PROCURADORIA
GERAL DO ESTADO.
PROCURADORIA DE
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA DE TAUBATÉ.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DE UMA DAS MM. VARAS CÍVEIS DA COMARCA DE TAUBATÉ – S.P..
Nome,
qualificação, assistido pela Procuradoria de Assistência Judiciária Cível de
Taubaté da Procuradoria Geral do Estado, por intermédio do Procurador do Estado
infra-assinado, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, com fundamento
no artigo 282 e seguintes do Código de Processo Civil, propor
AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO
ADMINISTRATIVO,
com
pedido de tutela antecipada liminarmente, pelo rito ordinário, em face da FAZENDA
PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, sediada na Capital do Estado, na avenida
São Luiz nº 99, 4º andar, Centro, CEP.: 01046-905, na pessoa de seu
representante legal, pelos motivos de fato e de direito abaixo aduzidos.
DOS FATOS.
O
Autor desempenhou serviços de reparos mecânicos em automóveis para o Estado,
ocupando cargo público de Oficial de Serviços e Manutenção, junto ao
Departamento de Estradas e Rodagem, da Secretaria dos Transportes do Estado de
São Paulo, XXXXX, escala de vencimentos nível básico, faixa 7, nível I,
classificado junto à U.A. nº – Setor XXXX, da Seção de XXXX Regional, do
Serviço de XXXX, da Divisão Regional de XXXX – DR-X.
No
início do vínculo estatutário o referido servidor prestava condignamente seu
mister, com desenvoltura e habilidade de um ótimo profissional.
Mas
com o passar do tempo, a chefia imediata constatou decréscimo produtivo, e,
inicialmente, não vislumbrou outra alternativa a não ser a via punitiva para
emendar o funcionário, cada vez mais relapso.
Nome,
olheirento, quando comparecia ao trabalho, atrasava-se em demasia. Executava as
mais simples tarefas com extrema dificuldade, estafando-se em poucos minutos na
lida. Sua aparência não agradava - emagreceu sobejamente , e manifestava pouca
sociabilidade. Seus olhos fundos, injetados, revelavam pecados notívagos...
Diante
desse quadro insustentável, na iminência de se instaurar uma sindicância
administrativa, a chefia “negociou” uma saída honrosa, possibilitando ao Autor
a exoneração a pedido.
Sem
dúvida o Autor viu-se satisfeito com o estratagema, seguro que sua vida
funcional não apresentaria qualquer mácula, e requereu a exoneração em 20
de novembro de 1991, desligando-se do quadro dos funcionários públicos
estaduais definitivamente.
Sob a
análise objetiva traçada acima sobre o desvinculamento do servidor, atualmente
não existiria fundamento jurídico para a anulação do ato jurídico
administrativo.
Mas
falta ao ato higidez jurídica decorrente da inexistência de requisito essencial
da voluntariedade, consoante evidenciam os fatos narrados a seguir.
O
Autor sempre residiu com os pais e outros seis irmãos em casa própria, e,
embora não houvesse fartura, recebeu assistência material e educação adequadas
nos moldes da boa família cristã.
Apesar
da favorável estrutura familiar, sem qualquer relevante motivo, precocemente o
Autor tomou contato com os prazeres e perigos das drogas. Aos dezesseis anos de
idade experimentou pela primeira vez cocaína inalada, logo em seguida
utilizou-a injetada na corrente sanguínea, sempre acompanhada pelo consumo da
maconha e ingestão do álcool, e conviveu com o vício durante longos dezessete
anos.
Agravou
imensamente sua situação a descoberta de ser portador do vírus da AIDS,
síndrome da imunodeficiência adquirida, após constatação da soropositividade
(HIV positivo) em exame hematológico patrocinado pelo SUDS-SP, em 28 de abril
de 1989.
Deste
momento em diante nada mais fazia diferença! Ao Autor restaram apenas as drogas
como meio mais cômodo de fugir de sua triste realidade, participando
assiduamente do frenético ritual noturno de injeção compartilhada de cocaína com
outros colegas viciados, “canos silenciosos”.
A
doença instigou o vício e o vício exacerbou a doença em um literal círculo
vicioso!
Deteriorou
rapidamente sua capacidade física e mental, expirou seu desempenho
profissional, eliminou seus vínculos sociais, com o afastamento dos amigos e da
família, e, por fim, sucumbiu diante do inapelável vício, clamando pela morte
purificadora...
