(AULA 02) RESUMO DA AULA

A competência do julgamento dos crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri - art. 5º, XXXVIII, "d", da CF/88.

o 121, §2º - HOMICÍDIO QUALIFICADO - crime hediondo - art. 1º, I da lei 8.072/90

- A premeditação ou o parricídio não são qualificadoras. A premeditação, no entanto, pode ser levada em consideração como circunstância judicial (59). Explica-se tal posicionamento pelo fato de a premeditação não revelar, necessariamente, disposição de ânimo fria e calculista. O agente pode, por exemplo, praticar de forma premeditada um homicídio por motivo de relevante valor moral. O parricídio é genericamente agravado pelo 61, II, "e", CP. * Parricida = aquele que mata o próprio pai, mãe ou qq ascendente.

As circunstâncias que qualificam o homicídio dividem-se em: a) motivos (paga, promessa de recompensa ou outro motivo torpe ou fútil - I e II; b) meios (veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio de que possa resultar perigo comum - III); c) modos (traição, emboscada, mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou tome impossível a defesa da vítima - IV); d) fins ou conexão (para assegurar a execução, ocultação, impunidade ou vantagem de outro crime - V).

OBS: Fala-se em dolo geral (hipótese de erro sucessivo) quando o autor acredita já haver consumado o delito quando na realidade o resultado somente se produz por uma ação posterior, com a qual buscava encobrir o fato. Ex: MÉVIO, após desferir golpes de faca na vítima, supondo-a morta, joga o seu corpo em um rio, vindo esta, na realidade, a falecer por afogamento. Rogério Greco assevera que nesses casos "se o agente atuou com animus necandi (dolo de matar) ao efetuar os golpes na vítima, deverá responder por homicídio doloso, mesmo que o resultado morte advenha de um outro modo que não aquele pretendido pelo agente (aberratio causae), quer dizer, o dolo acompanhará todos os seus atos até a produção do resultado, respondendo o agente, portanto, por um único crime de homicídio doloso, independentemente da ocorrência do resultado aberrante."

Inc.I (circunstância subjetiva) - Mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe. Mediante paga ou promessa de recompensa: É o homicídio mercenário, uma das modalidades de torpeza. Na paga o agente recebe previamente a recompensa pelo crime, o que não ocorre na promessa de recompensa, onde há somente a expectativa de paga. Torpe é o motivo moralmente reprovável, desprezível, repugnante. Questão que gera controvérsia na doutrina e na jurisprudência é saber se tanto o mandante quanto o executor respondem por esta modalidade. a) Fernando Capez afirma que: "embora haja decisão no sentido de que tanto o mandante quanto o executor respondem pela forma qualificada do delito, pois a qualificadora, embora subjetiva, é elementar do tipo, entendemos que, por se tratar a qualificadora de mera circunstância, e não de uma elementar, não se há que falar em comunicabilidade neste inciso, dado que possui natureza subjetiva (motivo do crime é algo relacionado ao agente, não ao crime), à luz do que dispõe o art. 30 do CP." Assim, para ele, o executor responderá pela qualificadora, pois cometeu o crime impelido por motivo de cupidez econômica, mas o mandante não, devendo responder pelo seu próprio motivo. Luiz Regis Prado corrobora com esse entendimento. b) Para Bitencourt, no entanto, respondem pelo crime qualificado o que praticou a conduta e o que pagou ou prometeu a recompensa. O motivo torpe se caracteriza pela singela ocorrência de paga e, não obstante seja circunstância de caráter pessoal, comunica-se ao mandante, por ser elementar do crime (art. 30 do CP), bem como a qualquer outro co-autor.

Revisão da matéria de Penal I O art. 30 prevê que não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Elementar é tudo aquilo que é essencial para a configuração do delito, são dados que fazem parte do núcleo típico do delito, o verbo do tipo, sem os quais ou ocorre uma atipicidade absoluta (indiferente penal) ou relativa (desclassificação para outro crime). circunstâncias (segundo Rogério Greco) "são dados periféricos, acessórios, que gravitam ao redor da figura típica, somente interferindo na graduação da pena". São aqueles dados que se encontram ao redor do crime com a finalidade de ora aumentar a pena, e ora diminuir a pena. Pode ser: a) circunstâncias objetivas ou materiais: são aquelas que dizem respeito ao fato delituoso (questões de tempo, lugar, meios e modos de execução, qualidades da vítima etc). b) circunstâncias Sujetivas ou pessoais: são aquelas que dizem respeito ao agente, às suas qualidades pessoais, o seu relacionamento com a vítima, os motivos determinantes da infração (condição). OBS: As elementares sejam elas objetivas ou subjetivas comunicam-se em caso de concurso de pessoas, mas desde que tenham ingressado na esfera de conhecimento do agente.

Outrossim também não é pacifico o entendimento de que a recompensa visada limita-se à retribuição de ordem econômica. a) Luiz Regis Prado assevera que: "predomina o entendimento segundo o qual a recompensa deve ter, para a configuração da qualificadora, conteúdo econômico. Embora não se negue que motivos não-econômicos possam perfeitamente figurar como móvel do delito, não foram estes incluídos no âmbito da qualificadora. O fundamento de maior reprovabilidade reside na desvaloração do motivo, de forma que a admissão de motivos não-econômicos implicaria a necessidade de determinação, em cada caso, da especial reprovabilidade dos mesmos, o que criaria grande insegurança jurídica. Deveria ser analisado, concretamente, se a promessa de um cargo político, de matrimônio ou de um favor sexual, por exemplo, configurariam ou não motivos torpes e, por isso, particularmente reprováveis. Por essa razão, acertada a opinião dominante que considera que a paga ou promessa de recompensa devam ter conteúdo econômico."

"Ou por outro motivo Torpe" - trata-se de interpretação analógica - pois há no texto uma enumeração casuística, à qual segue uma formulação genérica, que deverá ser interpretada de acordo com o caso.

Revisão de Penal I Diferença entre interpretação analógica e analogia:

A interpretação analógica ocorre quando a própria lei autoriza ao intérprete, utilizando-se dos recursos por ela fornecidos, a abranger situações não previstas em lei. Na interpretação analógica existe uma norma expressa regulamentando a hipótese que deve ser abrangida, mas de forma genérica, o que torna necessário o recurso interpretativo, podendo, inclusive, ser prejudicial ao acusado. É exemplo o art. 121, § 2º, IV do CP, quando menciona matar alguém: "à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido" . Note-se que o legislador enuncia exemplos e, ao final, acrescenta uma fórmula genérica que abarca as condutas que se pretende incriminar. É o que se chama interpretação analógica. A analogia é uma forma de integração, não existe uma norma reguladora para a hipótese, havendo uma omissão do legislador. Assim, aplica-se ao caso não previsto em lei, a disposição relativa a um caso semelhante, onde existe a mesma razão de decidir, sempre em benefício do réu.

"Motivo Torpe" = é o moralmente reprovável, desprezível. Exs: matar: para obter quantidade de maconha; por vingança (dependendo do que a provocou); com a intenção de herdar fortuna; por rivalidade profissional etc.

Inc.II: (circunstancia subjetiva) - "Motivo Fútil" = é o insignificante; desproporcional entre o crime e sua causa moral. Exs: simples incidente de trânsito; rompimento de namoro; pequenas discussões entre familiares etc.

OBS: Não confundir motivo fútil / com a situação do privilégio na violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima. O motivo fútil, justamente por ser fútil, ele, a princípio, não causa violenta emoção, só se o sujeito for um alucinado. Ora, ninguém, ao ser chamado de bobo, vai imaginar que é tomado de uma emoção tal a ponto de determinar que ele pratique um crime de homicídio.

- Ausência de motivo: 3 correntes: 1a) (Damásio e Delmanto) Não é motivo fútil, mas pode responder por motivo torpe. 2a) (Fernando Capez) Equipara ao motivo fútil. Para ele, matar sem qualquer motivo é ainda pior que matar por mesquinharia, estando, portanto, incluído no conceito de fútil. Não seria lógico permitir pena mais branda para quem age sem qualquer motivo. 3ª) (Bitencourt) não qualifica o homicídio. Princípio da reserva legal. - Emgriaguez: 3 correntes: 1a) Exclui o motivo fútil quando compromete completamente o estado psíquico, pois não permite a realização pelo agente do juízo de proporção entre o motivo e a reação do agente; 2a) Não exclui, pois o princípio da actio libera in causa deve ser aceito em relação às circunstâncias qualificadoras ou agravantes, não sendo afastadas ante o reconhecimento da embriaguez voluntária do agente. 3a) Exclui sempre.

Para alguns doutrinadores, o dolo eventual é incompatível com o motivo fútil. - É inadmissível motivo fútil e torpe ao mesmo tempo.

- Inc.III: (circunstância objetiva) - permite a interpretação analógica. - "veneno" (venefício = homicídiio com veneno) - qualquer substância que, introduzida no organismo, seja capaz de colocar em perigo a vida ou a saúde humana através de ação química, bioquímica ou mecânica. Para Fernando Capez e Luiz Regis Prado, pode ser ministrado à vítima de diversas formas, desde que de maneira insidiosa ou dissimulada, já que o que exaspera a sanção aqui é a insciência da vítima. Caso tenha utilização de violência, para o ministramento da substância, poderá ser qualificadora do meio cruel. OBS: na hipótese do veneno ser considerado um meio absolutamente ineficaz, será crime impossível (art. 17 do CP). Entretanto, ocorrendo a ineficácia relativa, ou seja, se o meio empregado normalmente é capaz, pela sua natureza e essência, de produzir o evento letal, mas falha no caso concreto, o agente responderá por tentativa de homicídio qualificado pelo emprego de veneno. (Fernando Capez) - "fogo ou explosivo" = é uma espécie de meio cruel. Ex: jogar combustível e atear fogo ao corpo da vítima. Entretanto, no caso do agente incendiar um apartamento com a finalidade de matar seus moradores, acarretará perigo de incêndio das residências vizinhas, caracterizando, portanto, perigo comum. O explosivo é a substância que atua com detonação ou estrondo, ex. dinamite. Obs: perigo comum é aquele que pode expor um número indeterminado de pessoas, fazendo periclitar a incolumidade social. Fernando Capez nos ensina que, no caso concreto, se o agente, além de matar a vítima, expõe um número indeterminado de pessoas a perigo comum, configurando algum crime de perigo comum (ex. 250 do CP), entende-se que poderá o agente responder em concurso formal pelos crimes de perigo comum e homicídio qualificado. * Não confundir homicídio qualificado, cujo meio para sua pratica é o crime de perigo comum, e o delito de crime de perigo comum qualificado pelo resultado morte (art. 258 do CP). A diferença está no elemento subjetivo.

- "asfixia" - "consiste na supressão da função respiratória através de estrangulamento, enforcamento, esganadura, afogamento, soterramento ou sufocação da vítima, causando a falta de oxigênio no sangue (anoxemia)" . São hipóteses de asfixia mecânica. Porém, a asfixia também poderá ser tóxica (gás asfixiante).

- "tortura" - Como nos ensina Luiz Regis Prado, a tortura consiste na inflição de mal desnecessário, com o propósito de provocar dor, angústia e grave sofrimento físico à vítima. Cuida-se aqui de meio para a prática do delito de homicídio, e não de delito autônomo (art. 1º, lei 9.455/97). OBS: o art. 1º, § 3º da lei 9.455/97 prevê o crime de tortura qualificado pelo evento morte (crime preterdoloso). O agente tem a intenção de alcançar qualquer objetivo previsto na lei (informação, confissão, impor castigo etc), mas acaba resultando a morte culposa da vítima. Diversa será a situação se o agente com a finalidade de matar, emprega como meio a tortura. * É possível, todavia, concurso material de ambos os crimes, basta ter o agente a intenção de torturar com uma certa finalidade, e após ter conseguido, resolva matar a vítima.

- outro meio insidioso - ocorre quando o agente utiliza qualquer mecanismo para a prática do crime sem que a vítima tenha qualquer conhecimento. É o meio disfarçado, dissimulado. Ex: armadilhas; sabotagem de freios de veículo etc. * Não confundir meio insidioso (inciso III) com modo insidioso (inciso IV).

- meio cruel - a tortura é uma espécie de meio cruel. O meio cruel revela uma brutalidade fora do comum. O agente age por puro sadismo, com o nítido propósito de prolongar o sofrimento da vítima. Mirabete ressalta que o meio cruel poderá ser tanto o sofrimento físico quanto moral. Ex: pisoteamento da vítima; impedimento de sono (Nelson Hungria) etc.

- ou de que possa resultar perigo comum - ocorre quando o agente expõe a perigo um número indeterminado de pessoas. Note-se que a finalidade do agente é a morte e não o perigo comum (Título VIII, Capítulo I). Ver "fogo ou explosivo".

- Inc. IV: (circunstancia objetiva) - o modo insidioso "demonstra maior grau de criminalidade, na medida em que o agente esconde a sua ação e intenção de matar, agindo de forma sorrateira, inesperada, surpreendendo a vítima que estava descuidada ou confiava no agente, dificultando ou impedindo a sua defesa. Dessa forma a qualificadora será afastada sempre que o agente não lograr esconder seu propósito criminoso". - "traição" - Nelson Hungria define como sendo o homicídio cometido mediante ataque súbito e sorrateiro, atingindo a vítima, descuidada ou confiante, antes de perceber o gesto criminoso. Para Bitencourt a traição pode ser física (ataque súbito, ex: tiro pelas costas) ou moral (há quebra de confiança; ex: o agente atrai a vítima a local onde existe um poço). Fernando Capez e Mirabete, todavia, entendem que a traição consubstancia-se essencialmente na quebra de confiança depositada pela vítima do agente, que dela se aproveita para matá-la. Assim, para estes autores, não basta tão-somente o ataque brusco e inesperado, sendo necessário a existência de anterior vínculo subjetivo. Ex: reconheceu-se haver traição na conduta do agente que eliminou a esposa, esganando-a durante o amplexo sexual (RT/458/337).

- "emboscada" = é a tocaia, cilada. O agente aguarda por determinado lapso temporal a passagem ou a chegada da vítima. Verifica-se quando o agente se esconde para surpreender a vítima. A ação é premeditada.

- "dissimulação" = é uma modalidade de surpresa. Para E. Magalhães Noronha, é a ocultação do próprio designo, o disfarce que esconde o propósito delituoso: a fraude que precede, então à violência. Na dissimulação, o criminoso pode agir com falsas mostras de amizade ou, de outra forma, iludir a vítima, fazendo com que esta não desconfie da intenção do agente. Pode ser material (ex: o agente se disfarça de "mata-mosquito" e adentra na residência da vítima) ou moral (o agente age com falsas mostras de amizade).

- "outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido" - trata-se de interpretação analógica. Poderá ser a surpresa. Esta será qualificadora desde que impossibilite a defesa da vítima. Por vezes, a surpresa confunde-se com traição. Por exemplo, matar a vítima dormindo, ora pode caracterizar traição, ora surpresa, dependendo do caso concreto. Assim, caso o agente conviva sob o mesmo teto poderá ser traição.

- Inc.V: trata-se de qualificadora subjetiva, pois diz respeito ao motivo determinante do crime. Para Bitencourt, é irrelevante que o autor do homicídio aja no interesse próprio ou de terceiro. É uma espécie de motivo torpe em que há conexão (é o liame subj. ou obj. que liga 2 ou + crimes). A conexão pode ser teleológica (é argumento que relaciona um fato com sua causa final) ou conseqüêncial (é o que sucede um outro crime).

- "Para assegurar a execução de outro crime" - trata-se de conexão teleológica. O homicídio é praticado com o fim de 'assegurar a execução' de outro crime. Ex: matar o marido para estuprar a esposa. Neste caso o agente responderá por ambos os crimes em concurso material.

- "Para assegurar a ocultação de outro crime" - trata-se de conexão conseqüêncial. O homicídio é praticado com a finalidade de impedir que se descubra o crime por ele praticado. O sujeito visa impedir a descoberta do crime. Ex: agente mata o perito que vai apurar apropriação indébita praticada por aquele.

- "Para assegurar a impunidade de outro crime" - trata-se de conexão conseqüêncial. Nessa hipótese já se sabe que um crime foi praticado, porém não se sabe quem o praticou. Ex: agente mata a testemunha que pode identificá-lo como autor de um outro crime. O crime é conhecido, mas a autoria não.

- "Para assegurar vantagem de outro crime" - trata-se de conexão conseqüêncial. O agente visa garantir a fruição de vantagem, econômica ou não, advinda da prática de outro crime. Ex: "Pedro mata João, que descobrira sua falsa identidade, para continuar passando por Ricardo, que seqüestrara, a fim de, por ele, receber um título honorifico".

OBS: Para Fernando Capez, se o homicídio for praticado para assegurar a execução, ocultação, impunidade ou vantagem de uma contravenção penal, não incidirá a qualificadora em questão, podendo incidir o motivo torpe ou fútil, conforme o caso concreto.

Concluindo, as qualificadoras integram a própria figura típica, razão pela qual devem ser abrangidas pelo dolo, podendo, conseqüentemente, ser excluídas pela ocorrência de erro. "Assim, por exemplo, a vítima morre por asfixia, que não foi querida, nem mesmo eventualmente, pelo sujeito ativo, mas resultou de erro na execução; não se qualificará o homicídio. O agente deve ter, por exemplo, consciência de que age à traição, de emboscada ou com surpresa para a vítima."

* As circunstâncias objetivas comunicam-se aos co-delinqüentes quando entrarem na esfera de conhecimento destes. * As circunstâncias subjetivas, para aqueles que as consideram como elementares, comunicam-se aos co-delinqüentes quando entrarem na esfera de conhecimento destes (art. 30 do CP). * As circunstâncias subjetivas, para aqueles que não as consideram como elementares, não se comunicam aos co-delinqüentes, mesmo quando entrarem na esfera de conhecimento destes.

OBS: Apesar da divergência doutrinária sobre a possibilidade de coexistência de homicídio qualificado e privilegiado, tem-se admitido na hipótese de circunstância qualificadora objetiva e das que autorizam a diminuição de pena.

CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA DO HOMICÍDIO DOLOSO (art. 121, § 4º) - Trata-se de natureza objetiva. - A lei 8.069/90 (ECA) acrescentou uma causa de aumento de pena quando o agente pratica o homicídio (simples, privilegiado ou qualificado) contra menor de 14 anos (se o homicídio for praticado no dia em que a vítima completa 14 anos, não incidirá a causa de aumento de pena). Como o CP adotou a teoria da atividade (art. 4º), considera-se a menoridade na data da prática da ação delituosa, ainda que outra seja a produção do resultado. É necessário o conhecimento da menoridade da vítima, podendo configurar erro de tipo. - A lei 10.741/03 (estatuto do idoso) acrescentou uma causa de aumento de pena quando o agente pratica o homicídio (simples, privilegiado ou qualificado) contra maior de 60 anos. É necessário o conhecimento da idade da vítima, podendo configurar erro de tipo.

CRIME HEDIONDO - LEI 8072/90, ART. 1, I. Originalmente, diante da pressa do legislador em editar a lei, o crime de homicídio (que procura proteger o maior dos bens jurídicos, que é a vida) não foi incluído no rol dos crimes hediondos. A inclusão do homicídio deu-se através da lei 8930/94. Basicamente foram duas as inclusões: homicídio simples quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio (homicídio do exterminador, ex: Vigário Geral, e Candelária) e também nas hipóteses de homicídio qualificado, nos termos do § 2º do art. 121 do CP. Vale ressaltar que o legislador falhou ao não definir o que se deva entender por grupo de extermínio. * Detalhe importante: a lei 8072/90, em seu art. 1º, parágrafo único já considera o genocídio (arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 2.889/56) como sendo crime hediondo. A diferença entre o genocídio e o crime de homicídio do exterminador, é que no genocídio o objetivo do agente é o de acabar com determinados grupos de pessoas por motivos étnicos, raciais ou religiosos. No homicídio do exterminador, o sujeito elimina pessoas pelos mais variados motivos; não que ele queira acabar com determinado grupo de pessoas. Ex.: Vigário Geral e Candelária. Em relação ao grupo de extermínio, a doutrina diverge, pois há quem afirme que deveria ser no mínimo de três pessoas, embora o sujeito possa agir sozinho. Outro aspecto é o extermínio que a jurisprudência afirma ser pelo menos a morte de duas pessoas.

O homicídio sendo qualificado é crime hediondo também, mas o crime de homicídio qualificado-privilegiado, que ocorre quando há circunstância subjetiva que torne o crime privilegiado e circunstância objetiva que qualifique o crime, pelo entendimento do STF este crime não será hediondo, pois a presença do privilégio retira a hediondez do homicídio qualificado.

OBS: Quando o homicídio configurar crime político, revestido das circunstâncias previstas na Lei de Segurança Nacional, a lei competente será a lei nº 7.170/83, art. 2º e 29.

PENAL. JÚRI. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO -QUALIFICADO. POSSIBILIDADE. Não há incompatibilidade na coexistência de circunstâncias que qualificam o homicídio e as que o tornam privilegiado. Pode o Júri reconhecer concomitantemente que o réu agiu sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, e que empregou um meio que dificultou ou impossibilitou sua defesa. (STJ, 5ª Turma, rel. Min. Edson Vidgal, em 18.12.95 - Rec. Esp. 30.947 - MS Registro nº 92.0033775 - 9).

REVISÃO DE PENAL I

DOLO - é a vontade livre e consciente dirigida a realizar a conduta prevista no tipo penal. A consciência é o momento intelectual, o agente quer praticar o crime com todos os elementos do tipo. A vontade é outro elemento necessário para a configuração do dolo, é o elemento volitivo, é a decisão a respeito de realizar o delito.

A regra do nosso CP está no § único do art. 18. Todos os crimes são dolosos, somente havendo a possibilidade de punição pela prática de conduta culposa se a lei assim o prever expressamente. Ex. Art. 163, crime de dano, não há modalidade culposa.

ESPÉCIES DE DOLO - direto e indireto 1) Dolo direto - o agente quer praticar a conduta descrita no tipo. Pode ser de primeiro e segundo grau: Dolo direto de primeiro grau é o dolo direto em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos, e em relação aos efeitos colaterais, representados como necessários, é classificado como de segundo grau.

Ex. "A", terrorista internacional, querendo matar "B", importante autoridade pública, sabendo que este faria uma viagem de cunho político, coloca um explosivo no avião e este explode. Neste caso, não somente ocorre a morte de "B", como também de todas as pessoas que estavam no avião. O dolo referente a "B" é de 1º grau, pois que a conduta foi dirigida para causar a sua morte, com relação às demais pessoas, "A" sequer as conhecia, porém em razão do meio por ele escolhido, a morte dessas pessoas era certa, ou seja, a certeza com relação aos efeitos colaterais faz com que o dolo seja direto, porém de 2º grau.

2) Dolo indireto - pode ser alternativo ou eventual Alternativo - a vontade do agente. não se dirige a certo e determinado resultado, pode ser um ou outro resultado. Ex: A, a certa distância, efetua disparos contra duas pessoas, querendo matar uma ou outra. Eventual: o suj. assume o risco de produzir o resultado. Admite e aceita o risco de produzi-lo. O agente não quer o resultado diretamente, mas se ocorrer, "tanto faz".

3) Dolo geral (hipótese de erro sucessivo) - quando o agente acredita haver consumado o delito quando na realidade o resultado somente se produz por uma ação posterior, com a qual buscava encobrir o fato. Ex. "A" após desferir golpes de faca na vítima, supondo-a morta, joga seu corpo em um rio, vindo esta, na realidade, a falecer por afogamento. Como o agente atuou com dolo de matar, deverá responder por um único crime de homicídio doloso, independente da ocorrência de resultado aberrante. OBS: dolo genérico e específico - com a adoção da teoria finalista da ação, todo o tipo penal há uma finalidade que o difere do outro, razão pela qual, atualmente, tal distinção é irrelevante.

CULPA (ART. 18, II) - o agente tem uma conduta voluntária (ação ou omissão) que produz um resultado antijurídico não querido, mas previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, com a devida atenção, ser evitado, agindo com imprudência, negligencia ou imperícia, deixando de observar o dever de cuidado.

A conduta não é dirigida à pratica de um crime. Ex. "A", querendo chegar mais cedo em casa, imprime velocidade excessiva em seu veículo, e em virtude disso atropela e mata uma pessoa. A finalidade dele não era dirigida à prática de um crime, mas por deixar de observar um dever de cuidado, atinge um resultado que, embora previsível, não foi querido.

Para que se possa falar em culpa, é preciso que o agente pratique uma conduta que infrinja um dever de cuidado objetivo, e por conseguinte, venha a causar um resultado naturalístico penalmente relevante, que tenha nexo de causalidade entre a conduta praticada e o resultado, e que este seja previsível.

Diz-se que no crime culposo o agente não prevê aquilo que lhe era previsível, pois se o fato escapar totalmente à previsibilidade do agente (do homem médio), o resultado não lhe poderá ser atribuído, mas sim ao caso fortuito ou à força maior.

Elementos da culpa - imprudência, imperícia e negligência -

1) imprudente seria a conduta positiva praticada pelo agente que, por não observar o seu dever de cuidado, causasse o resultado lesivo que lhe era previsível.

2) negligência - ao contrário, é um deixar de fazer aquilo que a diligência normal impunha. Ex. Motorista que não conserta os freios já gastos de seu automóvel ou o pai que deixa arma de fogo ao alcance de seus filhos menores.

3) imperícia - é uma inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte ou profissão, geralmente está ligada à profissão.

CULPA CONSCIENTE E CULPA INCONSCIENTE

A culpa inconsciente é a culpa comum, a que o agente deixa de prever o resultado que lhe era previsível. Já a culpa consciente é aquela que em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta acreditando, sinceramente, que este resultado não venha a ocorrer. O resultado, embora previsto, não é assumido ou aceito pelo agente, que confia na sua não ocorrência.

DIFERENÇA ENTRE CULPA CONSCIENTE E DOLO EVENTUAL - na culpa consciente, o agente, embora prevendo o resultado, acredita sinceramente na sua não ocorrência; o resultado previsto não é querido ou mesmo assumido pelo agente. Já no dolo eventual, embora o agente não queira diretamente o resultado, assume o risco de vir a produzi-lo, se este vier a acontecer, pouco importa.

CULPA IMPRÓPRIA - ocorre nas chamadas descriminantes putativas em que o agente, em virtude de erro evitável pelas circunstâncias, dá causa dolosamente a um resultado, mas responde como se tivesse praticado um delito culposo (ver segunda parte do § 1º do art. 20). Ex. Pai, que colocou seu filho de castigo, proibindo que este saísse de casa. Durante a madrugada, escuta um barulho como se um ladrão estivesse invadindo sua residência. Imediatamente pega uma arma e atira no vulto, julgando ser um ladrão, quando na verdade era seu filho. A situação de invasão somente existia na imaginação do pai, entretanto, esse erro poderia ser evitado? Se inevitável, ficará isento de pena; se evitável, deverá responder a título de culpa. Apesar da conduta ter sido dolosa, é punida como culposa, por isso alguns autores entendem se tratar de uma exceção à regra, ou seja, a possibilidade de tentativa em delito culposo.

Conceito de crime:

O legislador penal não forneceu um conceito de crime, cabendo tal incumbência aos doutrinadores. Façamos uma análise dos conceitos mais importantes: 1) conceito formal - crime é toda conduta humana contrária à lei penal editada pelo Estado, logo, se o agente a viola, se ausente qualquer causa de excludente de ilicitude ou culpabilidade, haverá crime. 2) conceito material - crime é toda conduta humana que viola oss bens jurídicos mais importantes, comprometendo a vida em sociedade. Sobreleva a importância do princípio da intervenção mínima, pois considera os bens mais importantes. 3) conceito analítico - ambos os conceitos anteriores não definem, com exatidão, o que seria crime, desta forma, surge este conceito que analisa as características ou elementos que compõe o crime que são: fato típico + ilícito (ou antijurídico) + culpável (culpabilidade). Quadro demonstrativo (Rogério Greco) FATO TÍPICOANTIJURÍDICO CULPÁVEL(reprovável)Conduta · dolosa/culposa · comissiva/omissivaO fato típico será ilícito ou antijurídico caso não tenha uma excludente de ilicitude. Ilícita, é toda conduta não amparada por uma causa de justificação, como:O fato típico e ilícito será culpável, caso não tenha uma excludente de culpabilidade, tais como:Resultado jurídico e naturalísticoEstado de necessidadeImputabilidade ex. 26Nexo de causalidadeLegítima defesaPotencial consciência da ilicitude do fato *Tipicidade (adequação do fato à norma) · formal · conglobante Estrito cumprimento do dever legal / exercício regular de direito. (além das causas supralegais como o consentimento do ofendido sobre bem disponível)Exigibilidade de conduta diversa o 121, §3o - HOMICÍDIO CULPOSO

O homicídio admite a forma culposa, desde que presentes os seguintes requisitos:comportamento humano voluntário; descumprimento do dever de cuidado objetivo; previsibilidade objetiva do resultado; morte involuntária. 1) Conduta voluntária - Na conduta dolosa, há uma ação ou omissão voluntária dirigida a uma finalidade ilícita; o agente quer ou assume o risco da produção do resultado danoso. Na conduta culposa, há uma ação voluntária dirigida a uma finalidade lícita, mas pela quebra do dever de cuidado a todos exigidos, sobrevém um resultado diverso do pretendido. 2) Descumprimento do dever de cuidado - se a conduta do agente afastar-se daquela prevista na norma social, haverá a quebra do dever de cuidado e, conseqüentemente, a culpa. 3) previsibilidade objetiva do resultado - é essencial que as conseqüências da ação humana sejam previsíveis. O Direito somente pode censurar o indivíduo que não previu o que poderia ter sido previsto. Previsibilidade objetiva é a possibilidade de qualquer pessoa dotada de prudência mediana prever o resultado. A culpa com a previsibilidade subjetiva é a culpa consciente, soma a objetiva + subjetiva = sujeito, antes de cometer a ação, imagina que aquele resultado possa ser atingido, o que não há na culpa é a admissibilidade desse resultado, porque se houvesse seria dolo. 4) morte involuntária - resultado não pretendido pelo agente.

Culpa: modalidades: imprudência (é o atuar sem precaução, precipitado), negligência (abstenção de um comportamento que era devido) e imperícia (falta de conhecimentos técnicos ou habilitação para o exercício da profissão). Tentativa: a modalidade culposa não admite tentativa (salvo culpa imprópria)

Princípio da confiança - todas as pessoas devem esperar por parte de outras que estas sejam responsáveis e ajam de acordo com as normas da sociedade, visando a evitar danos a terceiros. Ex: nas intervenções médico-cirúrgicas, o cirurgião tem de confiar na assistência correta que costuma receber dos seus auxiliares, de maneira que, se a enfermeira lhe passa uma injeção com medicamento trocado e, em face disso, o paciente vem a falecer, não haverá conduta culposa por parte do médico.

* Omissão imprópria - esta pressupõe um agente garantidor. Ex. um banhista está no mar fazendo sinais de socorro para o salva-vidas, este vira para um colega e diz: "está vendo aquele cara, todo dia ele faz isso, aí eu pulo no mar e ele começa a rir!" Só que neste dia era verdade. Então, temos que analisar qual a motivação da omissão. No caso acima não poderemos falar em dolo, mas como ele pensou: "hoje esse banhista me paga", ele não quis nem achou que fosse verdade, mas era = erro de tipo evitável, exclui o dolo, mas como existe a modalidade culposa responde por homicídio culposo (culpa imprópria).

o 121, §4o (homicídio culposo e aumento de pena) A causa de aumento do d 4o ocorre nas seguintes hipóteses: 1) se o evento resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte, ofício ou atividade - A inobservância de regra técnica e a imperícia são diferentes, pois na imperícia o sujeito não tem o conhecimento que deveria ter, pressupõe inabilidade ou insuficiência profissional. Enquanto que na inobservância de regra técnica, o sujeito conhecia a regras, no entanto, não a utiliza. Ex. médico que foi contratado justamente porque é perito em tal cirurgia, e falhou grosseiramente causando a morte culposa. 2) se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima - o agente após ter dado causa ao evento culposo, omite-se no socorro necessário a evitar que a vítima continue a correr perigo de vida ou de saúde. Ex: operário de uma obra em construção, em local ermo, que de forma descuidada deixa cair o andaime sobre o seu único colega que se encontra no local, e que se omite em prestar-lhe imediato socorro, deixando-o à própria sorte, a qual vem a falecer horas depois. É diferente do art. 135, pois aqui a mesma pessoa que criou a situação é obrigada a socorrer. * se a vítima for socorrida por terceiros, há duas posições: a) não subsiste a causa de aumento de pena, na medida em que só terá incidência quando não houver possibilidade de a vítima ser socorrida (JTACrimSP, 79/358, 98/208; RT, 543/383, 554/412). b) subsiste a majorante ainda que a vítima tenha sido socorrida, pois esta tem natureza subjetiva, pretendendo punir mais severamente o agente que, após realizar uma conduta culposa, dolosamente omite socorro.( JTACrimSP, 82/336; RT, 571/359, Fernando Capez) 3) o agente não procura diminuir as conseqüências de seu ato - é redundante, pois a causa anterior já engloba esta possibilidade. 4) se o agente foge para evitar prisão em flagrante (art. 301 ao 310 do CPP)- a reprovação consiste no fato de que, a fuga do agente dificulta o trabalho da apuração do crime.

