A dor em Terapia Manual

Por Marcel Bienfait

Além das possibilidades que traz para a reeducação funcional, além da
reeducação dos desequilíbrios estáticos, a razão de ser da terapia manual
é o tratamento da dor. Muitas vezes repetimos que a localização de uma
dor não é um meio de localizar a lesão que por ela é responsável. Esta
pode situar-se longe da dor. No entanto os fenômenos de dolorosos em
nossos pacientes são ricas fontes de informação e podem guiar o exame e
orientar o diagnóstico.

Não vamos aqui entrar nos detalhes patológicos sobre os quais já falamos
em outras ocasiões.

Vamos apenas classificar as dores em categorias gerais de acordo com a
causa. É claro que todas as exceções podem ser encontradas, mas em
regra geral, a dor assume aspectos diferentes de acordo com sua origem.
Isto é indicador importante que orientará o exame em um sentido ou em
outro. Vamos assim distinguir as dores de posicionamento, as dores
estáticas, as dores que diremos osteopáticas, as dores por artrose, as
dores por lesão interna.

I. AS DORES DE POSICIONAMENTO

Denominamos desta forma as dores profissionais, isto é, as dores
provocadas por posições mantidas durante muitas horas. Levam todas a
uma artrose bem localizada na região da coluna. Há uns 30 anos
juntamente com o Dr. Jean du Croquet realizei um estudo fotográfico e
radiográfico de posições profissionais. Desta forma fotografamos e
radiografamos numerosos trabalhadores em suas posições de trabalho:
datilógrafas, contadores, padeiros, marceneiros, plantadores de
beterrabas, ceifadores, etc. sempre sinais artrósicos sobre três vértebras
eram perceptíveis no ápice das curvas determinadas pelas posições
profissionais. A localização das lesões era diferente para cada categoria de
trabalhador. A dor era sempre um sinal precursor destas artroses. Elas são
devidas a atitudes prolongadas que criam tensões anormais sobre os
ligamentos solicitados para o equilíbrio e desequilíbrios de pressão na
região das superfícies articulares.

As más posições escolares são com freqüência acusadas de serem a causa
de certas escolioses. Não acreditamos que isto corresponda à realidade.
No entanto é fato que muitas crianças sofrem de dores dorsais devidas à
posição curvada para a frente sobre o caderno. Nunca devemos ignorar as
dores. Devem fazer pensar na moléstia de Scheuerman tão
freqüentemente negligenciada.

As dores de posicionamento nunca são agudas. Instalam-se sub-reptícia e
progressivamente e o paciente é em geral incapaz de situar o momento em
que começaram. A dor não é constante, desaparece durante os períodos
de repouso e acentua-se com o cansaço. Sobretudo, o paciente sente um
alívio imediato ao mudar de posição durante o trabalho.

Se o terapeuta manual nada pode fazer contra as manifestações de
artrose, a reeducação estática age de forma maravilhosa sobre as dores e
por isso mesmo sobre a evolução da artrose. Esta reeducação deve ser o
mais precoce possível. As seções são rapidamente espaçadas, um trabalho
cotidiano deve ser confiado ao paciente.

II. AS DORES ESTÁTICAS

As dores estáticas são bastante comparáveis às dores de posicionamento
sobre as quais acabamos de falar, com exceção do fato de não serem
jamais localizadas. Os desequilíbrios segmentares criam tensões
ligamentares, mas sobretudo criam desequilíbrios de tensão da musculatura
tônica e a hiper solicitação de certos músculos levam rapidamente a
retrações dolorosas. O paciente procura tratamento com mais freqüência
quando sua dor, que nunca é aguda e é praticamente sempre suportável ,
existe há muito tempo e tem tendência a piorar. Ele nunca é capaz de
situar o começo da dor. Contrariamente a uma dor de posicionamento em
geral fácil de ser localizada, esta é difusa e muito freqüentemente sentida
em toda a região sem um ponto preciso. Por outro lado, às vezes pode se
deslocar. Não é o que chamamos uma dor intermitente, mas inicia-se em
geral durante a manhã e exagera-se progressivamente até à noite.
Somente a posição deitada a diminui ou mesmo a faz desaparecer.
Exagera-se sempre com o cansaço. O movimento não aumenta a sua
intensidade, ao contrário a faz às vezes desaparecer durante um tempo.

As dores estáticas são sempre uma indicação importante. Só assinalam
que a deformidade ainda não está fixada, mas são também sinal de
evolução no sentido da piora e da fixação. Deve-se prestar grande
atenção a ela, sobretudo nas crianças e adolescentes. As deformidades
fixadas nunca são dolorosas.

É lógico que encontraremos a solução para os problemas deste paciente
em uma reeducação estática bem conduzida.

III. AS DORES OSTEOPÁTICAS

Por não contarmos com outro qualificativo, chamamos assim as dores das
lesões dos micromovimentos articulares. Ao contrário das duas categorias
precedentes, são sempre dores relativamente recentes e o paciente
consegue situar o momento em que iniciaram. Nunca são dores surdas,
mas dores nítidas, sempre precisas e que podem chegar até um estado
agudo. São com freqüência intermitentes, manifestam-se apenas em
determinadas condições, em certas posições. Exageram-se quase sempre
por um movimento que aumenta a tensão responsável pela lesão, por
exemplo, uma dor de flexão dorsal da coluna (desabitação) será diminuída
através de uma anteflexão do tronco, mas será agravada por uma
posteroflexão.