Neste
catastrófico instante de sua vida o Autor, pelas razões apontadas acima,
requereu a exoneração, indubitavelmente, sem mensurar as conseqüências nefastas
de seu “ato”. Ademais, não havia como o toxicômano refletir ou raciocinar,
dominado completamente pelo vício e pelo medo.
Quando
mais precisava do apoio assistencial do Estado, por ignorância e preconceito,
recebeu dos seus superiores hierárquicos apenas discriminação; cônscios dos
males suportados pelo Autor, impingiram-lhe os piores e inenarráveis
sofrimentos.
Milagrosamente
o Autor não morreu, apesar de conviver (rectius, sobreviver) com as drogas e a
maligna doença da modernidade durante tantos anos. A sua notável resistência
física, deu-lhe condições de suportar os males da doença, do vício e da
discriminação, talvez o pior, pois subjuga o adoentado, lançando-o ao
ostracismo silencioso do preconceito.
Sobre
a relação entre conflito social e preconceito, aplicável ao caso dos drogados e
soropositivos, importante rever o clássico estudo de psicologia elaborado pelo
Dr. Clifford T. Morgan, renomado professor norte-americano (in “Introdução à
Psicologia”, autor citado, Editora McGraw-Hill do Brasil, São Paulo, 1977,
páginas 274 a 277):
“Conflito
social, da maneira em que usamos o termo, refere-se a qualquer situação em que
dois grupos ou segmentos da sociedade se encontram em posições emocionalmente
opostas. Em geral, um grupo é suficientemente forte em números, educação e/ou
posição econômica para dominar ou oprimir o outro. O conflito se manifesta em
campo aberto com demonstrações e violência quando o grupo oprimido procura
mudar sua condição. As formas mais comuns de conflito são as raciais, como se
tem visto na África e nos Estados Unidos nos últimos anos. As diferenças
religiosas, especialmente quando acopladas a diferenças econômicas, também são
base para conflito social; o testemunho está na Irlanda do Norte. E as
diferenças econômicas por si podem desencadear conflito social, como se tem
visto na luta entre empregados e empregadores. Qualquer que seja a fonte
do conflito, este é sempre marcado por fortes preconceitos; eis que
preconceitos e conflito social sempre andam de mãos dadas. A maioria
dos exemplos nesta secção virá do preconceito contra os negros, já que é tantas
vezes encontrado nos Estados Unidos e tem sido minuciosamente estudado.
Mas os mesmos princípios são aplicáveis a todos os tipos de conflito social.”
“Aquisição de Preconceitos”
“A palavra preconceito
foi definida anteriormente neste capítulo como um prejulgamento
injustificado. Em princípio, os preconceitos podem ser favoráveis ou
desfavoráveis. Na prática, os de maior interesse para os estadistas e
cientistas sociais são as atitudes desfavoráveis e hostis em relação a um grupo
racial, religioso ou econômico.”
“Os preconceitos, assim como outras atitudes,
obedecem os princípios da formação e manutenção de atitude, que já discutimos. Em
particular, os preconceitos são aprendidos. As pessoas os adquirem (1)
do contato com outras que os têm e (2) do contato com o objeto que o cause.”
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“Bode
expiatório. Quando a agressão se desloca para um grupo minoritário, em geral
se diz que foi encontrado um bode expiatório. A pessoa preconceituosa, que sofre de frustrações econômicas, sociais
ou políticas, desloca sua agressão para um objeto conveniente que,
freqüentemente é um grupo em relação ao qual ela tem um preconceito. Um exemplo infamante é a perseguição de
Hitler aos judeus nas décadas de 1930 e 1940. Durante os 20 anos anteriores, o
povo alemão havia sofrido uma derrota militar na Primeira Guerra Mundial,
seguida de depressão, inflação e uma série de males sociais. A maioria dos
alemães já tinha preconceito contra os judeus, como a maioria dos gentios no
mundo ocidental. Para Hitler, portanto, foi fácil convencer seus patrícios de
que os judeus eram responsáveis por seus problemas econômicos e sociais. Em
certas ocasiões os judeus têm sido os bodes expiatórios também nos Estados
Unidos, bem como em outras nações no mundo inteiro.”
“Percepção.
