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Boletim Mensal * Ano VII * Junho de 2009 * N.º 71 |
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FADO
TAMBÉM É
CULTURA (29)
Alfredo Antunes |
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2. Augusto Hilário |
Falar da outra lenda viva que foi o Hilário, é falar do Fado de Coimbra. Ambos se confundem. São a mesma magia!
Augusto Hilário Costa Alves era natural de Viseu (onde virá a morrer, de cirrose hepática, nas férias da Páscoa de 1896, com 36 anos de idade).
Estudante de Coimbra durante cerca de 20 anos, jamais passou do 3º ano de Medicina.
Foi “o último boémio português”, na palavra de Camilo Castelo Branco.
Voz belíssima de tenor, cantou (primeiro, o “Fado de Lisboa”) por todos os espaços culturais de Portugal, e foi ele que ajudou a elitizar este mesmo fado no seu ambiente acadêmico coimbrão.
Pouco a pouco, os estudantes de Coimbra foram substituindo a velha temática fatalista pelo simples lirismo do amor cortês, da saudade pura ou das lides e boêmia acadêmicas.
Aliás, a temática da agitada e, por vezes, dolorida vida de estudante, fora tradição, na Europa, em quase todas as universidades medievais. Acrescente-se a isto, o fato de que, sendo inicialmente a Universidade de Coimbra a única existente no país, a ela acorriam jovens de todo o Portugal. Cada um levava consigo as cantigas e as modas da sua terra as quais, ali, iam sendo estilizadas para, com elas, ao som de guitarras, curtirem as saudades da distância.
Criou-se, assim, uma espécie de folclore lírico, o qual, paralelo ao puro lirismo amoroso “intra muros”, foi dando corpo a um novo cantar de Coimbra. Cantar este que passa a ganhar entonações típicas do “Bello Canto” italiano, dos finais do Séc. XIX.
Começam as belas serenatas ao luar, pelas margens do Mondego, ou pelas ruas e escadinhas da encosta medieval da cidade. E assim como a “praxe” regulamentava muitos dos hábitos da estudantada coimbrã, também ela regulamentará este novo cantar: uso obrigatório da capa negra, acompanhamento cadenciado de guitarras, gestualização discreta, vozes exclusivamente masculinas etc. etc.
Grandes poetas escreveram expressamente para o Augusto Hilário, nomeadamente os seus companheiros: João de Deus, António Nobre, Guerra Junqueiro, Gomes Leal, Augusto Gil e outros.
A seguir, alguns versos que ficaram famosos na voz do Hilário:
”Nossa Senhora faz meia Com linhas feitas de luz O novelo é a lua cheia As meias são p´ra Jesus”
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Teus olhos, contas escuras São duas Ave-Marias D´um rosário d´amarguras Que eu rezo todos os dias”
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“ A minha capa velhinha Tem a cor da noite escura Nela quero amortalhar-me Quando for pr`a sepultura”
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(A.Nobre)
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(A. Gil)
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(Hilário)
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“Eu quero que o meu caixão Tenha uma forma bizarra A forma de um coração A forma de uma guitarra” |
Os teus olhos negros, negros, São gentios da Guiné: Da Guiné por serem negros Gentios por não ter fé” |
Tenho já seca a garganta E como é que é isto não sei Quem canta seu mal espanta Pus-me a cantar e...chorei” |
(Hilário) |
(Popular) |
(Hilário) |
Ficaram eternas as vozes do Menano, do Bettancourt, do Paradela, do Cavalheiro, do Lucas Junot, do Luis Goes e de tantos, tantos outros, que vêm sustentado um dos mais belos e elevados cantares de Portugal.
Mas, antes de todos, e depois de todos, está o Hilário! Foi ele a ponte, o “eterno boêmio” que, tornando-se símbolo dum “jeito de todos nós”, encontrou, em Coimbra, a “cantiga” certa para expressar este jeito!
Assim como o fado, também este cantar jamais morrerá. Não morrerá, porque eternos são o amor e a saudade! O Hilário morreu, mas deixou-nos de herança a sua alma e a sua “Canção de Coimbra”!
Que descanses em paz, Hilário! E que, juntamente com tuas irmãs, Maria Severa e Amália Rodrigues, não deixes ninguém descansar nem dormir, aí no Céu!
“Calem-se os sons da guitarra
Porque o Hilário morreu
E foi cantar serenatas
Pr´ às virgens brancas do Céu!”.
Falarei, na próxima, de outra lenda eterna: o Alfredo Marceneiro.
Até lá, amigos e compatriotas!