, onde os personagens são levados a lutar contra o pecado, superando-se. Há grande fortalecimento dos aspectos psicológicos e de vivencia em grupo dos personagens, diminuição do número de combates, na maioria dos títulos e maior incentivo da produção narrativa como o próprio nome, Storyteller (contador de histórias) sugere.

Porém, foi este o sistema que causou mais preocupação e dor de cabeça aos RPGistas na ultima década, vista  a falta de responsabilidade com que muitos dos mestres administraram suas mesas, pode-se dizer que inclusive foi essa irresponsabilidade que fez com que algumas castas eclesiásticas centrassem sua atenção no RPG de maneira negativa.

Mais uma vez, mestre, mas com cautela, não se fala aqui de mestrar pisando em ovos, mas sim de narrar uma aventura com responsabilidade.

Chegamos então á quarta e até agora ultima geração de mestres, são jovens que tem uma quantidade de títulos imensa a sua disposição, podem contar com sistemas nacionais de apoio e principalmente são mestres de um incrível fenômeno de amalgama de sistemas, onde parece que em peso os “novos mestres” se utilizam de um mundo criado por brasileiros, que tem muita influencia dos sistemas internacionais, muitas vezes descriminado como copia, e um sistema qualquer de regras, vista a facilidade que já se tem hoje em dia de se adaptar qualquer mundo a qualquer sistema por parte destes mestres em mestrar.

Esta também é uma geração que traz muitas das expectativas á flor da pele, seja por parte de historiadores, como eu, seja por conta das editoras, ou ainda, por parte dos novos criadores nacionais de RPG e escritores de romance baseados em aventuras por eles criadas.

Não vou me adiantar á possível realizações e afirmações sobre o futuro do RPG no Brasil pois senão estarei fugindo a minha função.

Vãos passar agora para o ponto crucial, o jogador, o corpo da aventura.

O Jogador
Grupo
Aventura



O RPG como Ferramenta do Homem

O RPG tem características que o tornam uma excelente ferramenta educacional, sociabilizante, e criadora de uma consciencia crítica no ser humano visto que tem incutido em seus pontos principais as seguintes peculiaridades:
· Socialização: A própria atividade de RPG desenvolve a socialização. Os jogadores conversam entre si e com o mestre, trocando idéias e expondo as ações de seus personagens. Juntos, eles criam uma história. Eles também aprendem que seus atos trazem conseqüências, pois a história muda de acordo com as ações dos personagens.
· Cooperação: Para serem bem sucedidos diante dos desafios propostos pelo Mestre na história, os jogadores tem de cooperar entre si. As habilidades de seus personagens são complementares. O desenvolvimento do espírito de equipe é importantíssimo num mundo cercado de tantas atividades competitivas.
· Criatividade: Os jogadores desenvolvem sua criatividade ao se imaginar na história e ao decidirem como os seus personagens reagem e resolvem os desafios das histórias. Eles também podem criar seus personagens, históricos e personalidades.
· Interatividade: Os jogadores estão constantemente interagindo entre si e com o mestre. Atividades interativas comprovadamente levam a uma maior fixação de conteúdo do que atividades expositivas. Os jogadores aprenderão muito sobre o cenário de jogo aonde se passa a história e sobre o que os seus personagens precisam saber para vencer os desafios da história.
· Interdisciplinaridade: Uma única história pode abordar temas de várias disciplinas harmonicamente. No exemplo proposto acima, a história pode abordar elementos de História (a época em que se passa a história), Geografia (o local da história, atividades humanas) e Biologia (conhecimentos de botânica da curandeira, Ecologia para o caçador). Outros elementos podem ser adicionados. Por exemplo. Uma outra história pode abordar um disparo de canhão contra um navio inimigo. A trajetória do tiro versus a velocidade de deslocamento do navio aborda elementos de Física e Matemática, além de História.

Os jogos de interpretação de papeis vem sendo usados nos meios de educação, socializaçãoe até evangelização (acreditem), desde 1978, cerca de dez anos após a sua criação vistas as suas propriedades e capacidades   sociabilizantes, educativas, criativas e inclusive salutares para o crescimento do ser humano como objeto atuante no mundo, e a partir de agora nós vamos dissecar como e onde o RPG, até agora, pode auxiliar o ser humano a crescer, tanto intelectualmente, quanto no seu mau uso, ou seja, em excesso, já que é mais do que sabido que todo o que é usado em demasia pode e faz mal, portanto não iremos discorrer sobre isso aqui.

Na verdade o RPG vem, como já comentei, sendo usado a cerca de 25 anos como ferramenta alternativa na educação de seu país de origem sendo uma ferramenta pedagógica de ensino objetivo e para  a melhor captação de conteúdo, bem como sua fixação.

Parte-se do pressuposto, na educação de que toda a experiência vivida não é facilmente esquecida e que a vivencia escolar deve ser uma experiência positiva para a criança e para o adolescente de maneira que eles não venham a esquecer o que aprenderam, mas isso não tem acontecido e muito menos dado certo.

No  caso do RPG educacional ou nos outros campos como vamos ver aqui, seja ele empresarial, comunitário, familiar, político, profissional, enfim, onde quer mais que ele esteja sendo aplicado, conclui-se justamente que, o que fixa justamente a maneira de se fixar a idéia que se esta tentando passar é através deste trauma positivo, já que no RPG não há um vencedor e sim um grupo ou ainda, um coletivo vitorioso que alcança um objetivo de maneira conjunta  e unida, na qual se tem de maneia nítida um individuo trabalhando com um grupo, para o crescimento individual e para alcançar um objetivo por ele mesmo pré estabelecido no inicio da aula.

Claro que a partir daí pode-se divagar acerca de alunos que deixariam o grupo para buscar seus próprios interesses, mas essa idéia cai por terra quando recordamos que o RPG, único jogo autorizado pela NASA para subir ao espaço com os astronautas, tem justamente a capacidade de manter um grupo centrado em um foco em comum e estimula o convívio em grupo e onde as características e particularidades do indivíduos não deixam de ser respeitadas e vivenciadas durante o jogo, criando no jogador o entendimento de vivencia em grupo participação em um coletivo e ainda a possibilidade de um crescimento individual a partir de atitudes voltadas para a s necessidades do coletivo, vista  a bonificação final estar sempre de alguma maneira relacionada com a participação ativa de cada um dos personagens envolvidos.
Mas isso e outros tópicos veremos a partir do tópico adiante, que mostra onde e como pode e  vem sendo desenvolvido.



RPG E EDUCAÇÂO


Este é o item que tem mais chamado a atenção dos pesquisadores, educadores e mestres brasileiros no que se refere a utilidade do RPG.

Mesmo sendo utilizado neste meio desde 1975 fora do país e ser reconhecido como uma poderosíssima ferramenta pedagógica em países como a França, Inglaterra, Japão, EUA, Colômbia e tantos outros, os métodos Positivista-Cartesianos adotados e utilizados no Brasil não dão espaço para  a inserção de métodos que não sejam incluídos e citados explicitamente nos textos dos pensadores da “Nova Escola”, digo assim pois o RPG está subliminarmente implícito nos discursos tanto de pensadores tradicionais como Skinner, Piaget Vigotski, Paulo Freire, quanto dos novos pensadores da escola moderna que justamente se embasam nas idías já levantadas para fixa- las.

Onde o que se percebe é que todos querem dinamizar cada vez mais o aprendizado nas escolas para que as crianças e os adolescentes não mais vejam a escola como um fardo pesado a ser carregado e como uma instituição falida.

Porem esse é outro ponto, nos atendo ao RPG como ferramenta educacional podemos perceber o quanto ele consegue ser paradoxal em suas metodologias e filosofias implícitas sem que possamos nos dar conta em uma simples partida desatenta.O RPG conglomera em suas propriedades pedagógicas conceitos nítidos de fundamentos positivistas, marxistas e anarquistas juntos, o que não se encontra em outras ferramentas mais comuns.

Quando nos referimos á positivista é em razão de haver um mestre(ou professor)que detêm o poder de decisão e que é responsável por manter a ordem e os jogadores(alunos) que devem se submeter ao saber e as decisões do grande pai, porem inserimos os conceitos marxistas quando os alunos podem e devem interferir nas mudanças pois o professor mesmo sabendo muito ainda não é o dono da verdade e com este pensamento as idéias podem ser trocadas com maior facilidade e as características de classe são então suprimidas, mas não deixam de existir e acabam a cada vez mais se aproximar dos conceito de anarquia conjuntos quando percebemos que cada jogador passa a saber o seu lugar no todo e também a trabalhar para o desenvolvimento conjunto do todo e passam a saber também que são responsáveis diretos por seus atos e também que uma ação má pode levar tudo o que se está desenvolvendo ou ainda aprendendo pode vir a ser jogado fora por um pensamento individualista e sem sentido ou sem um precedente.

Porem a partir de agora vou me fundamentar nos pensamentos dos novos ícones da educação, como pr exemplo Edgar Morim que prega a união dos conteúdos e a maior atenção ao complexo, sabemos que ao ver uma formula ou um cálculo mais aprimorado, grande parte dos educadores sai pela tangente pensando que não será possível passar a matéria, porem por mais que o RPG por muitas vezes pareça “muito complicado” ao ser explicado, e não deixa de ser se analisarmos objetivamente, por que motivo será que ele arrebanha pelo menos três milhões de jogadores em seu país de origem um numero similar no Brasil e tantos outros milhões somados no mundo?

