OS REINOS ROMANO-GERMÂNICOS

INTRODUÇÃO

A crise do mundo romano e as invasões bárbaras marcaram o fim do Império Romano do Ocidente e o advento da Idade Média. Das invasões resultou uma fusão de elementos romanos e germânicos, que condicionou o futuro da Europa Ocidental nos séculos seguintes, dando origem ao feudalismo.
O processo de formação do feudalismo passou, pois, pela crise e ruralização do Império Romano nos séculos IV e V, pela constituição dos reinos romano-germânicos nos séculos VI e VII, pela organização do Império Carolíngeo nos séculos VIII e IX, para se firmar em fins do século IX e princípios do século X.

OS REINOS ROMANO-GERMÂNICOS

Ao longo do século V, os reis bárbaros, senhores de sua força, apoderaram-se das províncias ocupadas, dividindo o Império Romano do Ocidente em diversos reinos: o reino dos vândalos na África do norte, o reino dos suevos em Portugal, o reino visigodo na Espanha, o reino dos francos no norte da França, o reino dos borgúndios no centro da França. Em 476, Odoacro, rei dos érulos, derrotou Rômulo Augústulo, último imperador do Ocidente e ocupou Roma. Logo em seguida, foi vencido pelos ostrogodos de Teodorico, que fundou um reino na Itália e parte dos Bálcãs, em 493.
Os bárbaros eram camponeses e soldados e como já foi dito, faltava-lhes a noção de Estado. Conservando suas armas, seus hábitos, sua língua, sua religião politeísta ou ariana e seus reis, adaptaram-se ao ruralizado mundo romano, respeitando-lhe as instituições e a cultura que admiravam e reconheciam ser superiores. Introduziram, porém, alguns de seus costumes, como a noção de fidelidade pessoal entre o rei(chefe do bando armado) e seu séquito de guerreiros. Nos reinos bárbaros que se formaram, a noção de bem público não existia, pois entre eles o reino era considerado uma propriedade particular do rei, que recompensava seus fiéis seguidores com terras e produtos dos saques.
Os primeiros estados bárbaros não tiveram vida muita longa, com a exceção dos francos, que subjugando os borgúndios, iniciaram uma expansão que daria origem ao Império de Carlos Magno. Na África e na Itália, os bizantinos(do Império Romano do Oriente) dominaram os vândalos e os ostrogodos. Na Espanha, os visigodos foram vencidos pelos muçulmanos(vindo do norte da África) que aí ficaram de 711 até o século XV. Os anglo-saxões conquistaram a Inglaterra e os lombardos desceram sobre a Itália, dando uma nova configuração ao mapa da Europa.
Os nobres, francos e lombardos, ao se estabeleceram na Gália e na Itália, apropriavam-se de 1/3 ou de 2/3 das propriedades pertecentes aos romanos, baseados no princípio da "hospitalidade". Lotes de terra eram repartidos entre os membros pobres da tribo, como colonos ou pequenos proprietários. Em pouco tempo, estava consolidada uma aristocracia romano-germânica, com um campesinato dependente também da mesma origem.
As invasões germânicas contribuíram também para alterar a situação dos escravos que ainda existiam. A expansão dos ideais cristãos, a mortalidade, as fugas e o colonato levaram os senhores a considerar mais conveniente entregar aos escravos remanescentes um lote de terra para cultivo, com a obrigação do pagamento de uma renda "in natura" de gêneros variados, sendo-lhes permitido constituir família.
O estabelecimento dos reinos bárbaros levou a Igreja Católica Romana a procurar uma base de apoio que garantisse sua sobrevivência e facilitasse a missão de converter os germanos ao verdadeiro cristianismo. Isso foi conseguido a partir de uma aliança com o Reino Franco, facilitada pela conversão do rei Clóvis, responsável pela unificação de todas as tribos francas e fundador da dinastia merovíngia, no início do século VI.
A conversão dos francos ao Cristianismo tornou a Igreja protegida pelo Estado. Seu patrimônio foi ampliado com novas doações de terras concedidas pelos reis merovíngios, gozando de privilégios como a "imunidade", isto é, a isenção de impostos e de justiça do rei. A Gália tornou-se centro de irradiação do Cristianismo e os francos muito se utilizaram dos bispos e do alto clero católico para a organização e a administração de seu reino.
Além de religião, a língua latina constituiu-se também em um grande fator de aproximação entre romanos e bárbaros, por ser a língua administrativa, na qual as leis eram redigidas. Progressivamente, verificava-se um processo de fusão de elementos tanto romanos quanto germânicos, dando origem a uma nova Europa. O mundo romano forneceu a tradição dos latifúndios, do colonato e da vinculação dos camponeses à terra, enquanto os germanos contribuíram com a noção de fidelidade pessoal e a inexistência da noção de coisa pública, sendo reino considerado patrimônio pessoal do rei, que dele podia dispor como quisesse.