O tratamento de tais dores constitui a razão de ser da osteopatia.

IV. AS DORES POR ASTROSE

As dores devidas à artrose escapam da competência do terapeuta manual.
Na articulação, a artrose se manifesta de duas formas: pelo uso das
superfícies cartilaginosas, por uma densificação e uma calcificação do
sistema ligamentar. Com exceção das irritações radiculares que provocam
na região da coluna, as afecções artrósicas não são dolorosas a não ser
durante os movimentos que elas são capazes de limitar nos dois sentidos.
Assim, por exemplo, uma artrose vertebral limitará a rotação da vértebra
para os dois lados, enquanto uma lesão osteopática limitará esta rotação
apenas para o lado oposto à lesão.

Uma manifestação dolorosa liga seus fenômenos de artrose. O movimento
articular repetido chega facilmente nos casos de artrose a uma irritação e
a uma reação inflamatória dolorosa. Em geral falamos inadequadamente de
"crise de artrose". Trata-se em geral apenas de uma solicitação articular
mais intensa que a usual.

No tratamento da artrose, é clássico preconizar exercícios ativos.
Acreditamos que seja um erro. O movimento nada traz para a degeneração
cartilaginosa, nem para a densificação conjuntiva. A contrário, o
movimento com freqüência acarreta uma irritação e um período
inflamatório, fatores de evolução que acabamos de relembrar.

Sim, como acabamos de ver, o tratamento da artrose escapa da
competência do terapeuta manual, é inegável que este pode trazer sua
modesta contribuição, sobretudo na prevenção, através das "pompages"
articulares que reidratam a cartilagem, através de manobras circulatórias
da região envolvida. Por outro lado, não devemos esquecer que numerosas
artroses procedem de desequilíbrios estáticos.

Com respeito a estas dores artrósicas, relembramos o que dissemos quanto
à prática osteopática verdadeira. Seja o que for que digam numerosos
osteopatas, uma lesão osteopática não pode criar irritação radicular. Ela
ocorre, nós sabemos, dentro das possibilidades articulares de frouxidão
ligamentar, o que exclui toda irritação da raiz nervosa. Com exceção da
protusão discal que é um caso especial, a maioria das irritações radiculares
são devidas à osteofitose do sistema ligamentar vertebral.

V. AS DORES DEVIDAS A UMA PATOLOGIA INTERNA

O terapeuta manual não deve pensar que é capaz de tratar todas as
dores, o que muitos acreditam após passarem por um ensino irresponsável.
É uma pretensão terapêutica que comporta altos riscos. O campo das
dores é vasto e nós não podemos explorá-lo aqui. O terapeuta manual
deve estar consciente, acabamos de lembrar, de que todas as dores não
são mecânicas. Neste grupo classificamos as irritações radiculares das
quais acabamos de falar. Aí classificamos também as dores por protusão
discal que o terapeuta manual deve evitar de tratar, por duas razões: a
primeira por ser uma patologia ligada sobretudo à degeneração do anel,
que nenhuma manobra pode melhorar. A segunda é porque a protusão
pode ser sempre agravada, agravação que leva facilmente a fenômenos
paralíticos irreversíveis.

INTERROGATÓRIO

É através de um longo interrogatório que o terapeuta manual será capaz
de classificar as dores dentro de uma das categorias sobre as quais
acabamos falar e em seguida poder orientar o seu tratamento. Este
interrogatório deve então preceder qualquer outra coisa. Ele acompanha o
interrogatório clássico que não relembraremos aqui. Para este
interrogatório, nunca é suficiente contentar-se com o relato do paciente.
Este é sempre incompleto e com freqüência pouco preciso.
Inconscientemente, certos pacientes escondem uma parte da verdade,
outros, ao contrário, a transformam e juntam detalhes imaginários. O
terapeuta deve interrogar através de questões precisas, insistindo,
repetindo suas questões, complementando eventualmente outras mais
precisas ainda.

Enumeramos a seguir as questões que pessoalmente utilizamos. A lista não
é completa e pode comportar outras questões adaptadas a cada caso.

a. Qual é sua profissão e suas posições de trabalho?
Trata-se de uma primeira questão indispensável quando estamos frente a
dores raquidianas. Para a região dorsal, por exemplo, estas dores são com
freqüência devidas a uma posição encurvada para frente mantida por
muito tempo. Na região lombar, devidas a cargas com freqüência
manipuladas. Se este for o caso, o terapeuta deverá pensar em uma dor
de posicionamento ou uma dor por esforços repetidos, sejam por uma
deterioração discal se as dores são antigas e de tipo dor em queimação,
seja por uma lesão osteopática se a dor é recente e sobretudo se
apresenta um caráter agudo ou sobre-agudo.

