Setembro 2.002

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História do Movimento Homossexual – Cem anos de Lutas

 

         Um dos primeiros escritos que se conhece contra a discriminação aos homossexuais, data de 1869. Neste ano um médico húngaro, Karóly Benkert, escreveu uma carta ao Ministério da Justiça alemão condenando o novo código penal que em seu artigo 175 declarava que os atos sexuais entre homens eram delito. Foi nesta carta, também, que Benkert utilizou pela primeira vez o termo homossexual para denominar estes atos.

         A luta contra o artigo 175 fez florescer na Alemanha os primeiros movimentos em defesa da liberação homossexual. Em 1897 surgia o Comitê Científico e Humanitário (CCH), que promoveu diversas atividades até 1933, quando foi duramente vitimado pela violenta perseguição do nazismo que recém chegava ao poder.

         Durante sua existência o CCH lançou as bases daquilo que seria o movimento homossexual no decorrer do século. Abaixo-assinados, palestras e atividades públicas foram intensamente utilizados numa tentativa de por fim à discriminação contra os homossexuais. O grau de atividade e “modernidade” do Comitê pode ser, inclusive, exemplificado pela participação de Hirschfeld em inúmeras produções cinematográficas que discutiam o tema. Na mais famosa delas, intitulada “Diferente dos Outros”, de 1919 (ou seja, menos de 20 anos depois do surgimento do cinema), Hirschfeld não participou como ator ( um médico que procura convencer a sociedade que a homossexualidade não é crime nem doença), como também inseriu um poderoso discurso no final do filme, válido até hoje:

         “Nós devemos assegurar que brevemente chegará um tempo em que tragédias como esta [o suicídio do principal personagem gay] serão impossíveis de acontecer, porque o conhecimento irá superar o preconceito, a verdade irá superar as mentiras e o amor conquistará o ódio”.

         Como sabemos, a profecia de Hirschfeld infelizmente não se cumpriu até hoje, apesar do movimento de gays e lésbicas nunca ter cessado desde então. Os anos 30 e 40 foram marcados por retrocessos e derrotas causados pelo fascismo e a guerra. Contudo, nos anos 50, o movimento homossexual internacional ganhou novo fôlego com a luta dos homossexuais norte-americanos contra a “caça às bruxas” promovido pelo senador McCarthy. Mas, os pequenos grupos que surgiam na época, apenas anunciavam o poderoso movimento homossexual que iria surgir naquele país duas décadas depois.

         A década de sessenta foi marcada pela revolução nos costumes e no comportamento de amplos setores da sociedade em vários país capitalistas. 1968 entrou para a história como ano da rebeldia estudantil. Já 1969 é um marco para a luta pelos direitos dos homossexuais. Em 28 de junho daquele ano, a polícia de Nova York promoveu uma de suas costumeiras batidas em um bar freqüentado por homossexuais, o Stonewall, em Greenwich Village. Mas, desta vez a história foi bastante diferente das anteriores. Cansados das humilhações e perseguições, os homossexuais que estavam no bar, liderados por travestis, resistiram à polícia, trancando-os dentro do bar e ateando fogo ao recinto. A batalha que tinha pedras e garrafas como armas, e envolveu milhares de pessoas, prolongou-se durante toda a madrugada do dia 28 e nas 4 noites posteriores.

         No primeiro aniversário da rebelião, 10 mil homossexuais, provenientes de todos os estados norte-americanos marcharam sobre as ruas de Nova York, demonstrando que estavam dispostos a seguir lutando por seus direitos. Desde então, “28 de junho”  é considerado o Dia Internacional do orgulho Homossexual.

         Como resultado direto dessa mobilização, durante os anos 70, surgiram centenas de organizações de gays e lésbicas. Estas organizações obtiveram importantes conquistas como as seguintes:

  1. Forçou a Associação Nacional de psiquiatria a rediscutir a classificação dos homossexuais como doentes;
  2. Impôs fim à proibição de homossexuais nos serviços públicos em diversas cidades e estados;
  3. Dezoito estados dos EUA anularam as leis que puniam criminalmente a sodomia;
  4. Em várias cidades foram aprovadas leis proibindo a discriminação nos locais de trabalho e moradia.

Porém, os avanços conquistados no início da década foram sistematicamente atacados durante o decorrer dos anos 70 e 80. O aprofundamento da crise econômica mundial abriu espaço para um discurso conservador que fez com que muitas leis anti-discriminatórias fossem revogadas apesar da resistência dos grupos organizados e da comunidade homossexual em geral. Um dos exemplos mais importantes desse embate se deu em Miami, na Flórida, em 1977. A derrota de uma lei em defesa dos direitos homossexuais levou centenas de milhares de pessoas às ruas. Já em São Francisco, 250.000 pessoas saíram às ruas em protesto contra os ataques aos direitos homossexuais e para repudiar o assassinato de um membro da comunidade por 3 adolescentes.

Na medida em que a onda conservadora avançava e os direitos legais eram retirados, aumentavam também os ataques físicos aos homossexuais. O caso mais famoso foi sem dúvida o assassinato de Harvey Milk, em São Francisco, o primeiro vereador assumidamente gay eleito nos EUA. Em novembro de 1978, um ex-policial e vereador, Dan White, assassinou Milk juntamente com o prefeito da cidade dentro da própria prefeitura. O assassinato provocou uma onda de manifestações à nível nacional e internacional, que teve seu ápice em maio o ano seguinte, quando White, apesar de todas as evidências, recebeu a sentença mínima (8 anos, com direito à liberdade condicional depois de 5).

Diante deste resultado, 10 mil pessoas se concentraram na frente da prefeitura para protestar. A manifestação evoluiu rapidamente em um violento confronto com a polícia que teve como saldo 119 feridos (entre policiais e manifestantes), danos generalizados no prédio da Prefeitura e vários carros queimados. A revolta dos manifestantes foi ainda maior diante dos policiais que os atacavam aos berros dizendo que era chegada a hora de “limpar a cidade” e retoma-la das mãos dos “veados”.

 

 


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