Por que sem duvida ao se compreender o complexo a dificuldade se dissolva e passe a ser comum passando, após transpor esta barreira inicial, a conquistar o aluno por sua hermética virtual.

Não podemos nos esquecer de que o ser humano  não podemos nos esquecer de que o ser humano  gosta de peculiaridades impares e também de se sentir parte de um grupo, isso tudo paradoxalmente unido ao mesmo tempo, e os jovens humanos não são diferentes.

Ao analisarmos os mecanismos pedagógicos colocados anteriormente perceberemos que o aluno tem todas as condições não apenas de aprender mas também de crescer com o RPG.

O RPG, no tocante a Perrenoud, capta os seus dez pontos de competência disciplinar pois, com esse real aprendizado em grupo, ele ajuda a organizar e dirigir as situações de aprendizagem, visto que o professor(mestre) tem controle sobre o jogo e seu andamento, bem como da administração sobre o ‘que” está sendo desenvolvido em sala de aula, também visa, com os tipos de personagens diferentes disponíveis, ele pode dar e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação mas sem perder o sentido de grupo, ou seja o trabalho em grupo é muito valorizado e assim fica muito mais fácil envolver o aluno, fazer uso de tecnologia e aproximar os pais, sim, pois ao perceber que os seus filhos continuam desenvolvendo conteúdos aprendidos na escola eles virão ao encontro da escola e também ajudar o aluno nesta maneira virtual realista de se aproximar de sua profissão, viver as dificuldades e dilemas da mesma e assim mais facilmente administrar as sua própria formação tornando a escola com características mais humanistas ou ainda como diz Bernardo Toro, que criou os Códigos da Modernidade, que em muito convergem com o que o RPG educacional tem a oferecer visto que o RPG dá quase que automaticamente ao aluno domínio da leitura, seja ela corrida ou hipertextualizada e conseqüentemente da escrita, gera a facilidade para fazer e resolver cálculos e problemas, provê a capacidade de analizar, sintetizar e interpretarsituações, fatos e dados, cria o entendimentode o que é atuar socialmente, passa também o aluno a receber criticamente os meiosde comunicação, pois poderá localizar e acessar melhor as informaçõesacumuladas e por fim, como nada disso foi adquirido observando uma parede escura, estará apto para viver e produzir em e para um grupo sem perder o sentido da sua individualidade dentro do coletivo.

Concluindo, o RPG leva o aluno a viver o conteúdo, de maneira prática, não apenas teórica e também recria no professor o sentimento de utilidade perdido durante os anos 80 e 90 no Brasil vista a realidade que para eles se apresentou.


RPG e SOCIALIZAÇÂO


No tocante a socialização o RPG tem como desenvolver isso quase que automaticamente, porem esse ponto devemos tratar com maior delicadeza pois um mau uso de um conceito moral e social especifico pode ter resultados futuros que não almejamos.

Podemos notar como o RPG permite ao jogador exercitar sua fantasia e torná-la aceitável em seu meio. Isso, por si só, dá ao jogo um grande papel como elemento socializante. Ao se sentir aceito, o jogador começa a se desfazer de suas inibições e se expor mais à sociedade.
A inigualável capacidade de integração social do ser humano por parte do RPG começa na própria estrutura do jogo: é jogado em grupo, sendo que não é voltado para a competição, mas sim para a cooperação entre seus participantes. A própria história leva a isso. Se o grupo tem seis jogadores, o mestre criará um obstáculo possível de ser superado por seis personagens, talvez cinco, dificilmente por quatro e improvável que seja superado por três.
Há um famoso ditado no meio do RPG que sintetiza bem esta filosofia: "grupos separados levam a mortes simultâneas".

Além disso, é um jogo que transcorre fixado no discurso, na tradição oral, no diálogo e troca de idéias. Ou seja, os jogadores ficam sentados em volta de uma mesa, por quatro ou até dez horas, dialogando. Mesmo o mais convicto dos tímidos acaba sendo envolvido e se sentindo livre para se expressar. Neste aspecto, o RPG é um importante elemento de comunicação e socialização de idéias e ações. Jogar leva, naturalmente, a uma maior facilidade de se comunicar, expressar um pensamento.

Os grupos de RPG acabam sendo formados em torno de afinidades. Mas, ao contrário de outras estruturas socializantes existentes, o RPG se caracteriza pela libertação (de idéias, de fantasias), ao contrário da imposição, da repressão ou da segmentação da maioria pois, no RPG, podemos ter em um mesmo grupo um judeu e um católico durante a idade média que nada de mais ou de perigoso ira ocorrer por causa das opiniões destes. O jogador de RPG acaba sendo impulsionado para novas experiências, novas relações, da mesma forma que navega por novos mundos, novas realidades, novas personalidades.

A única limitação do RPG talvez seja o fato de que quem não gosta não joga, como se possuísse um dispositivo natural contra "adesistas". Um exemplo da característica impar do RPG é visto se comparado a “paixão nacional”, o futebol,você pode não gostar muito de futebol mas pode se dizer torcedor de um determinador time, no intuito de se fazer mais sociável, e ler esporadicamente a seção de esportes para não ficar totalmente "por fora”, ou nos jogos de cartas com nipes,você pode participar de um jogo de baralho só para acompanhar os seus amigos (afinal, você não quer ser desmancha-prazeres). Porém, você não vai jogar RPG por muito tempo, isso com certeza.Isso pode parecer antipático de início, mas é o que permite aos jogadores um total desprendimento no exercício da fantasia. Eles sabem que todos ali participam da mesma "onda", ou “barato”. Um jogador descontente é logo identificado, e perturba bastante o desenrolar da história e do grupo, chegando até mesmo a desconcentrar o mestre do jogo e prejudicar o coletivo. Enfim, quem não está disposto a expor suas fantasias, ou não se permite o prazer de sonhar não consegue participar do processo e interagir com os outros jogadores. Ao mesmo tempo que experimenta uma sensação de desconforto, faz com que todos se sintam pouco à vontade. Isso não quer dizer, contudo, que há uma forma correta de jogar RPG, de maneira alguma. O único pré-requisito necessário é o interesse genuíno em jogá-lo.

Devemos lembrar que a fantasia funciona como uma regressão tática da mente, visando uma melhor adaptação posterior à realidade, como já vimos anteriormente. E, de fato, apesar de o jogador sair da realidade enquanto se deixa levar pelo exercício da fantasia das sessões de jogo, este exercício constante da imaginação lhe proporciona instrumentos poderosos na interação com a realidade.

Após experimentar, na fantasia, diversas realidades, várias maneiras de ser, inúmeras situações e experiência, o jogador está munido de um rico repertório de ações, pensamentos, reações, emoções... A realidade para ele não se apresentará mais somente como algo linear, de certo ou errado, mas como um universo de múltiplas possibilidades, do que é possível e do que não é possível.

Uma garrafa não será apenas uma garrafa: ela poderá ser um instrumento musical, uma arma de defesa contra um assaltante. Ao atravessar uma rua ou alcançar um ônibus, mais de duas possibilidades de como alcançar estes objetivos lhe ocorrerão em frações de segundos.

Assim como ele questiona a todo momento o mestre, procurando melhor compreensão da história e interação com os seus elementos, passa a questionar mais a realidade que o cerca, tornando-se um ser humano mais ativo e integrado com a realidade do mundo que o cerca. Não é à toa que, nos EUA, o jogo foi vítima de grande preconceito logo que surgiu nas classes juvenis. Quem iria gostar de um jogo "esquisito", que leva os jovens a ficar horas em volta de uma mesa conversando e os estimula a ter uma visão diferente, com argumento para discusão, instrução sobre assuntos diversos e cultura geral e uma noção mais ampla da realidade? Numa perspectiva conservadora e relativamente opressora como a americana, ninguém.
Além disso, é bom lembrarmos do destino inevitável de qualquer livro de RPG: ter sua ambientação e regras alteradas. Esta vocação do jogador de alterar uma "realidade" já pronta e mudar as regras do jogo (em todos os sentidos) não deve ser ignorada ao analisarmos o auxílio do RPG (através da fantasia) na adaptação à realidade.

Neste aspecto, o RPG se mostra como uma eficaz ferramenta de treinamento de profissionais para empresas, ou mesmo de simulação para as forças armadas, guerrilheiros cubanos levavam seus jovens até o centro de suas cidades e ordenavam que retornassem como guias dos seus chefes. De certo modo isso já ocorre, pois os métodos empregados se desenvolvem naturalmente em direção à dinâmica do RPG. Não seria exagero afirmar que, se grupos de traficantes, ou qualquer outra milícia urbana assimilasse as técnicas do RPG, as populações das grandes capitais teria um excelente motivo para não dormir à noite.

Dentro de uma sociedade que se mostra cada vez mais complexa com o desenvolvimento da informática, não seria exagero supor que o jogador de RPG está, a princípio, mais apto para agir nesta sociedade. Talvez não seja por acaso que os novos grandes nomes da publicidade e da televisão nos EUA são pessoas que jogaram RPG na adolescência.

