JULHO 2.001
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Orientação Sexual e a Legislação Federal

        Esta é a mais recente emenda ao qual tivemos acesso sobre a inclusão do termo "orientação sexual" como uma das categorias "protegidas" contra qualquer tipo de discriminação. Sugerimos a leitura do texto: "As bases formadoras do Preconceito" e "Relato de Caso: a Parada do Orgulho GLBT" em Temas de Discussão - Preconceito, de forma a complementar esta apresentação.

        "A cultura é o primeiro regulamento que surge como intermediador das relações de um povo. Com o passar dos anos ela muda e quase nada é para sempre, porém no cotidiano a vida de uma pessoa enfrenta várias realidades, pois nada é uniforme e quantas vezes não temos que aturar o desplante de tantos absurdos, para citar apenas um exemplo, quem não sente, não sabe, ou não ouviu falar que as leis no Brasil não são aplicadas igualmente para todos. (...)

        Essa é a nossa cultura que têm através da heterossexualidade obrigatória, fortemente impedido para todas as pesssoas, outras possibilidades de orientações sexuais. (...)

        A Constituição, ao proteger o respeito à religião, resguarda o direito humano da livre condução de sentimentos e credos, ela está interessada em garantir a manifestação de sentimentos que são inerentes a vida humana; seria uma contradição não garantir também os sentimentos presentes na afetividade, no amor e na manifestação da sexualidade de pessoas adultas. Dentro do atual desenvolvimento do direito constitucional barsileiro, não há espaço para a discriminação sofrida em razão do exercício fundamental da liberdade da pessoa humana.

        Os fatos se impõem ao direito e contribuem para dissolver a hipocrisia que impede os efeitos jurídicos à orientação sexual e o Brasil amparado na Constituição, na legislação, jurisprudências e no direito internacional dá seus primeiros passos para a garantia de direitos civis de lésbicas e gays."

Rosana Zaiden

Em: Lésbicas, Gays e a Legislação


PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL

De autoria da Deputada Federal Marta Suplicy (PT-SP)

Altera os artigos 3º e 7º da Constituição Federal

        As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do Artigo 60º da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Art. 1º - É conferida nova redação ao Inciso IV do art. 3º da Constituição:

"Art. 3º - .............................................................

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, orientação sexual, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

Art. 2º - É conferida nova redação ao Inciso XXX do art. 7º da Constituição:

"Art. 7º ......................................................

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, orientação sexual, idade, cor ou estado civil."

        JUSTIFICATIVA

        A idéia não é nova. Quando da elaboração da Constituição de 1988, a subcomissão dos Negros, Populações Indígenas e Pessoas Portadoras de Deficiência do Congresso Constituinte aprovou, justamente em 25 de maio de 1987, ou seja, exatamente há oito anos atrás, o seguinte texto para o que seria o art. 2º:

"Art. 2º - Todos, homens e mulheres, são iguais perante a lei, que punirá como crime inafiançável qualquer discriminação atentatória aos direitos humanos e aos aqui estabelecidos.

        Parágrafo 1º - Ninguém será prejudicado ou privilegiado em razão de nascimento, etnia, raça, cor, sexo, trabalho, religião, orientação sexual, convicções políticas ou filosóficas, ser portador de deficiência de qualquer ordem e qualquer particularidade ou condição social. ... "

        Com o argumento de "enxugar" o texto constitucional, o relator da Comissão de Sistematização, deputado Bernardo Cabral, retirou a expressão orientação sexual daquela redação.

        Na revisão constitucional de 1993, o deputado Fábio Feldmann, apresentou, em 07 de dezembro de 1993, a proposta de emenda constitucional PRE 006951-4. Esta emenda visava modificar o inciso XXX do art. 7º, dando a seguinte redação: "proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, orientação sexual, idade, cor ou estado civil". A matéria não chegou a ser apreciada pelo Congresso naquela ocasião.

        Portanto, não estamos inovando. Apenas reapresentamos para análise destas Casas proposta que visa incluir entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, além de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor e idade, também o faça, sem preconceito por orientação sexual.

        Além disso, pretendemos incluir nos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, a proibição da diferenciação de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por sexo, idade, cor ou estado civil e orientação sexual.