Resumindo, o
preconceito é sustentado por necessidades —especialmente pela
necessidade que uma pessoa tem de sentir-se superior e a de expressar sua
agressão sobre algum objeto conveniente. Mas o preconceito também é
suportado por distorção na percepção. Anteriormente, este capítulo
salientou que as atitudes fortes fazem uma pessoa perceber seletivamente certas situações, de modo que sua percepção
se ajuste à sua atitude. O preconceito é apenas um outro exemplo da mesma
coisa. Um racista vê somente o que quer ver. Se uma pessoa julga que os judeus
são “intrometidos”, ela toma notas especiais de casos em que eles podem ser
intrometidos. Em casos semelhantes envolvendo gentios, ela dá pouca atenção, ou
interpreta o comportamento de modo diferente. Com a prática, todos nós nos
tornamos peritos em perceber somente aquilo que está de acordo com nossos
preconceitos.”
“Desvantagens
sociais: Um outro apoio forte do racismo está nas
conseqüências sociais do próprio preconceito; isto é, o preconceito nos
afazeres sociais produz um mundo que se aproxima do que os preconcebidos
esperam que seja. Os que têm atitudes racistas acreditam que os pretos são
inferiores aos brancos. Acreditando nisso, impedem-nos de obter escolaridade
adequada, instalações de biblioteca, habitação e outras vantagens sociais. O
resultado é uma desvantagem social que os impede de serem tão educados quanto
os brancos. Assim, cria-se um círculo vicioso em que os efeitos do preconceito
ajudam a mantê-lo, proporcionando-lhe uma base real.”
“Efeitos Sociais do Preconceito”
“Um outro efeito, bem como causa do preconceito —
na verdade, o meio através do qual são criadas as desvantagens sociais
—. é a segregação. Todas as vezes que o racismo tem sido forte e
disseminado — contra os judeus na Idade Média (e muito mais tarde em alguns
países), contra os pretos na África do Sul, e contra grupos semelhantes nos
Estados Unidos — o grupo oprimido tem sido segregado em escolas,
habitação e emprego. A segregação é um meio de privar os oprimidos das
oportunidades desfrutadas pelos opressores. Qualquer tentativa para combater o
preconceito deve começar com os esforços para abolir a segregação. O Supremo
Tribunal reconheceu isso em sua decisão de 1954 que foi um marco na História; e
a legislação sobre os direitos civis da década de 1960 procurou dar meios de
execução à decisão. Mas a eliminação de toda a segregação forçada em educação,
habitação e emprego será uma longa batalha montanha acima. Mais duro ainda é o
esforço para romper a segregação de fato que
é disseminada nas cidades da parte norte dos Estados Unidos. São difíceis de
combater as práticas racistas em compras, vendas e aluguéis de casas, através
de métodos legais; isso tudo mantém a segregação” (grifos nossos).
O
Autor não sucumbiu diante das vicissitudes, e embora não tenha derrotado a
AIDS, recentemente passou a utilizar a medicação com a regularidade ministrada
pelos médicos, o que lhe propiciou melhores condições físicas.
Lutou
bravamente desde o início do ano de 1999, contra o uso desenfreado das drogas,
e a partir de 2000, deixou o vício. Quando retornou à lucidez, restaram-lhe
apenas todos os arrependimentos do mundo, e algumas esperanças de justiça!
DO DIREITO.
Nulo é
o ato praticado por toxicômano, equiparado aos absolutamente incapazes do
artigo 5º do Código Civil, por força do artigo 30, §§ 2º e 3º, do Decreto-lei
159/67, artigo 1º do Decreto-lei nº 891/38 e Lei nº 6.368/76.
A cocaína vem descrita como
droga de uso proscrito no Brasil, por ocasionar dependência física, no anexo 1,
lista “F”, item 11, da Portaria nº 344/98 da Secretária de Vigilância Sanitária
do Ministério da Saúde. O THC, tetrahidrocanabinol, princípio ativo da maconha,
por ocasionar dependência psicológica, foi proscrito ao ser incluído no item 43
do mesmo dispositivo legal. O álcool, embora não seja proibido, também ocasiona
vício e sujeita o usuário, nos casos extremos, à absoluta incapacidade civil.
O ato
administrativo exoneratório do funcionário público não pode prosperar, nem
produzir efeitos jurídicos, pois não se conformou com o elemento essencial de
todo e qualquer ato jurídico: a vontade consciente e livremente manifestada.
“Entendemos que os elementos dos atos administrativos
são os mesmos dos atos jurídicos em geral, apenas com as peculiaridades
próprias à natureza da atividade administrativa. É o que ocorre com a forma de
manifestação de vontade, a declaração dos motivos, a determinação das causas, a
definição da competência, as exigências formais para a validade do ato” (in “Teoria Dos Atos Administrativos”, Themístocles
Brandão Cavalcanti, São Paulo, Editora RT, 1973, página 62).