Mas vamos nos concentrar agora no que parece ser o grande achado dos professores e que alguns deles, por simples desmotivação de seus trabalhos, em razão de seus salários, da dita falta de incentivo de atenção à categoria ou mesmo por simples preguiça e frustração com a profissão, preferem se manter atrás da mesa mandando os seus alunos ler textos jurássicos de livros selecionados por Cleópatras e Judas da educação,

Sabendo que a maneira positivista de apresentar as coisas não leva a um desenvolvimento produtivo do ser humano temos uma arma para acabar com a falta de interesse e com a evasão escolar, usada e comprovada em boa parte do planeta:

RPG e POLITIZAÇÂO


Com os sistemas e mecanismos de que o RPG dispõe hoje em dia este ponto parece ser facilmente desenvolvido com qualquer grupo, mas ao que pude perceber temos que nos ater a detalhes importantes do processo de politização do ser, como por exemplo, no que tange a disponibilidade para criar no ou nos indivíduos que participam de uma partida ilustrativa, a consciência política e não a partidarização política, onde sabemos, quem joga RPG hoje em dia são adolescentes e jovens, ou sejam, pessoas com conceitos ainda em formação.

Temos por exemplo como ilustrar movimentos, diretrizes e atitudes políticas, bem como a sua importância para o bem estar social, com ambientações ou sistemas que interajam ou reflitam sistemas de sociedades complexas, como o jogo da White Wolf, Vampiro A Mascara, GURPS Império Romano e ainda outros também encontrados com esta temática.

É importante também salientar que, a menos que haja uma pré disposição e que não haja vinculo algum  com formação de qualquer gênero  político ou ainda em caso de pedido dos próprios jogadores, é aconselhável que se use as ferramentas disponibilizadas pelo sistema ou ainda criadas pelo mestre.

O uso por exemplo de partidos políticos já existentes pode tanto caracterizar uma tentativa de passar alguma idéia implícita por meio de mensagem subliminar quanto trazer certas incomodações ou até descrédito do mestre por parte do grupo ou das pessoas que estão cientes da temática do jogo.

Mas é realmente mais do que válido utilizar o RPG em uma criação de consciência política no individuo ser humano.

Como já vimos anteriormente, as suas capacidades de crias, simular ou ainda, recriar situações já ocorridas por meio de explicação representativa são de tamanha eficiência que valem com certeza mais do que uma simples explanação de alguém que pode conter um teor parcial em seu discurso despretensioso, não exonerando o RPG desta possibilidade, mas como eu já disse, fica ainda mais difícil de se tangir em uma linha de raciocínio política ou partidária pré escolhida, visto que as ferramentas utilizadas podem muito bem se afastar completamente da realidade em que se vive.

O interesse único de se utilizar uma ferramenta poderosa como o RPG em suas passagens de instrução sobre algo é justamente o fato de ele dar a liberdade de o ser humano visualizar de fora uma situação e poder opinar sobre e então tomar a sua melhor decisão, e não a de outra pessoa.


Código de Conduta no RPG


1) Respeito ao "outro" - Em sessões convencionais (ou "de mesa"), lembre-se que podem existir diversas outras pessoas por ali nem um pouco interessadas em sua atuação como jogador (como os pais do dono da casa, o vizinho, ou mesmo em outras sessões rolando ao lado, caso seja um espaço de RPG).
Portanto, nada de sair berrando como seu personagem eventualmente poderia fazer. Você informa o Mestre e o personagem realizou a ação. Pronto. Nada de monopolizar o aparelho de som e ligar no máximo para "criar clima" (isso só funciona se o ambiente for exclusivo para a sessão do seu grupo), nada de esparramar os dados, fichas, pizzas pela casa/ loja e por aí vai. É simples: faça só o que você gostaria que fizessem em sua casa.
2) O anfitrião não é seu patrocinador - Nada de assaltar a geladeira toda do seu colega que fez a gentileza de ceder a casa para a sessão. Ajude, levando refrigerantes, pipoca, ou crie um revezamento entre casas para que um só anfitrião não vá à falência por causa dos outros. Ah, e ajude a arrumar tudo depois, claro.
3) Avise o que vai acontecer - Esclareça a um não-jogador que pode eventualmente entrar em contato com o jogo (os pais do anfitriao, por exemplo), o que vai acontecer ali. Para evitar acusações como "Isso é coisa do demo". Lembrem-se que as pessoas mais temem o que não conhecem, esclarecer estes eventuais observadores do RPG é importante não só para difundir, mas para a própria reputação do jogo.
4) Combinar antes da sessão o que vai ser jogado - Confesso que essa é difícil e mesmo meu grupo tem problemas com isso. Mas essa regra impede que um cara que odeie TREVAS, por exemplo, saia de sua casa do outro lado da cidade achando que vai jogar AD&D e acabe descobrindo, só no local, que TODOS votaram a favor de jogar TREVAS...
Todos têm muito mais o que fazer pra ficar perdendo tempo assim. Claro que o cara que não foi àquela sessão não precisa ficar parado sem jogar: se só joga Storyteller, por exemplo, pode formar um grupo alternativo só para este sistema, ou ir jogar em alguma loja. Obrigar uma pessoa a jogar o que ele não quer é bobagem e só vai contra o princípio básico de diversão acima de tudo, do RPG.
5) Pontualidade - (Este é outro ponto difícil) O mesmo princípio dos pontos anteriores: respeito aos colegas. Ninguém tem tempo sobrando para ficar esperando os atrasados. Marquem um horário, e não algo do tipo "à tarde em casa". Tarde, para alguns começa às 12h, para outros, às as 16h...
Pode-se valorizar quem chegou mais cedo com mais pontos de personagens ao final da aventura e até punindo ao descontar pontos dos caras que empatam o jogo. Ou começar sem eles e deixar os personagens dos atrasados esperando ainda depois para entrar na história (um Mestre pode ser sádico quando quer, he, he...) É chato descontar a falha do jogador no personagem, mas fazer o quê?? O grande problema é quando o Mestre é quem atrasa. Boicote imediato nele!
6) Não tocar - Não só em LIVES, mas no RPG de mesa também. Eventualmente alguém pode achar que as ações de determinado personagem são contra a sua pessoa e partir para ignorância. É só deixar o bom senso agir.
7) Não use armas - Nunca, em hipótese alguma, use armas - mesmo que de brinquedo - em sessões de RPG. Esse é um jogo de imaginação, não de ação. Não-jogadores poderiam interpretar a situação como um ato de violência, e o grupo todo estaria em maus lençóis.
8) Voce não é seu personagem - Portanto, não considere ações contra seu personagem como ações contra você. Se seu personagem foi traído pelo grupo, ele quem foi traído, não você!
Se o seu personagem morreu, faça outro, nada de partir para cima do Mestre.
(Atenção: em tempo: pense várias vezes antes de atribuir a morte de seu personagem ao Mestre - o PC pode ter simplesmente feito uma ação idiota ou entrado em combate em desvantagem, coisa bem comum entre jogadores com excesso de confiança natural)
9) Não tenha longas discussões com o Mestre de jogo - Se ele entendeu e não concordou, baixa a bola e continua jogando. Longas discussões só travam o jogo e cria um ambiente chato que atrapalha o clima de camaradagem. Você pode até saber mais de regras do que ele, mas ele é o dono do jogo, não é perfeito e se você não gostou, da próxima vez não jogue com ele.
10) Respeite a diversão alheia - Não saia matando outros jogadores só porque é o que seu cara faria. Não dê motivos para os outros te matarem só porque você fez uma merda que seu personagem faria. Se for o caso, aprenda a jogar melhor ou troque seu personagem por outro mais fácil.
11) Não faça piadas e comentários fora de contexto em excesso - Tudo o que é demais enche. Não se empolgue simulando sempre o que poderia acontecer de engraçado, ou repetindo sempre como sua espada é sua única companheira. O jogo deve correr, e você deve contribuir para tal.
12) Faça seu personagem pensando como ele como pessoa seria, criando o maior número de detalhes possível, e depois faç a ficha dele, atribuindo habilidades de acordo com seu rascunho. Dessa forma seu personagem será mais rico e você terá mais diversão pois não pensará apenas em ter um cara melhor, mas sim em ter o <nome_do_personagem> melhor.
                             Dicas de Mestre


1) Conheça muito bem as regras do jogo - Apesar do Mestre poder dizer sempre "é assim e ponto final", deturpações excessivas das regras podem causar desânimo nos jogadores e falhas críticas no sistema do jogo.
2) Nunca diga ao jogador "você não pode fazer isso" - Diga sim as conseqüências prováveis, tipo "você quer mesmo pular o abismo, um salto de 8 metros? Todos vão achar que é suicídio, mas se quiser vai lá".
3) Não trave o jogo em jogatina de dados, exceto se todos estiverem envolvidos e se divertindo. Uma batalha deve ser narrada, enquanto os dados são jogados o mais rápido possível!
4) Todos os encontros devem ser interpretados - Os jogadores devem barganhar, mentir, implorar, ameaçar, enfim, interpretar sempre. Nada de jogar dado e dizer "você (não) conseguiu". Interpretações podres são falhas automáticas. Tome cuidado, entretanto, para não colocar jogadores tímidos em situações traumatizantes, como já vi acontecer.
5) Recompense coisas boas, iniba coisas podres.
Entenda-se coisas boas:
· boa interpretação do personagem;
· grandes idéias e soluções para problemas;
· contribuições para divertimento de todos (comentários feitos pelo personagem, idéias divertidas e tudo mais);
· atos de heroísmo (salvar alguém, basicamente).
Não dê prêmios para quem:
· monopoliza o jogo só para ele;
· deu sorte nos dados.
Iniba jogadas típicas de jogadores que:
· repetem erros dos quais já foi alertado;
· só resolvem problemas jogando dados;
· reprimem o jogo de outros jogadores.
6) Faça a área de atuação do grupo ser a mais ampla possível, ou seja, faça com que todos os jogadores possam usar todas as suas habilidades. História, astronomia, costura, tudo deve ser um dia necessário, não apenas espada e arma de fogo. Senão você privilegia um tipo de personagem e renega outro. Isto inclui por batalhas para o lutador ficar feliz e dar descanso para o mago, por exemplo.