*Homicídio culposo na direção de veículo automotor - lei nº 9.503, art. 302 (CTB).

O homicídio culposo do CP não se confunde com o homicídio culposo na direção de veículo automotor que será punível pelo CTB. Este é mais específico. Se ocorrer em via particular, também será CTB, pois nos crimes do CTB que o legislador quis exigir via pública, ele o fez expressamente, como a embriaguez ao volante, por exemplo. Não obstante o CTB não ter previsto a possibilidade de perdão judicial, o art. 291 prevê a aplicação subsidiária das regras gerais do CP. Esta matéria será mais bem estudada em Penal V!

o 121, §5o - trata do perdão judicial. A pena, segundo o art. 59, tem uma finalidade repressiva e preventiva. No homicídio culposo, essa finalidade repressiva já foi atingida, pois a própria pessoa se reprime, sente-se culpada. Podendo o juiz deixar de aplicar a pena. Para grande parte dos doutrinadores, não é uma atividade discricionária do juiz, ele deve aplicar. E assim vai extinguir a punibilidade do sujeito (art. 107, IX e 120 do CP e súmula 18 do STJ). As conseqüências a que se refere o § 5º podem ser: a) físicas (o agente também acaba sendo lesionado de forma grave) b) morais (dizem respeito à morte de familiares e pessoas ligadas por afinidades ao agente)

OBS: Para o STF a sentença que concede o perdão tem natureza condenatória - afasta apenas o efeito principal da conddenação e a reincidência, permanecendo os efeitos secundários. Para o STJ (súmula 18) tem natureza declaratória, afastando todos os efeitos da condenação.

AÇÃO PENAL 1) Homicídio doloso - A competência do julgamento dos crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri - art. 5º, XXXVIII, "d", da CF/88 e arts.. 406 e s. do CPP. 2) Homicídio culposo - ação penal pública incondicionada (art. 100 do CP). Segue o procedimento sumário previsto no art. 539 do CPP. Em virtude de a pena mínima ser de 1 ano cabe suspensão condicional do processo (lei 9.099/95).

EXERCÍCIOS:

1) Mévio, pretendendo matar Tício, seu pai, com o objetivo de herdar a herança, dispara contra este, vindo, porém, a acertar pessoa diversa, Beto, por erro na execução. Considerando que Beto morreu, como deverá ser tipificada a conduta de Mévio? 2) JOÃO contrata ALBERTO para matar JUCA, tendo em vista não ter coragem, pelas próprias mãos, de executar o delito. Combinado o preço a ser pago após a consumação deste, dirige-se ALBERTO para a casa de JUCA que, uma vez saindo para o trabalho, resta atingido, pelas costas, por três disparos, circunstância (meio) executória esta de conhecimento de JOÃO. O motivo que ensejou o delito foi uma antiga desavença entre JOÃO e JUCA acerca da propriedade de uma cadela "vira-lata", circunstância esta desconhecida por ALBERTO. a) Qual a tipificação legal do delito praticado por JOÃO? Responda justificadamente, apontando os dispositivos legais pertinentes. b) Qual a tipificação legal do delito praticado por ALBERTO? Responda justificadamente, apontando os dispositivos legais pertinentes 3) MARIA, ao passear pela rua com sua filha ROSA, é abordada por JUCA que aponta uma arma para a cabeça de ROSA, ameaçando matá-la, caso MARIA não lhe traga certa quantidade de cocaína. MARIA, após comprar certa quantidade de cocaína, é presa. Tipifique a conduta de MARIA E JUCA. Justifique sua resposta.

4) JOÃO, desejando matar seu desafeto BETO, dispara contra este, momento em que é preso. Após o exame devido, restou comprovado que BETO morrera minutos antes em razão do veneno que havia ingerido. Tipifique a conduta de JOÃO.

5) O chamado homicídio passional admite o reconhecimento de causa de legítima defesa da honra? Justifique.

ART. 122 - DA PARTICIPAÇÃO NO SUICÍDIO: O suicídio que é a "deliberada destruição da própria vida", ou a tentativa de suicídio não são consideradas condutas delitivas, mas a participação de terceiros em atos dessa natureza constituem fato punível. Assim, o induzimento, a instigação ou o auxílio a suicídio estão previstos no art. 122 do CP como crime autônomo. Como assevera Luiz Regis Prado, "embora atípico, o suicídio é fato ilícito, de modo que não constitui constrangimento ilegal a coação exercida para impedi-lo (art. 146, § 3º, II do CP)."

Bem jurídico tutelado - a vida humana. Sujeito ativo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, não requerendo nenhuma condição particular. Não se trata de punir o partícipe do suicídio alheio, uma vez que o suicídio não é crime, mas sim de puni-lo como autor do crime, pois cometeu a conduta descrita na norma incriminadora. Sujeito passivo - pode ser qualquer ser humano vivo. Não obstante, é indispensável que se trate de pessoa determinada, ou determinável grupo de pessoas. O induzimento genérico não caracteriza crime do art. 122 do CP. *A vítima não pode sofrer qualquer vício de consentimento (fraude, coação física ou moral, erro provocado por terceiro), senão será homicídio (autor mediato). Também se entende que a vítima deve ter alguma capacidade de entendimento da natureza do ato praticado, se for por exemplo um louco, ou criança (menor de 14), o crime será de homicídio pela autoria mediata. Tipo objetivo: a conduta típica consiste em induzir, (suscitar, fazer surgir uma idéia inexistente) instigar (animar, estimular, reforçar uma idéia existente) ou auxiliar (ajudar materialmente) alguém se suicidar. Induzir, instigar e auxiliar, que teoricamente representariam mera atividade de partícipe, neste tipo, constituem o núcleo do tipo penal. Ainda que as várias condutas sejam praticadas, o sujeito ativo praticará um único crime (conteúdo variado). Assim, quem realizar qualquer destas ações, em relação ao sujeito ativo, não será partícipe, mas autor do crime, desde que tenha eficiência causal. Por isso, é um equívoco falar-se em participação quando se trata de um único sujeito ativo. *A conduta prevista no art. 122 é acessória (circunscreve a esfera dos atos preparatórios), ocorrendo qualquer ato de execução por parte de outra pessoa, o crime não será de participação no suicídio e sim homicídio.

Alguém significa outro ser humano, além do sujeito ativo. O suicídio em si mesmo não é crime. Matar-se é atípico. Concurso de pessoas - Nada impede que alguém desempenhe a atividade de partícipe, instigando, induzindo ou auxiliando o sujeito ativo a realizar uma das condutas descritas no tipo. Mas, nesta hipótese, não estará desenvolvendo sua ação diretamente relacionada à vítima, mas sim em relação ao autor material do fato. Tipo subjetivo: o dolo e o elemento subjetivo do tipo visando a conduzir a vítima ao suicídio. Alguns autores, entre eles Fernando Capez, admitem também o dolo eventual. Inserem-se aqui os maus-tratos sucessivos infligidos contra a vítima. Consumação e tentativa: 1ª) Para Nelson Hungria, Luiz Regis Prado e outros, "consuma-se com a instigação, o induzimento ou o auxílio prestado (delito instantâneo e de mera conduta). A aplicação concreta da pena, todavia, está sujeita à superveniência do evento morte ou lesão corporal grave." Assim, o resultado morte ou lesão grave é tão-somente condição objetiva de punibilidade. Por vezes, a lei penal, ao incriminar um fato e cominar a pena correspondente, condiciona a imposição desta a um determinado acontecimento (condição de punibilidade). Esta não constitui requisito do delito, mas apenas diz respeito à imposição da sanção penal, posto que o crime já está perfeito em todos os seus elementos estruturais. Dessa forma, a eventual inocorrência da morte ou lesão grave não descaracteriza o crime, mas impede a imposição efetiva da sanção penal. A tentativa é impossível, pois se o agente praticou os atos descritos no tipo o crime se consumou. Se o suicídio não se consuma ou se da tentativa não advém lesão corporal grave, não será possível a aplicação da pena, pois inexistirá punibilidade.

2ª) Para Fernando Capez, E. Magalhães Noronha, Damásio e outros - estamos diante de um crime material que exige a produção do resultado morte ou lesão corporal grave. Se houver lesão corporal leve ou se a vítima não sofre lesão, o fato é atípico, logo o problema não é de punibilidade, mas de atipicidade. Para estes autores, a conseqüência lesiva não é condição objetiva de punibilidade, por ser querida pelo agente, seu dolo. Como crime material que é, em tese, admitiria a tentativa. No entanto, se trata de uma figura complexa que prevê no próprio tipo a sua forma tentada, que poderíamos chamar de tentativa qualificada, na medida que a pune se decorrer lesão de natureza grave. Em síntese, não admite tentativa de participação em suicídio.

Suicídio conjunto - O pacto de morte, no caso de casal que tenta o suicídio pela ingestão de gás, o sujeito que abriu o gás, responderá pelo homicídio tentado ou consumado, enquanto que aquele que instigou, auxiliou ou participou responderá pela participação no suicídio, desde que haja lesão corporal grave ou morte do outro.

*Suicídio a dois, um atira no outro (há uma instigação ao suicídio, mas quem realiza o ato executório é o outro, então é homicídio. Se ambos sobrevivem, será 121 tentado. *No caso de roleta russa, ou duelo americano (2 armas uma carregada e outra não) os sobreviventes respondem pela participação em suicídio.

Classificação: 1) crime comum; 2) comissivo e para alguns autores, como Bitencourt, omissivo (sustenta que o auxílio a suicídio por omissão é, em tese, admissível, se o omitente é agente garantidor ex: médico que diante da greve de fome do paciente deixa de lhe aplicar medicamento forçado - art. 146, § 3º); 3) crime de dano; 4) material (corrente majoritária); 5) instantâneo; 6) doloso; 7) de conteúdo variado.

122, p.ú., I - Se o motivo for egoístico, como o recebimento de uma herança, ambição de lucro, inveja, eliminar concorrente, por exemplo, a pena poderá ser duplicada. 122, p.ú., II se a vítima tiver entre 14 e 18 anos será duplicada a pena (corrente majoritária). Se for menor será homicídio. Essa conclusão é extraída do art. 224, "a" do CP, que não considera válida a manifestação de vontade do menor de 14 anos. Assim, se a vítima tiver mais de 18 anos, aplica-se o caput. Se a vítima não for maior de 14 anos, como o seu consentimento é irrelevante, o crime é de homicídio.

- Capacidade de resistência diminuída. EX: induzir ao suicídio vítima embriagada. Aqui, a embriaguez deve apenas diminuir essa capacidade. Se a embriaguez anula completamente tal capacidade, o agente comete 121 e não 122. Idoso, vítima doente e etc)

Ação penal - ação penal pública incondicionada. Por se tratar de crime doloso contra a vida, insere-se na competência do Tribunal do Júri, seguindo o procedimento do art. 406 e s. do CPP.

Jurisprudência: "Não há auxílio por omissão. Prestar auxílio é sempre conduta comissiva. A expressão usada no núcleo do tipo (a prestar-lhe auxílio para que o faça) do art. 122 do CP impede a admissão do auxílio omissivo" (TJSP - Rec - Rel - Hoppner Dutra - RT 491/285) no mesmo sentido: RT 444/327 "Suicídio - tentativa frustrada - pretendida responsabilização do agente pelas infrações residuais - Porte de armas e disparo em via pública - Se o agente não pretendeu aumentar a capacidade de ataque a terceiros com o porte de armas, nem provocar o desassossego público com a efetuação de disparar a esmo em via pública, mas unicamente pôr cobro à própria vida, as mesmas razões de política criminal que descriminam o suicídio frustro desaconselham a punição das infrações residuais"(TACRIM - SP - AC - Rel. Régio Barbosa - BMJ 67/13). No mesmo sentido : JUTACRIM 97/343 e RJD 2/194.

ART. 123 - DO INFANTICÍDIO:

Bem jurídico tutelado - a vida humana. Sujeito ativo: trata-se de crime próprio. Só a mãe puérpera pode, durante ou logo após o parto, praticar o crime. Deve haver uma relação de causalidade entre a morte do neonato e o estado puerperal (se não houver, existirá homicídio). Não cabe a agravante do 61, II, "e" e "h", pois integram a descrição típica do próprio infanticídio.

O reconhecimento de estado puerperal deve ser interpretado de maneira suficientemente ampla, de modo a abranger o variável período do choque puerperal. O logo após que a lei prevê é o imediatamente, incontinente, embora exija interpretação que seja enquanto durar o estado puerperal. (ver exposição de motivos nº 40). Cabe à perícia médica determinar se a conduta foi realmente impulsionada pelas perturbações físicas e psíquicas decorrentes do parto. Fernando Capez assevera que, havendo dúvida acerca da existência do puerpério, o delito de infanticídio não deve ser afastado, uma vez que incide aqui o princípio do in dubio pro reo. OBS: Pode ocorrer que, além das psicoses que afloram na mulher durante o parto ou logo após, outras psicoses já presentes anteriormente na genitora se aflorem agravadas pelo puerpério. Nessa hipótese, poderá incidir a inimputabilidade (art. 26, caput) ou a semi-imputabilidade (art. 26, § único).

Sujeito passivo - somente o próprio filho recém-nascido, ou o feto que está nascendo. O feto sem vida não pode ser sujeito passivo. OBS: se a mulher mata outra criança pensando ser seu filho, responderá pelo infanticídio, é o infanticídio putativo (art. 20, § 3º do CP). Elemento subjetivo - é um crime doloso. Não existe a modalidade culposa. Se a mãe ainda no estado puerperal mata a criança de forma culposa, há duas correntes: 1ª) Damásio- o fato é atípico e a mãe não deverá responder por crime algum, uma vez que há incompatibilidade entre o estado puerperal e o dever de cuidado dirigido a todos. 2ª) Nelson Hungria, Bitencourt e Fernando Capez- responde por homicídio culposo, o fato objetivamente previsível e a conduta imprudente, negligente ou imperita fazem parte do crime culposo.

Indaga-se se o "estado puerperal" comunica-se no caso de concurso de agente, ou seja, se é possível a co-autoria ou a participação no infanticídio. Há 2 correntes:

1ª) Heleno C. Fragoso e A. Mayrink da Costa - Não há a possibilidade de concurso de pessoas, pois o art. 30 diz que não se comunicam as circunstancias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime, e estado puerperal é elementar de natureza personalíssima, é condição personalíssima que atenua a culpabilidade, que não pode ser estendida aos co-autores e partícipes. Estes, realizando atos de execução, ou auxiliando, respondem pelo 121. 2ª) Damásio, Magalhães Noronha, Delmanto, Nelson Hungria - É possível - Embora seja uma condição peersonalíssima, trata-se de condição elementar do crime. Integra o tipo como seu elemento essencial. Se eliminada essa elementar resta o crime de 121. Pelo art.30,comunica-se ao co-autor ou ao partícipe. OBS:. O tipo penal do art. 123 deixa claro que a mãe mata o filho em estado puerperal, e é discutida a participação ou co-autoria de terceiro. Entretanto, se o terceiro realiza o núcleo matar a criança com a participação da mãe, deve responder por homicídio, mas neste caso, em relação à mãe, são duas as soluções:

1o) (Regis Prado) O terceiro responde por 121 e a mãe como partícipe do 121. Teoria Monística do concurso de agentes - art. 29 do CP. "Recomenda-se, de conseguinte, a aplicação pelo magistrado da pena mínima cominada ao homicídio, diminuída de um sexto a um terço se a participação da mãe for de menor importância (art. 29, §1o do CP). 2o) (Fernando Capez) O terceiro responde por 121 e a mãe por 123. Seria uma exceção à regra Monística, baseado no princípio da proporcionalidade, pois, se ambos respondessem por 121, haveria uma incongruência nas penas, já que a mãe que mata (ato executório) responde por 123 (pena mais branda) e, a mãe que participa do homicídio de terceiro responde por participação em 121 (pena mais severa).

OBS: Aborto ocorre antes do início do parto. A partir de seu início haverá infanticídio. O parto inicia-se com a dilação do colo do útero e termina com a completa separação da criança do organismo materno, com a expulsão da placenta e o corte do cordão umbilical. Classificação : O infanticídio é um crime material, doloso, direto ou eventual, cuja tentativa é admissível. A conduta pode ser comissiva (Ex: sufocação, estrangulamento, traumatismo) ou omissiva (Ex: falta de aleitamento). A ação penal é pública incondicionada, competindo ao tribunal do júri o seu julgamento.

Jurisprudência: "responde por infanticídio a progenitora que, após o nascimento do filho, não presta os cuidados indispensáveis à criança, deixando de fazer a ligadura do cordão umbilical seccionado" (TACRIM - SP - AC - Rel. Lauro Alves - JUTACRIM 49/187)) "o reconhecimento do estado puerperal deve ser interpretado de maneira suficientemente ampla, de modo a abranger o variável período do choque puerperal. A influência deste estado é efeito normal e corriqueiro de qualquer parto e, dada a sua grande freqüência, deve ser admitido sem maior dificuldade" (TACRIM-SP-AC-Rel. Fernandes Braga - JUTACRIM 83/383)

EXERCÍCIOS: 1) TÍCIO, pretendendo matar-se com um tiro de revólver, dispara em direção de seu ouvido, mas erra o alvo, acertando MÉVIO que, posteriormente, morreu em decorrência do tiro recebido. Qual a solução jurídica? 2) TÍCIO induz MÉVIO, débil mental, a suicidar-se. MÉVIO cometeu o suicídio com o incentivo de TÍCIO. Qual a solução jurídica? 3) É possível o concurso de pessoas no crime de infanticídio? Em sendo possível, qual pena deve ser aplicada ao partícipe: a cominada ao crime de infanticídio ou a prevista para o caso de homicídio? (MP-MG - XI Concurso de Ingresso) 4) JUCA, com o auxílio de MARIA ainda em estado puerperal, mata a criança recém-nascida. Qual a solução jurídica? 5) MARIA, após o nascimento de seu filho e em estado puerperal, praticou atos executórios de matar em outra criança, supondo tratar-se do próprio filho. Qual a solução jurídica?

DO ABORTO - considerações gerais:

Consiste na interrupção da gravidez, ou na expulsão prematura do feto, resultando em qualquer caso, a morte deste. É a eliminação da vida intrauterina. A lei não faz distinção entre óvulo fecundado, embrião ou feto, pois em qualquer fase da gravidez estará configurado o crime de aborto. Vale ressaltar, porém, que sob o prisma jurídico, a corrente majoritária afirma que a gestação tem início com a implantação do óvulo fecundado no endométrio, ou seja, com a sua fixação no útero materno. Por esta razão, não se pune a conduta de quem utiliza alguns métodos para evitar a gravidez que atuam após a concepção, obstando a implantação do ovo na cavidade uterina, tais como o DIU e algumas pílulas. Como bem ressalta Eduardo Mayr, o aborto é o produto, não deve ser o processo. Processo é o abortamento. Do contrário, seria como se chamássemos crime de homicídio de crime de cadáver. Objeto material - é o ser humano em formação com desenvolvimento fisiológico normal (a gravidez molar - incapaz de produzir uma nova vida- e a extra-uterina - capaz de produzir a morte da gestante - não são consideradas normais, logo não existe crime de aborto nestas circunstâncias). O Código Penal brasileiro adotou a teoria monista ou unitária no que concerne ao concurso de pessoas. Esta teoria distingue autor de partícipe, mas o crime é um só. É o resultado da soma de esforços de cada um. Dessa forma, todos aqueles que concorrem para o crime, incidem nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade (art. 29). Todavia, o legislador, em muitas situações, cindiu o crime, afastando a teoria monista e aplicando a teoria dualista ou pluralista. No crime de aborto, o legislador cindiu e passou a examinar a participação de cada pessoa naquela conduta sob uma ótica diferente. No crime de aborto com o consentimento da gestante, a mulher (ex-grávida) responde pelo crime tipificado no artigo 124 e o terceiro que realiza a intervenção pratica o crime previsto no artigo 126. Note-se que o crime é um só - crime de aborto, mas por haver previsão legal, cada um responderá de forma autônoma por sua conduta. Não obstante, pode suceder que terceira pessoa participe do crime de auto-aborto. A questão, porém, gera controvérsias:

1ª corrente) é admissível participação. Por exemplo, caso a gestante não tenha certeza de que queira realizar essa intervenção e, ao pedir conselhos à sua amiga, esta a instiga de forma decisiva. Essa amiga será partícipe moral do crime da gestante (artigo 124 - o terceiro está aderindo a vontade de quem está consentido). Outro exemplo, seria o médico que para realizar a intervenção utiliza a ajuda de uma enfermeira. Essa enfermeira vai responder pelo mesmo crime do médico (art. 126 - o terceiro está aderindo a vontade de quem está provocando o aborto). OBS: o consentimento da gestante deve ser válido.

2ª corrente) Não é admissível participação no crime do art. 124. O terceiro, ainda que atue como partícipe, induzindo, instigando etc, responde nos termos do art. 126 do CP.

Meios de execução: é crime de ação livre. Poderá ser praticado com a ingestão de substâncias químicas, meios físicos etc. É indispensável a prova de que o ser em gestação se encontrava vivo quando da intervenção abortiva e de que sua morte foi decorrência precisa da mesma. Após o início do parto, a morte dada ao nascente é infanticídio ou homicídio. * Para alguns, o aborto pode, ainda, ser praticado por omissão. Nada obsta, por exemplo, a responsabilização do médico que, dolosamente, deixa de prestar socorro ou assistência devida para evitar o aborto espontâneo ou acidental.

Consumação/ tentativa: por ser crime material, consuma-se com a morte do feto, ainda que venha a ocorrer após a expulsão do útero materno. Basta a afirmação do nexo de causalidade entre as manobras abortivas e a subseqüente morte do feto. A tentativa é possível quando as manobras abortivas não interrompem a gravidez ou provocam apenas aceleração do parto, com a sobrevivência do neonato.

PENAL - HABEAS CORPUS - ABORTO - AUSÊNCIA DE PROVA DA GRAVIDEZ - AÇÃO PENAL TRANCADA - 1. No delito capitulado no art. 124 do CP, para instauração da persecução penal, é imprescindível a prova de sua materialidade. O ônus incumbe ao órgão acusador, não sendo suficiente para este mister, a simples confissão da acusada. Aborto, diz a medicina, é interrupção da gravidez e, portanto, fundamental, essencial, imprescindível o diagnóstico desta como meio de configuração da infração. 2. Ordem concedida para trancar a ação penal. (STJ - HC 11515 - RJ - 6ª T. - Rel. Min. Fernando Gonçalves - DJU 18.12.2000 - p. 00243) JCP.124

Elemento subjetivo - é o dolo direto ou eventual. Consciência e vontade de produzir a morte do feto. O CP não prevê o aborto praticado por motivo de honra. Assim como também não é previsto o aborto culposo. *A única forma de se punir o aborto (cometido por outra pessoa) a título de culpa é o decorrente da lesão corporal como forma qualificadora desta (art. 129, § 2º, inciso V), é a lesão corporal dolosa, seguida pelo aborto culposo, é crime preterdoloso.

Concurso de crimes: 1) apesar de haver entendimento contrário (Fragoso), caso sejam vários os fetos, a morte dada a eles conduz ao concurso de delitos, desde que tal circunstância tenha entrado na esfera de conhecimento do agente. 2) A agressão dirigida à mulher grávida, conhecendo o agente essa circunstância e assumindo a eventual morte do feto como resultado de sua conduta, dá lugar ao concurso formal de crimes. Entretanto, se o agente queria apenas lesar a integridade física da gestante, cuja gravidez conhecia ou não podia desconhecer, e da violência sobrevém o aborto não desejado, o crime será o de lesão corporal gravíssima - art. 129, § 2º, inciso V. 3) A morte dada a gestante, conhecendo o agente essa circunstância, implica concurso formal de crimes - homicídio doloso consumado e aborto praticado sem o consentimento da gestante.

OBS: Não se aplica o 61, II, "h",CP, pois seria bis in idem.

Classificação geral dos crimes de aborto: material (consuma-se com a morte do feto, embrião ou ovo); crime de ação múltipla (a gestante consente no aborto e depois auxilia com emprego de manobras abortivas, responde por um único crime); doloso; de dano; instantâneo; unissubjetivo e plurissubjetivo; plurissubsistente;

A ação penal nos crimes de aborto é pública incondicionada (art. 100) e, por se tratar de crime doloso contra a vida, é de competência do tribunal do júri.

ART. 124 - Auto-aborto e aborto consentido Objeto Jurídico - para a corrente majoritária é o direito à vida do produto da concepção. Elemento objetivo: provocar (dar causa, originar o aborto. Deve ser antes do parto); consentir (permitir que terceiro lhe faça o aborto).

Para Luiz Regis Prado, se a gestante tenta o suicídio, que não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade, e advém a morte do feto, esta deverá responder pelo delito de aborto, se consciente da situação e das conseqüências de seus atos. Bitencourt sustenta a impunibilidade da tentativa de auto-aborto, com o fundamento de que o ordenamento jurídico não pune a auto-lesão.

Sujeito ativo: Para Fernando Capez, Bitencourt etc, somente a gestante pode ser autora, pois trata-se de crime de mão-própria, uma vez que não se pode delegar a outrem a execução do crime, não cabe co-autoria. Para Luiz Regis Prado, Mirabete, Delmanto etc, trata-se de crime próprio.

Sujeito passivo: Para Luiz Regis Prado, Bitencourt e Damásio é o próprio feto, pois a vida é um bem individual e não coletivo. Para Fragoso e Mirabete - o titular do bem jurídico é o Estado quee tem interesse em manter uma elevada quota de natalidade.

ART. 125 - Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante Objeto Jurídico - é o direito à vida do produto da concepção, bem como o direito à vida e à incolumidade física e psíquica da própria gestante. Elemento objetivo: provocar (dar causa, originar o aborto. Deve ser antes do parto); sem o consentimento da gestante (é elementar do crime - ocorrendo erro por parte do terceiro quanto ao imaginado consentimento da gestante, dará ensejo ao erro de tipo e o deslocamento para o art. 126).

"Para provocar aborto sem consentimento da gestante não é necessário que seja mediante violência, fraude ou grave ameaça; basta a simulação ou mesmo dissimulação, ardil ou qualquer outra forma de burlar a atenção ou vigilância da gestante. Em outros termos, é suficiente que a gestante desconheça que nela está sendo praticado o aborto. Essas são formas de ausência de consentimento real, que também pode ser presumida, quando estiverem presentes aquelas condições elencadas no art. 224 do CP."

Outros exemplos da prática desse crime: Pontapé violento no ventre de mulher grávida; homicídio de mulher grávida - o agente responde por 121 + 125 (se sabia da gravidez) em concurso formal de crimes (70) etc.

Sujeito ativo: é crime comum, logo pode ser praticado por qualquer pessoa. Sujeito passivo: Para Luiz Regis Prado, Bitencourt e Damásio ocorre a dupla subjetividade passiva - é o próprio feto, e a gestante. Para Fragoso e Mirabete - o titular do bem jurídico é o Estado e a mulher.

ART. 126 - Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante Objeto Jurídico - para a corrente majoritária é o direito à vida do produto da concepção. Para outros é, também, incolumidade física e psíquica da gestante, uma vez que são bens indisponíveis (Fernando Capez e Delmanto). O 126 e o 124, 2a p são crimes de concurso necessário. Elemento objetivo: provocar (dar causa, originar o aborto. Deve ser antes do parto); com o consentimento da gestante . (consentimento válido expresso ou tácito)

* É essencial que o consentimento da gestante seja válido, ou seja, que ela tenha capacidade penal para consentir.

Sujeito ativo: é crime comum, logo pode ser praticado por qualquer pessoa. Para Luiz Regis Prado, Bitencourt e Damásio é o próprio feto, pois a vida é um bem individual e não coletivo. Para Fragoso e Mirabete - o titular do bem jurídico é o Estado que tem interesse em manter uma elevada quota de natalidade

Parágrafo único do art. 126 - aplica-se a pena do art. 125: a) se a gestante não é maior de 14 anos; b) se a gestante é alienada ou débil mental; c) se o consentimento for obtido mediante fraude (ex. médico diz à gestante que sua gravidez poderá causar sua morte), grave ameaça (dirigida à gestante ou à pessoa próxima) ou violência (a violência aqui é empregada para conseguir o consentimento e não o aborto direto).

Na hipótese a) e b), presume-se a ausência de consentimento. Na hipótese c), a não-concordância é real.

ART. 127 - Forma Qualificada ou causa de aumento de pena? Tecnicamente, o art. 127 não se trata de qualificadora, mas sim causa de aumento de pena, pois na realidade atuará na terceira fase de aplicação da pena, ao contrário das qualificadoras, que fixam os limites mínimo e máximo da pena.

O art. 127 é um crime preterdoloso. O agente tem dolo no aborto (do art. 125 e 126) e culpa (art. 19) na lesão grave (a lesão leve é absorvida) ou morte da mulher. Vale ressaltar que a majoração da pena pode ocorrer ainda quando o aborto não se realiza, sendo suficiente que o resultado majorador decorra das manobras abortivas.

* As lesões graves previstas no art. 127 são aquelas extraordinárias (ex: peritonite, septicemia, gangrena do útero etc), ou seja, não necessárias a causação do aborto; do contrário, o crime de aborto seria sempre qualificado.

Ficam excluídos do art. 127, o auto-aborto e o aborto consentido (art. 124), pois o direito penal brasileiro não pune a auto-lesão. Todavia, como ficará a conduta do partícipe no crime de auto-aborto do qual resulte lesão corporal grave ou morte da gestante? Temos três posições: 1ª) Nelson Hungria - responderá por lesão corporal culposa ou homicídio culposo. 2ª) Magalhães Noronha, Luiz Regis Prado, Mirabete- responderá somente pela participação no delito do art. 124 do CP, já que os crimes culposos não admitem co-autoria e não há participação dolosa em delito culposo alheio. 3ª) Damásio - o partícipe responderá pelo delito previsto no art. 124, além de responder pela lesão corporal culposa ou homicídio culposo, sendo inaplicável o art. 127, uma vez que esta norma exclui os casos do art. 124. Fernando Capez complementa aduzindo ser esta a melhor opção, já que o agente atua na qualidade de autor mediato, pois a gestante funcionou como instrumento de sua atuação imprudente. Assim, o agente responde por participação em auto-aborto em concurso formal com a lesão culposa ou homicídio culposo.

* Ocorrendo a morte da gestante e o aborto tentado: 1ª corrente) - Fernando Capez, Luiz Regis Prado, Bitencourt e outros - a majoração da pena pode ocorrer ainda quando o abortamento não se tenha efetivado, sendo suficiente que o resultado majorador decorra das manobras abortivas. Ademais, não cabe tentativa de crime preterdoloso, pois neste o resultado agravador não é querido, sendo impossível ao agente tentar produzir algo que não quis. Não obstante, o tipo do art. 127 não exige a consumação do aborto, admitindo o aumento da pena aplicada também se a lesão corporal grave ou a morte resultam dos meios empregados para provocá-lo. 2ª corrente) - Fragoso, Aníbal Bruno, Mirabete e outros - referindo-se a lei não só ao aborto, mas aos meios empregados para provocá-lo, responderá o agente pela tentativa de aborto qualificado quando não se consuma a morte do feto, embora ocorra lesão grave ou morte da gestante.

