O título “Embriagado de Amor” dá uma boa idéia da sensação que o espectador pode ter durante uma sessão do filme. É uma grande mistura que faz com que seja um filme inclassificável. É uma comédia romântica clássica no que diz respeito ao tema e à trama, mas em termos estéticos e narrativos, é específico demais para se encaixar em qualquer rótulo. O quarto longa-metragem de Paul Thomas Anderson é um filme realmente novo, uma das poucas realizações do cinema recente a se aventurar por caminhos estéticos de fato inovadores. É puro estilo, uma tentativa de auto-reflexão e auto-crítica. A não ser pela banalidade do seu conteúdo, tudo no filme é esquisito e, de certa forma, contraditório. A começar pela escalação do elenco: soa bizarro colocar no mesmo set uma atriz de prestígio, representante de uma alta cultura como Emily Watson ao lado de um ator como Adam Sandler, que representa justamente o oposto: o popular, o cinema comercial sem qualidade. Sandler interpreta Barry Egan, um rapaz derrotado e sonhador, zombado com freqüência pelas sete irmãs mais velhas e repressoras. Numa noite de solidão, liga para um serviço de tele-sexo e acaba se envolvendo em uma grande confusão com uma família que passa a perseguí-lo. Paralelamente, a delicada e também solitária Lena (Watson) tenta se aproximar de Barry após conhecê-lo por meio de uma foto. A trama decorre entre os encontros amorosos tortos de Barry e Lena e a ameaça da família de bandidos que quer se aproveitar da ingenuidade de Barry. O diretor e roteirista Paul Thomas Anderson, que ficou famoso com projetos ambiciosos e bem-sucedidos como “Boogie nights” e “Magnólia”, se supera no seu quarto longa. “Embriagado de amor” é talvez ainda mais pretensioso que seus filmes anteriores, mas aqui há uma diferença: o cineasta domina o material com o qual trabalha como nunca fizera antes. Os roteiros de “Boogie nights” e “Magnólia” eram extraordinários, e de um filme para o outro, percebe-se um amadurecimento do P. T. Anderson diretor. “Embriagado de amor” era o filme que faltava para comprovar que se trata de um diretor excepcional. Anderson recebeu o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes de 2002. Anderson domina a obra e o espectador; usa com habilidade e extrema inteligência alguns truques técnicos, como chiados, música dissonante e movimentos de câmera pré-calculados de forma a obter efeitos que deseja; não importa a trivialidade do diálogo, uma série de recursos torna a coisa toda estranha e é isso que Anderson deseja fazer o tempo todo: causar estranhamento, colocar valores pré-existentes em crise. E isso ele consegue com a destreza de um mestre: não se assiste ao filme sem sentir as sensações que Anderson quer que sintamos. Não é difícil entender por que muitas pessoas deverão odiar o filme: “Embriagado de amor”, uma obra corajosa, que coloca em crise um gênero que atrai grande parte dos espectadores por não esperarem muito além de uma diversão efêmera de uma tarde dominical. Mas a comédia romântica que Anderson nos apresenta é muito mais que puro entretenimento. |