PROJETO RPG NA SALA DE AULA

Caminhos para o uso do RPG na Educação
Rafael Baracy

Um dos maiores desafios pedagógicos, principalmente nos grandes centros, vem sendo resgatar o interesse e o estímulo dos alunos. O mundo mudou, e mudou rápido. A tecnologia da comunicação deu um salto gigantesco nos últimos dez anos. Assim, as fontes básicas de informação das crianças e dos adolescentes, a família e a escola, se vêem perdidas na nova sociedade que se vê surgindo nos anos 90 e 2000.
Assim como a Revolução Industrial representou uma série de profundas mudanças em todos os setores da sociedade do século XIX, a computação tem tudo para ser o novo grande marco da história humana. E, como tal, vem provocando profundas alterações, nem todas ainda perceptíveis. As grandes instituições, exatamente por serem grandes, não conseguem se adaptar à nova realidade com a velocidade necessária.
Um fenômeno bem nítido nestes novos tempos é a interatividade. A informação passada em mão única e a detenção onipotente do saber pelo professor são artifícios que não mais seduzem os jovens. Estes, com computador, internet, TV a cabo e revistas especializadas, estão acostumados a um mundo mais dinâmico, onde a troca de informações se processa em grande velocidade e, principalmente, com mais participação, mais interação.
Bem, mas o que o RPG (Role Playing Game) tem a ver com isso? O RPG pode trazer para a escola a interatividade, a participação no ensino e o interesse na escola bem como um interesse maior pela leitura, incentivando assim o hábito de ler e diminuindo os índices de analfabetismo significativa e quase que automaticamente, visto que, não se joga RPG sem ler e o rpg estimula a leitura em razão de ter atrelado a si, livros e textos para ajudar na compreensão das situações propostas e também em vias de regra. Da mesma forma que, no jogo, o jogador vai interferindo e mudando a história que vai sendo contada, na escola ele pode aprender ao mesmo tempo em que vai utilizando o que está sendo aprendido.
O RPG estimula um raciocínio globalizante, muito importante para os dias de hoje. Ele não se contenta apenas com o que é, procurando sempre ter em mente o que pode ser. Ele deixa para trás o raciocínio linear da maioria dos jogos para assimilar um raciocínio totalitarista, que tenta agrupar ao mesmo tempo o cenário onde se encontra; os acontecimentos passados; as pessoas a sua volta, suas ações e intenções; os possíveis desdobramentos de cada um desses elementos; e as conseqüências das suas ações e das de seus companheiros.
Além disso, o RPG é um jogo que estimula a ação em conjunto, a colaboração entre os jogadores, ao invés da competição. Tanto é que o único jogo autorizado pela NASA para fazer parte da sonda tripulada a Marte é o RPG. Até o clássico e respeitável xadrez foi rejeitado, pois já provocou problemas em outras missões tripuladas, como forte antagonismo e comportamento obsessivo. Estamos num mundo cada vez mais opressivo, onde tudo é mais fácil mas as exigências são maiores. Há uma contradição social, pois o meio estimula o individualismo enquanto a melhor maneira de viver nele é a cooperação.
O RPG funciona, então, como ferramenta para preparar o jovem a interagir na sociedade, tanto profissional quanto socialmente. Algumas empresas já utilizam o RPG para treinamento de pessoal, uma vez que a premissa básica do jogo é a simulação da realidade. Além disso, através do jogo, é possível resgatar valores morais e éticos que andam um pouco esquecidos.
Estimulo do raciocínio, cooperação e interação, além do auxílio a um desenvolvimento mental e social sadios, são o que o RPG pode fornecer à educação. Mas como fazê-lo na prática?



O RPG tem características que o tornam uma excelente ferramenta educacional:
· Socialização: A própria atividade de RPG desenvolve a socialização. Os jogadores conversam entre si e com o mestre, trocando idéias e expondo as ações de seus personagens. Juntos, eles criam uma história. Eles também aprendem que seus atos trazem conseqüências, pois a história muda de acordo com as ações dos personagens.
· Cooperação: Para serem bem sucedidos diante dos desafios propostos pelo Mestre na história, os jogadores tem de cooperar entre si. As habilidades de seus personagens são complementares. O desenvolvimento do espírito de equipe é importantíssimo num mundo cercado de tantas atividades competitivas.
· Criatividade: Os jogadores desenvolvem sua criatividade ao se imaginar na história e ao decidirem como os seus personagens reagem e resolvem os desafios das histórias. Eles também podem criar seus personagens, históricos e personalidades.
· Interatividade: Os jogadores estão constantemente interagindo entre si e com o mestre. Atividades interativas comprovadamente levam a uma maior fixação de conteúdo do que atividades expositivas. Os jogadores aprenderão muito sobre o cenário de jogo aonde se passa a história e sobre o que os seus personagens precisam saber para vencer os desafios da história.
Interdisciplinaridade: Uma única história pode abordar temas de várias disciplinas harmoniosamente. No exemplo proposto acima, a história pode abordar elementos de História (a época em que se passa a história), Geografia (o local da história, atividades humanas) e Biologia (conhecimentos de botânica da curandeira, Ecologia para o caçador). Outros elementos podem ser adicionados. Por exemplo. Uma outra história pode abordar um disparo de canhão contra um navio inimigo. A trajetória do tiro contra a velocidade de deslocamento do navio aborda elementos de Física e Matemática, além de História.

Projeto RPG na sala de aula


O que é

       -    Método alternativo de introduzir a matéria na sala de aula.
       -    Nova maneira de buscar o interesse do aluno para a leitura e a interação social.

Público Alvo
      
       -    Professores, pedagogos, universitários e educadores em geral.

Objetivos

- Capacitar o participante a utilizar o RPG em sala de aula, desde a seleção do conteúdo        didático até a avaliação final dos resultados, passando pela criação do “universo” em que se desenvolverá a aventura, pela criação da história e aplicação em sala de aula. 

- Praticar técnicas de criatividade adequadas à elaboração de histórias compatíveis        com o objetivo pedagógico.                     
- Praticar o RPG como mestre, personagem não jogador e personagem jogador.
- Dinamizar o método de ensino atual como alternativa para alunos com dificuldade em determinados pontos da matéria.
      -    Incorporar o aluno na matéria dada sem perder o interesse pelo próximo ponto a ser      visto.
- Evitar o atrelamento do ensino de matérias como a História, Literatura e outras, que englobem leitura obrigatória às ditas “Matérias Chatas”, vistas a s dificuldades de dinamismo apresentadas na atual conjuntura metodológica do ensino de base.
- Motivar os alunos com dificuldade de interação e disciplinar os alunos com histórico de  comportamento dispersivo em sala de aula.


Programa



Vivência de aventura pedagógica  

Os personagens  
Mestre  
Personagens jogadores (PCs)  
Personagens não jogadores (NPCs)
Sistemas de RPG mais adequados à aplicação pedagógica  
Características básicas  
Como escolher um sistema em função do seu objetivo pedagógico
Elaboração e aplicação de aventura pedagógica  
Preparação da aventura  
Selecionando o conteúdo didático  
Determinando a aplicação prática do conteúdo didático  
Criando o “universo” e a história da aventura  
Técnicas de criatividade
Apresentação da aventura para a classe  
Como mestrar uma aventura em sala de aula  
Elementos facilitadores e solução de problemas durante a aventura
Colocando em prática os conhecimentos adquiridos  
Elaboração de aventura pedagógica pelos participantes  
Vivência das aventuras criadas
Análise de resultados e esclarecimentos

Metodologia

O programa utiliza o RPG para treinar o RPG. É vivencial, lúdico, informal.  
O participante vivenciará duas aventuras (uma criada pelo instrutor e outra por seus colegas) e participará da elaboração de duas aventuras (uma em conjunto com o instrutor e outra com sua equipe de trabalho). O participante dirigirá uma aventura, como mestre e em conjunto com sua equipe de trabalho. 
Os participantes terão à disposição exemplares para consulta de todos os sistemas de RPG citados durante o programa.
Duração

- De 5 a 7 semanas todo o circuito, com encontros todas as semanas (1 vez pelo menos).

MÓDULO: Conhecendo o RPG





O RPG


1. Encontro Um: Introdução
1.1 O que é o RPG
1.2 Instrumentos de jogo
1.3 Linguagem tratada

2. Encontro Dois: RPG
2.1 quem é quem?
2.2 As funções do mestre
2.3 As funções dos jogadores
2.4 Quem ganha?

3. Encontro Três: ONDE USAR O RPG?
3.1 Com as crianças
3.2 Com os adolescentes
3.3 Na escola
3.4 Na Empresa

4. Encontro Quatro: Conclusão


5. Encontro Cinco: Avaliação prática do que foi desenvolvido


MÓDULO: Aplicando o RPG





O RPG e a escola


6. Encontro Um: Introdução
6.1 Instrumentos de jogo em sala de aula
6.2 Linguagem tratada conforme a matéria

7. Encontro Dois: RPG na aula
7.1 Quem é quem na sala de aula?
7.2 As funções do professor
7.3 As funções dos alunos
7.4 Como se ganha nota?