ART. 128 - EXCLUDENTES ESPECIAIS DA ILICITUDE:

I - ABORTO NECESSÁRIO OU TERAPÊUTICO- Não se pune o aborto praticado por médico se não há outro meio de salvar a vida da gestante. Trata-se de causa de exclusão especial da ilicitude e não da culpabilidade, razão pela qual a enfermeira que auxilia o médico no aborto não é punida (teoria da acessoriedade limitada - exige que a conduta principal seja típica e ilícita. Não necessita que o autor seja culpável, pois o fato é comum, mas a culpabilidade é individual).

Consoante a doutrina, trata-se de espécie de estado de necessidade, mas sem a exigência de que o perigo de vida seja atual, pois basta a constatação pelo médico de que a gravidez trará risco futuro para a vida da gestante, tais como câncer uterino, anemia profunda etc. Assim, há dois bens jurídicos (a vida do feto e da genitora) postos em perigo, e a preservação de um depende da destruição do outro.

Assim, caberá ao médico intervir após o parecer de dois outros colegas, devendo ser lavrada ata em três vias, sendo uma enviada ao Conselho Regional de Medicina e outra ao diretor clínico do nosocômio onde o aborto foi praticado.

Para Fernando Capez é dispensável a concordância da gestante ou do representante legal, podendo o médico intervir à revelia deles. Ademais o art. 146, § 3º, I do CP autoriza a intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por "iminente perigo de vida".

* Enfermeiro (a) ou parteiro (a) como sujeito ativo - a excludente do art. 128 abrange somente a conduta principal do médico e da enfermeira quando esta for partícipe. Ocorre que, a enfermeira e a parteira não responderão pelo delito de aborto se atuarem em estado de necessidade de terceiro (art. 24 do CP), sendo que, nesse caso, exige-se que o prosseguimento da gravidez acarrete perigo atual e inamovível, pois se o perigo não for atual, a conduta será criminosa, tendo em vista que o inciso I do art. 128 tem como destinatário exclusivo o médico, a quem cabe fazer o prognóstico de detecção de prejuízo futuro à vida da gestante.

II - ABORTO HUMANITÁRIO - trata-se de aborto praticado pelos médicos nos casos em que a gravidez decorreu de um crime de estupro, a enfermeira que auxilia o médico no aborto não é punida. Assim, o Estado não pode obrigar a mulher a gerar um filho que é fruto de uma violência sexual, gerando graves danos psicológicos a esta. Sustenta-se que a conduta do médico está amparada pela excludente de ilicitude - exercício regular do direito.

Vale ressaltar que o mesmo motivo que levou o legislador a permitir o aborto quando a gravidez é resultante de estupro, aplica-se quando a gravidez se dever ao fato de ter sido a mulher vítima de atentado violento ao pudor. Assim, não havendo previsão expressa para a permissão do aborto em caso de atentado violento ao pudor, mas existindo outra norma que regule hipótese muito parecida com aquela, devemos nos socorrer da analogia in bonam partem para que possamos tratar situações iguais, ou pelo menos muito parecidas, de forma igual, não permitindo que a falha do legislador nos leve a soluções absurdas e desiguais.

* no aborto humanitário, o médico precisa do consentimento da gestante ou de seu representante legal. A lei não exige autorização judicial, basta prova idônea do atentado sexual (boletim de ocorrência, testemunhos colhidos perante autoridade policial etc).

* Enfermeiro (a) ou parteiro (a) como sujeito ativo - Damásio entende que a lei faz referência expressa ao médico, razão pela qual as demais pessoas deverão responder pelo delito. Bitencourt, todavia, sustenta que as demais pessoas poderão alegar inexigibilidade de conduta diversa.

OUTRAS ESPÉCIES DE ABORTO:

*Natural: há interrupção espontânea da gravidez. Não há crime. *Acidental: em geral, ocorre em conseqüências de traumatismo. Não há crime. * Eugenésico (ou Eugênico): para impedir a continuação da gravidez quando há possibilidade de que a criança nasça com deformidade ou enfermidade incurável. Não é permitido pela legislação brasileira, logo poderá configurar crime. Alguns doutrinadores (Bitencourt e outros) sustentam que o juiz poderá autorizar a prática do aborto, estando a gestante amparada pela excludente de culpabilidade - inexigibilidade de conduta diversa, considerando o dano psicológico a ela causado, em razão de uma gravidez cujo feto sabidamente não sobreviverá . Da mesma forma o médico, que não pode ser compelido a prolongar o sofrimento da mulher.

Nelson Hungria nos ensina com grande mestria que: é suficiente a vida; não importa o grau da capacidade de viver. Devemos ver com preocupação a criação doutrinária do aborto eugenésico, entendendo que o mesmo só pode ser utilizado se ficar comprovado que a criança não tem a menor possibilidade de sobreviver em virtude da doença hereditária, caso contrário estaríamos praticando a eugenia (ciência que estuda as condições mais propícias à reprodução e melhoramento da raça humana), e usando o aborto para selecionar seres humanos e violando a Constituição que veda a discriminação. Ademais, tal prática nos conduziria a época de um Estado totalitário idealizado por Hitler (lei de 14 de julho de 1933, que instituiu na Alemanha o aborto eugenésico). Em sentido contrário Alberto Silva Franco sustenta que esse aborto tem por fundamento o interesse social na qualidade de vida independente de todo ser humano, e não o interesse em assegurar a existência de qualquer um desses seres em quaisquer condições.

OBS: No caso da Anencefalia, há quem sustente que se trata de atipicidade, pois falta violação de bem jurídico, já que não existe expectativa de vida.

MANDADO DE SEGURANÇA - Pretensão à realização de aborto eugênico. Feto acometido de anencefalia. Direito líquido e certo dos pais e familiares de evitar o nascimento de criança sem condições de vida extra-uterina. Fato que traria sofrimento físico e psicológico. Recurso provido. (TJSP - MS 329.564-3 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. David Haddad - J.. 20.11.2000)

* Social (ou Econômico): casos de família numerosa, para não lhe agravar a situação social. (há crime)

EXERCÍCIOS: 1) CAROL, com 15 anos de idade, descobre estar grávida de seu namorado, relatando este fato à mãe (MARTA). Esta, indignada com a promiscuidade da filha, instiga-a a praticar um aborto, recomendando, inclusive, uma clínica especializada em Porto Alegre. Influenciada pela mãe, a menor dirige-se ao estabelecimento citado, sendo atendida por um médico (ROBERTO) que realiza o aborto. Analise a conduta de cada agente, apontando os dispositivos legais pertinentes

2) Tipificar a conduta do agente que desfere violento pontapé no ventre de mulher visivelmente grávida, acarretando-lhe a expulsão e a morte do feto. (MP)

3) MÉVIO, consciente que TÍCIA está grávida, atira e mata. Qual a solução jurídica? ART, 129 - DAS LESÕES CORPORAIS Considerações gerais:

Bem jurídico tutelado - é a integridade física e psíquica do ser humano. Objeto material - é o ser humano vivo, a partir do momento do início do parto até sua morte. Sujeito ativo - pode ser qualquer pessoa. Todavia, não se pune a auto-lesão (exceção: art. 171, § 2º, V do CP ou art. 184 do CPM). Sujeito passivo - qualquer ser humano vivo.

Consentimento do ofendido - O Estado sempre zelou pela integridade física e a saúde dos indivíduos, ainda que estes consentissem na sua lesão. Assim, o bem jurídico em tela sempre constituiu um bem público indisponível, dado o interesse social em sua preservação, sendo crime de ação penal publica incondicionada. Ocorre que, com o advento da lei 9.099/95, que em seu art. 88 instituiu a ação penal pública condicionada à representação da vítima nos crimes de lesões corporais culposas (art. 129, §6º) e lesões leves (art. 129, caput), doutrina majoritária passou a entender que seriam hipóteses de disponibilidade do bem jurídico pela vítima. Ademais, para corroborar com este argumento, o novo Código Civil, em seu art. 13, menciona: "Salvo por exigência médica, é defeso (proibido) o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física ou contrariar os bons costumes".

Pelo exposto, a integridade corporal é bem jurídico relativamente disponível, desde de que não afete a moral e os bons costumes. Hodiernamente, em inúmeras situações, verificamos a autorização do ofendido para que a sua integridade corporal seja suprimida, sem que isso possa caracterizar um crime. Assim, o consentimento do ofendido funcionará como causa supra-legal de exclusão da ilicitude, desde que não afronte interesses maiores e não ofenda os bons costumes. Assim, as pequenas lesões podem ser livremente consentidas. Ex: perfurar o corpo para colocação de adereços.

OBS: Haverá crime do art. 129 se um inimputável causar lesão em si mesmo por instigação do agente, respondendo este pelo delito (autor mediato). Para Mirabete, responde também pelas lesões corporais o agente quando a vítima se fere ao se defender da agressão ou ao fugir desta. Ex: se alguém, agredido por outrem, para se defender, acaba ferindo a si próprio. A causa do ferimento foi a ação do agressor. Este responderá pelo crime. O ato da vítima é causa superveniente relativamente independente, mas que não produziu o resultado por si só (afastando a causa anterior desaparece a auto-lesão).

Consentimento do ofendido e lesões decorrentes de atividade médico-cirúrgica - Luiz Regis Prado ressalta que em se tratando de intervenção médico-cirúrgica com finalidade curativa, não se pode falar, a rigor, em ofensa ao bem jurídico protegido, pois através de uma interpretação teleológico-restritiva, conclui-se que inexiste o resultado típico do delito de lesão corporal. Assim, se o cirurgião atua com vontade de curar, não há dolo de causar lesão corporal. Todavia, se a intervenção for feita não com propósito curativo, mas com fins estéticos, a conduta do médico terá adequação típica no art. 129, porém será licita. O consentimento do ofendido, nesses casos, pode elidir a ilicitude da conduta, se preenchido seus requisitos. Para a legitimidade do consentimento, é necessário que o paciente conheça a natureza e o alcance da intervenção. OBS: no caso de esterilização cirúrgica, prevista no art. 10 da lei 9.263/96 (regula o art. 226, § 7º da CF), o médico estará amparado pela causa de excludente de ilicitude - exercício regular de direito. Se o médico, contudo, agir em desacordo com o disposto no art. 10, responderá pelo delito previsto no art. 15 da mesma lei. OBS2: Para Fernando Capez, Bitencourt e outros, o transplante de órgãos, tecidos ou partes do corpo vivo de pessoa "juridicamente capaz" (art. 9º da lei 9.434/97), feito pelo médico, exclui a tipicidade e não a ilicitude, pois uma conduta autorizada não pode ser ao mesmo tempo proibida. Em sentido contrário - Fragoso e outros.

Lesões desportivas - Tradicionalmente, ausente o dolo de causar lesões, configura fato típico, mas não ilícito, pois o agente está amparado pela excludente - exercício regular de direito. "Desse modo: se a agressão foi cometida dentro dos limites do esporte ou de seus desdobramentos previsíveis; se o participante consentiu validamente na sua prática; se a atividade não for contrária à ordem pública, à moral, aos postulados éticos que derivam do senso comum das pessoas normais, nem aos bons costumes, não haverá crime." Entretanto, ocorrendo excesso, haverá crime.

Vale ressaltar que esta posição não é pacífica. Fernando Capez, por exemplo, sustenta que o fato é atípico, por influxo da teoria da imputação objetiva. A violência é inerente a determinadas práticas esportivas, como o boxe, futebol etc. Tanto a lesão prevista pelas regras do desporto quanto aquela praticada fora do regulamento, mas como um desdobramento natural e previsível do jogo, não constituem fato típico. "Com efeito é impossível lutar com os punhos sem provocar ofensa à integridade corporal de outrem. Se o Estado permite e regulamenta o boxe, não pode, ao mesmo tempo, considerar sua prática um fato típico. O risco de lesão é um risco permitido e tolerado, após o Poder Público sopesar todos os prós e os contras de autorizar" .

Elemento objetivo - "Ofender" = lesar, ferir

Ofensa à integridade corporal = alteração anatômica ou funcional, interna ou externa, do corpo humano. Ex: luxações, mutilações, fraturas etc. Para Luiz Regis Prado, o delito ocorrerá ainda que a conduta do agente contribua para agravar uma perturbação preexistente. Ofensa à saúde = alteração de funções fisiológicas do organismo ou perturbação psíquica. Ex: distúrbios de memória

Doutrina e jurisprudência majoritárias afirmam que não configura crime de lesão corporal: 1)Desmaio por si só; 2)Rubor da pele ou vermelhidão; 3) Nos tipos que empregam a violência como meio executório. Exs: 157, 213, 146, 214, 219 etc.; 4) A dor por si só, (mas pode ser vias de fato - art. 21 da LCP) etc.

Princípio da Insignificância. Este princípio, que foi introduzido no sistema penal por Claus Roxin, tem como fundamento que o Direito Penal não deve preocupar-se com bagatelas, devendo o legislador, ao elaborar a redação do tipo penal, ter em mente os prejuízos relevantes que o comportamento incriminado possa causar à ordem jurídica e social. Assim, as lesões insignificantes ao bem jurídico devem ser excluídas da esfera de atuação do Direito Penal, transformando-o, cada vez mais, num Direito de intervenção mínima.

Para corroborar com o acima exposto, vale mencionar o exemplo fornecido por Rogério Greco : "o legislador, antevendo que a integridade física das pessoas, por ser extremamente relevante, deveria merecer a proteção do Direito Penal, criou o delito de lesões corporais, dizendo, no art. 129, caput, do Código Penal, que aquele que ofender a integridade física ou a saúde de outrem receberá uma pena de detenção, que variará entre um mínimo de três meses a um ano. Mas não parou por aí. Entendeu também o legislador que tinha de coibir as lesões corporais causadas também de forma culposa e, assim, fez inserir um parágrafo (6º) ao art. 129 do Código Penal."

Dessa forma, pode-se verificar que o legislador, ao elaborar os dispositivos penais referentes à integridade física das pessoas, o fez da forma mais abrangente possível, abrangendo todos os tipos de lesões. Entretanto, uma pergunta se faz pertinente: será que a intenção do legislador também era voltada a punir um leve arranhão, causado de forma imprudente por um indivíduo?

Os que defendem a aplicação do princípio da insignificância acreditam que não. Assim, para solucionar a questão e excluir do âmbito de incidência penal aquelas condutas que não chegam a lesionar de forma relevante, significativa o bem jurídico tutelado, os doutrinadores adotam o presente princípio.

Vale ressaltar que o fato penalmente irrelevante pode receber tratamento adequado, se necessário, em outros ramos do direito (enquadrando-se como, por exemplo, ilícito civil ou administrativo), respeitando o caráter fragmentário e de intervenção mínima do Direito Penal.

Outrossim, não se pode confundir uma conduta de lesividade insignificante, com o delito de menor potencial ofensivo. Neste o indivíduo praticou uma conduta descrita no verbo-tipo (tipicidade formal) acarretando uma lesão de pouca relevância, devendo, portanto, ser reprimida, mas de forma proporcional, buscando-se outras alternativas à pena privativa de liberdade, tais como a substituição por penas restritivas de direito etc. No delito de lesividade insignificante, apesar de previsto de forma genérica em um tipo penal, não afeta de forma relevante o bem jurídico tutelado a ponto de impor-lhe uma pena (para alguns, afasta-se a tipicidade material). Não haveria proporcionalidade entre a conduta e a reprimenda penal.

Certamente, cabe ao juiz avaliar no caso concreto se estamos diante de um delito insignificante ou um delito de menor potencial ofensivo. Entretanto, tal tarefa não nos parece árdua, uma vez que, na maioria dos casos, os delitos bagatela são identificados pelo bom senso. São adeptos da aplicação do princípio da insignificância em alguns tipos de lesões: Aníbal Bruno, Bitencourt, Mirabete, Fragoso, Luiz Regis Prado e outros.

Meios de execução: é crime de ação livre.

Elemento subjetivo - o crime de lesão corporal pode ser doloso, culposo ou qualificado pelo resultado.

As lesões podem ser classificadas em: leves (caput); graves (§ 1º); gravíssimas (§ 2º); seguidas de morte (§ 3º); "privilegiadas" (§ § 4º e 5º); culposas (§ 6º); majoradas (§ 7º); domésticas (§ 9º) e qualificadoras majoradas do § 9º (§ 10).

Consumação: trata-se de crime material que se consuma com a produção do resultado naturalístico previsto na norma e exige exame de corpo de delito (art. 158 do CPP).

Tentativa: "Discute-se na doutrina acerca da possibilidade da tentativa no crime de lesões corporais, pois argumenta-se que não se saberia na prática aferir qual a lesão intencionada pelo agente, ou seja, leve, grave, gravíssima; contudo como bem alerta E. Magalhães Noronha, 'confunde-se a admissibilidade com a prova de sua existência, que são coisas diversas'. Com efeito, por se tratar de um crime de dano, a tentativa é perfeitamente admissível. Dúvida não há quanto a isso. A dificuldade surge no momento em que se pretende provar qual a lesão intencionada pelo agente. Vejamos alguns exemplos dados pela doutrina que demonstram inexistir tal dificuldade: 'se, v. g., uma pessoa desfere um soco em outra, mas um terceiro o apara ou o encaixa, por que não se verá no fato tentativa de lesão leve? Se certa mulher atira ácido sulfúrico no rosto da amante, que, entretanto, se esquiva, não terá praticado tentativa de lesão gravíssima?', ou então, 'ninguém deixaria de reconhecer uma tentativa de lesão gravíssima no fato, por exemplo, de quem atira vitríolo na direção do rosto de seu inimigo, que, desviando-se tempestivamente, consegue escapar ileso'. Se realmente houver a dificuldade de prova, a doutrina assinala para a aplicação do princípio do in dubio pro reo, respondendo o agente pela tentativa de lesão corporal leve, ou seja, pelo delito menos grave." No mesmo sentido: Bitencourt, Mirabete, Luiz Regis Prado, Fragoso, Nelson Hungria e outros.

Dessa forma, por admitir o fracionamento do iter-criminis, admite-se a tentativa, salvo em algumas formas qualificadas (crime preterdoloso) e lesões culposas. Ocorre que tal posicionamento não é pacífico. Já se entendeu que é "juridicamente impossível a tentativa de lesões corporais porque tal figura, coincidindo inteiramente à definição de vias de fato, não passa deste modesto ilícito". (RT 445/410, 615/343; JTACrSP, Franceschini, v. II, p. 639, nº 3.774).

Classificação doutrinária: é crime comum; material; de dano; de forma livre; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente etc.

Ação penal - a Lesão corporal simples (caput) e a culposa (§ 6º), tiveram a natureza da ação penal modificada pela lei 9.099/95, no artigo 88. Antes esses crimes eram de ação penal pública incondicionada, hoje o crime é de ação penal pública condicionada à representação do ofendido. As demais espécies de lesão, por força da regra do art. 100 do CP, continuam sendo de ação penal pública incondicionada.

Crimes especiais de lesão corporal: art. 27 lei 7170/83; (lesão corporal contra o Presidente da República, do Sed. Fed. etc) art. 1o, b, lei 2889/56; (genocídio)-lesão contra membros de um grupo étnico, racial etc. art. 14, §§§ 2º, 3º e 4º da lei 9434/97 (transplante)-remover tecidos, órgãos para transplante. Art. 303 da lei 9.503/97 - lesão corporal culposa na direção de veículo automotor. art. 3o, "i" lei 4898/65 (lesionar indivíduo com abuso de autoridade)

Em relação ao concurso do art. 129, caput, com o art. 3o, i da lei 4898, existem 4 correntes: responde por ambos em concurso formal impróprio; responde por ambos em concurso material; responde somente pelo abuso; responde somente pela lesão corporal com aumento de pena do art. 61,II, g.

LESÃO CORPORAL LEVE - ART. 129, CAPUT

A definição de lesão corporal leve é formulada por exclusão, ou seja, será lesão corporal leve sempre que houver dolo de lesão e não ocorrer qualquer das situações previstas nos § 1º, 2º, 3º e 9º do art. 129. Tem como requisitos: o dano à integridade física ou à saúde de outrem; a relação causal entre ação e resultado e a vontade de lesionar.

OBS: O crime de lesões corporais leves não se confunde com a contravenção de vias de fato do art. 21 da LCP (decreto-lei 3688/41), que serve de tipo subsidiário ao tipo de lesões corporais leve, ou simples, pois vias de fato se configura pela ofensa não ultrajante realizada sem dano à integridade pessoal e sem animus laedendi (v.g. empurrão simples, puxão de cabelos). Se a violência exercida for ultrajante, havendo a intenção de humilhar, envergonhar a vítima, ofender a sua dignidade ou decoro, por exemplo, bofetada leve, estaremos diante do crime de injúria real (art. 140, § 2º do CP - ver preceito secundário - somam-se as penas).

O § 4º do art. 129 prevê uma causa de diminuição da pena que também poderá ser aplicada ao art. 129, caput. Vale dizer que as circunstâncias são subjetivas e incomunicáveis no concurso de pessoas. Outrossim, a previsão do disposto no § 5º destina-se à lesão corporal leve. Por fim, o § 7º menciona uma causa de aumento de pena se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º. Assim, nas lesões corporais cometidas contra menor de 14 anos e maior de 60 anos, incidirá o aumento de pena.

129, §1o - LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE

As circunstâncias do §1o são de natureza objetiva. São comunicáveis no caso de concurso de agentes, desde que o fato tenha ingressado na esfera de conhecimento do agente. Assim, deve-se exigir previsibilidade nos resultados. Se o resultado agravador da lesão for mais grave do que o desejado, e resultar de caso fortuito, aplica-se o art. 13, § 1º.

Importante notar que é possível a coexistência das diversas formas de lesão grave, constituindo elas crime único; deve o juiz, nessa hipótese, levá-las em consideração na fixação da pena base (art. 59 do CP). Por exemplo: se resulta perigo de vida (inciso II) e aceleração de parto (inciso IV).

As lesões corporais de natureza grave ou gravíssima constituem crimes qualificados pelo resultado, mas não necessariamente preterdolosos. Para a corrente majoritária, no § 1º e 2º o resultado, salvo algumas exceções, pode ser atribuído tanto a título de culpa quanto de dolo. Ocorre que, em alguns casos (ex: 129, § 1º, II -senão seria 121 c/c 14, II - e 2º, V - aborto), os resultados só poderão ser atribuídos a titulo de culpa.

Inc. I - Não se refere só ao trabalho (ocupações de natureza lucrativa); do contrário, estariam excluídos os idosos, as crianças, os enfermos etc. Trata-se de ocupações da vida em geral, do cotidiano do indivíduo. Ex: trabalho, lazer, recreação etc. A ocupação habitual deve ser lícita. Não há a qualificadora se a lesão impediu o ladrão de roubar. Porém, nada impede que a ocupação habitual seja imoral, como por exemplo, a prostituta. A incapacidade pode ser tanto física quanto psíquica. Não há a qualificadora na relutância por vergonha. Ex: ofendido deixa de trabalhar por mais de 30 dias em razão de apresentar ferimentos no rosto. A incapacidade deve ser provada por perícia médica em tempo hábil. Deve haver o exame de corpo de delito que será, depois dos 30 dias (o prazo é contado conforme o art. 10 do CP), complementado por outro exame (exame complementar) -168, §2o, CPP. O STF já se manifestou no sentido de que o exame complementar, por ser formalidade essencial, não é possível de substituição por qualquer outro meio de prova (STF, RT, 699/249). Entretanto, alguns doutrinadores, dentre eles Luiz Regis Prado e Bitencourt, sustentam que a falta de exame complementar poderá ser suprida por prova testemunhal com base no art. 168, § 3º do CPP.

Inc. II (preterdoloso - majoritário) - probabilidade concreta e iminente de um resultado letal. Trata-se de perigo concreto. Deve ser comprovado por perícia e o laudo pericial deve ser fundamentado. Nesse sentido já decidiu o STF: "Não basta o risco potencial, aferido pela natureza e sede das lesões, para caracterizar a qualificadora prevista no art. 129, § 1º, II do CP. O perigo de vida somente deve ser reconhecido segundo critérios objetivos, comprobatórios do perigo real a que ficou sujeita a vítima, mesmo que por pequeno lapso de tempo". (RT, 579/431). E. Magalhães Noronha assevera que: "um ferimento no pulmão é geralmente perigoso; todavia pode, no caso concreto, a constituição excepcional do ofendido, a natureza do instrumento ou qualquer outra circunstância impedir que se verifique esse risco. A lesão grave só existe, portanto, se, em um dado momento, a vida do sujeito passivo esteve efetivamente em perigo." Exemplo: embora não se possa negar que o traumatismo craniano seja suficiente para o reconhecimento do perigo de vida, a simples sede da lesão não justifica a presunção de perigo, que deve ser demonstrado e comprovado por laudo pericial. *Vale ressaltar que se o agente previu como possível o resultado morte da vítima, preferindo arriscar-se a produzi-lo a renunciar a ação, atuou com dolo e, de conseguinte, responderá pelo delito de homicídio tentado.

o Inc. III - "Membros" - são os quatro apêndices do tronco, abrangendo os membros superiores (braço, antebraço, mão) e inferiores (coxa, perna, pé). - "Sentidos". São 5 = visão, olfato, paladar, audição e tato. - "Função". É a atuação específica ou própria desempenhada por cada órgão, aparelho ou sistema. Ex: a respiratória, circulatória, reprodutora, digestiva, locomotora etc. "Debilidade" é o enfraquecimento, a diminuição ou a redução da capacidade funcional. Exige-se que a debilidade seja permanente, o que não implica em perpetuidade. Aníbal Bruno nos ensina que será debilidade permanente quando não se pode determinar previamente, mesmo por aproximação, se e quando ela terá fim. OBS: Em se tratando de órgão duplos (olhos, rins, pulmões), a perda ou ablação de um dos elementos componentes caracteriza a diminuição da capacidade funcional. Entretanto, se importa em completa inutilização do membro ou órgão, configura-se a lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º, III do CP). Para Bitencourt, a perda de um olho (debilidade), não se confunde com a perda da visão (perda de sentido). Para Damásio, se a vítima sofre, em decorrência da lesão, paralisia do braço, será inutilização; ser perder um dedo será debilidade; se perder todo o braço será perda de membro. - Perda de dentes. Depende do caso concreto: a) se estragados = 129, caput; b) se causou debilidade da função mastigatória = 129, §1o, III. - A recuperação do membro por meios ortopédicos, por transplante ou através de tratamento reeducativo do membro ou órgão debilitado, não faz desaparecer a qualificadora.

o Inc. IV - "aceleração" = antecipação do nascimento do feto com vida. O feto vem a ser expulso antes do período determinado para o nascimento. O feto deve estar e permanecer vivo. Para incidir a qualificadora é necessário que o agente tenha o conhecimento da gravidez da vítima, pois exige, no mínimo, a culpa (art. 19). Se desconhecer, responde por 129, caput, desde que escusável sua ignorância.

129, §2o - (lesões corporais gravíssimas)

Fernando Capez assevera que é possível a coexistência das diversas formas de lesão grave e gravíssima, constituindo um único crime. Deve o juiz, nessa hipótese, levá-las em consideração na fixação da pena-base (art. 59).

o Inc. I - "Incapacidade permanente" = é a duradoura, longa, de duração incalculada. - É incapacidade física ou psíquica para o trabalho em geral. O ofendido fica incapacitado para qualquer espécie de trabalho (atividade profissional lucrativa). - Se a vítima puder exercer outra atividade laboral, diferente da que exercia, não configura a lesão gravíssima. Será caso de lesão corporal grave e poderá ser enquadrado em um dos incisos do § 1º. Mirabete afirma que: "não haverá gravidade na lesão se, por exemplo, um pianista perde a destreza em decorrência de uma lesão em um dos dedos, podendo substituir seus recitais por aulas etc. Tal interpretação, porém, faz com que o dispositivo dificilmente seja aplicado, porque sempre restará à vítima possibilidade de vender bilhetes de loteria...Certamente, porém, a lesão acarretará um dos demais resultados previstos no mesmo parágrafo."

o Inc. II - enfermidade incurável - É a doença do corpo ou da mente que a ciência médica ainda não conseguiu conter nem sanar. - A curabilidade não é conseguida no atual estágio da Medicina, é afirmada pericialmente. - A vítima não está obrigada a submeter-se a intervenção cirúrgica arriscada a fim de curar-se da enfermidade. OBS: A enfermidade é o estado que duradouramente altera e progressivamente agrava o teor de um organismo. Para Frederico Marques, "a doença ou enfermidade pressupõe um processo em ato e dinâmico, enquanto que a debilidade é um fato estático residual, um processo encerrado e findo. Quando agressão corporal provoca, por exemplo, a fratura de um osso da perna, pode suceder que o ofendido se cure da lesão, mas permaneça coxo, isto é, com debilidade permanente em um membro.Todavia, se ele não se cura e no osso fraturado forma-se a sede de 'um processo osteomielítico tuberculoso', provavelmente incurável, verifica-se a existência de enfermidade incurável" Romeu de Almeida Salles Junior nos ensina que: "o entendimento dominante é o de que enfermidade é qualquer estado mórbido de evolução lenta, processo patológico em curso. É incurável, segundo exigência legal, aquela enfermidade cuja cura está relacionada ou dependente de tratamento excepcional, arriscado, ou que dure anos, ou fora das possibilidades da vítima. Ex: cardiopatias resultantes de trauma, pleurites (lesão da pleura), hérnia com prolapso permanente do intestino."

*Fernando Capez nos ensina que a dolosa transmissão de uma doença incurável e fatal como a AIDS poderá, se presente o animus necandi, caracterizar o delito de homicídio, que se consumará com a morte da vítima, ou homicídio tentado, enquanto não ocorre a morte desta. Mirabete sustenta que a transmissão da AIDS, pelo coito ou por transfusão, enquanto não ocorre a morte da vítima, é crime de lesão corporal grave, que pode ser integrado por dolo direto ou eventual. Jurisprudência: HABEAS CORPUS - TENTATIVA DE HOMICÍDIO - PORTADOR VÍRUS DA AIDS - DESCLASSIFICAÇÃO - ARTIGO 131 DO CÓDIGO PENAL - 1. Em havendo dolo de matar, a relação sexual forçada e dirigida à transmissão do vírus da AIDS é idônea para a caracterização da tentativa de homicídio. 2. Ordem denegada. (STJ - HC 9378 - RS - 6ª T. - Rel. Min. Hamilton Carvalhido - DJU 23.10.2000 - p. 186) JCP.131

o Inc. III - "Perda" = é a eliminação de órgão (membro, sentido ou função); é a ablação (ação de tirar, arrancar). Decorre de mutilação (momento da ação delituosa) ou amputação (cirurgia). Quando cessa o sentido ou função ou quando o membro ou órgão é extraído ou amputado. Ex: perder todo o braço. - "Inutilização" = quando cessa definitivamente a atividade do membro, sentido ou função. É a inaptidão do órgão à sua função específica. Aqui o membro permanece ligado ao corpo, mas inoperante em sua atividade própria ou função. Ex: paralisia de um braço.

o Inc. IV - É o dano estético de certa monta, permanente, visível (que cause desgosto ou desconforto para quem vê), irreparável (deformidade que não é passível de ser corrigida pelo transcurso do tempo) e capaz de causar impressão vexatória. - Vitriolagem = lançamento de ácido na vítima. É um meio de execução dessa qualificadora. - Não é somente aquele que se situa no rosto da vítima. É tudo que desfigura uma pessoa, de forma duradoura e grave. Ex: perda da orelha. - Cirurgia plástica. A vítima não está obrigada a submeter-se a intervenção cirúrgica a fim de afastar o mal da deformidade. Mas se o fizer, para alguns autores (Fernando Capez e outros), desaparecerá a qualificadora, desde que destruídos os efeitos da deformidade. Para Bitencourt, mesmo com a cirurgia plástica subsistirá a qualificadora. - Se a deformidade permanente decorre de ato cirúrgico posterior à lesão corporal, a qualificadora não incide sobre o autor da lesão. - Não caracteriza a "perda de membro, sentido ou função" a cirurgia que extrai órgãos genitais externos de transexual, com a finalidade de reduzir seu sofrimento físico ou mental. É uma conduta atípica. Nem a lei, nem o Código de Ética Médica proíbem. Ausência de dolo.

o Inc. V - É preterdoloso. Há dolo de provocar a lesão e culpa no aborto. Se o agente quis ou assumiu o risco de causar o resultado aborto, haverá crime de aborto. Se tiver dolo de lesionar e dolo de abortar, responde por 129 e 125 n/f 70, 2a p. (concurso formal impróprio - desígnios autônomos). - É preciso que o agente tenha conhecimento da gravidez da vítima. Do contrário, haveria responsabilidade penal objetiva (art. 19). O desconhecimento da gravidez afasta a qualificadora. Não existe culpa se não existe previsibilidade objetiva quanto ao resultado. - Não existe tentativa de lesão corporal qualificada pelo aborto. - Há uma inversão de situações entre o 127, 1a p. e o 129, §2o, V. (No primeiro a pessoa quer o aborto, na segunda quer a lesão na mãe)

129, §3o - LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE (crime preterdoloso - dolo na lesão e culpa na morte. Se esta for imprevisível, ou decorrente de caso fortuito será lesão.)