O DOMÍNIO E O COLONATO:

 

O SISTEMA SENHORIAL

Na integração da herança romano-germânica, formou-se uma nova sociedade em que se fundiram a grande e a pequena propriedade, o camponês livre e o trabalhador escravo, emergindo o domínio e o colonato.
O domínio ou senhorio tornou-se o modelo da propriedade rural do mundo romano-germânico, principalmente na Gália, sofrendo algumas variações de região para região. Pertencia aos grandes senhores - potentiores - de origem romana ou bárbara e à Igreja. Com área variável(entre 200 e 2000 hectares), constituia-se de parte interligadas: a reserva senhorial, os lotes(manso) destinados aos camponeses e os bosques, prados, baldios e pastagens, de uso comum.
A reserva senhorial, de uso exclusivo do senhor, consistia na melhor e na maior parte das terras do domínio. Era formada pela casa senhorial, cercada de celeiros, estábulos, fornos, oficinas artesanais, chiqueiros, moinho, capela, pomar e horta. Possuía também terras aráveis para o plantio de vinhas e cereais, além de prados e bosques, onde era praticada a caça.
Os mansos ou tenências eram lotes de 12 a 15 hectares, situados no interior do domínio, arrendados aos escravos e camponeses, livres(colonos), devendo seu cultivo suprir as necessidades de cada família. As casas dos camponeses agrupavam-se num determinado local do domínio, formando uma aldeia.
O colono tinha de prestar determinado número de jornadas de trabalho gratuitas(corvéias) para o senhor, a quem cabia a proteção e a garantia de terra para o cultivo. As corvéias consistiam em lavrar, plantar, colher e transportar gêneros alimentícios nas terras da reserva senhorial e executar serviços gerais como consertos e manutenção da propriedade. O camponês era também obrigado a entregar ovos, galinhas, ovelhas ou leitões como uma renda "in natura" devida ao senhor, além de moedas de prata pelo uso do pasto e de benfeitorias senhoriais como o moinho. O trabalhador escravo estava sujeito às mesmas imposições que o livre; entretanto, podia ser doado ou vendido com o domínio e devia fornecer trabalho garantido ao senhor a qualquer momento em que fosse solicitado.
O colonato, que atingia praticamente todos os camponeses, significou ao mesmo tempo um aviltamento da condição do homem livre agora submetido ao senhor e uma melhoria na situação do escravo que recebia um lote de terra para cultivar. A partir do século IX, ambos tiveram sua condição nivelada, passando a ser chamados de servos da terra.
O proprietário do domínio(senhor leigo ou eclesiástico), através das corvéias(trabalho gratuito), apoderava-se de grande parte do trabalho do camponês. Essa forma de exploração tornou-se a base do sistema senhorial.

Autores: Fábio Costa Pedro e Olga M. A. Fonseca Coulon.
História: Pré-História, Antiguidade e Feudalismo, 1989

 

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