8. Encontro Três: Em que momento o rpg deve entrar na sala?
8.1 Como alternativa para textos longos
8.2 Como método de recuperação de notas
8.3 Para integrar a turma
8.4 Para acalmar os ânimos

9. Encontro Quatro: Conclusão
10. Encontro Cinco: Avaliação prática do que foi desenvolvido


RPG como atividade extraclasse:

É formada uma equipe de RPG pedagógico independente das escolas. Essa equipe é formada por um grupo responsável em elaborar as sessões de jogo, escrever as aventuras, e responsável em formar o grupo de mestres que aplicam os jogos nas escolas.
Essas sessões são elaboradas com a orientação dos professores, que especificam que elementos devem ser abordados nas sessões de jogo. Trata-se de uma aventura diferente para cada matéria e para cada série. Obviamente, o professor deve estar de acordo com a utilização do RPG como complemento curricular.
As sessões não são feitas durante o período de aula, mas num horário alternativo, como uma atividade recreativa, extraclasse. Também deve ser evitada a obrigatoriedade da participação dos alunos. Ela deve ser estimulada pelo professor, até mesma incentivada, mas nunca obrigada.
Professor como Mestre de Jogo:

Caso haja interesse por parte dos professores, eles mesmos podem mestrar as aventuras para seus alunos. Assim, é dado um pequeno curso para prepará-los para essa missão. Neste caso, caberia ao professor decidir qual a melhor ocasião para realizar a sua sessão: se dentro do horário de aula ou não. De qualquer forma, recomendo a forma extra classe, a não ser que seja um grupo pequeno de alunos bastante interessados. Os próprios alunos podem auxiliá-lo na tarefa de mestrar.

Equipe especializada:

É feita a palestra e a apresentação do projeto em uma escola. O professor de História por exemplo se interessa e quer utilizá-lo como complemento da sua aula. Ele conta à equipe que no primeiro bimestre (ou mesmo um semestre) ele vai falar sobre o segundo reinado e gostaria que fosse feita uma aventura que envolvesse a Guerra do Paraguai, os interesses ingleses e argentinos, a participação dos negros e a situação política do Brasil na época. O ideal é que essa apresentação seja feita no final ano letivo ou antes de seu início, para que a equipe possa elaborar as aventuras durante o período de férias.
Após ouvir o professor, a equipe parte para pesquisar tudo sobre a época, elaborando um pequeno dossiê sobre o assunto. O passo seguinte é a criação da aventura, com certeza a parte mais difícil (depois de convencer os professores). Tudo deve ser levado em conta: a forma como as informações desejadas são passadas, a qualidade da narrativa, o enredo, se as crianças vão gostar e etc... O resultado final é apresentado ao professor por meio de um resumo do que se aprendeu e então a fixação de pontos que não foram captados(ou mesmo durante o processo).
Com a aventura pronta, o próximo passo é a formação da equipe de jogo.
Não se trata de números obrigatórios, mas de um mínimo e máximo ideais para o melhor desempenho de mestre e jogadores. No caso, o número pode ser de até 10 alunos por grupo.
Esses grupos podem ser totalmente independentes, podem estar agindo na mesma história mas em situações diferentes, ou todos ao mesmo tempo, havendo um mestre coordenando os diferentes grupos ou o um grupo e seus agentes auxiliares. Isso pode depender da matéria, da história ou dos próprios alunos. A duração da aventura também dependerá desses elementos, como também da vontade do professor. Pode ser uma única sessão, uma aventura que se estenda por um, dois, quatro meses, ou até mesmo por todo o ano letivo.
O trabalho é dividido, basicamente, em duas etapas: elaboração e aplicação.
Elaboração: tempo necessário para se pesquisar o assunto desejado e desenvolver o roteiro da aventura.
Período intermediário: familiarização do professor(mestre de jogo) com a aventura.
Aplicação: realização da aventura através de sessões de jogo
Livro interativo:

O livro interativo é uma introdução ao RPG, onde o leitor "joga" sozinho. O livro conta uma história onde, a cada momento, o leitor decide o destino do personagem principal. Isso permite ao leitor realmente se colocar na pele do personagem.
Esses livros são de grande aceitação entre os pré-adolescentes, através de histórias de ficção científica, terror ou fantasia. Mas essas histórias também poderiam ter um forte conteúdo pedagógico. Através de uma aventura, o aluno poderia passar por diversas situações (históricas, científicas ou mesmo éticas) que facilitariam o seu aprendizado através da vivência do personagem.
O livro interativo, apesar de não ser tão abrangente e profundo quanto o RPG, permite um maior alcance e exige menos recursos e esforço. Através de uma apostila, ou mesmo de um livro, poderia chegar facilmente a milhares de alunos. Já o RPG exige um processo mais artesanal e maior dedicação por parte do professor ou da equipe.
RPG Eletrônico:

O RPG eletrônico é uma aventura de conduzida via e-mail. Os alunos, agrupados nos terminais de computador da escola, recebem uma mensagem inicial. Eles escolhem seus personagens (um personagem para cada terminal), lêem a introdução da história e se deparam com o primeiro problema apresentado pelo Mestre do Jogo. Eles enviam a resposta descrevendo suas ações e assim se segue até o final da história.
A vantagem deste método é que um único mestre pode atingir um número maior de alunos. No caso de uma rede de escolas, pode englobar todos os alunos de uma determinada série ao mesmo tempo. A principal diferença é que se trata de uma troca de mensagens por aula, o que faz uma aventura curta durar pelo menos uma vez.




O RPG em sua simplicidade
O roleplay, ou o ato de interpretação acredite ou não, é uma parte importante em nosso dia-a-dia. Crianças pequenas fazem isso quando brincam de policia e ladrão ou de índios e cowboys. Atores fazem isso quando estão atuando. A maioria dos adultos faz isso de uma maneira ou outra durante o seu dia de trabalho (a maioria das pessoas se comporta diferente no trabalho ou quando estão ao telefone do que elas realmente são - isto é uma forma de interpretação). Psicólogos também usam a interpretação como uma ajuda a em sua profissão.
Deixando todas as definições de lado, os roleplaying games podem ser mais bem descritos como "jogos de interpretação com regras". Alguns talvez possam ter mais regras que outros. Alguns podem ser mais "interpretativos" do que outros. Mas a grande maioria tem em seu comum o contexto: "interpretação com regras".

                          Como os RPGs funcionam
Quando as crianças pequenas jogam polícia e ladrão, um aponta o dedo para o outro e diz "Bang! Te acertei !". A este ponto a resposta mais comum é "Não, não! Você errou !". Por ser uma interpretação, não há regras para se determinar se a bala acertou ou não o alvo. No entanto, nos RPGs existem regras para garantir que tais argumentos não existam (apesar de às vezes surgirem do mesmo jeito).
Na maioria dos casos, existem números que representam as chances para esta "bala imaginária" atingir seu alvo. Dados são rolados (existem exceções - alguns jogos não utilizam dados) em relação a um número para determinar o resultado final, se a bala acertou ou não. Uma vez que esta determinação é feita, o outro jogador pode dizer, dependendo do resultado, "Você errou !! HAHAHA !!" ou "ARGH! Você me acertou"
E é lógico, ninguém é baleado de verdade. Os roleplaying games se tornam realidade inteiramente na imaginação das pessoas que estão jogando. Os jogadores, por exemplo, se imaginam na pele de um explorador espacial. Eles se imaginam como é explorar a floresta alienígena de um outro planeta. Eles imaginam todos os elementos que fazem parte do jogo, mesmo que eles mesmos inventem ou que se tenha dito a eles o que já existe ao seu redor.