Não se admite tentativa de lesão corporal seguida de morte, pois não há vontade nesta última. A diferença entre 121, § 3º e 129, § 3º é que, no 129, há concurso de dolo e culpa. Para Fernando Capez, Mirabete e outros, o homicídio culposo resulta ou de um fato penalmente irrelevante, ou de uma contravenção, ex. "A" desfere uma bofetada (art. 21 da LCP) no rosto de "B", que perde o equilíbrio e bate a cabeça em uma pedra e morre - 121, § 3º. Ex2: "A" desfere umma paulada nas pernas da vítima vindo esta a cair e a bater a cabeça em uma pedra, sobrevindo a sua morte. Há, na espécie, um delito de lesão corporal seguida de morte, tendo o evento letal decorrido de uma lesão dolosa.

129, §4o - (lesões corporais privilegiadas)

As circunstâncias são subjetivas e incomunicáveis no concurso de pessoas. Aplica-se, aqui, todo o estudo feito no 121, § 1º, incide sobre todas as modalidades de lesão corporal dolosa, excluindo-se, assim, a lesão culposa. A redução de pena é obrigatória - direito subjetivo do réu. O juiz tem discricionariedade somente quanto ao quantum de redução.

129, §5o - SUBSTITUIÇÃO DE PENA

Desde que presente seus pressupostos, a substituição de pena é obrigatória.

Após a lei 9.714/98 (lei das penas alternativas), este § ficou desnecessário, pois o art. 44, § 2º, diz que a pena menor ou igual a um ano pode ser substituída.

Só se aplica à lesão dolosa.

o Inc. II - Casos de reciprocidade de lesões leves: 1o) "A" e "B" se ferem. "A" agiu em legítima defesa. "A" é absolvido e "B" é condenado com o privilégio. 2o) "A" e "B" se ferem. Ambos dizem que agiram em legítima defesa. Ausência de prova do início da agressão. Ambos são absolvidos. 3o) "A" e "B" são culpados e nenhum agiu em legítima defesa. Ambos são condenado com o privilégio.

129, §6o - LESÃO CORPORAL CULPOSA

O grau da lesão (se leve, grave ou gravíssima) é irrelevante, pois o legislador não diferenciou. Crime culposo (art. 18, II), a princípio, não há intenção de causar resultado algum, então, conseqüentemente, não seria pertinente se proceder essa distinção. Todavia, o juiz obviamente irá avaliar e irá dosar a pena de acordo com duas considerações, o desvalor da ação (culpabilidade) e o desvalor do resultado (conseqüências do crime). Na fixação de pena é que o juiz vai levar em consideração a gravidade do mal causado pelo agente (59, CP, 303, CTB).

Requisitos para que haja lesão corporal culposa: a) comportamento humano voluntário; b) descumprimento do dever de cuidado objetivo; c) previsibilidade objetiva do resultado (apesar de não serem previstas pelo agente); d) lesão corporal involuntária.

Lesão corporal culposa qualificada (129, §6o e §7o).

Ex: negligência na guarda de armas de fogo; negligência da custódia de animal perigoso, cabeleireiro que usa produto muito ácido e queima o couro cabeludo da cliente, médico que não avalia corretamente radiografia, vindo a paciente a ter deformidades etc.

A lesão culposa desde o advento da lei 9099/95 passou a depender de representação. Em se tratando de lesão corporal na direção de veículo automotor será aplicado o art. 303 do CTB.

129, §7o - (lesões corporais majoradas)

Trata-se de circunstância legal específica. Causa de aumento de pena de natureza objetiva e obrigatória. Vítima < 14 anos ou > 60 anos = lesão corporal dolosa

129, §8o

Trata do perdão judicial - ver art. 121, § 5º. JUNHO DE 2004. Acrescenta parágrafos ao art. 129 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, criando o tipo especial denominado "Violência Doméstica". O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1o O art. 129 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 9o e 10: Violência Doméstica

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano.

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço)." (NR) Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. CRIMES CONTRA HONRA (art. 138-145):

O bem jurídico protegido é a honra, esta proteção deriva da própria Constituição Federal (art. 5º, X). São considerados crimes formais. O agente age com dolo de dano, com a intenção de ofender a honra alheia, e consuma-se com o efetivo dano à reputação do ofendido, por isso se diz que o animus jocandi é a intenção de brincar, não é punível. Honra é o valor moral e social de uma pessoa, a doutrina divide a honra em: Objetiva (Fernando Capez): é a opinião de terceiros no tocante aos aspectos físicos, intelectuais, morais de alguém. É aquilo que os outros pensam; o conceito que a sociedade tem do indivíduo, e esse conceito envolve, abrange, abarca o conjunto de valores profissionais, pessoais, morais, da pessoa humana. A calúnia (art. 138) e a difamação (art. 139) ofendem a honra objetiva, pois atingem o valor social do indivíduo, passando este a ter má fama no seio da coletividade, e com isso, a sofrer diversos prejuízos de ordem pessoal e patrimonial. Nestes dois crimes, exige-se uma descrição pormenorizada dos fatos;

subjetiva: é a auto estima, própria dignidade, refere-se à opinião do sujeito a respeito de si mesmo, seus atributos físicos, intelectuais e morais. Aqui não importa a opinião de terceiros. O crime de injúria (art. 140) atinge a honra subjetiva, não exige descrição detalhada dos fatos.

* Consentimento do ofendido - tanto a honra objetiva, quanto subjetiva são bens jurídicos disponíveis, razão pela qual em regra a ação é de iniciativa privada. O núcleo do verbo de cada uma das ações típicas descritas pressupõe que a ofensa se dê contra a vontade do ofendido, por este motivo, caso haja o consentimento do ofendido, teremos uma causa geradora de atipicidade, logo o consentimento do ofendido EXCLUI A TIPICIDADE da conduta do ofensor.

O tipo subjetivo dos crimes contra a honra só admite a forma dolosa, ainda que seja o dolo eventual. Também tem o seu tipo subjetivo composto por um especial fim de agir, que vai variar de acordo com o crime, é chamado de animus caluniandi, animus injuriandi ou animus difamandi, dependendo com qual crime o aplicador da lei esteja diante.

Além do dolo, leia-se, além da vontade de proferir a expressão atentatória à honra, potencialmente capaz de malucar à honra alheia, exige-se que ao proferi-la o agente tivesse o especial fim de ofender a honra alheia, dolo específico. Então não basta ter a vontade de dizer a expressão, ou de proferir a expressão ofensiva, isso é o dolo, deve-se exigir que ao proferi-la o sujeito tivesse a intenção de causar gravame a honra de outrem. Inexistindo esse dolo, descaracteriza o crime, gerando uma atipicidade subjetiva.

* legislação especial - os crimes contra a honra também são previstos em leis penais especiais tais como: lei da imprensa (5.250/65), código eleitoral (4.737/65), lei de segurança nacional (7170/83) etc.

Sujeito ativo: pode ser qualquer pessoa física, desde que seja imputável, são crimes comuns. Sujeito passivo: também pode ser qualquer pessoa, inclusive as desonradas. Porém, em se tratando de honra subjetiva, o sujeito passivo deve ter alguma capacidade de entendimento; assim, uma criança, na maioria das vezes, pode não ter honra subjetiva.

Há uma discussão se a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo em crime contra honra. a) Na calúnia, alguns autores (maioria) entendem que a pessoa jurídica é uma ficção, não pratica crime, logo não pode ser sujeito passivo do delito de calúnia. Outros entendem (Fernando Capez) que a pessoa jurídica é uma realidade e a CF/88 em seus art. 225, § 3º e 173, § 5º teria conferido capacidade penal ativa à pessoa jurídica, um exemplo é que a pessoa jurídica pode ser sujeito ativo de delito ambiental (9.605/98, art. 3º, 21 a 24), logo, pode figurar como vítima de calúnia, ao ser-lhe imputada falsamente a prática de tais crimes. b) Na difamação também há divergências. Fernando Capez entende que a pessoa jurídica tem reputação, de forma que a divulgação de fatos desabonadores de seu conceito junto à sociedade pode acarretar-lhe dano irreparável, sendo sujeito passivo do delito. Em sentido contrário, há quem sustente que pessoa jurídica, apesar de possuir reputação, não pode ser sujeito passivo de difamação, pois os crimes contra a honra estão no título que cuida "dos crimes contra a pessoa", tendo como vítima a pessoa humana. c) Predomina o entendimento que pessoa jurídica não possui honra subjetiva, logo não pode ser sujeito passivo do crime de injúria.

ART. 138 - CALÚNIA:

É a falsa imputação, pormenorizada, de um fato definido como CRIME, atinge-se a honra Objetiva. Não pode ser contravenção penal (seria difamação - ex. ontem o vi exercendo jogo do bicho na rua X = difamação, pois não é crime, é contravenção); nem conduta atípica ex. afirmar que determinada pessoa, por imprudência, danificou patrimônio público, pois o crime de dano (art. 163, § único) é doloso. imputar é descrever fato atribuindo a sua autoria a alguém. Na calúnia o agente atribui a alguém a responsabilidade pela prática de um crime que não ocorreu ou que não foi por ele cometido. Chamar alguém de estelionatário, não é caluniar, e sim injuriar, porque não se descreveu os fatos, entretanto, se houvesse a seguinte frase: "Você é um estelionatário, porque você me passou um cheque em contraprestação a um serviço, e esse cheque não tinha fundos, e você sabia disso", aí já há uma descrição detalhada dos fatos, sendo essa descrição detalhada típica do 171, a hipótese é de calúnia e não mais de injúria. O fato criminoso deve ser determinado, porém não é necessário apontar dia, hora, local. Basta que se apontem as circunstâncias capazes de identificar o fato criminoso. A falsidade da imputação é elementar do tipo, se a imputação for verdadeira, o fato é atípico. Logo calúnia é : imputação de fato + qualificado como crime + falsidade da imputação. O dolo do agente deve abranger o elemento normativo "falsamente", o ofensor deve ter ciência da sua falsidade ou não tendo, assume o risco, logo se admite dolo eventual. Haverá erro de tipo (art. 20) se ele crê erroneamente na veracidade da imputação.

Não haverá crime contra a honra quando presentes o animus jocandi (intenção de brincar, sem ultrapassar os limites); o aminus narrandi (intenção apenas de narrar o fato ex. testemunha que por ciência própria ou por ouvir dizer narra fato criminoso imputando a alguém, é estrito cumprimento do dever legal- se o depoimento é falso, será crime de falso testemunho); o animus defendendi (intenção de se defender em processo); o aminus corrigendi (é a intenção de corrigir erros daquele que se encontra sob sua autoridade, guarda ou vigilância e exaspera-se no emprego dos termos), o animus consulendi (intenção de aconselhar, informar acerca dos atributos de determinada pessoa, ex. carta de referência, desde que não haja excessos) e exaltação emocional ou discussão - não há crime contra a honra se o agente, motivado por um estado de justa indignação, de exaltação emocional ou no calor da discussão profere expressões que ofendam.

Doentes mentais e menores de 18 anos como sujeitos passivos (correntes): 1) Para Damásio, podem ser sujeitos passivos do crime de calúnia, pois crime é fato típico e ilícito, logo eles cometem crimes, mas não são culpáveis. 2) Porém a doutrina clássica entende que eles não podem ser sujeitos passivos, pois a culpabilidade é elemento do crime, logo se não cometem crime não podem ser sujeitos passivos. Para esta, a imputação de crime a um inimputável deve ser considerada difamação. 3) Bitencourt entende que, apesar de inimputável não cometer crime, pode praticar "fatos definidos como crime", e essa é a expressão contida no art. 138, logo os inimputáveis podem ser caluniados.

Desonrados- podem ser sujeitos passivos do crime, já que a honra é um bem incorporado à personalidade humana, sendo certo que jamais poderá haver sua supressão total. Logo, afirmar, falsamente, que determinado político, que um dia fora corrupto, continua a utilizar-se de seu cargo para solicitar vantagens indevidas, é calúnia.

Consumação: quando terceira pessoa, sem ser a vítima, tem ciência da ofensa falsa, pois é crime de honra objetiva, conceito que terceiros têm do agente, daí porque quando ela é proferida direta e exclusivamente para sujeito passivo, tanto a calúnia quanto a difamação, a hipótese é de injúria.

Tentativa - é um crime formal. Na calúnia verbal, que se perfaz em um único ato, não admite tentativa, já na calúnia escrita é possível.

§ 1º - na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. É a conduta de levar ao conhecimento de outrem a calúnia de que tenha tomado conhecimento. Aqui não se admite dolo eventual, pois a lei diz expressamente : "sabendo falsa", que se refere ao dolo direto. § 2º - calúnia contra os mortos - o morto não éé sujeito passivo deste delito, e sim o cônjuge, o ascendente, o descendente, ou o irmão do falecido. Somente essas pessoas, por analogia ao art. 31 do CPP, poderão promover a ação penal. § 3º exceção da verdade - Sendo a falsidade da imputação, elementar do crime de calúnia, a regra é a admissibilidade da exceção da verdade, que é um meio de defesa indireta do ofensor. Através da exceção da verdade, o ofensor visa a se defender, argumentando que aquilo que ele disse é verdadeiro, e que por isso a sua conduta é atípica, se realiza por um procedimento especial (art. 85 e 523 do CPP) por ocasião do oferecimento da defesa prévia.

Outro motivo pelo qual admite-se, em regra, a exceção da verdade no crime de calúnia é que há, a princípio, o interesse público de se apurar a existência ou não de um crime, mas essa regra tem 3 exceções: Inciso I - é bastante óbvia, porque se o crime imputado ao agente é de ação penal privada, e se o ofendido do crime de ação penal privada não quis levar o fato ao conhecimento, não seria o réu da ação penal no crime contra a honra que o faria, por falta de legitimidade. Ex. A fala para B na frente de terceiros - "B você foi o autor daquele crime de estupro em desfavor de C". Ora, B sentindo-se ofendido, caluniado, ingressa com uma ação por crime contra a honra. Nesse caso, não seria o A, que não foi o ofendido no crime de estupro, que agora é réu no crime contra a honra, que argumentaria com a exceção da verdade "Eu quero provar que o crime de estupro existiu, e o faço em autos próprios", isto está absolutamente vedado, porque isso seria levar ao conhecimento público algo que a mulher, a ofendida, a estuprada não quis fazê-lo.

Inciso II - há nesses cargos um interesse Estatal de proteger acima de qualquer coisa a honradez do cargo. E não seria, então, em qualquer ação penal ajuizada em juízo de primeira instância, que ficaria se discutindo se o Presidente da República cometeu ou não cometeu o crime, isso resultaria então numa vedação legal com uma presunção absoluta da honorabilidade desses cargos. Logo, é possível responder por crime de calúnia quando for verdadeira a imputação da pratica de fato definido como crime, contra as pessoas elencadas neste inciso, pois não se admite exceção de verdade. Ex. determinada pessoa declara, na frente de terceiros, que o Presidente somente conseguiu aprovação do projeto de emenda constitucional X, através da compra de votos no congresso nacional. A pessoa que fez a declaração não poderia alegar exceção da verdade, por esta vedação do inciso II. Bitencourt entende (corrente minoritária) que, apesar de tal defesa ser vedada em autos apartados, a pessoa que declarou o fato, poderia juntar tais provas na própria ação penal, sob pena de ferir o princípio da ampla defesa, já que a elementar falsidade, uma vez descaracterizada, geraria a atipicidade do fato, além do fato de que aquele que imputa fato verdadeiro a alguém não age com o propósito de caluniar.

Inciso III - visa inviabilizar decisões contraditórias no seio do próprio Poder Judiciário, porque se o Poder Judiciário anteriormente chegou à conclusão de que o acusado não é culpado, porque o absolveu, não poderia, agora, decidir de modo diverso. É a autoridade da coisa julgada. Ex. A imputa, detalhadamente, uma conduta descrevendo o fato de corrupção contra B. Sendo que B já foi submetido a uma ação penal em que se apurou esse crime de corrupção e foi absolvido. B poderá ingressar uma ação penal contra A, e A não poderá se valer da exceção da verdade, por ser vedada neste caso.

Se o pedido da exceção for julgado procedente, então o juiz necessariamente absolverá o querelado réu e ainda extrairá peças ao MP, na forma do art. 40 do CPP.

Exceção de notoriedade do fato - o art. 523 do CPP também permite a exceção de notoriedade, consiste na oportunidade facultada ao ofensor de demonstrar que suas afirmações são do domínio público. E assim, se o fato já é de domínio público, não há como se atentar contra a honra objetiva.

Não confundir calúnia, com denunciação caluniosa (art. 339 do CP). Este é um crime contra a administração pública, praticado por particular, então o sujeito que, sabendo da falsidade da situação, procura autoridade ao fito de dar causa a instauração de inquérito judicial contra aquele que ele quer prejudicar.

ART. 139 - DIFAMAÇÃO:

É a imputação, pormenorizada, de um fato ofensivo, não criminoso (mas pode ser contravenção), ainda que verdadeiro. Atinge-se a honra objetiva.

O CP não prevê difamação contra memória dos mortos, porém se a difamação ocorre através dos meios de comunicação será o art. 24 da lei de imprensa.

Consumação - quando terceira pessoa tem ciência da ofensa. Tentativa - admissível quando a ofensa é proferida por escrito.

Não importa para a configuração do crime que a imputação do fato seja falsa ou verdadeira, razão pela qual, em regra, não se admite a exceção da verdade.

§ único - A exceção da verdade, contudo, é excepcionada no § único, e ocorre somente quando o ofendido é funcionário público, e por ser funcionário público, tenha sido ofendido. A ofensa deve guardar nexo de causalidade com o exercício da função pública, nesse momento, surge o interesse da Administração Pública em saber se a imputação inconveniente é verdadeira ou não, e por isso admite-se a exceção da verdade. Ex. A se dirige a terceiros e fala "B é um funcionário público preguiçoso". Ser preguiçoso, enquanto funcionário, não caracteriza crime, ou seja, há uma ofensa a honra de terceiro, essa ofensa é diretamente relacionada ao cargo público exercido pelo sujeito, por conta disso surge o interesse da administração em saber se o sujeito realmente é ou não é preguiçoso em razão das funções, daí porque, nesse caso, admite-se a exceção da verdade, é o único caso de exceção da verdade na difamação.

A exceção da verdade no crime de calúnia, funciona como causa de exclusão de tipicidade, pois a falsidade da imputação integra o tipo. Já na Difamação, a exceção da verdade funciona como causa de exclusão de ilicitude, quando permitida.

ART. 140 - INJÚRIA:

É a atribuição de uma qualidade negativa ou a imputação de fatos genéricos ofensivos à honra subjetiva, o conceito que o ofendido tem de si mesmo. Não importa se o fato é ou não verdadeiro. São os insultos, xingamentos (ex. ladrão, vagabundo, incompetente etc).

A existência do crime está condicionada à capacidade de o sujeito passivo perceber a injúria. Assim, os doentes mentais podem ser injuriados, desde que compreendam a expressão ofensiva. Da mesma forma os menores.

O CP não prevê injúria contra memória dos mortos, porém se a injúria ocorre através dos meios de comunicação será o art. 24 da lei de imprensa

Consumação - quando o próprio ofendido tem ciência da ofensa. A injúria não precisa ser proferida na presença do ofendido, basta que chegue ao seu conhecimento, por intermédio de terceiro, correspondência ou outro meio.

Tentativa - quando a ofensa é proferida por escrito exceção de notoriedade do fato - não é uma exceção prevista em lei, é um argumento usado nos autos da ação penal. É quando o sujeito quer comprovar aquele fato que já está arraigado na consciência popular como sendo verdadeiro. Ex. todos chamam o Juiz Nicolau de Lalau, mas ele poderia ajuizar uma ação penal contra alguém, e esse alguém poderia argumentar (exceção de notoriedade do fato) que todos o chamam assim, e o juiz poderia acolher a inexistência do especial fim de agir, da especial intenção de macular a honra, fundamentar que ele não teve intenção de injuriar, e sim de reproduzir, talvez até com animus jocandi um conceito que já se tem como acertado pela opinião pública.

É importante ressaltar que estamos tratando de ação penal, o fato do sujeito ser absolvido por inexistência do especial fim de agir não descaracteriza o dano moral causado por aquela ofensa.

A injúria não admite a prova da verdade. O art. 140, § 1o - prevê duas hipóteses de perdão judicial: a) provocação (inciso I) - o provocador diretamente dá causa a injuria que sofre. A provocação pode ser um crime contra a honra, ameaça ou qualquer outra conduta reprovável. Ex. !A" provoca "B" de forma reprovável (sem ser crime) e "B" profere uma injúria. "B" terá o perdão judicial e A"" nada sofrerá, pois não praticou crime. Ex2. "A" acusa "B", de forma detalhada, de ter matado "C". "B", furioso xinga "A" de ladrão. "B", apesar de ter praticado um crime contra a honra, será beneficiado pelo perdão judicial, pois apenas revidou a provocação. Entretanto "A" responderá pelo crime de calúnia.

b) retorsão (inciso II) - No caso injúria recíproca, só o segundo, aquele que retorquiu a ofensa que recebera anteriormente de maneira reprovável é que vai se beneficiar desse perdão judicial. Não é legitima defesa, pois aqui a injuria já ocorreu.

O § 2º trata da injúria real que consiste em violência ou vias de fato (art. 21 do Dec-lei 3688/41) que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes, ou humilhantes; vale dizer que pode restar ainda uma lesão corporal. A intenção do agente é utilizar a violência ou vias de fato para injuriar.

na pena o legislador menciona: a pena é de .... além das penas correspondentes à violência. Essa pena correspondente à violência é de lesão corporal, porque a contravenção de vias de fato, fica absorvida pela injúria real.

O legislador estabelece uma obrigatoriedade de cumulação de penas na hipótese de emprego de violência com vistas à ofensa de honra de terceiro, e dessa violência tenha resultado lesão corporal, qualquer que seja essa lesão corporal. Não se trata de concurso material, e sim concurso formal impróprio que se deve cumular as penas (art. 70, 2ª parte). Ex. um tapa na cara (vias de fato), mas vamos supor que o agente estivesse com um anel e cortasse o rosto da vítima = lesão corporal. O agente vai responder pela injúria, pois o tapa demonstra uma intenção de denegrir a imagem do ofendido, esse especial fim de agir também aqui é exigido, então se aplica essa pena mais a pena da lesão corporal leve, é o que diz o preceito secundário do parágrafo segundo.

§ 3º do art. 140 - injúria qualificada - consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição idosa ou portadora de deficiência (acrescentado pela lei 10.741/03). Não deve ser confundida com o crime de racismo do art. 20 da lei 7716/89; normalmente quando o sujeito quer ofender determinada pessoa é injúria qualificada, quando há pregação contra raça ou religião, será crime de racismo.

Na injúria preconceituosa a expressão que denota uma discriminação ela é meio para se atingir a honra subjetiva do agente, e não o fim. A finalidade é discriminar para macular a honra, a distinção que existirá entre o crime de injúria preconceituosa ou injúria qualificada do racismo, é justamente essa finalidade. Vejam que a distinção gira basicamente sobre a análise do elemento subjetivo.

INJÚRIA QUALIFICADA- ART. 140 ( 3o CRIME DE RACISMO - ART. 20 LEI 7170/89Pena de reclusão de 1 a 3 anos e multa Pena de reclusão de 1 a 3 anos e multa Ação penal PrivadaAção penal pública IncondicionadaCabe liberdade provisória com e sem fiançaÉ inafiançável, só cabe liberdade provisória sem fiançaPrazo prescricional de 8 anosÉ imprescritível DISPOSIÇÕES COMUNS

ART. 141 - Causas De Aumento De Pena dos Crimes Contra A Honra

Inciso I - a fundamentação é que qualquer mácula à honra do Presidente ou chefe de governo estrangeiro pode representar desprestígio na sua vida política e por conseqüência afetar as diretrizes políticas da nação. Vale atentar que o inciso I do referido artigo não deve ser confundido com o art. 26 da lei 7170/83 que é a lei da segurança nacional, pois nesta última, a calúnia ou a difamação tem a finalidade de desestabilizar o governo.

Inciso II - dependendo do caso pode gerar um desacato (art. 331) ou pode gerar um crime contra a honra em razão das funções, é o chamado crime contra a honra propter offícium. Para configurar o inciso II deste artigo, a intenção é, malgrado haja nexo de causalidade entre a ofensa e a função pública, é amesquinhar a honra da pessoa, do funcionário em razão da função. Ex. "você é um corrupto porque você no exercício de suas funções recebe dinheiro para praticar o ato de ofício". Vejam que, nesse caso, há um nexo de causalidade entre a ofensa-honra, você é um corrupto, e o exercício das funções, você é um corrupto por conta disso. De alguma maneira a Administração Pública é maculada nessas situações, por isso que a Ação Pública é condicionada à representação (art. 145, § único). A intenção aqui, pelo menos teoricamente, foi a de macular à honra da pessoa do funcionário. Agora dizer o seguinte, "Você é um escrevente de m...", não se está pretendendo com isso amesquinhar a pessoa e sim a própria função, o crime é de desacato, pois estamos menosprezando a profissão.

Inciso III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, injúria ou difamação (alto-falante, escrever em muros). Várias pessoas para a doutrina majoritária seriam pelo ao menos três, fora o ofendido e ofensores e pessoas que não tenham capacidade de compreender a ofensa. Vale lembrar que o ofensor deve necessariamente ter conhecimento da presença de várias pessoas. (art. 19) § único - se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro. Trata-se de motivo torpe. Para Fernando Capes, tanto o mandante quanto o mandado respondem pela majorante. ART. 142 - EXCLUSÃO DO CRIME (SOMENTE INJÚRIA E DIFAMAÇÃO)- para alguns autores seria causa de exclusão de ilicitude, pois o fato é típico, para outros de exclusão de tipicidade, pois falta elemento subjetivo do tipo (aminus injuriandi vel diffamandi).

o tipo subjetivo dos crimes contra a honra, é um tipo subjetivo complexo, composto de dolo mais especial fim de agir, ambos admitem o dolo eventual. A rigor, essas situações de imunidade acontecem naquelas situações onde não há o especial fim de macular a honra de terceiro. Cabe destacar que a calúnia não tem imunidade, assim ninguém tem o direito de caluniar.

Inciso I - é a imunidade judiciária na discussão da causa. Deve ter relação com a causa, ou no juízo cível ou no juízo criminal, pois o exercício prático do direito é pautado na argumentação recíproca, de onde o juiz extrai sua convicção. E como essas argumentações são exercidas por seres humanos, por vezes as emoções se exaltam, e dessa exaltação poderia surgir uma ofensa. Nesse contexto, ofensas relacionadas à causa posta em discussão, embora típicas, não podem configurar conduta antijurídica, sob pena de inibir a ampla defesa. Nota-se que a conduta tem que ser praticada pela parte ou seu procurador (e não por juiz, serventuário, testemunha, perito etc). A imunidade acoberta as ofensas contra o MP, desde que este atue como parte (e não custos legis), e tenha relação com a causa. Em relação ao Juiz, existem 2 correntes: 1) tem imunidade desde que tenha relação com a causa; 2) não tem imunidade, pois para defender uma tese, por mais importante que seja, não é necessário envolver o órgão jurisdicional.

Ex. durante um júri, após o MP tecer comentários sobre o crime, o advogado, em exposição do fato, chama o MP de mentiroso e preguiçoso, porque leu e omitiu dos jurados, com o intuito de engana-los, trechos do depoimento de testemunhas. Aqui já poderíamos observar uma ofensa (não calúnia) sendo dirigida contra o MP, porém, há imunidade, porque, caso acolhidas as argumentações a tese sustentada será favorável, então há uma conexão entre o que se discute na causa e a ofensa, isso sim concretiza a ratio do instituto. A ofensa gratuita não tem imunidade, se o MP revidasse o chamando de "corno", por exemplo, como não se extraí relação nenhuma com o que se discute na causa, é uma ofensa gratuita, que já revela então o especial fim de macular a honra, ou seja, não tem a imunidade judiciária.

Inciso II - todo aquele que expõe a sua obra ao público está sujeito à crítica, e o CP a autoriza, ainda que em termos severos, desde que não esteja comprovada a intenção de difamar ou injuriar. A opinião revela única e exclusivamente o intuito de informar a sociedade, ou de informar um grupo especializado da má qualidade daquela obra, que se criticou. É o único caso em que o legislador já estabeleceu, de antemão, essa necessidade de que a crítica não revele por si só um intuito de macular a honra.

Inciso III - o sujeito ativo que profere a expressão nesse sentido será sempre um funcionário público, nos termos do artigo 327 do Código, e esse funcionário têm por missão, no exercício cotidiano das funções, de emitir conceitos sobre quem está sendo submetido ao seu crivo. Ora, se toda a vez que funcionário público emitisse um conceito desfavorável sobre aquela pessoa que está sob o seu crivo, seja julgamentos judiciais (juizes), seja oferecimento de denúncia (MP), seja por via de um procedimento administrativo disciplinar, se toda a vez que esse sujeito assim fizesse, pudesse ser de imediato demandado em juízo por um crime contra a honra, ele na verdade não exerceria a função, ou gastaria todos os seus vencimentos pagando um advogado para lhe defender.

ART. 143 - DA RETRATAÇÃO:

a retratação significa reconsiderar o que foi dito, só é cabível em crimes de calúnia e difamação (não é aceita na injúria), e mesmo assim, cabível em ação penal privada e antes da publicação da sentença de 1º grau (sublinhar querelado, logo não cabe no caso do art. 141, I e II), isto é, geralmente na audiência de conciliação, antes do juiz prolatar a sentença, antes do julgamento. Serve para restaurar a honra da pessoa que foi ofendida, por isso deve ser cabal, se persistir a dúvida não será considerada a retratação. Como a retratação não parte da idéia de um arrependimento, não se exige um sentimento nobre do sujeito ativo, basta que ele resgate a dignidade do ofendido. Para este, é mais útil do que a condenação do ofensor.

A retratação não se confunde com o perdão do ofendido (art. 105 e 107, V), pois o perdão depende de aceitação do ofendido enquanto que a retratação é ato unilateral do querelado, que o juiz absolve, julgando extinta a punibilidade (art. 107, VI); o querelado retira tudo aquilo que disse anteriormente (a calúnia ou a difamação), não há necessidade do juiz ouvir o querelante.

A retratação é circunstancia subjetiva incomunicável de modo que a retratação realizada por um dos co-autores não se comunica aos demais. A retratação na lei de imprensa (art. 26 da lei 5250/67) é cabível em todos os crimes contra a honra, inclusive no crime de injúria.

ART. 144 - DO PEDIDO DE EXPLICAÇÕES:

tem a finalidade de esclarecer aquilo que foi dito pelo sujeito ativo. Ex. A, B e C encontram-se numa sala questionando um deles quem fora o autor do crime de subtração de um bem. A diz: "meu relógio sumiu nessa casa e só estávamos nós, estou achando estranho". B, para se livrar diz: "É, eu também estou achando muito estranho essa história, porque eu nem vi esse seu relógio, mas eu estou achando estranho, porque só tínhamos nós três aqui". C não tem outra alternativa, só lhe resta pensar o seguinte "Ora, estão pensando que fui eu, B ao dizer isso imputou a conduta de subtrair o relógio do A a minha pessoa".