“Além dos vícios de incompetência, ainda
existem os de incapacidade, previstos nos artigos 5º e 6º do CC, e os
resultantes de erro, dolo, coação, simulação ou fraude, os quais não servem
para distinguir a nulidade absoluta da relativa, como ocorre no direito
privado, uma vez que, conforme se verá, no direito administrativo o critério
distintivo é diverso” (grifos nossos).
A competente doutrinadora continua seus ensinamentos
elucidando as classificações dos mais renomados administrativistas sobre atos
ilegais, para apontar as conseqüências dos vícios (idem, página 201 e 202).
“No direito administrativo, encontram-se
diferentes formas de classificar os atos ilegais.”
“Oswaldo Aranha Bandeira de Mello (1979:650-651)
considera que o ato administrativo pode ser nulo ou anulável. Será nulo “quanto
à capacidade da pessoa se praticado o ato por pessoa jurídica sem atribuição,
por órgão absolutamente incompetente ou por agente usurpador da função pública.
Será nulo quanto ao objeto, se ilícito ou impossível por ofensa frontal à lei,
ou nele se verifique o exercício de direito de modo abusivo. Será nulo, ainda,
se deixar de respeitar forma externa prevista em lei ou preterir solenidade
essencial para a sua validade. Ao contrário, será simplesmente anulável, quanto
à capacidade da pessoa, se praticado por agente incompetente, dentro do mesmo
órgão especializado, uma vez o ato caiba, na hierarquia, ao superior.
Outrossim, será tão-somente anulável o que padeça de vício de vontade decorrente
de erro, dolo, coação moral ou simulação”.
“Seabra Fagundes (1984:42-51), refutando a
possibilidade de aplicar-se ao direito administrativo a teoria das nulidades do
direito civil, entende que os atos administrativos viciosos podem agrupar-se em
três categorias: atos absolutamente inválidos ou atos nulos, atos relativamente
inválidos ou anuláveis e atos irregulares. Atos nulos são os que violam regras
fundamentais atinentes à manifestação da vontade, ao motivo, à finalidade ou à
forma, havidas como de obediência indispensável pela sua natureza, pelo
interesse público que as inspira ou por menção expressa da lei. Atos anuláveis são os que infringem regras atinentes aos cinco elementos do ato
administrativo, mas, em face de razões concretamente consideradas, se tem como
melhor atendido o interesse público pela sua parcial validez; para o autor,
tratando-se de ato relativamente inválido, se estabelece uma hierarquia entre
dois interesses públicos: o abstratamente considerado, em virtude do qual
certas normas devem ser obedecidas, e o ocorrente na espécie, que se apresenta,
eventualmente, por motivos de ordem prática, de justiça e de eqüidade em
condições de superar aquele. Atos irregulares são os que apresentam defeitos
irrelevantes, quase sempre de forma, não afetando ponderavelmente o interesse
público, dada a natureza leve da infringência das normas legais; os seus
efeitos perduram e continuam, posto que constatado o vício; é o caso em que a
lei exige portaria e se expede outro tipo de ato.”
...............................................................................................................
“Para Hely Lopes Meirelles (1996:157), não existem
atos administrativos anuláveis, “pela impossibilidade de preponderar o
interesse privado sobre atos ilegais, ainda
que assim o desejem as partes, porque a isto se opõe a exigência de legalidade
administrativa. Daí a impossibilidade jurídica de convalidar-se o ato
considerado anulável que não passa
de um ato originariamente nulo”. Embora mencionando o ato inexistente (que tem apenas a
aparência de manifestação regular da Administração, mas não chega a se
aperfeiçoar como ato administrativo), nega, como a maioria dos autores, a
importância dessa distinção, porque os atos inexistentes se equiparam aos atos
nulos.”
Conclui
a preclara jurista, após análise de diversas posições doutrinárias, que existem
as nulidades relativas e absolutas, respectivamente, quando constituem mácula
sanável ou irreparável do ato administrativo. Dentre os vícios sanáveis não se
poderia incluir aquele que prescinde do elemento essencial da vontade
conscientemente manifestada.