O Mestre do Jogo
Diferente das regras de esportes ou jogos de tabuleiros, as regras de RPGs podem variar muito. Diferentes interpretações destas regras são utilizadas pela grande maioria dos jogadores de RPG (geralmente pendendo a favor dos jogadores).Para manter o jogo mais organizado, para que ele não se torne uma livre interpretação que pode ser prejudicial ao jogo, a maioria dos jogos necessitam de um juiz. Esta pessoa pode ter diferentes nomes - no Dungeons and Dragons, jogo da TSR , o termo utilizado é "Dungeon Master", ou "DM"; em Call of Cthulhu, da Chaosium , a palavra utilizada é "Keeper" (Guardião) - mas um termo genérico é "Game Master" (Mestre do Jogo) ou "GM". Outro termo utilizado, talvez pelo peso de se usar  a palavra "mestre" é "Dice Monitor" (Monitor dos Dados) (o que volta ao "DM"). Mas é preferível utilizar o termo Mestre do Jogo, ou só Mestre, por ser mais genérico e de que o termo separa esta pessoa dos outros jogadores, que apenas irão interpretar em cima do o Mestre lhes disser.
É o trabalho do Mestre saber as regras de um RPG em particular, ou o que será utilizado durante o jogo, para que ele/ela possa resolver qualquer dúvida que apareça. Desta maneira, quando um jogador rola os dados para determinar se a bala acertou seu alvo, o Mestre está lá para garantir que nenhum argumento irá alterar o resultado, e para que os jogadores não criem atrito entre si por causa do resultado.
O trabalho do Mestre demanda uma pessoa matura, consciente do jogo e experiente. Conseqüentemente, isto significa que ser o Mestre vai além de apenas ser o mais velho, ou o que conhece mais as regras. É por isso que não é incomum encontrar alguém de 15, 16 anos mestrando para jogadores de 11 a 17 anos de idade, ou até mais velhas. Geralmente os grupos de rpg se concentram por idade, formando grupos de 11 a 17, e de 18 para mais. Mas isso tende muito a variar.
Interpretação Coletiva
Em qualquer RPG, é trabalho do Mestre criar um ambiente em que todos irão participar. A decisão sobre que tipo de ambiente (ou gênero) a aventura irá se desenrolar geralmente é feita com a opinião de todos os jogadores.
Mas todo o resto do trabalho geralmente cabe ao Mestre decidir - as pessoas, lugares e eventos com quais os jogadores deverão interagir. Por exemplo, em uma aventura o Mestre decide que Black Bart e sua gangue pretendem assaltar um trem e roubar todo o carregamento de ouro. Isso é o esqueleto da história criada pelo Mestre. Agora, se Black Bart irá conseguir ou não irá depender inteiramente de como os jogadores irão jogar. Se eles jogarem mal, a história tem um final triste -- Black Bart rouba o trem e foge com o ouro. Se os jogadores jogarem bem, a história terá um final feliz - Black Bart é capturado e preso.
Mas é a cooperação entre todos os jogadores e o mestre que irá decidir o enredo da história e seu fim.
O que o jogador faz
Parece que há bastante trabalho envolvido quando se fala no Mestre. Mas é justamente por causa disso, por ele ser o Mestre ! Ele deve colocar as regras, facilitar o andamento do jogo, mediar os argumentos e discussões, criar ganchos para aventura e um enredo que irá ser interessante e criar todo o ambiente do jogo. É por isso que a pessoa que assume este papel precisa ser madura, sensata e experiente. Se o Mestre não estiver gostando de assumir o papel de Mestre, isso irá ficar claro e desagradará a todos os jogadores.
Mas não pense que os jogadores não fazem nada enquanto o Mestre faz todo o trabalho pesado. Longe disso. Os jogadores precisam ter um conhecimento do sistema de jogo, suas regras e as variações que serão utilizadas pelo Mestre. É também dever dos jogadores se comportar de uma maneira madura e responsável, e não como uma criança que insiste em dizer "Não! Você errou! Eu ganhei!" (No RPG, isto é equivalente ao Mestre tomar uma decisão que é contrária aos desejos do jogador. E enquanto o Mestre está criando as pessoas, lugares e eventos da ambientação proposta, os jogadores precisam criar o personagem fictício com quem eles irão jogar.
Na maioria das vezes, cada RPg tem diferentes regras para a criação destes personagens (também chamados "Player Characters (PCs)"). Em alguns jogos precisa-se rolar dados para determinar a personalidade e habilidades deste personagem, enquanto que em outros o jogador precisa gastar um número pré-determinado de "pontos" para "comprar" habilidades e características que farão este personagem melhor do que o normal. Alguns jogos combinam as duas técnicas e outros requerem que o personagem seja baseado em outros pré-criados, com mínimas modificações para torná-lo diferente dos outros personagens baseados neste mesmo exemplo.
Entretanto, uma coisa que a maioria destes métodos tem em comum é que cabe aos jogadores definir a personalidade do personagem. Ele será um paladino da paz ou um guerreiro brutal como Coam? O personagem é educado ou rude? Limpo ou sujo? Ele fala normalmente ou tem algum sotaque? Raros são os jogos que forçam o jogador a assumir um personagem cuja personalidade não foi escolhida por ele (por isso, se o jogador joga com um personagem cheio de armas, que adora chutar gatos na rua e atirar pedras em carros é porque o jogador escolheu isso, e não porque as regras do jogo impuseram isso a ele).
Mas para inventar estas características de personalidade requer que o jogador pense numa razão em porque seu personagem tem tais características. Se o jogador decide que seu jogador, Saffron, o Mago, tem medo de barcos, ele precisa, por exemplo, decidir que Saffron caiu de um barco quando era criança e tem medo de barcos desde então. Este incidente em particular geralmente nunca irá ser explorado mais profundamente no jogo, mas o jogador pode utilizar esta particularidade em um jogo para determinar que as ações de Saffron nunca envolverão um passeio de barco, por exemplo.Esta história e muitas outras que podem ser inventadas para justificar as características do personagem são usualmente conhecidas como "background".







Colocando tudo isso junto
Com o Mestre tendo criado o gancho para uma aventura, as situações envolvidas e o cenário em que tudo se desenvolverá, e os jogadores terem decidido com que personagens atuarão, tudo está pronto para o jogo. Com o jogo iniciado, o Mestre atua como um diretor, direcionando as ações que rolarão sobre a aventura criada por ele, e cada jogador atua como diretor de seu próprio personagem, determinando pela personalidade e história agregadas a seu personagem como ele deverá reagir quando confrontado com as situações criadas pelo Mestre. A junção dos jogadores atuando como diretores de seus personagens, e o Mestre atuando como mediador contador de histórias, ator e diretor, é que forma todo o Role Play.
Uma vez que o jogo inicia, todo o jogo atual se forma na imaginação dos jogadores e do Mestre (Ninguém realmente age físico ou psicologicamente durante o jogo, a não ser em exceções que podem ocorrer durante momentos empolgantes do jogo. O Mestre narra a aventura e assume os personagens que aparecem na história mas não são criados pelos jogadores (chamados "NON-Player Characters" ou "NPCs"). O jogador então reage com o que o Mestre descreveu.



Um jogo de exemplo
Este exemplo é de um grupo jogando nos tempos modernos, em um jogo de super-heróis. O Mestre decidiu que, como nos gibis, os personagens quase nunca morrem, mas tendem a se machucar bastante. Nossos jogadores são Brian, Adam, Gwen, Miranda and Joseph. Marcus é o Mestre. Adam é Capitão Coragem, um super-herói que acredita na verdade, justiça e no jeito americano de ser. Brian é Lockjaw, um herói super forte, musculoso, uma máquina de lutar, sem ligar muito para pessoas ou propriedades. Miranda está jogando com Raging Red, uma super-heroína voadora, com poderes de fogo. Joseph está jogando com Darkling, um ninja todo poderoso. E Gwen está jogando com Angel, um anjo encarregado em derrotar as forças do mal.
GM: Ok, todo mundo. O supervilão conhecido como Rhino roubou uma loja de jóias em um shopping. A polícia o cercou, mas ele está com reféns. O major chamou por vocês, que chegaram rapidamente ao shopping. Rhino está do lado de fora da praça de alimentação. A maioria das mesas estão viradas, e algumas cadeiras estão flutuando na fonte que fica no meio da praça. Todos parecem ter saído do shopping, exceto por uma jovem mulher que Rhino está segurando. Ela parece estar morta.
Adam [que se alto nomeou líder do grupo]: O quão perto ele está da fonte?
GM: Mais ou menos uns 5 metros.
Miranda: 5 metros da fonte. Jura. Eu não chegarei a mais de 4 metros dela! [Miranda decidiu quando criou seu personagem que Raging Red tinha medo de água.]
Joseph: Darkling irá usar sua habilidade de Ocultamento Ninja.
GM: Ok, qual é o nível da habilidade?
Joseph: 18
GM [rola alguns dados]: Ok, você sorrateiramente se distanciou do grupo...
Joseph: Rhino me vê?
GM: Não parece ver. [Na verdade, a rolagem de dados indicou que Rhino viu Darkling, mas Darkling não pode saber disso. Assim Marcus está sendo propositalmente vago.]
Gwen: A mulher está ferida?
GM: Não, ela parece ter desmaiado de medo.
Gwen para Adam, atuando como seu personagem: [IC - In Character]: "Ela pode estar em choque, C.C! Nós temos que tirá-la de lá!” ·Brian: Lockjaw está pegando uma mesa e se preparando para atirá-la em Rhino. [IC] "Largue a garota seu idiota com armadura!” ·Gwen [IC]: "Não!” ·Adam [IC]: "Lockjaw! Seu tolo! Para trás!” ·GM: Rhino segura a garota na frente dele. No momento em que ele anda na direção de voc6es, ele diz: "Fora do caminho de Rhino ou Rhino machuca garota”.
Joseph: Ele andou em minha direção ?
GM: Sim.
Joseph: Eu vou pular e chutá-lo nas costas.
Adam [IC]: Espere!
GM: Adam, Capitão Coragem não sabe que Darkling irá fazer isso, por isso você não pode impedi-lo. Joseph, qual o nível de ocultamento de Darkling?
Joseph: 14, mas eu tenho um bônus porque ele não está me vendo.
GM [rola o dado -- Marcus sabe que o bônus não existe porque Rhino está apenas fingindo que não viu Darkling. A rolagem falha.] Ok, você correu para trás dele. Faça um teste de chute.
Joseph [rola o dado]: Eu consegui! Bem no meio das costas!
GM: De alguma maneira, Rhino sabia que você estava lá, talvez ele tenha te escutado. Ele larga a garota bem no momento em que você está pulando para chutá-lo, se vira e agarra seu pé com a mão "singela" dele, que é duas vezes o tamanho de sua cabeça. Você não pode evitar, pois já está dominado.
Adam [IC]: "Rápido! Enquanto ele está distraído!” ·Gwen: Eu vou me teleportar até lá e pegar a garota.
GM: Sem problema. O que o resto do grupo está fazendo?
Miranda: Eu estou preparando uma bola de fogo, mas não vou atirá-la até Angel e a garota saírem de lá.
Adam: Quando Angel sair com a garota de lá, vou tentar derrubar Rhino.
Brian: Estou atirando a mesa.
Gwen: Não! Você me acertar ou à garota!
Joseph: Ou me acertar!
GM: Eis o que aconteceu ao mesmo tempo: Angel se teleporta e pega a garota, enquanto Red voa sobre eles, com uma bola de fogo preparada e Capitão Coragem voa em direção a Rhino. Quando vocês dois olham, Lockjaw atira a mesa com toda a sua força! Rápido, Angel! O que você vai fazer?
Gwen: Eu vou desviar da mesa.
GM: Para fazer isso, você precisa soltar a garota.
Gwen: Então vou usar minhas asas como escudo e torcer para que elas sejam fortes o bastante para bloquear a pancada!
GM: Brian faça um teste de ataque para Lockjaw.
Brian [rola o dado]: Olhe para isso! Na mosca!
GM: Talvez seja uma intervenção divina, mas a mesa voa sobre a cabeça de Angel e atinge Rhino nas costas. Rhino fica atordoado com a força da pancada, e acaba jogando Darkling na fonte. A água espirra pra todo lado.everywhere.
Joseph: Ai!
Miranda: Ainda bem que eu não tive que descer!
Gwen: Estou teleportando a garota para onde estão os médicos.
Adam: Vou atacar Rhino enquanto ele está atordoado.
Miranda: Espere! Não vou poder atirar a bola de fogo se você tiver lá!
Brian: Estou pegando outra mesa.
A idéia da aventura (um supervilão cercado pela polícia em um shopping) é desenvolvida através das ações dos jogadores e do Mestre (GM), que fazem suas próprias escolhas e reagem com as ações feitas pelos outros. Essa é a essência do RPG.
É bom ressaltar, entretanto que enquanto os jogadores dizem coisas como "Eu vou fazer tal coisa..." ou "Vou usar minha tal habilidade...", não significa que eles estejam REALMENTE realizando essas ações. Todos os jogadores sabem que é um jogo de imaginação, e somente isso.