Nota-se que não foi uma expressão direta, deixou dúvidas. Logo, C poderia se valer desse instrumento processual, chamado pedido de explicações (no processo civil tem um instrumento parecido - a interpelação). A finalidade do pedido de explicações nada mais é do que esclarecer o intuito subjetivo do agente que proferiu uma expressão, frase, ou referência dúbia, visa-se com isso chamar em juízo a pessoa que disse a frase, e questioná-la se, ao dizer, ela visou imputar o crime, ou imputar o fato ofensivo a reputação, ou atribuir a qualidade negativa ao sujeito.

No pedido de explicações, não há relação processual penal que tenha a pretensão punitiva, visa só esclarecer a intenção do sujeito, primeiro se houve atribuição e segundo se houve intenção quando da atribuição, justamente por isso, não será proferida decisão alguma nos pedidos de explicações. Se, no exemplo acima, B comparecer e falar que não foi nada daquilo, que não teve a intenção, vai desaguar em um nada jurídico, porque isso, por certo, inviabilizará o futuro exercício de uma ação penal, mas até então o juiz não vai fazer absolutamente nada, como o juiz vai absolver antecipadamente se não há pretensão deduzida em juízo?

Não há previsão na legislação penal sobre o rito, tendo sido adotado o disposto no art. 867 a 873 do CPC (notificações ou interpelações judiciais)

Agora se B confirmar o que C imaginou e o acusar, o juiz homologa a situação, e os autos serão entregues, então, à pessoa que requereu a explicação, e ela, se a ação penal for privada, decide se vai ou não vai ajuizar a queixa crime. Se a ação penal for pública condicionada ela decide se vai ou não representar contra o sujeito, e os autos do pedido de explicação servirão então de peça de informação para ele ajuizar a queixa crime no futuro, através de outra peça, em outros autos, tal como se fosse por exemplo, o inquérito policial. É tão somente essa a finalidade do pedido de explicações.

O entendimento é que uma vez proposto o pedido de explicações, o juízo se tornará prevento para futura ação penal (será o mesmo juiz). E mais, o juiz quando do pedido de explicações não deverá emitir opinião, sob pena de tornar-se suspeito para futura ação penal.

ART. 145 - DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA HONRA

A regra é que a ação penal seja privada nos três delitos contra a honra. O ofendido ou seu representante legal poderão exercer o direito de queixa dentro do prazo de 6 meses, contado do dia em que vierem a saber quem foi o autor do delito (art. 38 do CPP). O prazo é decadencial.

Exceções - a) art. 145, caput, 2ª parte - art. 140, § 2º - quando na chamada injúria real, da violência, resulta lesão corporal (notem que se resultam em vias de fato é ação privada). O legislador não disse qual seria a ação penal, daí porque se tem que a injúria real é crime de ação penal pública incondicionada. Ocorre que com art. 88 da lei 9.099/95, a ação penal nos crimes de lesão corporal leve passou a ser pública condicionada a representação, logo teremos 2 situações: 1) se resultar lesão corporal leve - a ação penal será pública condicionada aa representação; 2) se resultar lesão corporal grave - ação penal será incondicionada. b) art. 145, § único 1ª parte - Se os delitos forem cometidos contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro (art. 141, I) a ação penal será pública condicionada à requisição do Ministro da justiça. c) art. 145, § único 2ª parte- será ação penal pública condicionada à representação se a ofensa for contra funcionário público referente às suas funções (art. 142, II)

CRIMES CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL.

Objeto jurídico - A liberdade individual abrange a liberdade física e a psíquica. A CF/88 em seu art. 5º, II, garante a todos o direito de não ter sua liberdade tolhida pela ação arbitrária do Estado e dos demais cidadãos, ou seja, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude da lei.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL (art. 146) Constranger significa coagir, forçar, obrigar. Vale ressaltar que a ação de constranger realizada pelo coator deve ser ilegítima (ex. deixar de passar na rua X, pagar uma dívida de jogo etc), pois se for legítima, ou seja, se a pretensão do agente puder ser exigida por intermédio de ação judicial, poderá haver o delito do art. 345.

Os meios previstos para a prática do delito são: a) coação mediante violência física - pode ser direta ou indireta (sobre terceira pessoa ou coisa a que o coagido esteja vinculado) b) coação mediante ameaça - é a intimidação de causar um mal iminente ou futuro como meio para obter determinado comportamento da vítima. O mal prometido deve ser relevante, determinado e possível. Na ameaça (art. 147) a intimidação é o próprio objetivo, no constrangimento é o meio. c) qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência do ofendido - priva a liberdade de escolha do ofendido através, por exemplo, da hipnose, álcool, narcóticos etc.

Previsto no art. 146, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, é crime comum, e o sujeito passivo, em regra, também pode ser qualquer pessoa, mas esta deverá TER CAPACIDADE DE ENTENDIMENTO, deve entender que sua liberdade de escolha está sendo tolhida. OBS : Se a violência ou a grave ameaça visar a prática de crime, configurará o crime de tortura (art. 1º, I, "b" da lei 9455/97).

Admite tanto o dolo direto, quanto o eventual. O agente deve saber que não está autorizado pela lei a se valer dos referidos instrumentos de coação para obter o comportamento da vítima.

Consumação - por ser um crime material, vai ocorrer um resultado naturalístico. O crime se consuma no momento em que a vítima faz ou deixa de fazer alguma coisa, no momento em que esta obedece à ordem do coator, caso contrário estará configurada a tentativa.

Natureza subsidiária - subsidiária é a norma que descreve um grau menor de violação de um mesmo bem jurídico, ou seja, embora definido como delito autônomo, encontra-se compreendido em outro tipo como fase normal de execução de crime mais grave, ex. art. 213, 216-A, 214 etc.

§ 1º- exige o concurso de no mínimo quatro pessoas para incidir a majorante prevista na primeira parte. Bitencourt entende que somente os co-autores devem ser computados, uma vez que o texto legal exige que tenham participado da "execução do crime". Já Fernando Capez entende que se exige que mais de três pessoas se reúnam para a execução do crime, ou seja, não é necessário que todos executem a ação, podendo ser co-autor e partícipe.

A segunda majorante é o emprego de armas (o plural indica gênero, pode ser apenas uma). A arma pode ser própria (tem a finalidade especifica de ataque ou defesa, ex. revólver, granada, bomba etc); ou imprópria (a finalidade natural não se destina ao ataque ou defesa, ex. machado, faca etc)

§ 2º A doutrina clássica majoritária entende se tratar de concurso material de crimes, uma vez que o legislador o reconheceu expressamente. Logo, quando do emprego de violência para a prática do crime de constrangimento ilegal advier lesão corporal, as penas deverão ser somadas. Bitencourt entende que a referida expressão faz referência ao sistema de cúmulo material, razão pela qual o concurso formal imperfeito (art. 70 , 2ª parte) seria o mais correto, já que ocorreu uma unidade de ação e pluralidade de crimes. § 3º Natureza Jurídica da exclusão (existe divergência): a) Nelson Hungria, Magalhães Noronha, Mirabete e outros entendem que se trata de uma excludente da ilicitude, estado de necessidade de terceiro. b) Delmanto, Bittencourt, Fernando Capez, Damásio e outros entendem que se trata de um estado de necessidade de terceiros levado a categoria de excludente de tipicidade. inciso I) Em regra, as intervenções cirúrgicas constituem exercício regular de direito, desde que tenham o consentimento do ofendido ou de seu representante legal. Estando o paciente correndo iminente perigo de vida, poderá caracterizar o estado de necessidade em favor de terceiro. Ocorre que, de acordo com o § 3º a intervenção médica, quando ausente o consentimento da vítima, mas estando esta correndo perigo de vida, é atípica, para alguns, configurando nesse caso, a exclusão da tipicidade, já que esta é a adequação do fato à norma. Inciso II) A coação exercida para impedir o suicídio exclui a própria tipicidade do fato, pois a existência da previsão legal em si constitui causa de exclusão de adequação típica. PENA E AÇÃO - a pena é alternativa, PPL ou multa. Entretanto, aplicam-se cumulativamente e em dobro no caso do §1º. A ação penal é pública incondicionada.

AMEAÇA (art. 147)

No crime de ameaça, a finalidade do agente é intimidar e perturbar a tranqüilidade e paz do ofendido. O dolo pode ser direto ou eventual. Os meios de execução são: mediante palavras; escritos; gestos (ex. apontar arma de fogo); ou qualquer outro meio simbólico (ex. enviar boneco perfurado com agulhas etc). A ameaça pode, ainda, ser: direta (refere-se ao sujeito passivo ou ao seu patrimônio); ou indireta (se refere a terceira pessoa ligada à vítima); explicita; ou implícita; condicional (ex. "se repetir o que disse, eu lhe parto a cara!", se fulano me denunciar, eu mato você etc). Para configurar a adequação típica, o mal tem que ser injusto (sem apoio legal) e grave. A ameaça deve ser capaz de atemorizar o homem médio. O poder intimidatório da ameaça também deverá ser avaliado conforme as circunstâncias pessoais da vítima. Se a ameaça é proferida em estado de embriaguez, apesar de existir entendimento contrário, predomina no sentido de que deverá ser avaliado o motivo e o grau de embriaguez. O crime de ameaça é também subsidiário, porque ameaça é elementar de outros crimes, como por exemplo, o roubo, extorsão, constrangimento ilegal, estupro, atentado violento ao pudor, etc.

Consumação - é um crime formal, logo a consumação ocorre no momento em que o teor da ameaça, a intimidação, chega ao conhecimento do ameaçado, independentemente de sentir-se ameaçado e de se concretizar o mal prenunciado.

Tentativa - alguns autores sustentam ser possível na modalidade escrita. Entretanto, uma vez que o § único diz que se trata de ação penal pública condicionada à representação, para que o sujeito exerça o direito de representação é necessário que antes tome conhecimento da ameaça. Se isso ocorreu, o crime é consumado e não tentado.

§ único - trata-se de ação penal pública condicionada à representação do ofendido, este tem seis meses (prazo decadencial), contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime (art. 38 do CPP)

SEQUESTRO OU CARCERE PRIVADO (art. 148) "Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado". Se consuma quando a vítima tem o seu direito, a sua liberdade de locomoção afetada, diminuída, reduzida. A doutrina faz diferença entre o seqüestro e o cárcere privado, no seqüestro a vítima embora privada de sua liberdade, tem maior poder de locomoção (exemplo: casa, ilha, fazenda), enquanto que no cárcere privado a vítima não possui liberdade de locomoção (exemplo: buraco, jaula, amarrada em um quarto), é o que acontece, por exemplo, na extorsão mediante seqüestro (art. 159), na verdade seria extorsão mediante cárcere, mas como não há distinção prática alguma, é irrelevante.

A liberdade jurídica tutelada é a liberdade de ir e vir, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois se trata de crime comum, e o sujeito passivo também, inclusive pessoa que não tenha capacidade de entendimento, é crime material (exige a produção do resultado), permanente (perdura por um tempo), que se consuma no instante em que a vítima se vê privada da liberdade de locomoção. A tentativa é possível na forma comissiva.

O tempo de duração da privação é irrelevante, devendo ser considerada somente para efeito de dosagem da pena.

Para Damásio é possível a prática do delito mediante omissão, ex. deixar de pôr em liberdade pessoa que se restabeleceu de doença mental.

Esse crime não se confunde com a extorsão mediante seqüestro, que há o intuito de obter vantagem econômica, enquanto que no seqüestro, o único intuito é privar a vítima de sua liberdade.

Também não se confunde com o rapto (art. 219) que é de mulher honesta para fim libidinoso, nem se confunde quando for o funcionário público que vier a tolher a liberdade de pessoa que não esteja em flagrante delito, que é crime de abuso de autoridade.

O crime é doloso e o dolo é dirigido única e exclusivamente à vontade de cercear a liberdade individual da vítima, qualquer outro fim de agir fará ou desaguará em outro crime, assim, por exemplo, se o dolo do agente é dirigido a uma finalidade libidinosa, o crime é de rapto, vejam a distinção entre o rapto e o seqüestro se dá pelo tipo subjetivo, todo rapto contém um seqüestro. De igual maneira se a finalidade com a restrição a liberdade individual da vítima visa a obtenção de vantagem ilícita, patrimonial o crime é de extorsão mediante seqüestro, também apenas num plano subjetivo há uma distinção.

O crime pode ocorrer de duas formas: 1) detenção (ex. retirar a vítima de um local e coloca-la em outro); 2) ou retenção (impedir que a vítima saia do local). § 1º - qualificadora: inciso I) não pode ser interpretada de forma extensiva, ex. padrasto; Inc. II) há o emprego de fraude; inc. III) deve ser contado com base no art. 10 do CP. § 2º - maus-tratos aqui é o emprego de meios que acarretam grave sofrimento à vítima pode ser físico (ex. frio, fome etc) ou moral (ex. situações humilhantes). Se ocorrer lesão corporal, haverá concurso material de crimes. A ação penal é pública incondicionada.

REDUÇÃO A SITUAÇÃO ANÁLOGA DE ESCRAVO (art. 149):

É crime material e permanente, portanto, a consumação ocorre quando o sujeito logra reduzir a vítima à condição análoga à de escravo. A prescrição só irá iniciar, como em todo crime permanente, quando cessada a permanência, artigo 111, inciso III.

A redução consiste na vontade de exercer domínio sobre outra pessoa, mediante emprego de fraude, ameaça etc. A redução à condição análoga de escravo, ainda que haja um consentimento esse consentimento será irrelevante, porque além da liberdade de locomoção, liberdade individual, se tutela a dignidade da pessoa humana, que é bem jurídico indisponível. A última parte do artigo diz respeito àquelas situações onde os contratados não recebem salário, pois se tornam devedores de seus patrões devido às suas despesas (moradia, alimentação, condução etc.)

VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO (art. 150)

A objetividade jurídica é a inviolabilidade do domicílio, da tranqüilidade domiciliar, que é protegida pela CF/88 em seu art. 5º, XI. Os sujeitos ativos e passivos do crime podem ser qualquer pessoa.

É crime doloso, e o dolo deve abranger o conhecimento do elemento normativo "contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito", pode ocorrer erro de tipo.

Temos dois núcleos verbais: entrar e permanecer, essa entrada ou permanência para que sejam típicas, devem ser astuciosas, clandestinas ou contra a vontade do morador. Na permanência presume-se, por óbvio, que a entrada foi legitima. Quando o agente age com astúcia (ex. se veste de carteiro para entrar) ou clandestinidade (às ocultas), presume-se o dissentimento da vítima.

O crime possui mais de um núcleo verbal, também chamado tipo misto, tipo misto que aqui é alternativo, o que significa dizer que se o sujeito entra e permanece contra a vontade, ele só responde por um único crime de violação de domicilio, não por dois, malgrado tenha violado os dois núcleos verbais.

O crime é de mera conduta, o legislador só descreve a conduta do sujeito ativo, sem fazer referência a qualquer resultado.

Para Damásio não é um crime subsidiário, pois entre a violação de domicílio e os delitos que a absorvem não há subsidiariedade nem expressa, nem implícita (princípio da consunção- é absorvido por outro de maior gravidade, a quem serve de meio de execução ou normal fase de execução). Já para outros autores, como Bitencourt, pode, eventualmente, ser subsidiário, quando coincidirem na proteção do mesmo bem jurídico e haja diversidade de graus de proteção desse bem jurídico tutelado, liberdade individual, ex. furto com rompimento de obstáculo.

Consuma-se com a entrada (delito instantâneo) ou permanência (delito permanente), astuciosa, clandestina, ou contra a vontade do morador.

A tentativa, em tese, é admissível, embora seja de difícil configuração, por se tratar se crime de mera conduta. Para alguns autores é impossível na modalidade tentar entrar. § 1º (qualificadora)- durante a noite (não se falou em repouso noturno, mas sim em noite, ausência de luz solar. A majorante se justifica pelo fato de que o período noturno dificulta a defesa do ofendido.); ermo (habitualmente despovoado); violência física (contra pessoa ou coisa); emprego de arma (própria ou imprópria); por duas ou mais pessoas (divergência se cabe somente co-autoria, "se o crime é cometido... por duas ou mais pessoas, ou autoria e participação)

§ 2º (causa de aumento de pena) - "casos legais" são os previstos no § 3º. "Inobservância das formalidades legais" são aquelas hipóteses onde o funcionário não cumpre corretamente o que está na lei, esta prevê a legitima entrada de funcionários públicos em casa alheia para efetuar determinadas diligencias. Ex. oficial de justiça tem que cumprir ordem judicial fora do período noturno (art. 241 a 248 e 293 do CPP). Já o "abuso de poder", para alguns, ocorre quando o funcionário excede-se no cumprimento do dever legal, ex. oficial permanecer na residência do executado, contra a vontade deste e desnecessariamente, além do tempo preciso.

Cabe ressaltar que a própria Constituição trata dessa matéria em seu art. 5º, XI. Doutrina majoritária entende que o funcionário público que entre dolosamente, fora as ressalvas constitucionais, incidirá na lei 4898/65, art. 3º, "b". Para alguns é questão de conflito aparente de normas (especialidade) e para outros a questão é de direito intertemporal (lei posterior que cuida da matéria que tratava a lei anterior e com ela incompatível, revoga essa lei anterior - revogação tácita). § 3º - causas especiais de exclusão de ilicitude -ver código

DA VIOLAÇÃO DE CORRESPONDÊNCIA (art. 151)

A CF/88, em seu art. 5º, XII, determina a inviolabilidade da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e telefônicas.

A parte referente à interceptação de comunicações telefônicas foi regulamentada pela lei 9.296/96.

Já o art. 40 da lei 6538/78 dispõe: "Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada dirigida a outrem." Assim, para alguns, o art. 40 da referida lei teria derrogado o art. 151 do CP, não se encontrando em sua plena vigência. O bem jurídico tutelado é a liberdade de comunicação do pensamento, sem intromissão de terceiros, por isso é preciso que tenha destinatário específico. O consentimento do remetente ou do destinatário descaracteriza o crime. Para Damásio tem que ser de ambos. A Administração penitenciária, com fundamento em razões de segurança pública, pode, excepcionalmente, "violar" correspondências dos presos. (art. 41, § único da LEP) O objeto material é a correspondência fechada (art. 47 da lei 6538/78, "é toda comunicação de pessoa a pessoa, por meio de carta, através de via postal, ou por telegrama"). Ex. o fax é correspondência aberta, logo não se aplica. Sujeito ativo - qualquer pessoa, é crime comum. Sujeito passivo - são o remetente e o destinatário. Para Fernando Capez, o responsável pelo menor de idade pode violar a correspondência deste.

Consumação - Para Damásio, não importa o idioma em que a correspondência esteja contida, uma vez devassada, o crime está consumado. Para grande parte da doutrina, devassar é tomar conhecimento do conteúdo é saber do que se trata (ex. dinheiro, carta, cds etc). É desnecessária a abertura da correspondência, basta, por qualquer meio, tomar conhecimento do conteúdo.

O § 1º, I foi tacitamente revogado pelo art. 40, § 1º da Lei 6538/78. É um crime formal que se consuma com o simples apossamento da correspondência.

O inciso II - são 3 núcleos: divulgar (relatar o conteúdo da correspondência a um número indeterminado de pessoas); utilizar (usar a comunicação obtida para qualquer fim); transmitir (narrar o conteúdo a terceiro). É crime material, que se consuma no momento em que ocorre qualquer das ações típicas. Damásio entende que o art. 10 da lei 9296/96, que cuida da interceptação telefônica, teria revogado a parte final do art. 151 ( 1o, II do CP no que tange a conversação telefônica. Para Fernando Capez, entretanto, não houve a revogação, pois são figuras diferentes. O referido art. 10 trata da violação do conteúdo da interceptação telefônica, quebrando o segredo de justiça, feita por pessoas autorizadas legalmente a participar do procedimento de interceptação telefônica (ex. juiz, MP, delegado etc), já o caso do incido II do § 1º do art. 151 é a divulgação de qualquer conversa telefônica ex. linha cruzada.

A lei pune a conduta de impedir a conversação telefônica no inciso III do ( 1o do art. 151, pode ser feito confronto com o art. 266 do CP, a diferença é que no art 151, inciso III do ( 1o, impede-se a conversação de pessoas determinadas, mas se for por exemplo um corte do cabo telefônico que deixa um bairro sem telefone, responde pelo crime do art. 266.

O inciso IV foi tacitamente revogado pelo art. 70 da lei 4.117/62 (código Brasileiro de telecomunicações)

§ 2º - só se aplica se for comprovada e relevante. O dano pode ser moral ou material. § 3º - não é abuso de autoridade, pois nem todo funcionário público reputa-se autoridade. § 4º - é crime de ação penal pública condicionada a representação, salvo as exceções expressas.

CORRESPONDÊNCIA COMERCIAL (art. 152) BJT - a liberdade de comunicação de pensamento transmitida por intermédio de correspondência comercial. Sujeito Ativo - é crime próprio -só pode ser o sócio ou o empregado. Se consuma com o desvio, sonegação e etc. Admite-se a tentativa. Ação penal pública condicionada a representação - § único

DA DIVULGAÇÃO DE SEGREDO (art. 153): É crime formal, consiste na divulgação de segredo a um número indeterminado de pessoas (corrente majoritária). O crime é próprio de quem é destinatário ou detentor da informação. Não é necessário que a divulgação cause prejuízo econômico ou moral a terceiro, pois o CP diz "cuja divulgação possa produzir dano a outrem", ou seja, basta a potencialidade lesiva.

A ação penal será pública condicionada à representação.

DA DIVULGAÇÃO DO SEGREDO PROFISSIONAL: O sujeito ativo será o profissional, como médico, padre, advogado, basta que estes contem o segredo a terceiro, que tomaram conhecimento através do exercício de suas funções. É crime próprio. Segundo Damásio, função é a incumbência determinada a uma pessoa, em face da lei, imposição judicial ou contrato. Ex. tutor; ministério é a incumbência determinada por uma situação de fato e não de direito ex. sacerdote; ofício é a atividade eminentemente manual.

O crime é formal e se consuma no momento da realização da conduta, independentemente da produção de qualquer resultado. É crime de ação penal pública condicionada à representação (§ único).

O crime de violação de segredo diz respeito à atividade privada. Tratando-se de atividade pública poderá ser art. 325 do CP ou 326.

CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO.

O Código Penal nessa parte tutela o patrimônio particular, a coisa móvel com valor econômico juridicamente relevante, que para alguns autores abrange os bens com valor apenas sentimental, o que difere dos bens de pequeno valor. Agora como o bem jurídico tutelado então é de todo disponível, por parte de seu titular, cabe analisar, aqui, a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ou da bagatela em relação a esses crimes, e também do consentimento do ofendido, funcionando como causa de exclusão da própria tipicidade.

Patrimônio, para fins penais, apesar de haver divergências, é a utilidade propiciada ao titular do objeto, logo, a subtração de um objeto alheio não lesiona só a propriedade, mas também os poderes de disposição sobre o objeto..

No que toca a insignificância, nós deveremos analisar que este princípio poderá ser aplicado a esses delitos que tutelam o patrimônio particular. Devemos observar, entretanto, que naqueles delitos que, apesar de protegerem o patrimônio, exista elementar que denote um desvalor de conduta exacerbado por parte do sujeito ativo do crime (ex. violência), não se poderá cogitar de aplicação do princípio da insignificância, porque o tipo penal valorava uma situação, que prepondera sobre o resultado jurídico.

O princípio da insignificância ou da bagatela suprime o desvalor do resultado, o bem jurídico não foi de forma significativa afetado, conseqüentemente o resultado jurídico, que é a ofensa ao bem jurídico, causada pela conduta do sujeito não foi significativo para fins penais, se o direito penal só atua quando os outros ramos não se mostram aptos, nesse caso ele não deveria atuar.

Vamos imaginar um crime de roubo, cujo objeto roubado seja avaliado em R$ 10,00 (dez reais). Ex. "A", exercendo grave ameaça com emprego de arma de fogo, rouba de outra R$ 10,00. O crime de roubo tutela o patrimônio, ora, se o crime de roubo tutela o patrimônio, será que o patrimônio dessa pessoa foi severamente afetado pelo desfalque de R$ 10,00? Pode não ter sido, mas vejam, duas elementares no crime de roubo, aí denotando um desvalor de conduta preponderante sobre o desvalor do resultado, a grave ameaça e/ou violência, conseqüentemente nesse tipo de crime não se poderá aplicar o princípio da insignificância, não há um roubo insignificante, assim como não há uma extorsão insignificante. Justamente pela preponderância, nesses tipos, dada a redação que o legislador optou, o desvalor de conduta sobre o desvalor de resultado.

Então a regra é que, como esses crimes tutelam o patrimônio, e esse patrimônio é o patrimônio privado, a princípio se poderá aplicar aí, livremente, o princípio da bagatela ou princípio da insignificância. Diante desses crimes, entretanto, em que na redação do tipo o legislador insere uma elementar que revele um desvalor de conduta exagerado, preponderante, basicamente são os crimes em que há a elementar violência ou grave ameaça, como é o crime de roubo, como é o crime de extorsão mediante seqüestro, não se aplicará.

CRIME DE FURTO.

Diz o tipo objetivo do crime de furto subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel, com o fim de assenhoreamento definitivo. Não há uma elementar indicando essa preponderância do desvalor da conduta, conseqüentemente, a princípio, pode-se cogitar da aplicação do princípio da insignificância, da bagatela em sede do crime de furto, essa é a posição amplamente majoritária, mas anotem posição minoritária no que toca a aplicação da bagatela no furto, de parte jurisprudência que entende ser inaplicável a bagatela no crime de furto dada a disposição inserida pelo legislador no § 2º do art. 155 do Código Penal.

O tipo objetivo do crime de furto parte do pressuposto de que o objeto material do crime de furto é coisa alheia móvel. A res nullius (coisa de ninguém) e a res derelicta (coisa abandonada) não podem ser objeto material do crime de furto, por falta de previsão em lei. Já a res desperdita (coisa perdida), quando apanhada pelo sujeito, não é objeto de furto, e sim de apropriação indébita de coisa achada (art. 169, § único, II do CP).

É necessário que o agente tenha conhecimento do elemento normativo "alheia", pois se a subtrai supondo-a própria, existe erro de tipo.

Apesar de existir divergência doutrinária quanto à objetividade jurídica, majoritariamente, tem se entendido que é objeto da proteção tanto a propriedade (conjunto de direitos inerentes ao uso, gozo, e disposição dos bens), como a posse (art. 1.197 do CC exercício de alguns direitos inerentes ao proprietário) - e a detenção (art. 1.198 do CC - não é possuidor, o detentor conserva a posse em nome do proprietário ou do possuidor e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Ex "A" pede a "B", Office-boy, que efetue o pagamento no banco. "B" tem a detenção e não a posse); vez que representa um bem para o possuidor poder usa-la, e, por conseqüência, a privação desse uso implica necessariamente um dano de natureza patrimonial, pois há interesse na coisa furtada.

Ex. o dono do imóvel é o proprietário, o locatário é o possuidor e o caseiro, o detentor.

OBS: A posse tem que ser legítima, pois se ladrão furta ladrão, o sujeito passivo será o proprietário.

Consentimento do titular - exclui a tipicidade da conduta, porque com o consentimento não se poderá precisamente afirmar que houve uma subtração. A subtração implica na implícita discordância da vítima.

FURTO FAMÉLICO - não há crime pela exclusão da ilicitude, estado de necessidade, é preciso o preenchimento dos requisitos do art. 24 do CP.

O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa (crime comum), havendo controvérsia doutrinária quanto à possibilidade de o proprietário ser autor. Os que sustentam a possibilidade do proprietário ser o autor, afirmam que, se o furto é a violação da posse, caracteriza-se como coisa alheia (minoritária).

Para Damásio, Luiz Regis Prado e outros, o proprietário não pode ser autor do delito de furto, a coisa não pode ser própria e alheia ao mesmo tempo, ex,. "A" deve dez mil reais a "B", dando-lhe em garantia um relógio (contrato de penhor). "A", sabendo que não tem como pagar a dívida, penetra na residência de "B" e subtrai o relógio. Para Damásio, não existe furto de coisa própria e sim o delito do art. 346 do CP, ou ainda, se "A" subtrai a bolsa de "B", e "B" entra na residência de "A" e subtrai sua bolsa, seria o delito do art. 345, uma vez que o meio correto para reaver sua bolsa seria pela via judicial. E, ainda, quem subtrai coisa comum comete o delito do art. 156.

No furto de coisa comum, a objetividade jurídica é o patrimônio, a propriedade e a posse (legítimas), é crime próprio do condômino, do co-possuidor, do sócio, do possuidor legítimo ou do co-herdeiro. O sujeito passivo também pode ser estas pessoas.

Desde o primeiro momento em que o sujeito ativo do crime de furto adquire a posse do bem, essa posse já é ilícita, isso que vai distinguir o crime de furto, por exemplo, do crime de apropriação indébita (art. 168), pois enquanto na apropriação indébita em algum momento a posse era lícita, era legítima, no crime de furto ela sempre foi ilícita, ela sempre foi ilegítima, a posse do sujeito ativo do crime.

Sujeito passivo - o proprietário, o possuidor ou o mero detentor.

O tipo subjetivo do crime de furto é complexo, ele é composto de dolo de "subtrair coisa alheia móvel" + com o fim, intenção de assenhoreamento da coisa (animus furandi), que a doutrina penal nomeia de animus rem sibi habendi, traduzido por essa expressão para si ou para outrem.

O que sempre se exige no crime de furto, é que haja uma intenção de se assenhorar do bem, uma intenção de se comportar frente ao bem tal como se dono fosse, e só o dono pode dispor do bem, só o dono pode ceder o seu bem para terceiro, conseqüentemente, na hipótese em que o furto, o sujeito ativo do crime de furto apenas tem a intenção de repassar o bem para terceiro também há o animus rem sibi habendi, também há uma intenção de assenhoreamento, porque só pode dispor do bem quem dono é. Entretanto, observar, contudo o seguinte, não há o animus rem sibi habendi naquelas hipóteses em que o sujeito tem até a vontade de retirar o bem da esfera de disponibilidade em que ele se encontra, mas apenas o faz com a intenção de usar o bem, isso é o que a doutrina é denomina de furto de uso.

FURTO DE USO - O furto de uso é uma figura de atipicidade subjetiva (falta o dolo de apropriar-se), e acontece naquelas situações onde o sujeito ativo do crime, sem autorização expressa ou tácita, retira a coisa móvel de outrem da esfera de disponibilidade que ela se encontrava, porém o faz tão somente ao intuito de se utilizar o bem, não há essa intenção de assenhoreamento do bem. Ex. porteiro que está com a chave do veículo, já que o morador do prédio lhe entregou a chave para lavar o veículo, retira o carro da garagem do prédio, mas o faz para dar uma "voltinha" com a namorada e logo em seguida devolve o veículo nas mesmas condições em que ele se encontrava dentro na garagem.

Vejam, essa hipótese é clássica de furto de uso, não se poderá dizer que ao retirar o bem da esfera de proteção, garagem, em que ele se encontrava, o sujeito tenha atuado com esse animus rem sibi habendi, e a intenção dele era tão somente devolver o bem logo após utiliza-lo. Bem verdade que essa utilização foi desautorizada, justamente por isso que há a perpetração do núcleo verbal subtrair, mas não há o especial fim de agir reclamado pelo crime de furto, essa hipótese é uma hipótese de atipicidade da figura do crime de furto de uso acontece por falta do especial fim de agir, por falta do dolo específico nesse outro elemento subjetivo reclamado pelo tipo penal.

REQUISITOS DO FURTO DE USO:

1 -que a coisa subtraída não seja fungível (que se gasta, que se consome com o 1º uso), porque senão o dinheiro nunca poderia, por exemplo, ser objeto do crime de furto. É óbvio que o agente queria subtrair para utilizar o dinheiro, o dinheiro não tem outra valia senão a sua utilização, então a doutrina já afasta a possibilidade dessa figura ser cogitada na hipótese de coisa fungível.