“Essentialia negotii”, a vontade conscientemente manifestada é condição essencial de qualquer ato jurídico, como ensina Washington de Barros Monteiro, e sua falta provocaria, segundo a doutrina alemã, a inexistência do ato. No nosso direito, a falta de condição essencial do ato provoca sua nulidade, o mais grave dos defeitos dos atos jurídicos.
O ato
administrativo exoneratório é um “nada jurídico”, entretanto, causa extrema
penúria ao Autor, pois o hipossuficiente poderia albergar-se no manto protetor
da previdência estatal.
A
declaração judicial de inexistência de vontade conscientemente manifestada ao
praticar o ato exoneratório prescinde de ação de interdição do toxicômano.
Basta comprovar-se a incapacidade do sujeito de direito quanto ao referido ato
administrativo como relação prejudicial e premissa lógica à pretendida
anulação, com fundamento no artigo 145, inciso I, e artigo 82 do Código Civil,
como elucida brilhante doutrina do incomparável mestre Vicente Ráo:
“(a) Segundo regra geral de
direito, a capacidade sempre se presume, até prova em contrário. Mas, essa
presunção juris tantum não se
destrói, apenas, pela sentença de interdição, pois nosso direito admite a prova
da insanidade independentemente dessa declaração judicial para se demandar a
invalidade do ato que pelo insano houver sido praticado. Uma distinção
substancial existe, no entanto, entre a sentença de interdição e a sentença
que, em ação de nulidade, acolhe a prova da moléstia mental: enquanto a
primeira, prevalecendo erga omnes, declara
a incapacidade do paciente e o sujeita à curatela, a segunda outro efeito não
produz a não ser o da ineficácia do ato questionado, não prevalecendo, pois,
contra terceiros.
(b) A nulidade do ato praticado pelo insano,
independentemente processo de interdição, resulta do preceito de ordem pública
contido no art. 145, I, do Código Civil que declara nulo o ato jurídico
praticado pelo absolutamente incapaz e se reporta ao art. 82, por força do qual
para a validade do ato jurídico se exige, além de requisitos outros, da
capacidade do agente; e o art. 145, I, não submete a prova da incapacidade por
moléstia mental à condição de ser previamente decretada a interdição. Assim
sempre se entendeu e assim se entende em nosso direito (T. de Freitas, Consol., nota 23 ao art. 326; C. de
Carvalho, Nova Consol., art. 103;
Lafayette, Famíl., n. 165, Estevam de
Almeida, Manual, com. art. 452, n.
420; RT, vs. LXXXI, 34, XCI, 348, XCIV, 207 etc.).”(in “O Direito e a Vida do
Direito”,vol. 2, Vicente Ráo,4ª edição, São Paulo, Editora RT, 1997, página
672, nota de rodapé n. 62)
DOS DANOS MORAIS.
Após
longo dissídio jurisprudencial, a Constituição da República veio acolher
expressamente a tese da reparabilidade dos danos morais, consoante artigo 5º,
incisos V e X.
A
doutrina acolhia anteriormente a tese sem dissonância, caracterizando-a por seu
caráter reparador e sancionador. De um lado, amenizando a dor moral da vítima,
de outra banda, impedindo conseqüentemente a recidiva do “eventus damni”.
Vislumbram-se
no caso vertente todos os requisitos conformadores do dano moral, consoante
preciosa lição de Antonio Jeová Santos, em sua festejada obra “Dano Moral
Indenizável”, 2ª edição, São Paulo, Ed. Lejus, 1999, página 73:
“Alguns requisitos entremostram-se para a configuração do dano, quais sejam, o de que a lesão ou angústia vulnere interesse próprio. O prejuízo deve ser certo, impedindo-se indenização por algo fantástico e que só exista na imaginação do lesionado e o dano deve existir no momento da propositura da ação. É a subsistência do dano que, para ser ressarcível, deve estar presente no momento em que o prejudicado efetuar seu pedido na órbita judicial. Em alguns casos, a lesão se protrai no tempo, existindo até o fim da vida do prejudicado”(grifos nossos).
O
mesmo autor caracteriza o “dano moral como conseqüência de algum ato que cause
dor, angústia, aflição física ou espiritual ou qualquer padecimento infligido à
vítima em razão de algum evento danoso. É o menoscabo a qualquer direito
inerente à pessoa, como a vida, a integridade física, a liberdade, a honra, a
vida privada e a vida de relação”(idem, página 113).