        Mas o que na verdade significa orientação sexual? A expressão orientação sexual designa a atração sexual, quanto ao gênero, de uma pessoa por outra. Não se deve confundir orientação sexual com práticas como masoquismo, voyeurismo, etc. Existem três tipos de orientação sexual: a heterossexual, a homossexual e a bissexual. É importante lembrar que a Organização Mundial da Saúde e o Conselho Federal de Medicina não consideram a homossexualidade doença. É consenso para os estudiosos da sexualidade que a orientação sexual não é "opção", mas questão complexa, com fortes possibilidades da existência de predisposição genética, que seria concretizada ou não, a partir das relações familiares. As pessoas não escolhem, portanto, sua orientação sexual. O heterossexual não tem direitos de cidadania por ser heterossexual e o homossexual não deveria ser discriminado por ter uma orientação sexual minoritária.

        Cabe salientar que várias leis orgânicas municipais e algumas constituições estaduais já adotaram em seus textos, a inclusão da expressão "orientação sexual" como causa passível de ser penalizada frente a atos discriminatórios. Para uma melhor visualização, apresentamos o seguinte quadro:

        ESTADOS/MUNICÍPIOS:

        É importante salientar o fato de que o dispositivo constitucional sobre "orientação sexual" já consta da legislação de vários países, tendo como exemplo marcante a iniciativa da África do Sul, um país que viveu séculos de discriminação racial, através de um regime ditatorial, que incluiu em sua Primeira Constituição (1993) esse artigo.

        No quadro abaixo listamos os países, que proíbem expressamente em suas Constituições ou Legislações a discriminação por orientação sexual:

PAÍSES/UNIDADES DA FEDERAÇÃO/SUB-REGIÕES:

Fonte: Kings College of London - Universidade de Londres

        O que pretendemos com esta emenda é resgatar a cidadania de milhares de brasileiros que são preteridos no mercado de trabalho, assassinados, discriminados no cotidiano do convívio social. Portanto dentro do princípio que deve reger a ação legislativa , na permanente defesa dos direitos humanos e, considerando:

        1 - que "o desconhecimento e o menosprezo dos direitos humanos tem originado atos de barbárie ultrajantes para a consciência da humanidade", dos quais o genocídio nazista na Europa é exemplo, que eliminou, junto a seis milhões de judeus e outras importantes minorias raciais, aproximadamente 220.000 homossexuais, segundo dados da Igreja Luterana Austríaca e

        2 - que "todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e a segurança pessoal", assim como "sem distinção, direito à igual proteção da lei " e igual proteção contra toda discriminação que infrinja esta Declaração e contra toda provocação a tal discriminação."

        3 - que "toda pessoa tem o direito ao respeito à sua integridade física, psíquica e moral", da qual é parte constituinte a orientação sexual.

        4 - que "nada pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ataques ilegais à sua honra ou reputação, assim como "tem direito a toda proteção da lei contra essas ingerências ou esses ataques".

        5 - que "nas sociedades pluralistas de hoje, no seio das quais, a família guarda naturalmente todo seu lugar e seu valor, práticas tais como a exclusão das pessoas de certos empregos em razão de sua orientação sexual, a existência de atos de agressão ou a manutenção de perseguição sobre essas pessoas, que tem sobrevivido a vários séculos de preconceitos.

        6 - que "todos os indivíduos, homens e mulheres, tendo chegado à maioridade, prevista em lei, de acordo com a legislação do país em que vivem e sendo capazes de um consentimento pessoal válido, devem ter o direito a autodeterminação sexual".

        7 - que organizações internacionais de grande prestígio e de ideologias diversas (Organização Mundial da Saúde, Anistia Internacional, Partido Democrata dos Estados Unidos, Associação Psiquiátrica Americana, Associação Americana de Psicologia, Ministério da Saúde da França, Ministério da Saúde do Brasil, Parlamento Europeu, etc.) tem começado nas últimas décadas a revisar suas posições a respeito dos diferentes aspectos da orientação sexual das pessoas, tendendo à plena incorporação das mesmas num plano de igualdade.

        Apresentamos esta PEC e esperamos contar com o apoio de meus pares para sua aprovação.

Deputada Marta Suplicy (PT/SP)