2- que a coisa seja restituída a esfera de proteção ou de disponibilidade em que ela se encontrava anteriormente.

3- que essa coisa seja restituída exatamente nas mesmas condições em que ela se encontrava anteriormente. Presentes esses três requisitos pode-se cogitar de aplicação do furto de uso.

Momento consumativo do crime de furto - O crime de furto é um crime material e plurisubsistente, portanto, admite tentativa, desde que o agente tenha iniciado a execução. É um crime em que o legislador inseriu no tipo um resultado naturalístico, que é a subtração, é a diminuição no patrimônio do sujeito passivo, que é absolutamente indispensável que ocorra para que o crime se consumar.

Há várias teorias procurando estabelecer o momento consumativo:

1ª) Damásio e Fernando Capez- furto é subtrair, que implica na retirada (direta, quando a pessoa retira, ou indireta, quando o sujeito se vale, por exemplo, de animais) do bem da esfera de disponibilidade, da esfera de proteção que ele se encontrava, não há uma subtração perpetrada na sua forma consumada sem que essa retirada ocorra, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda que este não obtenha a posse tranqüila, pois não está no tipo. (atualmente majoritária)

2ª) Luiz Regis Prado - o mesmo que Damásio, entretanto, é essencial a posse tranqüila da coisa, caso contrário ter-se-á apenas a tentativa. Logo, é necessária a retirada do bem da esfera de disponibilidade da vítima + posse tranqüila da res, ainda que por curto período de tempo. A jurisprudência não é pacífica, o entendimento do STJ já foi no sentido de haver a necessidade da posse tranqüila.

3ª) é suficiente o deslocamento da coisa, mesmo que ainda não tenha saído da esfera de vigilância da vítima (minoritária).

Tentativa Frustrada e crime impossível - o punguista, desejando subtrair bens da vítima, coloca a mão no bolso desta. 2 hipóteses 1ª vítima havia esquecido a carteira em casa (crime impossível diante da inexistência de objeto material, art. 17); 2ª o ladrão põe a mão no bolso direito e a carteira está no esquerdo (tentativa de furto, existia o objeto material)

OBS: o sujeito que furta e depois vende a coisa a terceiro de boa-fé, para Damásio responde por furto + estelionato (art. 171, § 2º, I), pois os sujeitos passivos são diversos, não podendo se falar em absorção de um pelo outro. A jurisprudência, entretanto, por questão de política criminal, tem entendido pela ocorrência de um só crime, post factum impunível.

Desistência voluntária (art. 15) - o agente que invade a residência, cujos donos lá não se encontravam, começa a pegar os objetos, mas desiste de leva-los, responderá somente pelos atos já praticados.

§ 1º - CAUSA DE AUMENTO DE PENA - REPOUSO NOTURNO

O legislador utilizou a expressão "repouso noturno" e não noite, dando ensejo a divergências doutrinarias sobre sua interpretação. Para Damásio, Luiz Regis Prado, Fernando Capez e outros - repouso noturno é o período em que, à noite, as pessoas se recolhem para descansar, sendo irrelevante que ocorra em casa habitada e que os moradores estejam dormindo. Dessa forma, o juiz deverá avaliar no caso concreto o momento de sua incidência. Afirma, ainda, que o fundamento da qualificadora reside na circunstância da maior facilidade que pode obter o sujeito quando pratica o furto em altas horas da noite.

Para outra corrente, para que haja repouso noturno, é necessário que o fato da subtração seja praticado em casa habitada + que seus moradores estejam repousando no instante da subtração. Aumenta-se a pena pois, além violar a tranqüilidade pessoal dos que descansam, ocorre a facilitação do crime em face da menor vigilância.

OBS - Só deve ser aplicado no caso do furto simples e não no qualificado.

§2º - FURTO PRIVILEGIADO

O legislador estabelece a situação que é chamada na doutrina de furto de pequeno valor, na verdade erroneamente conhecido como furto privilegiado. Esse furto não é privilegiado, porque o privilégio implica em uma inserção de uma nova escala penal, coisa que não aconteceu aqui, então a natureza jurídica do §2º é de causa de diminuição de pena, pode-se falar que é uma minorante.

Primeiro requisito é primariedade do sujeito ativo do delito, ou seja, não reincidente (art. 63). O segundo requisito é que a coisa seja de pequeno valor . Deve-se observar que o legislador não fala em pequeno valor de prejuízo, ele fala em pequeno valor de coisa. Justamente por isso é que em todo o crime de furto será indispensável a avaliação da rés furtiva, um laudo de avaliação se impõe primeiro para saber se a coisa era ou não objeto material do crime de furto, e segundo para saber se aplicação do §2º é ou não é cabível.

Dentro de um critério objetivo, a jurisprudência já firmou entendimento de que é ou pode ser de pequeno valor a coisa que seja avaliada em até um salário mínimo (corrente majoritária). Nada impede, porém, que determinado juiz, verificando a situação econômica da vítima, não leve em consideração o acima disposto, deixando de conceder o benefício (corrente minoritária).

Presentes esses dois requisitos (pequeno valor de coisa furtada + primariedade do agente), o juiz deverá aplicar a minorante.

A lei estabelece três possibilidades ao juiz, sendo primário e de pequeno valor a coisa furtada. O juiz tem a faculdade de optar entre a substituição da pena de reclusão pela de detenção; entre a diminuição nesses percentuais da pena de reclusão, da pena originária ou aí já na hipótese mais benéfica da aplicação somente da pena pecuniária, não aplicar pena privativa de liberdade alguma é a terceira hipótese, devendo sempre fundamentar a escolha (observar o art. 59).

Assim, num contexto em que o agente até subtraiu coisa de pequeno valor, mas o fez de uma pessoa extremamente pobre ou miserável, vejam que a sua culpabilidade já foi exacerbada, conseqüentemente nesse caso o juiz tenderia ou deveria então se inclinar para a adoção da tese menos favorável ao réu.

Por fim, para Luiz Regis Prado, o privilégio não se aplica ao furto qualificado, pois neste há um maior desvalor da ação, da conduta do agente, e seria um contra-senso beneficiar o autor quando sua ação é mais grave. Para Damásio e Fernando Capez, em princípio, como no homicídio, o tipo qualificado não afasta o privilégio. Entretanto, para que a causa de atenuação da pena do furto mínimo se aplique ao qualificado, além de seus requisitos legais, é necessário que o sujeito apresente antecedentes e personalidade capazes de lhe permitirem o benefício. Bitencourt, leciona que a jurisprudência majoritária historicamente tem negado essa possibilidade de o privilégio contido no § 2º incidir em qualquer das figuras qualificadas previstas no § 4º. Entretanto, atualmente, essas orientações têm cedido espaço a uma interpretação mais liberal, encontrando-se jurisprudência ora favorável, ora desfavorável.

§3º - FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA E OUTROS (mecânica, térmica, radioativa)

Furto de energia elétrica ("gato"), que se originariamente não existisse o § 3, por óbvio não poderia ser tido como coisa móvel, mas dada essas situações, hoje em dia fala-se em "gatos elétricos", e dá a energia elétrica um tratamento tal como se ela uma constituísse coisa móvel, objeto material então do crime de furto. Também é considerado neste §, apesar de haver discussão, quem viabiliza, sem possuir assinatura, o sinal de TV por assinatura, então ele faz um "gato" para a ligação da NET, por exemplo. Alguns julgados mais apegados a letra fria da lei, por conta de tal distinção vem fazendo ou vem pretendendo negar aplicação ao furto nessa situação e aí tratam do estelionato.

§ 4º - FURTO QUALIFICADO - são de natureza objetiva, se comunica aos agentes, desde que entre na esfera de conhecimento.

Inciso I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa - absorve o crime de dano (art. 163). A violência deve ser contra obstáculo que dificulta a subtração (ex. arrombamento de carro para subtrair toca-fitas - qualifica) e não contra a própria coisa. Não qualifica o crime a violência contra a coisa subtraída, ou o obstáculo que é inerente a própria coisa.

Inciso II - 1ª - com abuso de confiança, 2ª - ou mediante fraude, 3ª - escalada ou destreza.

1ª - Natureza subjetiva, qual seja o furto com maior desvalor de conduta, justamente por ter sido praticado mediante abuso de confiança, por óbvio deve existir uma relação de confiança entre sujeito ativo e sujeito passivo, relação de confiança essa que pode derivar, primeiro de relação empregatícia, segundo de relação afetiva ou até mesmo de parentesco, mas deve ser comprovado que existia confiança especial entre o agente e o dono da coisa furtada, senão será furto simples + agravantes genéricas do art. 61, II, f.

2ª - furto qualificado pela fraude. Não confundir este com estelionato (art. 171), justamente porque há uma elementar que une essas duas figuras típicas. É o emprego de artifício para a subtração da coisa. No furto qualificado pela fraude, esta é empregada para iludir a atenção ou vigilância do ofendido, que não percebe que a coisa lhe está sendo subtraída, que está saindo de seu patrimônio. Ex. "A" se veste de mata-mosquito para entrar na residência e furtar. Ex2. "A" e "B" entram em uma loja, "A" distrai o vendedor, enquanto "B" subtrai objetos.

Como bem disse Damásio (Jesus, Damásio E. de, 1935 - Direito Penal: parte especial: dos crimes contra a pessoa e dos crimes contra o patrimônio, vol. 2 - 25ª ed.- São Paulo, 2003, pág. 328) "No furto, a fraude ilude a vigilância do ofendido, que, por isso, não tem conhecimento de que o objeto material está saindo da esfera de seu patrimônio e ingressando na disponibilidade do sujeito ativo. No estelionato, ao contrário, a fraude visa a permitir que a vítima incida em erro. Por isso, voluntariamente, despoja-se de seus bens, tendo consciência de que eles estão saindo da esfera de seu patrimônio e ingressando na esfera de disponibilidade do autor."

Ex. vítima que entrega seu computador ao agente, que se passa por técnico de informática - a vítima, enganada pelo agente, entrega-lhe o bem. Ex.2 sujeito que se apresenta como manobrista é estelionato. Ex3. sujeito que pede para fazer um test-drive e foge com o veículo - furto qualificado pela fraude. Ex4. sujeito que se diz policial para ingressar no local da subtração - furto mediante fraude.

3ª - escalada e destreza - Escalada - é o acesso a um lugar por meio anormal de uso ex. assaltar com uso de escada, entrar pelo telhado, saltar o muro. Pode ser túnel, subterrâneo ou não e não precisa ser subida necessariamente, a escalada é o ingresso no local do furto por uma via que normalmente não é utilizado. Não basta que o ingresso se dê via anormal, mas também, demande esforço grande por parte do agente ou então que se utilize o meio artificial. Destreza: verifica-se quando o agente se vale de uma especial habilidade manual para retirar a coisa da vítima sem que ela perceba. É o crime do "mão-leve". Ex. pesca do objeto. Se a vítima perceber, não há destreza, mas pode restar tentativa de furto simples; se o agente, pretendendo praticar a subtração mediante destreza, se deixa pressentir pelo terceiro, responde por tentativa de furto qualificado.

OBS: A questão da trombada (violência contra a pessoa) e do arrebatamento (violência contra a coisa), QUE É A RETIRADA ABRUPTA DA COISA, prevalece a opinião que o arrebatamento é furto e não roubo, embora haja julgados antigos que afirmem que é roubo, a posição predominante é que é furto. Já a trombada, QUE É O EMPURRÃO, a posição majoritária é que a trombada é roubo, pois a violência é contra pessoa e não contra a coisa como no caso do arrebatamento.

Inciso III - com emprego de chave falsa - Para Damásio, chave falsa é todo instrumento, com ou sem forma de chave, destinado a abrir fechaduras. Ex. gazuas, grampos, pregos, arames etc (se o agente consegue, ardilosamente, a chave verdadeira, é furto com emprego de fraude.)

Inciso IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas

Exige-se, no mínimo, a concorrência de duas pessoas, sendo irrelevante que uma delas seja inimputável. Para Damásio pode ser autor e partícipe, pois o tipo fala em crime cometido e não subtração cometida, e não há necessidade de ambos estarem no local.

Para Bitencourt a qualificadora somente se configurará no furto cometido por duas ou mais pessoas, que, necessariamente, devem encontrar-se no local do crime, pois o fundamento da maior punibilidade é a temibilidade e eficiência da delinqüência coletiva.

OBS: quando se tratar de furto cometido por atividade de quadrilha (art. 288), há duas orientações: 1ª) STF - os agentes responderão por crime de quadrilha em concurso material com crime de furto qualificado pelo concurso de pessoas, não configurando o bis in idem, pois o crime de quadrilha se consuma com a simples associação e não pelo resultado, de forma que num furto praticado por membros de uma quadrilha, só respondem os que efetivamente participaram do delito. 2ª) configura bis in idem,pois o concurso de pessoas já foi devidamente sancionado no crime de quadrilha, devendo responder por furto simples e crime de quadrilha.

§ 5º Essa qualificadora foi introduzida em 96, trata-se da subtração de veículo automotor (abrange aeronaves, lanchas, motos, carros etc), com transporte para outro Estado da federação ou outro País. Tem que haver o dolo de transportar para outro estado ou país.

A ação penal é pública incondicionada - regra do art. 100

ROUBO (art. 157): O objeto jurídico é a inviolabilidade do patrimônio (o mesmo que no furto), bem como a liberdade individual e a integridade corporal. O patrimônio é integrado por propriedade, posse e detenção, ou seja, disposição, gozo ou fruição e o uso. Observar que, nos crimes patrimoniais a doutrina majoritária leva em consideração os valores intrínsecos, mas também os valores de utilidade, caso contrário, não haveria crime de furto ou roubo na subtração de um talonário de cheque. Roubo e extorsão são bastante parecidos, ambos são crimes contra o patrimônio em que há duas elementares comuns: a violência física e a grave ameaça.

Há várias correntes que buscam diferenciar roubo e extorsão, ex. "A" coage "B", mediante arma de fogo a lhe entregar a carteira. : 1) Para Nélson Hungria, na extorsão a própria vítima entrega o bem para o agente, ao passo que no roubo há subtração, o agente retira o bem da vítima, logo, para ele, o exemplo seria de extorsão. 2) E. Magalhães Noronha - no roubo implica uma causação de mal na vítima atual ou iminente. Enquanto na extorsão é um mal futuro. Logo, para ele o exemplo seria de roubo. 3) Damásio, Fernando Capez e outros - na extorsão é imprescindível o comportamento da vítima, enquanto no roubo é prescindível. Logo, para ele é irrelevante que a coisa venha a ser entregue pela vítima ao agente ou que este a subtraia, pois a entrega pode ser dispensada, sendo o exemplo de roubo. Já na extorsão o apoderamento do objeto material depende da conduta da vítima.

Tanto no roubo quanto na extorsão existe o constrangimento, mas ele é absorvido nas duas figuras.

O roubo é um crime comum, complexo (ex. 157 = 155 + 147) e material por excelência, cujo momento consumativo será idêntico ao momento consumativo do furto, já que o núcleo verbal existente entre as figuras é absolutamente o mesmo, subtrair para si ou para outrem, ocorre que no caso do roubo inexiste a figura do roubo de uso, porque o roubo é crime de dupla objetividade jurídica, tem o bem jurídico primordialmente tutelado no patrimônio, mas também na integridade corporal da vítima, que é afetada quando há o emprego de violência, ou a liberdade individual da vítima que é afetada na hipótese de ameaça, de grave ameaça.

É justamente por conta de tal dupla objetividade jurídica, que é manifestada pela presença das elementares que o crime de lesão corporal leve, ameaça e constrangimento ilegal, são absorvidos pelo crime de roubo. Na verdade o roubo é um constrangimento ilegal, só que especializado.

Também segundo entendimento amplamente majoritário, tanto em doutrina, quanto em jurisprudência não existe a figura do roubo insignificante, ou seja, o roubo é incompatível com o princípio da insignificância ou da bagatela pelo desvalor exacerbado de conduta. No roubo, também vai haver aquela controvérsia existente quanto à consumação: - posse mansa e pacífica da rés ou apenas a retirada da coisa da esfera de vigilância em que ela se encontrava. São três as elementares que distinguem a subtração do roubo da subtração do furto: A primeira elementar - violência física, violência contra a pessoa, que acaba por absorver a lesão leve. Luiz Regis Prado entende que a violência também pode ser indireta, ou seja, contra à coisa, desde que a vítima seja amedrontada. A segunda elementar - subtração viabilizada através de grave ameaça. Grave ameaça é a violência moral, aquela capaz de incutir o temor justificado na vítima quanto à manutenção da sua integridade corporal, promessa de fazer mal à vítima, viciando sua vontade; grave ameaça essa que obviamente vai absorver o crime de ameaça do art. 147 do CP, e também os crimes de constrangimento ilegal do art. 146. Até para que se possa preencher esse elemento normativo do tipo, grave, a ameaça deve ser uma ameaça com potencial de intimidação da vítima. Segundo Luiz Regis Prado, a ameaça depende das circunstâncias do caso concreto, uma vez que sua análise é subjetiva, ou seja, leva em consideração a idade, o sexo, a condição social e etc da vítima, para que se possa aquilatar o grau de temibilidade proporcionado pela conduta do agente.

E ainda há uma terceira elementar "por qualquer meio reduzido a capacidade de resistência da vítima". Trata-se de interpretação analógica, abrange qualquer meio que possa produzir um estado físico-psiquico na vítima, aptos a reduzir ou suprimir totalmente sua capacidade de resistência. Ex. utilização de narcóticos, anestésicos, "boa noite Cinderela" e etc. Vejam que essa hipótese acaba também por absorver a lesão corporal leve e/ ou o constrangimento,

OBS: O que aconteceria também diante da embriaguez provocada pelo agente do roubo, já provocando a embriagues na vítima com vistas a conseguir a subtração no futuro. Vejam que não existe o crime de roubo, quando a capacidade de resistência da vítima é diminuída por ato voluntário da própria vítima, sem a participação do sujeito ativo, vamos imaginar então que "A" encontra-se bebendo em um bar sozinho e se embriaga completamente, "B" chega no local e verifica que "A" está completamente embriagado e deixou a sua carteira em cima da mesa, e subtraí aproveitando-se de tal circunstância, será a hipótese de furto.

O tipo subjetivo é o mesmo do crime de furto.

As situações do caput são as situações em que a doutrina chama de ROUBO PRÓPRIO. São duas espécies de roubo: o próprio e o impróprio. O roubo próprio é aquele em que as elementares são praticadas com vistas a viabilizar a subtração, ou em outras palavras em que grave ameaça e violência ou redução da capacidade de resistência da vítima são destinadas a fazer com que sujeito ativo adentre, já ilicitamente a posse do bem. O sujeito emprega a violência ou a grave ameaça com vistas a facilitar o seu acesso ao bem. Então as elementares são perpetradas antes da subtração, essa é a hipótese do roubo próprio, a hipótese de que trata o caput do artigo 157.

ROUBO IMPRÓPRIO. Há situação vislumbrada pelo próprio legislador em que o sujeito adentra a posse do bem, sem exercer a grave ameaça ou violência, ou seja, a subtração é a subtração típica do furto, mas depois, ou para garantir o sucesso da subtração ou para garantir a sua impunidade, o sujeito se vê obrigado pelas circunstâncias de fato a empregar violência ou grave ameaça. Está previsto no art. 157 § 1o, há dois modos de execução: a violência e a grave ameaça, são modos empregados após o agente tirar a coisa, mas antes da consumação do delito, ele só emprega a violência para assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.

Para ser roubo impróprio, a violência ou grave ameaça deve ser empregada antes da coisa sair da esfera de vigilância do lesado. Exemplo: se o sujeito emprega a violência depois de Ter saído da esfera de vigilância do lesado, responderá pelo furto consumado em concurso com o crime praticado com a violência ou a grave ameaça utilizada.

Considerando que o momento consumativo do crime de roubo impróprio pressupõe que o sujeito já adentre, já esteja na posse do bem, será que nós poderíamos falar em tentativa de roubo impróprio?

Existem duas correntes: 1ª (majoritária)- é inadmissível, pois ou o sujeito usa a violência e o delito está consumado ou não usa. Se já estiver fora da esfera de vigilância, ou já tiver decorrido um lapso temporal considerável, quando ocorrer a violência ou ameaça, será furto + o crime, mas se ainda estiver na esfera de vigilância é roubo impróprio (Luiz Regis Prado, Damásio, Fernando Capez, STF (HC 49.436, RT, 453/436, RTJ 63/345). 2ª - admite-se quando, por exemplo, o sujeito ativo é interceptado logo após a subtração dos bens e emprega violência para poder assegurar a posse das coisas e a impunidade do crime, mas é preso e recuperada a res, a coisa não chegou a sair da esfera de vigilância.

Se ocorrer o roubo com várias pessoas num mesmo contexto fático, a opinião majoritária é que isso configura concurso formal de crimes, como o roubo num ônibus, em que há diversos lesados, considera-se a ação uma só, cada ato de subtração é considerado de por si, mas a ameaça em conjunto. Entretanto, ocorrendo multiplicidade de violência ou grave ameaça e de violações patrimoniais, haverá concurso material - Damásio.

Crime impossível - Segundo Fernando Capez, pode ocorrer que o sujeito ativo do delito não consiga consumar o crime de roubo pela impropriedade absoluta do objeto, ou seja, pela ausência total de objetos materiais a serem subtraídos. Será crime impossível, não respondendo o agente pelo crime de roubo; deve, contudo, responder pelo emprego da violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência da vítima.

Desistência voluntária - se o agente empregar grave ameaça ou violência, ou qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência da vítima e, após, desistir voluntariamente de se apoderar dos objetos dela, não responderá pelo crime de roubo, mas pelos atos já praticados (violência ou grave ameaça).

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA O § 2o do art. 157 é causa especial de aumento de pena, não se aplica ao § 3o, só se aplica ao caput e ao § 1o, isto é no roubo próprio e no roubo impróprio. É comum que o sujeito que comete o latrocínio utilize arma, nesse caso não se aplica o § 2o, I ao latrocínio. Inciso I - com emprego de arma. A arma pode ser arma própria ou imprópria, donde arma própria é aquela cujo destino específico é o ataque ou a defesa, (ex. arma de fogo, a granada e etc); enquanto que a arma imprópria é qualquer artefato que sirva para agredir como pedaço de madeira, caco de vidro e etc. Para caracterizar a majorante não basta estar com a arma, deve empregar a arma, como por exemplo empunhá-la ou simplesmente mostrá-la para caracterizar a grave ameaça. No que tange à arma de brinquedo, não há dúvida que esta serve para caracterizar a grave ameaça, sendo portanto roubo, o que se discute é se incide a causa de aumento de pena do § 2º, I ou não. A utilização da arma de brinquedo vinha provocando acirrados debates, havendo diversas correntes doutrinárias, a saber: a doutrina majoritária sempre afirmou que o uso da arma de brinquedo não aumentaria a pena do roubo, pois não há tipicidade, vez que a arma de brinquedo não é arma, estando qualquer entendimento contrário, violando o princípio da legalidade, fazendo uma analogia in malam partem, além da ausência de potencialidade ofensiva do artefato falso. A ratio (razão) da lei é a potencialidade ofensiva, e a arma de brinquedo não tem esta capacidade, não fere, não mata. Nelson Hungria, afirmava que a arma de brinquedo tinha capacidade de intimidação, tornando a capacidade de resistência da vítima menor, e por isso seria o uso da arma de brinquedo, roubo "qualificado". Tinha respaldo no STF e no STJ, inclusive com a Súmula 174 (STJ) que foi cancelada.

Com o advento da lei 9437/97, que no art. 10 § 1o, II passou a incriminar o porte da arma de brinquedo com o intuito de praticar crimes, houve o cancelamento da súmula, passando alguns a entender que o sujeito deveria responder por roubo simples em concurso com o crime do art. 10, § 2o, II da lei 9437/97, pois caso contrário seria bis in idem.

Luiz Regis Prado e Damásio entendem que a arma de brinquedo é inapta para determinar o aumento de pena, já que o fundamento da majorante está na potencialidade lesiva e no perigo que a arma real causa, e não no maior temor infligido à vítima. Além da impossibilidade de se aplicar analogia in malam partem, não é arma. Para Luiz Regis Prado, deveria responder por roubo simples em concurso formal com o art. 10, § 1º, II da lei 9.437/97. Entretanto, para Damásio, o referido art. 10, apenas caracteriza o uso de arma de brinquedo como sendo um a grave ameaça, o que integra o roubo simples, devendo o sujeito ativo responder somente por este delito. Fernando Capez entende que arma de brinquedo equipara-se a arma de verdade, para os fins específicos do tipo que define o roubo, já que sua finalidade se restringe à intimidação da vítima, o que é perfeitamente possível fazer com um simulacro, devendo o sujeito ativo responder somente pelo art. 157, § 2º, I, não incidindo o art. 10 da lei especial, pois o referido artigo menciona a finalidade de cometer crimes de forma genérica, sendo o art. 157, § 2º, I mais específico.

Atualmente, parte da discussão está resolvida já que o art. 36 da lei 10.826/03 revogou expressamente a lei 9.437/97, não havendo mais a previsão, em lei especial, da arma de brinquedo. A discussão, portanto, está restrita ao roubo simples ou roubo com aumento de pena.

Inciso II - concurso de duas ou mais pessoas As observações feitas em relação ao furto aqui são plenamente válidas. Por exemplo, serve para caracterizar a causa de aumento, o cômputo do inimputável que tenha eventualmente participado da subtração. Assim, também, não se requer que todos os comparsas (autores, co-autores, partícipes) sejam identificados. O que se quer é uma certeza que o crime tenha sido perpetrado por mais de uma pessoa, ainda que somente um deles seja identificado e responsabilizado pelo crime. O inciso III agrava a pena do roubo - nas circunstâncias onde a vítima está em transporte de valores e, obviamente, tenha o agente conhecimento disso, até porque se o sujeito ativo não tiver conhecimento da circunstância que agrava a pena, não será possível imputar-lhe o aumento (ver art. 19). Ex. roubo a carro-forte. O inciso IV foi inserido no CP em 1996, para subtração de veículos automotores que venham a ser transportado para outro Estado ou para o Exterior. É idêntico ao furto de veículo automotor, só que com as elementares do roubo. Inciso V - o agente restringe o direito de ir e vir da vítima, privando-a de sua liberdade. Ex. o assaltante constrange a vítima lhe entregar o carro e a mantém seqüestrada por várias horas depois de consumado o delito com a finalidade de assegurar o proveito do crime. Também esta causa de aumento de pena foi inserida em 1996, o sujeito tem que manter a vítima em seu poder para poder roubá-la ou para conseguir fugir, ou seja, o seqüestro é meio para crime fim de roubo. Qualquer outra finalidade revelará um dolo autônomo em relação à privação de liberdade, desvinculada da subtração, se o agente após roubar a vítima resolve privá-la de sua liberdade, desnecessariamente, responde pelo roubo em concurso material com o seqüestro do art. 148 do CP. Para Luiz Regis Prado e Damásio é indiferente que a restrição da liberdade do sujeito passivo ocorra na fase de execução ou após a consumação do roubo, porém, o seqüestro praticado depois da subtração (sem conexão com a execução ou com a ação policial), será concurso de crimes. Para Fernando Capez, "seqüestro-relâmpago", é crime de extorsão e não de roubo, pois a revelação da senha é ato da vítima, somente ela pode fazer, não havendo a subtração. § 3º QUALIFICADORA LATROCÍNIO - Para Damásio, Fernando Capez e outros, Latrocínio é o fato do sujeito matar para subtrair bens da vítima. Logo, somente será considerado crime hediondo se houver o resultado morte, com base no inciso II, do art. 1º da lei 8.072/90 que diz "in fine". Assim, o legislador só considera crime hediondo a última parte do § 3º que é o latrocínio. Nesse caso, não caberá anistia, graça e indulto, fiança e liberdade provisória (art. 2º, I e II da referida lei). Além da pena ser acrescida da metade, respeitando o limite superior de trinta anos, se presentes os requisitos do art. 224, conforme menciona o art. 9º da lei 8.072/90. O Roubo é qualificado em virtude da subtração ter causado dois resultados possíveis. Resultado lesão corporal grave ou resultado morte. Trata-se, portanto, de crime qualificado pelo RESULTADO. Normalmente quando a lei prevê a expressão "se resulta", é porque o resultado é punível a título de culpa, porém, nos crimes patrimoniais, independente da culpa ou do dolo, se pune o agente, mesmo com a expressão "se resulta". Se a morte foi culposa diz-se que é ROUBO SEGUIDO DE MORTE, enquanto que se a morte for dolosa, chama-se de LATROCÍNIO, apesar da capitulação penal ser a mesma, o art. 157 § 3o .

Esse entendimento nasceu pois a pena do homicídio qualificado em concurso com roubo, teria a pena mínima de 16 anos (121, §2º, V + 157) e o resultado culposo do art. 157 § 3o a pena mínima é de 20 anos, o que seria um total dissenso o resultado culposo ser punível mais severamente que o resultado doloso. Assim, o resultado morte do § 3o do art. 157 é punível tanto na forma culposa, roubo seguido de morte, quanto na forma dolosa, que é o latrocínio.

OBS: Se o sujeito durante o roubo, por erro na execução (art. 73 - aberratio ictus) mata o próprio comparsa, responde por latrocínio, pois considera-se no caso a pessoa que o agente queria realmente atingir, mas se um dos comparsas morre por reação da vítima ou da polícia, os demais não respondem pelo latrocínio.

ESPÉCIES DE ROUBO SEGUIDO DE MORTE: subtração consumada e a morte também consumada = LATROCÍNIO; subtração tentada e morte tentada = tentativa de latrocínio subtração consumada e morte tentada = tentativa de latrocínio (o STF (610) considera que o fundamental para consagrar o latrocínio é a morte não a subtração). subtração tentada e morte consumada = 4 correntes: a) tentativa de latrocínio (porque o crime complexo decorre da combinação de delitos que formam um novo, ou seja, mesmo que consumado o crime-meio, e não consumado o crime-fim, não há consumação - tecnicamente correta, mas a pena da tentativa seria inferior ao homicídio qualificado); b) latrocínio consumado (súmula 610 do STF - "há crime de latrocínio quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima" o § 3º não exige a consumação da subtração); c) homicídio qualificado (art. 121, § 2º V) - Nelson Hungria - é delito complexo, e se um dos crimes deixa de se consumar, fica prejudicada a consumação de todo, ficando absorvida a tentativa de lesão patrimonial; d) homicídio qualificado (art. 121, § 2º V) consumado em concurso material com tentativa de roubo.

OBS: vale lembrar que a súmula 603 do STF que prevê que a competência para o julgamento do latrocínio é do juiz singular, pois o latrocínio é crime contra o patrimônio. É de ação penal pública incondicionada.

Vale ressaltar que o § 3º do art. 157 do CP refere-se à morte resultante da VIOLÊNCIA.

"LATROCÍNIO - Não caracterização - Morte de uma das vítimas, pessoa cardíaca, decorrente de violência moral e não física - Desclassificação operada para tentativa de roubo duplamente qualificado pelo emprego de arma e concurso de agentes - Recurso Provido para esse fim." (AP. 57.827. São Paulo, in RJTJSP - LEX. 111, p. 495).

"LATROCÍNIO. Delito não configurado. Tiroteio entre assaltantes e policiais após a prática de roubo. Morte de terceiro atingido por um dos projéteis. Ausência de prova, contudo, de que proviesse de arma utilizada por aqueles. Condenação pelo delito de roubo mantida. Inteligência dos arts. 157, § § 2º e 3º, e 13 do CP. Se um terceiro, em meio a troca de tiros entre policiais e marginais, vier a ser atingido, a responsabilidade não pode ser imputada a estes, salvo se houver prova de que o projétil que atingiu a vítima proveio de arma por eles empunhada". (AP. 20.577-3, Capital, 4ª Câmara, v.u. Rel. Cunha Bueno, v.u. - RT 581/311).