Portanto,
representam dano moral as angústias decorrentes da discriminação advinda do
preconceito de seus superiores hierárquicos, cônscios de seu estado físico e
mental, de suas perturbações geradas pelo uso freqüente das drogas. Representam
dano moral, ainda, os sofrimentos aplicados ao Autor decorrentes da conduta maliciosa
dos representantes do Estado, que impingiram a exoneração a pedido ao desvalido
toxicômano, lançando-o ao desamparo durante todos esses anos.
Foi mais cômodo convencer o
incapacitado soropositivo e drogado funcionário público a requerer exoneração a
pedido, do que onerar o Estado com os deveres securitários, ou simples
tratamento à doença do toxicômano.
Não se
pode alegar inocorrência de dano moral decorrente do estado de inconsciência do
Autor, pois, como elucida o supra citado doutrinador, “a ausência de
conhecimento sensível do que está ocorrendo, não exclui a minoração espiritual
do sujeito, nem o caráter axiologicamente negativo da minoração”(idem).
Ressalte-se que o Autor retomou o controle de seus interesses e vontades,
vislumbrando com plena consciência o ocorrido.
CONCLUSÃO.
Inicialmente,
pugna o Autor a antecipação parcial da tutela “inaudita altera pars”,
determinando-se sua recondução ao cargo anteriormente ocupado, se ainda
existir, ou , caso contrário, a colocação do funcionário à disposição do
Estado, para poder usufruir os benefícios previdenciários estatais ainda em
vida
Preenchidos
plenamente os requisitos legais da concessão da tutela antecipada “inaudita
altera pars”, pois há o “periculum in mora” (artigo 273, inciso I,
do Código de Processo Civil), evidenciado pelo estado de saúde do Autor, e a
ocorrência de prova inequívoca das alegações (causa de pedir), com a juntada de
parecer médico sobre a incapacidade do Autor e de seus prontuários médicos,
onde se constata a longeva relação com as drogas (artigo 273, “caput”,
do Código de Processo Civil).
O
Autor pleiteia a procedência da ação para ser declarado nulo o ato
administrativo exoneratório de 26 de dezembro de 1991, publicado no Diário
Oficial do Estado em 14 de janeiro de 1992, a pedido de Nome, determinar a
recondução do funcionário ao seu antigo cargo, se este ainda existir, ou,
caso contrário, a colocação do funcionário à disposição do Estado, além do
apostilamento do período de desvinculação ilícita para contagem do tempo
como de trabalho efetivo para todos os efeitos jurídicos.
Pleiteia, ainda, a condenação da Ré ao pagamento das remunerações que deixou de auferir no período de dezembro de 1991 a data da efetiva reintegração no cargo, conforme apurar-se-á em sucessiva liquidação.
O Autor, por derradeiro, pleiteia a condenação da Ré a indenizá-lo pelos danos morais decorrentes dos fatos relatados, especialmente pela odiosa discriminação sofrida, que lhe causou especial sofrimento físico e moral, no importe sugerido equivalente a 400 (quatrocentos) salários mínimos, consoante arbitramento do douto Juízo em ação de conhecimento, como tem entendido maciça jurisprudência.
O
Autor requer a citação da Ré no endereço suso declinado para que apresente,
querendo, sua defesa, sob pena de sofrer os efeitos da revelia.
Requer
o Autor a expedição de ofício ao Departamento de Estradas e Rodagem, da
Secretaria dos Transportes do Estado de São Paulo, SQC-X do QDER, Setor de XXXX,
da Seção de XXXX Regional, do Serviço de XXXX, da Divisão Regional de XXXX –
DR-X, sediada na avenida XXX nº X, Parque X, XXXXX, onde o funcionário detinha
escala de vencimentos nível básico, faixa 7, nível I, classificado sob o nº
U.A. XXXXX, para informar sobre seu histórico funcional.
O
Autor protesta pela produção de provas orais em audiência a ser designada,
utilizando-se dos meios testemunhais e depoimento pessoal de representante da
Ré, sem descartar as provas documentais, periciais e inspeção judicial.
Requer,
por derradeiro, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do
artigo 2º e 4º da Lei nº 1.060/50, por ser pessoa pobre na acepção jurídica do
termo, não podendo arcar com as custas do processo e honorários advocatícios,
sem prejuízo de sua mantença e de sua família, conforme declaração anexa.
Dá-se
à causa o valor de R$ 60.400,00 (sessenta mil e quatrocentos reais).
Nestes termos, pede deferimento.
Taubaté, 6 de julho de 2000.