RPG x Maturidade
Como você deve ter percebido no jogo de exemplo, é necessário bastante imaginação para se jogar. E também é necessária uma boa dose de maturidade. O sujeito maduro aceita as coisas ruins no jogo assim como aproveita das coisas boas.Mas um sujeito imaturo não consegue distinguir entre o jogo e a realidade. O jogador imaturo pode ser comparado a aquela criancinha que quer voar igual ao Super-Homem ou que acredita que atingindo a cabeça de alguém com uma marreta (igual aos desenhos) não irá provocar grandes danos. Este mesmo jogador freqüentemente não entende a diferença entre um personagem fictício fazendo algo que não gosta e uma pessoa real fazendo algo que não gosta. Ele irá sempre ficar zangado com outro jogador ou até mesmo com o mestre pelo o que ele considera estarem atuando "contra ele", esquecendo que é apenas um jogo. (Este é o tipo de pessoa que irá ficar louca quando perder em qualquer jogo)
Maturidade é uma qualidade que não é fácil de se distinguir. Alguns jovens de 17 anos podem até ser muito mais maduros do que homens de 40 anos. Uma boa regra é observar o quão nervoso ou alterado um jogador fica durante um jogo. O jogador maduro irá provavelmente ficar empolgado durante momentos excitantes do jogo, mas estará sempre consciente que o RPG é apenas um jogo e não ficará terrivelmente revoltado se alguma coisa acontecer a seu personagem. Se por outro lado ele começar a xingar, amaldiçoar, brigar ou até mesmo chorar se alguma coisa má acontecer com seu personagem, talvez ele ainda não esteja pronto para jogar RPG.
Observe bem isso entre seus alunos para não prejudicar todo o grupo!
RPG x Fuga
Existem três tipos de pessoas que provavelmente não deveriam jogar RPG. Um deles vêm de um lar tumultuado, cujos parentes possuem sérios problemas mentais e emocionais. Outro é usuário de drogas e o outro é alcoólatra. Mas não foi o RPG que os deixou assim. Todos os exemplos citados são de pessoas que querem escapar de problemas ou de situações desconfortáveis utilizando uma fonte externa para conseguir dar uma razão à sua existência. Alguma mínima fuga pode até ser legal, mas todas as formas de escapismo são perigosas quando levadas ao extremo por pessoas conturbadas procurando escapar de sua realidade. E o RPG não é uma exceção.
RPG x Tempo & Dinheiro
Algumas pessoas reclamam da quantidade de tempo e dinheiro gastos neste "vicioso" RPG. Mas porque não reclamam isso com aqueles que colecionam trens em miniatura? Como isto, o RPG também é um hobby. Qual é a graça de ver um ou dois trenzinhos indo de lá para cá, com paisagens e toda aquela parafernália de acessórios? E assim como o entusiasmado em colecionar trenzinhos irá nos xingar por ter dito isso do hobby dele, porque nós também não podemos saber o que é melhor para manter nosso hobby? Mais uma vez, volta à questão da maturidade. O jogador maduro gasta o tempo e o dinheiro que ele acha necessário em seu hobby, enquanto que o jogador imaturo gasta muito mais do que ele pode, arranjando problemas para ele mesmo.

RPG x Personalidade
Eu não conheço nenhum outro jogo que force o jogador a dar a seu personagem uma personalidade na qual ele não se sinta confortável. Mas os jogadores freqüentemente escolhem características de personalidade para seus personagens que refletem profundamente seu próprio subconsciente. Se o jogador sempre escolhe jogar como mal, com personagens com sede de sangue, isto pode ser um sinal de que ele procura poder e controle em sua vida real. Mas, ao contrário de qualquer outra idéia ou opinião, não é nem o personagem ou o jogo que faz o jogador se sentir desta maneira - sua personalidade existe bem antes dele começar a jogar, e irá influenciar em sua maneira de atuação no jogo.
RPG x Religião
Esta questão não é tão complicada como parece ser. De fato, é bem simples: Se você segue uma religião/sistema de crença que acha errado em discutir ou considerar coisas como magia, habilidades psíquicas, outras religiões, mitologia, religião, dragões ou demônios, então você achará que a maioria dos RPG são satânicos. Entretanto, existem muitos tipos de RPG que não lida com estes assuntos. Velho Oeste, por exemplo.Existem também rpgs em que os jogadores assumem papéis de heróis bíblicos.
Se você não acredita que tais coisas são erradas, então você achará que os rpgs não têm nenhuma ligação com ocultismo ou "obras do demônio". Algumas pessoas que lidam com estas coisas podem até jogar rpg, mas nem todos os rpgs tem ligação com tais assuntos.
Contrariando a crença popular, os rpgs não "ensinam" ninguém sobre ocultismo. Alguns podem utilizar ou discutir a mitologia ou a religião de outras culturas, mas nenhuma irá ensinar a ninguém a se tornar um padre ou uma divindade nestas religiões ou mitologias. Um rpg ambientado nas 1001 noites, por exemplo, não ensinará a ninguém a ser um ladrão. A maioria dos jogadores se interessa por mitologia (mais comum a Grega, Romana ou Egípcia) antes mesmo de eles começarem a jogar rpg.
RPG x Violência
Existem pessoas que não conhecem ou não entendem o espírito de se jogar rpg, e insistem em dizer que alguns sistemas deste jogo inspiram a violência em seus jogadores, o que é uma grande mentira. A violência, se existir, já é proveniente da própria personalidade do jogador. A maioria dos filmes ou jogos de videogame hoje em dia são mais sanguinários do que a grande maioria dos rpgs. Se enxergarmos mais a diante, os videogames podem ser considerados pior do que os rpgs. Por exemplo, o jogador de videogame não vê nenhuma repercussão na morte do desenho animado no jogo - a única coisa que se precisa fazer é apertar o botão de start e começar tudo de novo. No rpg, entretanto, leva tempo para o personagem se desenvolver, se aprimorar. (como um escritor que desenvolve melhor seu protagonista a cada livro que escreve). Os jogadores não gostam de perder seus personagens, o que leva a um jogador maduro a evitar o combate e procurar por soluções não violentas aos problemas apresentados durante o jogo.