A morte pode se dar antes ou depois da subtração que será latrocínio, mas a morte deverá estar dentro do contexto fático do roubo- para existir o latrocínio tem que haver Nexo Causal entre morte e subtração -- quando a morte for ocasionada por tentativa de viabilizar o sucesso da subtração ou a fuga dos agentes. Se tiver outra finalidade, não existe nexo causal e não será latrocínio. Ex. A e B ingressam em uma agência bancária, com o fim de assaltar. A se dirige para o cofre junto ao gerente, enquanto B rende os clientes e funcionários do banco. Todos estão absolutamente tranqüilos, deitados com o rosto para o chão e B circulando pela agência percebe que um dos rendidos é o sujeito que roubou sua namorada e que está ali, absolutamente quieto, sem esboçar qualquer reação. E B olha para ele e diz: "você é o Zezinho que roubou minha namorada". E o mata. Vejam, ocorreu uma morte durante um roubo, mas completamente desvinculada da subtração. Nenhuma dessas duas intenções existiu neste caso, durante a causação da morte. Não existe a figura do latrocínio, mas a figura do Roubo e Homicídio em concurso de crimes.

EXTORSÃO (art. 158) O bem jurídico tutelado é o patrimônio e a integridade física e psíquica do ser humano. É um crime comum (se for funcionário público e não agir com violência ou grave ameaça será concussão art. 316), complexo e que tem como requisitos: constrangimento do sujeito passivo + violência ou grave ameaça + finalidade de obter indevida vantagem econômica (se ausente poderá ser art. 146). O objeto material imediato é a pessoa, e mediato, a vantagem indevida. O núcleo do tipo é constranger a vítima, mediante violência ou grave ameaça, pretendendo que ela faça (ex. "A" ameaça de morte "B" para deixar R$ 5.000,00 em determinado local), tolere que faça (ex. permitir que o credor rasgue o título de crédito) ou deixe de fazer alguma coisa (ex. deixar de cobrar uma dívida; obrigar a vítima a não propor ação judicial contra o agente). Apesar de haver discussão, a doutrina majoritária entende se tratar de um crime formal cujo tipo penal descreve a conduta e o resultado, mas não o exige para a consumação. É suficiente que o sujeito ativo constranja a vítima com a finalidade de obter indevida vantagem econômica, não se exigindo que realmente a consiga. O verbo é constranger e não obter. (ver súmula 96 do STJ ) Consumação - com o comportamento positivo ou negativo da vítima, no instante em que ela faz, deixa de fazer ou tolera que se faça alguma coisa. Segundo opinião majoritária, pode-se admitir a tentativa quando a vítima reprime o constrangimento. Exemplo: o sujeito liga para outro exigindo dinheiro, este vai até a delegacia, é extorsão tentada. A vantagem que se exige mediante constrangimento na extorsão, pela simples leitura do artigo, é a vantagem econômica, ou seja, com reflexo patrimonial e indevida, pois se for devida poderá ocorrer exercício arbitrário das próprias razões, art. 345. Também a vantagem deve adquirir reflexo patrimonial. Qualquer outra espécie de vantagem, desqualifica a exigência, desnaturando, então, o crime de extorsão, fazendo que se possa cogitar de outro crime. Segundo Luiz Regis Prado, o conceito de vantagem econômica contida no art. 158 é bem mais amplo que o do furto e o do roubo, haja vista que abrange não só a coisa móvel corpórea de outrem, mas todo interesse ou direito patrimonial alheio. Fernando Capez exemplifica que se o agente obriga a vítima a assinar uma escritura pública por meio da qual lhe transfere uma propriedade imóvel, comete o delito do art. 158. Entretanto, se o ato for juridicamente nulo (art. 145 CC), que nenhum benefício de ordem econômica possa produzir, não configura a extorsão (art. 17 - crime impossível por absoluta impropriedade do objeto), restando apenas o constrangimento ilegal. §1º- hipótese de aumento de pena que também são contempladas no roubo. Em duas das situações do §2º. E a mesma coisa se diga em no que toca a qualificação pelo resultado, que também existe no roubo, fazendo nascer o latrocínio e também existe na extorsão. O crime de extorsão será tido tal como existe lá no roubo, hediondo, quando o emprego de violência - só acontece quando a elementar for a violência - resultar morte art. 1º, inciso III da lei 8.072/90 A pena será rigorosamente a mesma pena do latrocínio, observando que tanto no latrocínio, §3º do 157, quanto pela qualificação pelo resultado da extorsão, §2º do 158, haverá aumento de pena estabelecida pela própria lei de crimes hediondos, art.9, nas situações previstas no art.224 do CP.

EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO (art 159) A objetividade jurídica é não só o patrimônio como a liberdade individual, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, trata-se de crime comum e o sujeito passivo, normalmente é a pessoa seqüestrada que sofre a lesão patrimonial, mas é muito comum Ter mais de um sujeito passivo, uma pessoa é seqüestrada e outra tem seu patrimônio lesado. Da mesma forma da extorsão esse delito é um crime formal, se consuma com o seqüestro independentemente da obtenção da vantagem econômica, é um crime permanente que admite a tentativa, quando não se obteve, ou não se conseguiu uma retenção, uma privação significativa da liberdade de ir e vir da vítima, malgrado já se tenha adentrado na ação executivo do seqüestro. A extorsão mediante seqüestro simples (art. 1º, V da lei 8.072/90) e a modalidade qualificada (art. 1º, IV da referida lei) são tidas como crime hediondo. Tanto no art. 158, quanto no art. 159 a finalidade é rigorosamente a mesma, o sujeito ativo se insurge contra o patrimônio de terceiro - da vítima. Ocorre que na primeira hipótese, na extorsão simples e pura, o sujeito se insurge mediante a utilização de violência ou grave ameaça de molde a exercer um constrangimento, para viabilizar uma exigência. Enquanto na hipótese de 159 esse constrangimento, essa exigência é viabilizada através de seqüestro ou da própria vitima ou de pessoa ligada a ela. O seqüestro, então do 159, é meio para viabilização da obtenção da vantagem . O crime de extorsão mediante seqüestro tem seu momento consumativo no efetivo seqüestro, mas a privação de liberdade tem que ser significativa, juridicamente relevante, por um tempo razoável. De modo que a distinção do crime do art.148, que é o crime autônomo de seqüestro ou cárcere privado, no crime do 159, que é a extorsão mediante seqüestro, gira, também, única e exclusivamente, no ESPECIAL FIM DE AGIR, no Dolo Específico, porque no 148 o sujeito retém; cerceia a liberdade individual da vítima, o direito de ir e vir da vítima fica cerceado com a finalidade que não seja a obtenção de vantagem, enquanto na extorsão mediante seqüestro, no plano objetivo, o sujeito faz rigorosamente a mesma coisa. Então vamos imaginar a seguinte situação: A, B e C abordam o carro de filho de empresário levando-o ao cativeiro. Há o objetivo, de no futuro, efetuar contato com o pai do seqüestrado, para combinar o pagamento do resgate. Ocorre que eles são flagrados e o cativeiro identificado antes que eles chegassem a efetuar contato com a família do seqüestrado. A hipótese é de crime consumado. Então, primeiro, é irrelevante que ele tenha, então, externado essa vantagem que ele queria obter, essa intenção de obtenção de vantagem indevida. E segundo, por óbvio e com maior razão, estará consumado independentemente de o sujeito obter tal vantagem. No que tange à vantagem descrita no tipo, segundo Luiz Regis Prado e Fernando Capez, deve ser necessariamente econômica, pois se outra é a finalidade, poderá ser crime diverso, além de ser um crime contra o patrimônio. Ex. Se o sujeito seqüestra com o interesse de satisfazer interesse libidinoso - 219. Para Damásio, o legislador utilizou a expressão "qualquer vantagem", ao contrário do art. 158 "indevida vantagem econômica", podendo ser qualquer vantagem, devida ou indevida. Logo, para ele, o sujeito que seqüestra com o fim de obter vantagem devida, não responde pelo art. 345, e sim pelo 159 (pág. 375 da obra já citada). Para os demais autores responde por 345 em concurso formal com o art. 148. OBS: Seqüestrar alguém achando que era filha de empresário, mas era filha do zelador do prédio. É erro sobre a pessoa. Responde tal como tivesse seqüestrado a pessoa que ele queria seqüestrar. Art.20,§3º Falamos, então, que a extorsão pressupõe uma retenção juridicamente relevante no direito de ir e vir da vítima. Entretanto, quando essa retenção, essa privação da liberdade da vítima for além de juridicamente relevante, tida pelo legislador como demasiada, o crime extorsão mediante seqüestro será qualificado. Isso acontece quando o seqüestro dura, no diapasão do legislador, mais de 24 horas. § 1º - E com isso nós chegamos a uma conclusão lógica: para que a retenção seja juridicamente relevante, para que o seqüestro seja consumado e, conseqüentemente, a extorsão mediante seqüestro seja consumada, não se exige, por óbvio, que a vítima fique mais de 24 horas no cativeiro. Tanto é que quando a vítima fica mais de 24 horas no cativeiro, além do crime estar consumado, ele já é até qualificado pelo resultado. A justificativa desta qualificadora é que neste caso, a privação da liberdade ou melhor dizendo, a liberdade individual da vítima, já foi afetado com maior severidade. OBS: SEQÜESTRO RELÂMPAGO - Não é extorsão mediante seqüestro, poderá ser extorsão ou roubo dependendo do caso, dada aquela situação inusitada do chamado seqüestro relâmpago, configurar um mal imediato. No roubo, há uma qualificadora específica para isso, §2º, V, art.157. Bem, a segunda hipótese de qualificação é ter a vítima ou seqüestrado menos de 18 anos de idade, ou mais de 60 anos (acrescentado pela lei 10.741/03). Obviamente, para que o sujeito possa responder por esta qualificação, esta situação de fato deve adentrar a sua esfera de conhecimento (ver art. 19). Em penal I vocês estudaram elementos do dolo. O dolo tem dois elementos: o elemento de conhecimento e elemento de vontade. Obviamente, para que eu possa atuar com vontade contra alguma coisa, contra algum bem jurídico, tenho que conhecer a situação de fato. Se a pessoa não atua com elemento conhecimento, por erro, por uma crença vã em sentido contrário, não há dolo no que toca a qualificadora. Assim, se seqüestro pessoa para fins de extorsão que ostenta aparência de pessoa que tem no mínimo 25 anos de idade e não tendo conhecimento que ela tem 17 anos de idade, não poderá responder por essa qualificação, sob pena de admitir uma responsabilidade penal objetiva. O seqüestrado aqui é menor de 18, mas deve ser maior de 14, se não for maior, não incidirá o § 1º e sim o art. 9o da LCH. A terceira situação fica qualificada pelo fato de ter sido praticado por quadrilha ou bando (art. 288). Há a necessidade da reunião de mais de 3 pessoas para o fim de cometer crimes, não se configurando, pois, essa majorante se a reunião for ocasional - especificamente para cometer crime do art. 159. Para Fernando Capez, o agente pode responder pelo crime autônomo do art. 288 em concurso material com a forma qualificada do crime em estudo, uma vez que os momentos consumativos e a objetividade jurídica são diferentes. Para outros autores, neste caso, não pode ser cumulado com o crime de formação de quadrilha, pois implicaria em bis in idem O sujeito responderá pelo crime autônomo de quadrilha ou bando e pelo crime de extorsão mediante seqüestro simples, sem a qualificadora. Os § 2º e 3º como acontece com todos os crimes já vistos, no 157 e 158, também se qualifica o resultado pela lesão corporal grave, na vítima ou pela morte, na vítima, tal como no latrocínio, 157,§3º e extorsão, 158,§2º. Inexistindo, rompendo-se o nexo de causalidade, vai surgir o concurso de crimes do homicídio ou lesão grave mais esse aqui. §4º prevê A DELAÇÃO PREMIADA para esses crimes. Primeiro, a natureza jurídica do §4º é de Causa Obrigatória de redução/diminuição de pena, quanto maior a contribuição, maior será a redução; segundo, para que ocorra a redução da pena, não é necessário que o sujeito, o delator, tenha identificado a autoria dos outros delinqüentes. A lei se contenta, para viabilizar a causa de diminuição que o sujeito delate a existência do crime, sem precisar delatar co-autores e que diante tal disso a vítima seja restituída a sua liberdade. Isso significa que a restituição da liberdade da vítima deve guardar nexo de causalidade com a delação. A delação é que facilitou a libertação da vítima no plano material. Independentemente de o delator ter identificado co-autores, que a lei não exige. OBS: a lei 9.807/99 (lei de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas), no seu art. 13, criou o perdão judicial para os réus colaboradores. EXTORSÃO INDIRETA (ART. 160) Segundo a exposição de motivos do CP/40, parte especial, item 57, a incriminação "visa a coibir os torpes e opressivos expedientes a que recorrem, por vezes, os agentes da usura, para garantir-se contra o risco do dinheiro mutuado. São bem conhecidos esses recursos, como, por exemplo, o de induzir o necessitado cliente a assinar um contrato simulado de depósito e etc, ficará o mutuário sob a pressão da ameaça de um processo por apropriação indébita ou falsidade". O Sujeito ativo é que exige ou recebe, como garantia de dívida, documento que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro. Exige-se que o sujeito ativo abuse da situação financeira da vítima. OBS: o crime de usura (art. 4º da lei 1.521/51) absorve o art. 160 do CP. É necessário que o documento, público ou particular, "possa" dar causa à instauração de um procedimento criminal contra alguém. Ex. cheque sem fundos, documento falso, confissão de prática de delito e etc. É delito formal na modalidade "exigir", consumando com a simples exigência, e material na "receber", exigindo a efetiva entrega do documento. DA USURPAÇÃO

Art. 161 - Alteração de limites Bem jurídico tutelado - tutela-se de forma direta a posse tranqüila das coisas imóveis, e indireta, a propriedade dos bens imóveis.

Os núcleos verbais são: suprimir (eliminar, fazer desaparecer) e deslocar (alterar a linha divisória da propriedade).

Objeto material - a) tapume (art. 1.297, § 1º do CC - cercas de arame ou madeira, muros, ou qualquer meio de separação de terreno); b) marco (é um sinal material, como pedra, árvores, etc, que também serve para atestar a propriedade); c) qualquer outro sinal de linha indicativa (interpretação analógica, ex. cursos d´água etc). Sujeito ativo - é o agente que suprime ou desloca o tapume, marco ou qualquer outro sinal indicativo da linha divisória. Para Fernando Capez, "não se trata de crime praticado somente por vizinho, pois o futuro comprador de um imóvel pode suprimir ou deslocar sinais da linha divisória para que, mais tarde, venha a obter, pelo preço ajustado, área maior que possa explorar ou desfrutar", o que é discutível. Luiz Regis Prado entende que tanto o proprietário, quanto o possuidor, pode ser sujeito ativo desse delito. Damásio entende que somente o proprietário do imóvel vizinho será sujeito ativo, pois somente este se beneficiará do imóvel alheio. Sujeito passivo - é o proprietário ou o possuidor do imóvel em que a conduta típica é realizada.

É um crime doloso, ou seja, é essencial que o sujeito ativo tenha vontade e consciência de apropriar-se, no todo ou em parte, do terreno alheio (se supõe seu terreno - art. 345 do CP)

Para Damásio e Fernando Capez, é um crime formal, pois o tipo descreve uma conduta (suprimir ou deslocar) e um resultado (apropriação do imóvel alheio), não exigindo a sua produção, ou seja, é essencial que o sujeito ativo realize a conduta para o fim de apropriação, não sendo, esta, necessária. A consumação ocorre com a supressão ou deslocamento do objeto material, sendo admissível a tentativa.

É um crime de perigo, bastando para sua caracterização a ameaça de apropriação do imóvel alheio. Concurso material de crimes - § 2º - art. 129 + 161.

§ 3º - se a propriedade é privada e não há emprego de violência, a ação é privada. Art. 161, § 1º, I - Usurpação de águas - tutela-se a posse das águas consideradas patrimônio imobiliário (CC, art. 79), através do desvio (alterar o curso da água); ou represa (conter o fluxo de água para a formação de reservatórios etc). Segundo Fernando Capez, o objeto material "é a água alheia, pertencente a terceiros, corrente ou estagnada, pública (mar, baía, lagos e canais navegáveis etc) ou particular. O Decreto 24.643/34 (código de águas) define o que se considera água pública ou particular. As águas subterrâneas (art. 96 do cód. de águas), assim como as águas pluviais (chuvas), também são objeto material deste crime."

Como bem lembra Damásio, o NCC no art. 1.292, menciona que o simples represamento, sem abuso, não é crime.

É necessário a vontade e consciência de realizar a conduta com o objetivo de obter proveito próprio ou alheio (ausente esse objetivo o crime pode ser outro, ex. 345). Para alguns autores é crime formal, consuma-se com o ato de desviar ou represar, não se exige a obtenção da vantagem.

Art. 161, § 1º, II - esbulho possessório - tutela-se a inviolabilidade patrimonial e a integridade física e psíquica de quem se acha na posse. Os elementos objetivos são: a) invadir com violência ou grave ameaça; ou com no mínimo quatro pessoas, a que invade e mais três. O elemento subjetivo é o dolo de invadir, nas situações acima, com o fim de excluir o sujeito passivo do exercício da posse, submetendo o omóvel à sua disponibilidade. É crime formal, pois não exige que o agente consiga espoliar o sujeito passivo.

OBS: Damásio lembra que "o CP não tutela a simples turbação da posse. É necessário que o sujeito pratique o fato com o fim de "esbulho possessório". ART. 162 - SUPRESSÃO OU ALTERAÇÃO DE MARCAS EM ANIMAIS

Tutela-se a posse e a propriedade do semovente, em especial o gado ou rebanho, considerados para efeitos penais coisa móvel (Fernando Capez). Elementos objetivos: a) suprimir; b) alterar, marca (ex.iniciais do proprietário) ou sinais (distintivo artificial ex. argola nos chifres). Elemento subjetivo -dolo de suprimir ou alterar marca ou sinal + intenção de causar dúvida a respeito da propriedade do animal. Consumação com a simples supressão ou alteração, sendo um crime formal, pois é irrelevante que o sujeito ativo consiga causar dúvida a respeito da propriedade do animal.

ART. 163 - CRIME DE DANO O artigo em tela trata do dano físico, que recai diretamente sobre a coisa, causando nesta modificações de ordem material. Logo, o objeto jurídico tutelado é a propriedade e a posse de coisas móveis e imóveis. E o objeto material é a coisa ALHEIA.

Para a maioria dos doutrinadores, o princípio da insignificância afasta a tipicidade no delito de dano.

Os núcleos dos verbos típicos são: 1) destruir (demolir, desmanchar, desfazer de modo que a coisa perca a sua essência, tornando-se inviável a sua recuperação, ex. quebrar uma vidraça, derrubar um muro etc); 2) inutilizar (tornar a coisa inútil, a coisa não perde sua individualidade, mas torna-se total, ou parcialmente, inadequada à sua finalidade, ex. quebrar peça de uma máquina, etc); 3) deteriorar (reduz o valor da coisa ex. alterar uma obra de arte)

OBS: a conduta de "pichar" muros e paredes deixou de ser crime de dano com a lei 9.605/98, art. 65 (lei ambiental). A conduta de ferir, mutilar ou praticar maus tratos contra animais domésticos também é tratada na referida lei em seu art. 32. Por fim, danificar bem protegido por lei, ato administrativo, ou decisão judicial, etc é crime previsto no art. 62 da referida lei.

O delito pode ser praticado tanto na forma comissiva, quanto omissiva (ex. agente responsável pelo maquinário alheio, propositalmente se abstém de retira-lo da chuva, vindo ele a enferrujar).

Aqui, como no furto, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, menos o proprietário.

Elemento subjetivo - esse crime só é praticado na forma dolosa, ou seja, o agente tem a vontade e consciência de danificar coisa alheia, não sendo necessária a intenção de causar prejuízo (majoritária).

Consumação - é crime material, logo se consuma com o dano efetivo à coisa alheia, havendo necessidade de exame pericial. Se o ladrão destrói a coisa furtada há post factum não punível. É também um delito subsidiário, pois funciona como elementar (ex. art. 250) ou circunstância qualificadora de outro crime (ex. art. 155, § 4º, I).

DANO QUALIFICADO - § ÚNICO Inciso I - a violência e a grave ameaça são meios para conseguir danificar a coisa alheia. A sanção é de 6 meses a 3 anos e multa, além das penas correspondentes à violência, logo, trata-se de concurso material entre o crime de dano qualificado e o crime de lesões corporais. Inciso II - substância inflamável ex. álcool etc; explosivas ex. dinamite, pólvora, etc. Desde que o fato não constitua delito mais grave (ex. art. 250, 251 etc). Inciso III - dependendo do objeto material será lei especial. Inciso IV - é necessário que o sujeito aja com a intenção de conseguir um interesse posterior de ordem moral ou econômica. Ex. destruir trabalho do concorrente para evitar competição, ou dar mais valor ao próprio.

AÇÃO PENAL - atenção - ver art. 167 - no crime de dano simples e qualificado na hipótese do inciso IV do § único, a ação penal é privada. Nos demais casos, a ação penal é pública incondicionada.

ART. 164 - o objeto jurídico tutelado é a inviolabilidade da posse ou propriedade do bem imóvel contra ações danosas de animais que nele são introduzidos, os quais destroem plantações, cercas etc. (Fernando Capez)

Os núcleos do tipo são: 1) introduzir (o agente propositalmente leva o animal para dentro da propriedade alheia); 2) deixar (largar, abandonar, o agente, tendo notícias de que o animal penetrou na propriedade alheia, nada faz para retira-lo de lá)

O objeto material do delito é a propriedade alheia, desde que tenha plantações etc passíveis de serem danificadas por algum animal, pois o tipo exige o prejuízo. O consentimento do ofendido exclui a tipicidade.

É um crime material, logo se consuma com a danificação total ou parcial da propriedade alheia, com prejuízo patrimonial. Logo, para a maioria dos doutrinadores, a tentativa é inadmissível, pois o fato só será típico se causar prejuízo alheio, não causando, o fato é atípico.

Elemento subjetivo- segundo Fernando Capez e Luiz Regis Prado, é a vontade livre e consciente de introduzir ou deixar animais em propriedade alheia. Se a intenção do agente for o lucro ou proveito direto, haverá o crime de furto (ex. introduzir animais para se alimentarem com a plantação alheia); se a intenção do agente for de causar prejuízo alheio, será o delito do art. 163.

AÇÃO PENAL - ver art. 167 - é crime de ação penal privada.

ART. 165 E 166- Fernando Capez, ob. cit. Pág. 442 - revogado tacitamente pela lei 9.605/98 (art. 62, 63 e seguintes).

ART. 168 - APROPRIAÇÃO INDÉBITA. Objeto jurídico tutelado - é o direito à propriedade. Para a maioria dos doutrinadores, é imprescindível que o objeto material tenha um valor significante, pois, se irrelevante, poderá incidir o princípio da insignificância, que exclui a tipicidade penal. Ex. apropriar-se de um isqueiro. Se a coisa for de pequeno valor, configurar-se-á o crime de apropriação indébita privilegiada - VER ART. 170 C/C ART. 155, § 2º

O núcleo do verbo típico é apropriar-se, que, segundo Fernando Capez, significa fazer sua a coisa de outrem; mudar o título da posse ou detenção desvigiada, comportando-se como se fosse dono.

O crime de apropriação indébita pressupõe que o sujeito ativo adentre a posse (art. 1.197 do CC - a posse é exercida pelo indivíduo em nome do outro, é direta e desvigiada, ex. locatário) ou a detenção (art. 1.198 e 1.208 do CC desvigiada, em que há disponibilidade sobre a coisa sob ordens, ex. vendedor de loja tem a detenção vigiada, logo se subtrai algo é furto, já o Office-boy, a detenção é desvigiada, pois ele sai da esfera de vigilância do proprietário ou possuidor, cometendo o crime de apropriação indébita) do bem de forma legítima e lícita, de caráter provisório, sendo que algum tempo depois é que ele irá se apropriar, inverter esse título, passando a agir como se dono fosse. Esse é o pressuposto indispensável para que se possa cogitar do crime de apropriação indébita, e justamente nisso reside a diferença entre a apropriação indébita e o furto. Porque no furto, desde o início, em que o sujeito ativo obtém a posse do bem, essa posse já era ilícita, porque ocorreu uma subtração.

"Não pode haver emprego de violência ou fraude por parte do agente para conseguir a posse ou a detenção do objeto. Assim, se o agente aluga uma jóia para utiliza-la em uma festa, e depois resolve dela apoderar-se, comete o crime de apropriação indébita. Se, por outro lado, o agente aluga o bem com a intenção de apropriar-se dele, utilizando o contrato como artifício para induzir a vítima em erro, haverá o crime de estelionato, pois a obtenção da posse se deu mediante o emprego de fraude iludente da vontade da vítima".

O objeto material do crime é coisa alheia móvel. É crime material, cuja consumação ocorre com a efetiva apropriação. Segundo Damásio, "a característica fundamental desse delito é o abuso de confiança. O sujeito ativo, tendo a posse ou a detenção da coisa alheia móvel, a ele confiada pelo ofendido, em determinado instante passa a comportar-se como se fosse dono, ou se negando a devolvê-la, ou realizando ato de disposição". O problema é saber quando acontece a efetiva apropriação.

Ex. No dia 10 de maio, o sujeito obtém a posse lícita da coisa móvel (o dono da coisa empresta um relógio por um mês). Esse sujeito, então, autorizado pelo proprietário do relógio começou a usar o relógio, até aí não temos crime algum, nós temos um empréstimo. Um ano depois o sujeito lembrou que deveria ter devolvido o relógio, mas pensou: ora, fulano me emprestou o relógio em maio até agora ele não pediu o relógio, logo esse relógio agora é meu, não devolvo mais. Nesse momento está consumado o crime de apropriação indébita, ou seja, o momento consumativo do crime de apropriação indébita acontece com a efetiva apropriação, e a efetiva apropriação ocorre quando o sujeito inverte o título da posse, ele ostentava a posse em caráter provisório, e agora passa a ostentar a posse com animus rem sibi habendi, nesse exato momento o crime está consumado. Esse se comporta frente à coisa como se dono dela fosse.

Na teoria é de fácil perceber o momento da inversão, mas na prática não, porque não há exteriorização desse comportamento. Essa inversão no título da posse acaba por caracterizar o especial fim de agir do tipo. O tipo subjetivo do crime é composto de dolo mais essa intenção de se comportar frente à coisa como se dono fosse, em doutrina recebe o nome de animus rem sibi habendi, que é o dolo específico reclamado pelo tipo de apropriação indébita. E não existirá esse especial fim de agir naquelas situações onde o sujeito apenas usa o bem, ainda que não autorizado para usa-lo. Ex. "A" pede para "B" guardar seu relógio. Ocorre que "B" acha o relógio bonito e o usa numa festa.

Entretanto, por se tratar de elemento subjetivo, não se reclama uma exteriorização de comportamento, isso fará com que, na pratica, se revele quase que impossível constatar a ocorrência do crime, e vejam que aqui não é constatar a simples consumação, é constatar a própria ocorrência, porque se não conseguirmos identificar a intenção que ostenta a posse, essa posse era lícita, então não haverá crime algum.

Por ser extremamente difícil essa verificação, a jurisprudência acaba por consagrar algumas situações que são consideradas, na prática, indispensáveis para a verificação do crime, tais como:

1ª - negativa de restituição - o crime de apropriação indébita se consuma quando notificado o agente para devolver a coisa, ele desatende essa notificação. Existem casos em que a negativa de restituição não constitui delito ex. art. 644, 664, 681 e 708 do CC, que regulam o direito de retenção. 2ª -propriamente dita - manifesta qualquer comportamento que evidência a intenção de se autodenominar dono da coisa, como por exemplo, tentar vender o objeto anunciando em jornal, neste caso o crime já se consumou, independente de ter conseguido ou não vender.

A tentativa para muitos autores é inadmissível, porque quando se constata um acontecimento dessa natureza é porque o crime já se consumou anteriormente. Para Damásio, é possível na apropriação indébita propriamente dita. Ex. o agente é surpreendido no ato de vender a coisa de que tinha a posse ou a detenção. Entretanto, nesse caso o agente já exerceu ato indicativo de inversão da posse, pois só pode vender quem se julga dono.

Quando o crime de apropriação indébita for cometido por funcionário público que adentre a posse de coisa móvel pelo exercício de suas funções, nós teremos um conflito aparente de normas, que se resolverá pelo princípio da especialidade. O crime será de peculato, apropriação do artigo 312 do Código Penal. Entretanto, quando for prefeito, o crime já será do Decreto - Lei 201/67, art. 1º.

Em princípio os bens fungíveis (substituíveis) não podem ser objeto de apropriação, salvo se forem recebidos para serem entregues a terceiros, como por exemplo o dinheiro. É o exemplo do office-boy que leva o dinheiro para ser depositado, no meio do caminho, ele retira uma parte, é apropriação indébita, bem como as administradoras de imóvel, e os advogados que não repassam o dinheiro aos seus clientes.

Arrependimento posterior (art. 16 do CP) - se o agente repara o dano antes do recebimento da denúncia, ou queixa, poderá ter sua pena diminuída de um a dois terços. Não há exclusão da tipicidade, pois o delito já se consumou.

Causas de aumento de pena - § 1º:

Ver art. 647 do CC - O depósito necessário pode ser: I - o que se faz em desempenho de obrigação legal (art. 648 do CC); II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como incêndio, inundação, naufrágio ou saque (depósito miserável); ao depósito necessário é equiparado o das bagagens dos viajantes e hóspedes, nos hotéis etc (art. 649 do CC).

Inciso I - é o depósito necessário previsto no art. 647, II - depósito necessário miserável. Inciso II - é o depósito necessário previsto no art. 647, I - depositário judicial etc Inciso III - é o depósito necessário previsto no art. 649 - coisa recebida em razão da profissão. Figura privilegiada - ver art. 170 do CP A ação penal é publica incondicionada.

APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA Prevista no art. 168 -A do CP, foi acrescentado pela lei 9983/00. Seria um crime de conduta mista, pois primeiro é a conduta comissiva do desconto e depois a conduta omissiva de não fazer o repasse à previdência social.

Enquanto no 168, o bem jurídico tutelado é o patrimônio, a coisa móvel que foi emprestada, mas foi apropriada, está na posse lícita do bem e se apropriou dela, é um patrimônio via de regra particular. O bem jurídico tutelado no tipo de apropriação indébita previdenciária é o interesse arrecadatório da previdência social, trata-se de crime basicamente tributário, trata-se de tipo atinente ao ramo do direito penal tributário. Só isso já nos faz concluir que há uma certa diferença.

A primeira vez que se tipificou expressamente essa situação foi na lei 8.137/90, (artigo 2, inciso, II). Vejam que as situações são parecidas, entretanto, o legislador do 168-A foi mais técnico, ao invés de utilizar a expressão deixar de recolher ele utilizou a expressão deixar de repassar. A lei 8.137 é a lei básica sobre sonegação fiscal. Então basicamente estamos tratando de delito de sonegação fiscal, só que com uma característica especial devido a sistemática de recolhimento desse tributo .

O tipo do artigo 2º, inciso II, da lei 8.137 continua tendo vigência e eficácia para outros tributos que não a contribuição previdenciária, e cuja sistemática de recolhimento seja idêntica, ou seja, que exista o responsável tributário.

Acontece que um ano após a lei 8.137/90 o legislador viu necessidade de tratar de forma especial o não recolhimento de contribuição previdenciária, em virtude da anunciada e alardeada crise da previdência social, o grande número de sonegação que acontece em relação a esse tributo específico, sem sombra de dúvida o tributo mais sonegado, ou melhor, dizendo mais inadimplido. E aí tratou especialmente de tal situação na lei 8.212/91, mais precisamente no artigo 95, alínea d da lei, que foi revogado expressamente pela lei 9.983/00, que foi justamente a lei que inseriu no corpo do código penal esse tipo que nós estamos tratando.

Esse artigo 95, alínea d enunciava o seguinte: deixar de recolher na época própria contribuição social, previdenciária, que tenha sido arrecadada do público ou descontada do salário dos empregados. Pena - de dois à 6 anos.

Essa lei vigorou até o ano de 2.000, quando então sobreveio a lei 9.983 e revogando expressamente esse tipo do 95, d, inseriu esse crime dentro do código penal, nesse artigo 168-A..

