Atualidades da Dra. Carla de J. Rodrigues, 25 de novembro de 2001:

Metade das crianças com menos de 3 anos têm anemia no Brasil

 

por Lígia Formenti

Pesquisa realizada em creches públicas de 20 capitais envolveu 8 mil menores de 3 anos.
Um levantamento inédito feito em 20 capitais do País revela que 49,8% das crianças com menos de 3 anos têm anemia. O estudo, conduzido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), avaliou as condições de 8 mil crianças, matriculadas em creches públicas, entre 1996 e 1999. Os números apresentados em algumas capitais assustam. Entre as crianças avaliadas no Recife, cidade que obteve o pior índice na pesquisa, 81% eram anêmicas. São Paulo ficou em quarto lugar: 56% das crianças tinham a doença.


O problema ganha proporções ainda maiores quando se considera a convenção de que, para cada paciente com diagnóstico de anemia, há outra, na mesma faixa etária, com deficiência de ferro no organismo - ou seja, a um passo da doença. "Isso significa que 2/3 das crianças brasileiras estão com reservas alteradas de ferro no organismo", afirma o coordenador do trabalho, o professor de pediatria da Unifesp Mauro Fisberg. "Não podemos aceitar isso, porque a doença tem um custo social alto", completa.


O alerta não é à toa. Estudos feitos em vários países demonstram que crianças com anemia apresentam alteração na memória, na velocidade de raciocínio, no aprendizado. Os trabalhos indicam que pacientes anêmicos têm desenvolvimento cognitivo 20% menor do que crianças com níveis adequados de ferro no organismo. Pior. Fisberg afirma que, mesmo quando as crianças são tratadas, é difícil recuperar o déficit. "Para isso, elas precisariam ser estimuladas, o que muitas vezes não ocorre."
O pediatra garante que esse alto índice poderia ser evitado. "Sabemos que a doença é comum entre pessoas com nível sócio-econômico menos privilegiado, mas se houvesse fortificação nos alimentos de fácil acesso, certamente o problema seria menor", garante. O enriquecimento de alimentos com ferro já ocorre em vários produtos consumidos pelo brasileiro, como leite e queijos.
Mas nem todos consomem esses produtos na quantidade necessária.

Redução - Uma das idéias defendidas pelo pediatra é o enriquecimento da farinha. "Um novo sal desenvolvido para ser colocado no alimento representaria um acréscimo de R$ 0,00009 para cada saco de 60 quilos de farinha", diz. "É preciso apenas vontade política para que medidas sejam adotadas." Em alguns locais, a experiência está sendo realizada.
Atualmente, as creches de São Bernardo do Campo oferecem pão feito com farinha enriquecida por ferro, com bons resultados. O índice de anemia, que era de 32%, baixou para 11% em seis meses.


O pediatra acredita que a merenda fornecida pelas creches exerce muitas vezes efeito protetor. O exemplo de Natal deixa evidente a influência do cardápio oferecido pelas creches. Pelos números da pesquisa, a capital apresenta o mais baixo índice de anemia: 18%. "Acreditamos que isso ocorra em razão da carne, que integra o cardápio da merenda."
Em alguns locais, porém, o cardápio oferecido para as crianças tem sua qualidade questionada. Ex-integrante do Conselho Municipal de Educação, irmã Miriam Alexandrina da Silva, afirma que em grande número de creches conveniadas de São Paulo, os alimentos oferecidos são de péssima qualidade.
"Há um grave problema no abastecimento de produtos, além de a verba para a compra de alguns produtos ser muito baixa", afirma.


Quando a doença se instala, a única forma de tratamento é o uso de complementos com ferro. A medida, porém, esbarra em um problema. O sal oferecido pelo Ministério da Saúde, mais barato, provoca nas crianças uma série de efeitos colaterais: náuseas, diarréia, fezes escurecida. "Por isso, não há aceitação, mesmo entre os pais", comenta Fisberg. Há outras opções do produto, mais caras, mas que não são distribuídas pelo governo. "Seria preciso também nesse aspecto avaliar quais são as prioridades: garantir a adesão ao tratamento ou economizar."

Fonte: http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2000/07/20/ger938.html

 

Dra. Carla de J. Rodrigues; Fisiopediatria - Pesquisa em Saúde Infantil, São Paulo/SP, Brasil.
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