Tipos de RPG
Existem diversos tipos (ou "gêneros") de rpg hoje em dia. Mas a maioria deles pertence a um dos tipos abaixo, ou à combinação de algum deles. O rpg Shadowrun, por exemplo, é uma combinação de Fantasia e Cyberpunk.
Fantasia - Ambientação num mundo imaginário que geralmente é parecido com a Terra, na época medieval, utilizando freqüentemente elementos da mitologia Grega e Romana. Os personagens são geralmente homens de espada, magos e elfos, sempre encarregados de encontrar algum tesouro ou resgatar alguém de alguma criatura do mal.
Horror - Ambientação num mundo imaginário recheado de terríveis criaturas, que parecem ter saído dos filmes de horror. Os personagens são geralmente pessoas comuns tentando impedir que um reinado de horror domine o mundo. Geralmente ambientado num período de tempo entre 1890 e os dias atuais.
Supers - A ambientação gira em torno de tudo aquilo que você encontra em gibis, com super-heróis e seus inúmeros superpoderes. Geralmente utiliza a época atual como cenário. Os personagens são super-heróis que precisam impedir que o mal vença e conquiste o mundo.
Space - Ambientação num futuro muito, muito distante. Os personagens são humanos, aliens ou robôs que geralmente estão "explorando novos mundos" (ala Star Trek). Ou eles são heróis combatendo o império do mal (ala Star Wars).
Cyberpunk - Ambientação num futuro próximo, onde enormes corporações dominam os governos e todo o dinheiro são créditos. Os personagens são humanos geralmente melhorados pela adição de implantes cibernéticos. Alguns personagens vivem para tornar o mundo um pouco melhor, o que lhes põe em confronto com as grandes corporações. Outros apenas lutam para sobreviver.
Velho Oeste - Ambientação no histórico mundo de cowboys e índios. Os personagens geralmente são delegados perseguindo fora-da-lei ou vice-versa.
Militar - Ambientado em uma das muitas guerras de nosso mundo, geralmente nas mais atuais, como a 2a Guerra do Mundo, Coréia ou Vietnã, mas podem ser outras. Os personagens são soldados tentando cumprir suas missões em busca da derrota do inimigo.
Pós-Holocausto - Uma ambientação não muito comum, num mundo destruído por guerras nucleares. Os personagens podem ser humanos, mutantes, cibórgues ou robôs geralmente encarregados de explorar as ruínas de antigas cidades.






Dicionário
Como mecânicos, engenheiros ou técnicos de computador, ouvir aos jogadores de rpg pode ser como escutar uma linguagem totalmente diferente. Para melhor entender o que você estará escutando, abaixo estão a tradução de algumas expressões mais usadas. Nem todos os sistemas utilizam estes termos, e alguns podem adicionar outras várias palavras a esta lista, mas este dicionário irá ajudá-lo pelo menos a entender um pouco do que dizem.

Atributos - São as estatísticas do personagem, representando numericamente as habilidades físicas e mentais de um personagem ou criatura. São geralmente coisas como Força (Strength ou ST), o poder físico do personagem; Destreza (Dexterity ou DX), que dá a velocidade e a agilidade de um personagem; IQ ou Inteligência (o poder mental do personagem); Constituição (Con), Stamina ou Vida (Health ou HT), que determina a resistência do personagem a ferimentos ou doença; e outras características que podem depender do sistema de jogo.
Aventura: É um jogo de RPG mais curto. Quando você e os seus camaradas acharem o assassino do prefeito, acaba o jogo, e o Mestre faz um epílogo, até a próxima aventura. Lembra muito uma história de gibi, que acaba esta semana, mas semana que vem o mesmo personagem já esta em outra.
Aventura-Solo: Um jogo de RPG que se disputa sozinho, com ou sem a participação de um mestre, normalmente escolhendo entre duas ou mais opções que levam a uma determinada página ou parágrafo, no qual haverá uma nova cena e uma nova decisão a ser tomada.
Background: É a história do seu personagem. Alguns mestres exigem que o jogador escreve o background do personagem antes de se iniciar uma campanha.
Campanha: Jogo de RPG  bem mais comprido contínuo. É muito comum em jogos estilo medieval, nos quais você vai viver a vida do infeliz do seu personagem, quem sabe até ele envelhecer.
Cena: Um pedaço de uma aventura ou campanha. É como uma cena de novela; tem um corte, e é a cena do outro jogador, que está do outro lado da cidade. E depois você volta de onde parou.
Dado - Usado para introduzir um elemento aleatório em um jogo para que nem todos os sucessos ou falhas sejam assegurados. Podem ser encontrados de diferentes tamanhos, número de lados e cores. São referidos geralmente como a letra "d" antes de um número (d4, d6, d20, etc.).
Dungeon: Muito comum em jogos medievais, é um cenário meio subterrâneo, cheio de salas secretas, monstros perdidos aqui e ali. Lembra muito uma masmorra.
DX: Veja Atributos
Falha (ou Erro) Crítica: Quando uma tentativa de ação, ou uma jogada de dados se tornam péssimos resultados. Ex: Você vai jogar os dados para decidir se você consegue pular de um prédio para o outro. Se você tirar uma falha crítica (o modo como acontece varia de sistema para sistema), danou-se... Você caiu, e foi dando com a cabeça em todos os varais do prédio do lado. Ao cair, você ainda cai numa lata de lixo cheia de peixe podre, e só fica acordado tempo suficiente para ver um inocente vaso de flores despencando na tua testa!
GM (Game Master): Também conhecido como Mestre, Storyteller ou Narrador. É o chefão do jogo, que descreve as cenas, comanda a história, dá uma de juiz e distribui os pontos.
Hack and Slash - Um termo utilizado para denominar os jogadores que preferem "matar ou morrer" em uma aventura de rpg do que realmente interpretar seu personagem, o que acaba prejudicando o desenvolvimento de todo o objetivo do jogo.
HT: Veja Atributos
Iniciativa: Jogada de dado para se determinar quem efetua uma determinada ação primeiro.
IQ: Veja Atributos
Mana: Energia mística da qual os magos dependem para realizarem as magias
Magia: Existente em praticamente qualquer mundo de fantasia, a magia é a capacidade de algumas pessoas, normalmente magos, de realizarem atos sobre-humanos, controlando uma energia chamada mana.
Nível - Geralmente utilizado de dois modos diferentes. O primeiro é para medir a habilidade do personagem em alguns sistemas - um personagem de primeiro nível é muito mais fraco que um de 4o nível. Os personagens ganham níveis através do acúmulo de pontos de experiência. O segundo uso descreve chãos diferentes de um edifício ou calabouço. Conseqüentemente, o primeiro-nível de um calabouço pode ser só o porão de um castelo enquanto o quarto-nível pode ser uns cem pés debaixo do solo.  Freqüentemente, nível mais alto em um calabouço (o qual de fato meios “abaixam” no calabouço) é mais difícil que os mais baixos níveis.
NPC (Non-Player Character): Os personagens que vão aparecer durante o jogo, pra interagir com você. Reza a lenda que alguns mestres tem um assistente para interpretar NPC's, mas a grande maioria dos mestres (como eu), prefere interpretar por si mesmo o personagem.
ON e OFF: Isso é muito importante pra você manter um jogo bem legal, sem criancices (muitas...). On é tudo aquilo que está no jogo, e off, o que está fora. Um exemplo: você e seu amigo estão jogando uma aventura de detetives juntos. Ele é um assassino perigoso, e você é o chefe de polícia que está procurando ele. Em off, você sabe que ele é o assassino, porque o teu amigo te contou, mas em on, você não sabe porra nenhuma, porque o teu personagem não descobriu ainda que o personagem dele é o matador.  Pode parecer simples, mas respeitar esta regra é fundamental para um bom andamento do jogo. Nunca use nada de OFF em ON, tá? Deixa de ser mala!
PC (Player Character): Ou jogador. Esse é você, o surrado e pisoteado personagem do jogo. Aliás, você e todos os outros que estiverem na mesa, né?
Perícias: são as capacidades que aquele personagem tem. Ex: se ele quer escalar uma montanha, ele precisa ter a perícia necessária para fazê-lo.
Planilha: É o papel no qual seu personagem ganha vida, e que você vai carregar durante todo o jogo. Ali, você anota os pontos todos, as características psicológicas do cidadão, quanto ele pesa, o que ele gosta de comer, e uma porrada de outras coisas. É a descrição completa do teu personagem.
Pontos de Experiência: Você não vai aprendendo mais e mais coisas durante a vida? Pois é, com o personagem é a mesma coisa! A planilha do cara tem que crescer, mesmo que aos poucos. Então, você ganha pontos extras ao final de cada sessão, para ir aumentando os atributos do seu personagem. Mas é bem aos poucos mesmo, viu, porque algumas sessões não descrevem necessariamente um dia inteiro! Você pode ter ficado três horas na real para se passar só uma hora no tempo de jogo!
Pontos de Personagem: Os pontos que você vai ganhar para distribuir pela planilha, para criar seu personagem. Acredite, quando você começar a jogar direto, vai começar a achar que estes malditos pontos são sempre muito pouco!
PV's (Pontos de Vida): quando seu personagem sofre um ataque que realmente acerta nele, o dano é descontado dos PV's.
Rolar os Dados: Expressão que a gente usa pra dizer que vai jogar os dados, cacete!
RPG: Role Playing Game, ou “Jogo de Interpretação”.
Screen: É um treco de papelão, parecido com um biombo, que o mestre usa pra poder ficar sentado na mesma mesa que os jogadores, sem eles vejam quais os resultados dos dados ou as maquinações que o mestre rascunhou num pedaço de papel de pão.
Sessão: Como se fosse cada capítulo do jogo. Você lembrou que sua mãe te pediu pra estar em casa as duas, e já são cinco da matina! Aí, você pede pra acabar a sessão, e semana que vem, continua de onde parou.
Sistema de Jogo: É o conjunto de regras do jogo. Temos vários tipos, cada um em sua ambientação e com características próprias. Ex: AD&D, Storyteller (Vampire e Cia.), GURPS, entre outros.
ST: Veja Atributos
Stamina: É a vitalidade do seu personagem, o quanto ele agüenta uma doença ou se ele vai desmaiar ou levantar inteiro depois de um soco. Vai ser muito difícil você ouvir um cara que curte RPG dizer Vitalidade!
XP: Veja Pontos de Experiência
Aqui terminam os dois trabalhos que eu tenho desenvolvido.
Caso tenha mais duvidas mande um email.