O sujeito ativo desse crime é a pessoa que tem a obrigação de repassar o tributo à Previdência Social, é delito próprio, e se consuma no momento em que se exaure o prazo legal ou convencional assinalado para o recolhimento das contribuições. Ex. O empregador que ao invés de dar o salário em grupo, retira uma parcela do salário com obrigação de recolher essa parcela que descontou para o INSS. Até aquele momento, em que ainda não chegou o prazo para o recolhimento do tributo, ele ostenta a posse do dinheiro descontado, de forma lícita, tal como acontece na apropriação indébita do 168 sem o A. Só que a partir do momento onde ele não efetua o repasse é que poderemos cogitar do crime, ou seja, quando decorrido o prazo legal para o recolhimento da contribuição previdenciária. Então temos uma situação realmente parecida com a situação da apropriação indébita do 168 sem o A, mas vamos ver que não é igual, e por isso que alguns autores entendem que não se trata de uma apropriação indébita, e por isso os requisitos da apropriação indébita, do 168 sem o A não lhe seriam aplicáveis, isso é, não se exigiria o animus rem sibi habendi. O sujeito ativo é o contribuinte e o sujeito passivo é a previdência social, é crime de competência da justiça federal.

São 4 as condutas incriminadas no 168-A, são normas penais em branco que devem ser completadas pela legislação previdenciária (lei 8.212/91) Art. 169 - "caput" - o objeto tutelado é o patrimônio alheio. São três elementares:

apropriação de coisa havida por erro (pode incidir sobre a pessoa ou coisa) a) pessoa - um indivíduo é tomado por outro ex. "A", sem conhecer "José Emanuel", tem que lhe entregar determinada coisa. Chegando ao local de trabalho de "José Emanuel" pergunta por este e, por coincidência a pessoa tem o mesmo nome de "José Emanuel" e recebe a coisa. Percebido o erro, após a entrega, se a pessoa não devolve incide nesse delito. (se desde o início, o sujeito age com fraude, responde por estelionato) b) sobre a coisa - ex. o sujeito vende livros velhos a terceiros, sendo que num deles se encontra alta quantia em dinheiro.

apropriação por caso fortuito - animais de uma fazenda vizinha aparece na do agente e este se apropria. apropriação por força da natureza - ex. num vendaval, roupas do varal do vizinho vão parar em propriedade alheia. O elemento subjetivo é o dolo de apropriar-se de coisa alheia.

§ único: Inciso I - o art. 1.264 do CC determina que quem achar depósito antigo de moeda ou coisas preciosas, enterradas, ou oculto, de cujo dono não haja memória, deverá dividi-la por igual entre o proprietário do imóvel e o inventor. Inciso II - constitui crime o sujeito achar coisa perdida e dela se apropriar, deixando de restitui-la ao dono ou de entregar á autoridade competente no prazo de 15 dias. ART. 170 - JÁ ESTUDADO ACIMA ESTELIONATO (ART. 171). O objeto jurídico tutelado, segundo Luiz Regis Prado, "é a especial proteção do patrimônio em relação aos atentados perpetrados mediante fraude. E ainda, para alguns, a segurança, a fidelidade e a veracidade das relações jurídicas que gravitam em torno do patrimônio" (Ob. cit., pág. 521). Já Magalhães Noronha leciona que: "tutelam-se tanto o interesse social da confiança mútua nos relacionamentos patrimoniais individuais, quanto o interesse público em impedir o emprego de engano para induzir quem quer que seja a prestações indevidas, com prejuízo alheio" (ob. cit, pág. 363).

A fraude é a característica essencial do estelionato, é a elementar usada para induzir (fazer surgir na mente da vítima a falsa noção) ou manter (impedir que a vítima descubra a realidade) a vítima em erro, utilizando-se de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento. O erro consiste em uma representação mental que não corresponde à realidade, é a falsa percepção.

Se vítima atuar em erro por conduta voluntária sua, e o sujeito ativo se aproveita dessa conduta voluntária, e pela fraude faz com que ela continue atuando em erro, obtendo uma vantagem, nesse caso a fraude é se passar por outra pessoa, e essa fraude não induziu a vítima a erro, apenas manteve em erro.

Se a iniciativa, no que toca ao erro da vítima, parte do sujeito ativo ele induz a vítima a um erro, a distinção existente entre essas duas situações reside justamente nisso. Ambas as situações levam ao estelionato.

O artifício é a forma astuta que o agente encontra para alterar a verdade, quer simulando o que não existe (ex. riqueza, qualidades, enfermidades), quer dissimulando a realidade, como ocultar seu estado de insolvência, é revestida de um aparato material. Segundo Mirabete "o artifício existe quando o agente se utiliza de um aparato que modifica, ao menos aparentemente, o aspecto material da coisa, figurando entre esses meios o documento falso ou outra falsificação qualquer, o disfarce, a modificação por aparelhos mecânicos ou elétricos, filmes, efeitos de luz etc." (ob. Cit. Pág. 301). Logo, pode ocorrer tanto na forma comissiva, como omissiva, explícita ou implícita, através de gestos, palavras, mentiras e até mesmo o silêncio (ver exposição de motivos item 61), etc.

Exemplos de silêncio- colecionador que, sabendo o valor estimado de determinado objeto, o adquire de uma pessoa inexperiente, por preço irrisório, sendo que esta deu o seu preço. Ex2. credor, após receber o pagamento da dívida, não entrega o recibo, já que o devedor não pediu, e posteriormente lhe cobra novamente.

Exemplo de mentira - "A", sabendo que "B" deixou determinado objeto em poder de "C", para que este guardasse até seu retorno, apresenta-se dizendo ser enviado de "B", e recebe o objeto.

"Ardil é a aplicação, pelo agente, de meios enganosos, sobre a inteligência ou sentimento da vítima, se direciona sobre o psiquismo do iludido, desvirtuando a realidade fática em torno daquilo que objetiva o agente, persuadindo o sujeito passivo a acreditar que a falsa aparência lógica ou sentimental montada por aquele é verdadeira, levando-o por conseguinte, a incorrer ou a manter em erro, com a conseqüente vantagem ilícita e lesão patrimonial." (Luiz Regis Prado, ob. cit. Pág. 524)

O legislador ainda possibilita a aplicação da interpretação analógica quando menciona "ou qualquer outro meio fraudulento", abrangendo os casos análogos. Logo, a figura típica em tela abrange qualquer conduta dolosa e fraudulenta do agente que leve o sujeito passivo a incorrer ou manter-se em erro, com a obtenção da vantagem ilícita e a conseqüente lesão patrimonial da vítima.

Exige-se, entretanto, que esta tenha capacidade de discernimento para ser iludida. Segundo Luiz Regis Prado, a criança e o doente mental, por exemplo, em razão de não poderem ser enganados, também não estão aptos a figurar como sujeitos passivos de estelionato, em face da ausência de capacidade de entender e de querer. "A incapacidade natural do sujeito passivo de ser iludido pode levar a ação delituosa a amoldar-se ao tipo de abuso de incapazes ou mesmo de furto, mas não de estelionato" (ob. cit, pág. 522).

Por outro lado, a vítima deve ser uma pessoa determinada, pois se a vítima for indeterminada, isto é, se a coletividade for enganada será crime contra a economia popular- lei 1521/51, ou contra as relações de consumo. Ex: taxista que roda com o taxímetro adulterado, é crime contra a economia popular.

Seja qual for o meio empregado, só há estelionato quando existir aptidão para iludir o ofendido, devendo verificar as características pessoais da vítima, quando totalmente inapta a iludir, o fato será atípico.

Trata-se de crime comum, pois não exige do sujeito ativo qualquer condição especial.

Há um duplo nexo de causalidade: 1) primeiro o agente engana a vítima, através da fraude, figurando esta como causa do efeito gerado (o engano da vítima); 2) o erro (o engano da vítima) causa como efeito a obtenção da vantagem ilícita e o conseqüente dano.

Elemento objetivo: O núcleo verbal do tipo "obter vantagem ilícita" nos conduz a conclusão de que o crime de estelionato, no que toca ao seu momento consumativo é um crime material. Crime material cujo momento consumativo é o exato momento em que o sujeito, através da fraude, incrementa indevidamente o seu patrimônio, e obviamente por conseqüência, acarreta um prejuízo, uma diminuição patrimonial na vítima, do enganado.

Para Luiz Regis Prado, vantagem ilícita é todo benefício ou proveito contrário ao direito, não necessitando ser econômica, bastando que haja o prejuízo alheio, que se consubstancia numa lesão ou dano ao patrimônio do sujeito passivo. Para Fernando Capez, a vantagem deve ser econômica, pois se trata de crime patrimonial. O prejuízo deve ser real e efetivo, e não apenas potencial, ocorrendo a diminuição do patrimônio (conjunto de valores econômicos juridicamente reconhecidos) da vítima ou de terceiro. "Para que se configure o estelionato, faz-se mister a presença de ambos elementos (vantagem ilícita e prejuízo alheio), sem os quais a ação será atípica." (ob. cit. Pág. 523)

No tocante ao elemento subjetivo, exige-se a vontade e a consciência de enganar a outrem, mediante fraude + visando a vantagem ilícita, em prejuízo da vítima.

Há um aumento indevido no patrimônio do sujeito ativo e um prejuízo, uma diminuição no patrimônio da vítima, neste momento o crime de estelionato está consumado, ou seja, consuma-se com a obtenção da vantagem ilícita e com a produção do prejuízo alheio. Estelionato é crime material, porque se consuma com a produção desse resultado naturalístico, qual seja, a obtenção de uma vantagem indevida.

Sendo delito plurissubsistente, admite plenamente a tentativa (art. 14, II), vale ressaltar que esta ocorre com o início da prática do meio fraudulento, visando à vantagem ilícita e o prejuízo alheio, sendo interrompida por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Torpeza Bilateral - Pode ocorrer, ainda, a má-fé de ambas as partes (agente e suposta vítima), como por exemplo, a venda de substâncias inócuas (inútil) para fins abortivos, ou "A" contrata "B" para matar "C". "B" apenas aceita para conseguir o dinheiro, mas não irá matar "C", entretanto "A" paga com moeda falsa, etc. Nesse caso, duas são as correntes: 1) subsiste o delito de estelionato, ainda que a vítima tenha agido de má-fé, desde que tenha ofendido o bem jurídico tutelado - o patrimônio alheio. Não existe, no Direito Penal, compensação de condutas, devendo-se punir o sujeito ativo, e se for o caso, também a vítima. (Luiz Regis Prado, Fernando Capez, etc); 2) não há crime a ser punido, em face dos motivos ilícitos e imorais que ensejaram o negócio, pois somente goza de proteção legal o patrimônio que serve a um fim legítimo (ver art. 883 do CC) (Nelson Hungria).

Distinção entre o estelionato e a apropriação indébita

No estelionato o agente atua com dolo desde o início, já na apropriação indébita, o dolo é posterior. No estelionato a posse, desde o seu início já foi ilícita, e a característica fundamental da apropriação indébita é que em algum momento a posse era lícita e ela só se transforma em ilícita através do animus rem sibi habendi, que nós já vimos na aula passada.

Distinção entre o estelionato e furto

No furto há uma subtração clandestina do bem, já no estelionato, a vítima, após ser enganada, entrega voluntariamente o bem ao agente.

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§ 1º do art. 171 - assim como acontece no furto, em que há o furto de pequeno valor, o tipo do estelionato no seu parágrafo primeiro prevê uma situação análoga àquela existente no parágrafo segundo do artigo 155.

Na figura do privilégio no furto (§ 2º do 155), o legislador vincula a aplicação do § 2º ao pequeno valor da coisa furtada, enquanto no estelionato, o legislador vincula ao pequeno valor do prejuízo, isso significa dizer que, enquanto no furto a jurisprudência já fixou, como nós já vimos, que coisa de pequeno valor para efeito de aplicação do § 2º do artigo 155, é aquela cujo valor não ultrapasse um salário mínimo. Aqui no estelionato nós não poderemos aferir essa circunstância de maneira objetiva, porque o legislador vincula, não ao valor da coisa, mas sim ao montante do prejuízo causado à vítima, o que inclusive poderá para efeitos de aplicação do § 1º, se levar em consideração até a condição econômica e financeira da vítima lesada, porque uma coisa de idêntico valor que tenha sido objeto material do crime de estelionato para o sujeito extremamente rico, pode não lhe ter causado um considerável prejuízo, enquanto para o lesado pobre, aquela coisa malgrado não fosse de tanto valor objetivo, poderia sim ter causado um prejuízo de monta a ele.

No furto o legislador vinculou uma situação estritamente objetiva, qual seja o pequeno valor de coisa, da rés, aqui no estelionato não.

No § 2º e seus incisos o legislador nada mais, do que elencar outras modalidades de fraude, e que também fazem nascer a figura do estelionato, quando através delas, das circunstâncias, das situações de fato elencadas nos seis incisos do parágrafo segundo, o agente chegar a obtenção de vantagem ilícita, induzindo ou mantendo a vítima em erro.

Inciso I - Para Luiz Regis Prado, os atos perpetrados atingem tanto os móveis (ex. "A" furta um objeto e depois vende para terceiro de boa-fé, há duas posições já estudadas) como imóveis (ex. proprietário que vende o mesmo imóvel para várias pessoas). A consumação ocorre com a obtenção da vantagem ilícita e admite-se tentativa. As ações nucleares são: vender (art. 481 do CC); permutar (art. 533 do CC); dar em pagamento (art. 356 do CC); dar em locação (art. 565 e 1.507 do CC e lei 8245/91); dar em garantia (art. 1.419 e s. do CC) - refere-se ao penhor (art. 1.431 e s.), anticrese (art. 1.506 e s.) e hipoteca (art. 1.473 e s.).

Inciso II - O silêncio do agente a respeito do ônus ou encargo que pesam sobre a coisa é que constitui a fraude. A diferença do inciso anterior é que aqui a coisa pertence ao próprio sujeito ativo. Coisa inalienável é a que não pode ser vendida por disposição legal (art. 1.911 do CC, cláusula de inalienabilidade). Coisa própria gravada de ônus abrange os direitos reais de garantia (penhor, hipoteca e anticrese), bem como outros direitos reais, como a servidão (art. 1.378 e s. do CC), o usufruto (art. 1.390 e s.), etc. A coisa litigiosa é aquela objeto de discussão judicial.

Inciso III - ver art. 1.431 do CC. O crime de defraudação de penhor só irá ocorrer quando a coisa móvel empenhada continua em poder do devedor e este a aliena, sem o consentimento do credor.

Inciso IV - O agente defrauda (desfalcar, adulterar, etc) substância (é a essência da coisa. Ex. substitui ouro de uma jóia por latão), qualidade (substitui uma coisa por outra parecida, porém de valor inferior ex. anel de ouro maciço, por anel folheado a ouro) ou quantidade (entregar 300 sacas de arroz em vez de 400) de coisa que deve entregar a alguém. Como bem lembra Fernando Capez, a coisa imóvel também pode ser defraudada.

Inciso V -trata-se da destruição do próprio patrimônio, ou a autolesão, que obviamente não constitui forma autônoma de crime, podem, entretanto, servir de molde a caracterizar a fraude, desde que cause prejuízo a outrem. E aí nesse caso não se está punindo a autolesão, mas sim a fraude. A autolesão é um meio para a caracterização da fraude, assim como também a destruição do próprio patrimônio nesse caso, nada mais é do que um meio fraudulento no qual o agente se utiliza para obter a indenização relativa ao seguro. Nessa modalidade o crime é formal, consuma-se com a ação física , desnecessária que o agente receba a indenização ou o valor do seguro.

Inciso VI - Temos duas figuras elencadas: A primeira situação é a de quem emite cheque sem provisão de fundos, já a segunda situação é daquele que frustra o pagamento do cheque. Algumas situações devem ser observadas aqui: 1ª - para que ocorra o crime de estelionato mediante emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos, o sujeito necessariamente, deve, no momento em que emite o cheque, ter consciência de que aquele cheque, no momento em que for apresentado para pagamento não o será, porque o agente não possui fundos junto ao banco sacado, não possui crédito junto ao banco sacado e nem o possuirá. Nesse sentido é o teor da súmula 246 do STF. Vale ressaltar que o sujeito no momento em que emite o cheque, pode até ter condições, ou melhor, dizendo ter disponibilidade de saldo no momento para adimplir a sua obrigação, mas isso por si só não elide o crime.

Ex. "A" emite, hoje, um cheque para a compra de um carro, esse cheque, ele sabe disso, demora 24 horas ou 48 horas pra ser descontado e HOJE ele possuía fundos mais do que suficiente para adimplir ou para pagar aquele cheque. Ocorre que, "A" sabe que ontem passou um cheque de maior valor, e que caso aquele cheque de ontem fosse descontado, esse cheque que ele passou hoje para a compra do carro não teria fundos para ser pago daqui a 48 horas. A pergunta é a seguinte, essa circunstância, qual seja, no dia de hoje ele possui fundos, nesse caso descaracteriza o crime? Não descaracteriza o crime, ou seja, o crime pode existir nessa modalidade, mesmo se no momento em que passou o cheque o sujeito possuía saldo suficiente para o seu pagamento, o que é condição sine qua non para caracterizar a existência de fraude é ele ter consciência, representação de que no momento em que for apresentado para pagamento, mediante a utilização daquele tipo de cheque, não haverá fundo.

No caso do cheque pré-datado, que na verdade é um cheque pós-datado, pois nele se coloca uma data posterior, justamente porque, hoje, a pessoa não tem fundos; caso o interessado apresente para pagamento perante o banco sacado em data anterior ao que foi afiançado, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que não caracteriza o crime de estelionato. É certo que o banco sacado tem a obrigação de pagar o cheque no momento em que ele é apresentado, já que cheque é uma ordem de pagamento à vista. Porém, nestas circunstâncias, o tomador do cheque tem conhecimento da ausência de fundos, não é induzido a erro, não haverá fraude, não há o dolo, há uma atipicidade subjetiva na conduta.

Da mesma forma, para Fernando Capez, não configura o crime a emissão de cheque sem provisão de fundos para pagamento de uma dívida preexistente. Ex. "A" realiza contrato de locação com "B", e este não paga por vários meses. Ao realizar um acordo, "B" emite um cheque sem provisão de fundos. A causa direta do prejuízo de "A" foi o descumprimento do contrato de locação, não há novo prejuízo.

No tocante aos cheques especiais, não há crime, pois o banco honra o pagamento de cheques de clientes especiais.

Finalmente, quanto à emissão de cheque sem fundos para pagamento de jogos ILÍCITOS, para Fernando Capez não há crime, pois o Direito Civil não protege o patrimônio do jogador (art. 814 do CC), inexistindo a obrigação de pagamento de dívida de jogo.

2ª situação - também comente o crime aquele que frustra o pagamento, a fraude acontece à posteriori da conduta em si. "Se, antes da emissão do cheque, o agente realiza atos que frustem o seu pagamento, por exemplo, o encerramento de conta corrente ou a anterior sustação do título com base em falsa notícia de que fora furtado, e, após utilizar esses artifícios emite as cártulas em prejuízo alheio, estamos diante de uma hipótese de estelionato na forma simples, pois a fraude foi anterior à emissão do título" (Fernando Capez, ob. cit. Pág. 492).

* SÚMULA 554 DO STF - "o pagamento de cheque sem suficiente provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal", ou seja, se fizermos uma interpretação a contrario sensu, não será possível o início da ação penal se o agente efetuar o pagamento relativo ao cheque por ele emitido sem suficiente provisão de fundos, até o recebimento da denúncia.

Ocorre que a referida súmula é anterior à vigência da nova parte geral do CP, que acrescentou o instituto do arrependimento posterior como causa obrigatória de redução de pena. Dessa forma, a corrente doutrinária majoritária entende que a súmula continua tendo aplicabilidade nos casos específicos de cheques emitidos sem suficiente provisão de fundos, ficando as demais situações regidas pelo art. 16 do CP. Isso porque falta justa causa para a ação penal, se pago o cheque emitido sem suficiente provisão de fundos.

POSIÇÃO CRÍTICA DE DAMÁSIO (Jesus, Damásio E. de, 1935- Direito Penal: parte especial: dos crimes contra a pessoa e dos crimes contra o patrimônio, vol. 2, 25ª edição - São Paulo / Saraiva 2003, pág. 448)

"A emissão de cheque sem fundos, subtipo de estelionato, constitui delito material, em que a figura típica descreve o comportamento do sujeito e exige a produção do resultado por ele visado. A conduta está na emissão fraudulenta; o resultado, que é duplo, na vantagem ilícita em prejuízo alheio. Isso porque os subtipos seguem os mesmos princípios da figura típica fundamental. Trata-se de crime instantâneo, em que o resultado ocorre em dado momento, não se prolongando no tempo. Diante disso, qualquer fato posterior não interfere na qualidade do crime. Assim, a circunstância do pagamento após a consumação não exclui o delito nem interfere na punibilidade. Essa é a nossa posição doutrinária. Para nós, o pagamento do cheque antes do recebimento da denúncia não exclui o delito. Por isso não concordamos com a orientação do STF."

§ 3º - a majorante tem em vista a lesão a interesse social, o que torna a conduta mais repreovável.

* Súmula nº 17 - Outra questão importante é a do falso com o estelionato é comum que o estelionatário para que possa dar um golpe se utilize de documento falso, pois a luz de um documento falso a pessoa se deixa enganar. Existem quatro correntes a esse respeito: deve haver o concurso material entre o falso e o estelionato; pois esses crimes tem objetividade jurídicas diferentes, tem sujeitos passivos diferentes, portanto deve responder em concurso material, pois uma ação é a ação de adulterar o documento e a outra ação é a de usar esse documento num golpe, mais de uma ação ou omissão diferentes é concurso material. (doutrinária) deve haver o concurso formal entre o falso e o estelionato; a ação é toda atividade dirigida a uma atividade, assim o sujeito estava preparando o golpe com o falso, a ação é única mas há mais de um crime, portanto o concurso é formal. (STF) O falso absorve o estelionato, os crimes de falso são normalmente formais, então o sujeito falsificar o documento e utilizá-lo no estelionato, o estelionato é o exaurimento do falso; até porque o crime de falso muitas das vezes é o crime mais grave, exemplo: art. 297 (doutrina minoritária) O estelionato absorve o falso, é a corrente mais finalista, pois o objetivo do falso foi dar o golpe, a falsidade documental é meio para o estelionato, funcionando como ante factum impunível. (súmula do STJ - 17).

RECEPTAÇÃO.

O objeto jurídico é a inviolabilidade do patrimônio. Como bem lembra Luiz Regis Prado, "a receptação atinge novamente o direito de propriedade já anteriormente violado, permanecendo a situação antijurídica criada, e obstaculizando, ainda, a recuperação dos produtos obtidos pelo crime anterior."

Objeto material - é o produto do crime anterior. Para Luiz Regis Prado e Nelson Hungria, será sempre coisa móvel, como jóias, mercadorias etc. O imóvel, para eles, não pode ser receptado, pois a receptação pressupõe um deslocamento da res do poder de quem legitimamente a detém para a do receptador. Fernando Capez completa dizendo que receptar é o mesmo que "dar esconderijo", e apenas as coisas móveis podem ser ocultadas. "As presunções da lei civil, no que toca os bens imóveis, não produzem efeitos na esfera penal. Por exemplo, um navio pode ser objeto material de receptação, em que pese ser um bem imóvel à luz do Direito Civil. Para que um bem seja considerado móvel perante o Direito Penal, basta a possibilidade de seu deslocamento físico". (ob. Cit. Pág. 526).

Já para Mirabete, "a lei não distingue entre coisas móveis e imóveis, nem há razão para se afirmar que é necessário o deslocamento da coisa. O nomen júris, por si só, não deve levar à conclusão de que o legislador quis referir-se apenas às coisas móveis, pois fácil seria limitar o dispositivo, como fez em outros tipos penais (art. 155, 157 etc)." (ob. Cit. Pág. 355).

A existência de crime (e não contravenção) anterior é pressuposto do crime de receptação. Porém, a receptação é um crime autônomo em relação à infração anterior, de modo que basta a prova da existência de crime anterior, mesmo que não se saiba a sua autoria. Assim, a receptação será punida, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime anterior (§ 4º art. 180). Entretanto, se o autor do crime anterior for absolvido por estar provada a inexistência do fato (art. 386, I do CPP) o receptador não poderá ser condenado.

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa (crime comum), salvo o autor, co-autor ou partícipe do delito antecedente, por se tratar, nessa hipótese de pós-fato impunível. O proprietário do bem, para a corrente majoritária, pode ser receptador, quando a coisa se encontrava em poder de terceira pessoa, como garantia de dívida. ex. "o bem se acha na posse do credor pignoratício, e, furtado por terceiro, é receptado pelo proprietário. Nesta hipótese, este recebe, adquire ou oculta coisa produto de crime (furto), praticado contra o legítimo possuidor" . O sujeito passivo é a vítima do crime antecedente.

Elementos do tipo: a doutrina divide a receptação em: própria: primeira parte do art. 180, "caput" - "adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime". imprópria: Segunda parte do art. 180, "caput". - "influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte".

O elemento subjetivo é o dolo, vontade livre e consciente de adquirir etc. Para Fernando Capez e Luiz Regis Prado, o art. 180, "caput" exige o dolo direto, a certeza que a coisa provém de prática criminosa anterior + um especial fim de agir, que é obter vantagem "em proveito próprio ou alheio". Não basta o dolo eventual, se assim agir, o fato será enquadrado na modalidade culposa do crime.

Se o dolo for posterior ao recebimento do objeto, ou seja, se o agente recebe o objeto e depois toma conhecimento de que se trata de produto de crime, e o oculta, ou influencia para que terceiro de boa-fé o adquira, receba ou oculte, haverá o crime de receptação.

Se o ocultamento da coisa for realizado com o fim de favorecer o autor do crime anterior, haverá o crime de favorecimento real (art. 349). É o fim especial de agir que vai distinguir os dois crimes, no art. 349, o agente tem por escopo apenas auxiliar o autor do crime anterior, sem animus lucrandi.

RECEPTAÇÃO x FAVORECIMENTO REAL.

Vamos imaginar alguns exemplos: 1- A, amigo de B, sabedor de que B subtraiu um carro, concorda com que B esconda o carro na sua garagem. Passados alguns dias B retira o carro da garagem sem contraprestação nenhuma para A, qual o crime foi cometido? Favorecimento real.

2- A, agora, recebe um bem (para isso recebendo um pagamento, um percentual do valor daquele bem), depois devolve o bem para quem cometeu o crime anterior, o furto. Qual crime que acontece aqui nesse caso? Receptação.

O crime de receptação possui no seu tipo subjetivo o animus lucrandi, o dolo da receptação abrange a vontade do sujeito ativo obter lucro com tal atividade é um crime patrimonial, enquanto o favorecimento real não, o favorecimento real não há na figura do 349 uma intenção de lucro no animus lucrandi, essa é a distinção entre as duas figuras.

Algumas das ações típicas da receptação traduzem a idéia de permanência, assim o núcleo verbal ocultar é hipótese de núcleo permanente, assim como a hipótese de transportar.

Momento consumativo - na receptação própria o crime é material, consumando-se com a produção do resultado previsto, admitindo a tentativa. Na receptação imprópria o crime é formal, basta o simples ato de influenciar, não sendo necessário que o terceiro de boa-fé efetivamente adquira, receba, oculte a coisa produto do crime, sendo inadmissível a tentativa, pois é crime unissubsistente.

§ 1º - Segundo Luiz Regis Prado, "o legislador, visando reprimir mais severamente a atuação de organização criminosa nos delitos patrimoniais, qualificou o delito de receptação, na modalidade dolosa, quando perpetrado no exercício de atividade comercial ou industrial, através das condutas adquirir etc. No entanto, não se pode olvidar que a referida norma foi estruturada num manifesto erro técnico de composição típica, já que o legislador inseriu no § 1º do art. 180 um tipo penal independente, sem atrelagem ao tipo fundamental".

Observe-se que o agente deve ser comerciante ou industrial (no exercício de atividade comercial ou industrial), tratando-se, assim, de crime próprio (tratado em Direito Mercantil). Entretanto, o próprio legislador no § 2º equiparou à atividade comercial, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. Vale ressaltar que deve haver habitualidade ou continuidade, pois exercício de uma atividade, pressupõe atividades reiteradas. Trata-se de tipo misto alternativo, a prática de mais de uma conduta caracteriza apenas um delito.

Elemento subjetivo - o § 1º menciona "deve saber", para Fernando Capez, a doutrina entende que seria dolo eventual. Entretanto por qual crime deveria responder se sabia que era produto de crime? Há duas correntes:

1ª) - o § 1º tanto prevê as condutas de quem sabe (dolo direto) quanto as de quem deve saber (dolo eventual), já que a vontade do legislador foi punir além da conduta de quem sabe, também a de quem deve saber. (Fernando Capez, Luiz Regis Prado etc)

2ª) se a lei tipificou apenas o comportamento de quem deve saber, logo, de acordo com o princípio da reserva legal, não pode ser empregada analogia para alcançar também a conduta de quem sabe. (por outro lado ofende o princípio da proporcionalidade). O legislador penal, no que toca a figura do crime culposo, adotou a regra da exceção do artigo 18, parágrafo único do código penal, só haverá punição do crime culposo quando o legislador expressamente mencionar a existência da culpa no tipo, sob pena de se não o fizer existir única e exclusivamente a possibilidade de se imputar o crime doloso ao agente, por isso que se diz que dolo é elemento subjetivo implícito do tipo, porque nunca o legislador diz matar dolosamente alguém, ele diz matar alguém, o dolo já está implicitamente ali na própria conduta, inserido na própria ação típica de matar, mas isso não acontece no crime culposo, a sistemática de incriminação na forma culposa é completamente diversa. § 3º - a expressão "deve presumir-se" denota conduta culposa, já que o agente deixa de presumir o que era presumível, deixando de observar o dever de cuidado. No artigo 18, parágrafo único, diz que salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente, a culpa deve ser expressa. Ocorre que essa menção expressa não foi feita no parágrafo terceiro, mas a menção a culpa existe indiretamente no § 5º, quando o legislador diz "Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena", uma hipótese de perdão judicial para o § 3º que é vamos ver a receptação culposa, porque logo em seguida diz "Na receptação dolosa aplica-se o disposto no furto de pequeno valor", ora se existe uma receptação dolosa e para ela se aplica unicamente a hipótese do furto de pequeno valor, aquela minoração, é porque existe uma receptação culposa, e é a anterior, no § 3º, com base no próprio § 5º do código. Aqui a figura culposa seria a violação do dever objetivo de cuidado, implica, segundo o próprio Código, na aquisição ou no recebimento da coisa com enorme desproporção entre o valor e o preço, ou, então, são duas as hipóteses em que se viola o dever objetivo de cuidado, segundo o Código, em virtude da condição de quem a oferece, ou de quem a vende, assim se uma pessoa ostentando uma aparência de mendigo vende para outrem um relógio, a princípio se deveria desconfiar, porque a regra de vida nos conduz a conclusão, e a regra da experiência prática nos conduz a conclusão que isso é normal, condição de quem oferece a coisa. De igual maneira o sujeito adquirir um rolex, verdadeiro, de ouro, por mil reais, há uma enorme desproporção, porque também é a regra de vida nos orientando que um relógio tão conhecido como esse e de ouro não possui esse valor de mercado, então alguma coisa está estranha nessa situação. Há uma desproporção entre o valor dela. A violação dessa regra de cuidado, que se deve observar implica aí no crime culposo de receptação, crime culposo esse que admite nos termos do parágrafo quinto um perdão judicial. Observar, ainda, que o crime de receptação possui uma figura específica, especial prevista no artigo 334 do Código, é o chamado contrabando ou descaminho. Quando pessoa que exerça atividade comercial ou industrial adquire coisa para vender na sua loja, ou na sua indústria que sabe ser produto ou fruto do crime de descaminho, coisas importadas que ingressaram irregularmente no território nacional, a hipótese será não do 180, mas sim do artigo 334, no seu parágrafo primeiro, alínea d. (fazer remissão) Disposições Gerais Sobre os Crimes Contra o Patrimônio. DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS: (art. 181 e seguintes)