b. Há quanto tempo o Sr. sofre com esta dor?
Esta questão deve ser também colocada desde o início do interrogatório.
Vimos que uma dor antiga ou muito antiga orientará nossas suspeitas para
uma dor de posicionamento ou sobretudo para uma dor estática. Uma dor
recente fará pensar em uma lesão osteopática.

c. O Sr. pode situar de forma exata o início e as circunstâncias desta
dor?
Esta questão completa a precedente. Para uma dor de origem estática, o
paciente em geral é incapaz de situar o início e os primeiros sintomas. É
ainda menos capaz de avançar uma hipótese sobre a causa. A dor
instalou-se progressivamente e piorou aos poucos. Para uma dor de
posicionamento, o paciente é incapaz de situar o início, mas é
perfeitamente consciente da causa. Para uma dor osteopática, ela
instalou-se subitamente e é raro que o paciente não lembre do seu início e
das circunstâncias ou do movimento que a provocou.

d. Onde situa-se esta dor?
Esta questão completa também as duas precedentes. Por uma dor de
posicionamento, o paciente é incapaz de localizar a dor com precisão. Nas
lesões osteopáticas, ocorrerá com freqüência a mesma coisa, seja a lesão
dolorosa primária ou secundária. Por outro lado, numa dor estática, ele
pode raramente ser preciso. Trata-se de uma dor difusa, mais ou menos
extensa, às vezes pode mesmo se deslocar.

e. A dor é permanente ou eventual?
A resposta desta questão só deve ser tomada em consideração após uma
verdadeira inquisição por parte do terapeuta. Muitos pacientes, obcecados
pela dor, respondem que ela é constante. Após questões mais precisas e
um pouco de reflexão acabo por concordar que a dor desaparece em
determinados momentos do dia ou em certas circunstâncias. Isto leva a
pensar em uma dor de posicionamento ou uma dor estática. As dores
osteopáticas podem atenuar-se em certas posições, e nunca desaparecem
completamente.

f. Qual movimento aumenta ou provoca a dor?
Qual movimento atenua ou faz desaparecer a dor? Numa dor de
posicionamento, o movimento acentua a dor mas o movimento inverso a
atenua ou a faz desaparecer. Em uma dor estática o movimento, seja qual
for, traz com freqüência alívio, mas a dor recomeça imediatamente quando
o movimento cessa. Em uma lesão osteopática, o movimento que vai no
sentido da lesão pode atenuar a dor, enquanto o movimento que vai no
sentido inverso a exagera nitidamente. Com exceção dos período
inflamatórios, a dor por artrose só aparece durante o movimento. Na região
da coluna, ela é sempre bilateral e ocorre em todas as amplitudes.

g. Qual posição atenua ou aumenta a dor?
Esta questão permite com freqüência diferenciar uma dor de
posicionamento de uma dor estática. Uma dor de posicionamento
desaparece, em geral, em uma posição inversa àquela que a provocou.
Para as dores estáticas, as mudanças de posicionamento têm pouca
influência sobre a dor, podem simplesmente atenuar-se um pouco, ou
desaparecer. Apenas a posição deitada a faz desaparecer. As mudanças
de posição nunca atenuam a dor osteopática, por outro lado podem
aumentá-la consideravelmente.

h. Qual é a influência do repouso sobre a dor?
As dores de posicionamento desaparecem por completo através de >


Transferência interrompida!

. As dores estáticas desaparecem ou atenuam-se consideravelmente,
depende de serem mais ou menos antigas. A repouso tem pouca influência
sobre as dores osteopáticas ou sobre as dores por artrose.

i. Qual o trajeto segue a sua dor?
Em que zona ela se situa? Esta questão deve ser colocada quando
suspeita-se de uma irritação radicular. Se a dor segue trajeto preciso, o
do nervo correspondente à raiz irritada, nos situamos em uma zona
metamérica, a resposta confirma o diagnóstico e localiza a irritação.

j. O Sr. já teve períodos inflamatórios articulares?
Esta questão segue a precedente. Se os períodos inflamatórios ocorrem
durante um estado de dor permanente ao movimento, se elas são
localizadas na mesma articulação, são sinal de uma provável artrose
articular. Se ao contrário, ocorrem sem uma grande dor prévia, sobretudo
se ocorrem em várias articulações, trata-se certamente de uma afeção
mais grave que deve ser orientada por um especialista.

k. A dor é maior à noite do que durante o dia?
Esta questão deve ser colocada quando há queixas de cervicalgias e
sobretudo de lombalgias. Vimos que as aponeuroses do psoas e do longo
do pescoço eram grandes aponeuroses de drenagem, desta forma estão
com freqüência sujeitas à inflamações tóxicas (psoit) que criam dores
noturnas que desaparecem ou se atenuam consideravelmente desde que o
paciente se levante e ande. Estes casos se tratam facilmente pelas
"pompages" circulatórias destes músculos.

l. O Sr. teve há muito tempo ou recentemente algum tipo de acidente?
Se a resposta for positiva qual foi seu tratamento? O terapeuta manual
deve conhecer os antecedentes traumáticos do paciente, mesmo aqueles
muito antigos. Ele deve insistir muito a colocar questões mais precisas:
fratura, ferimento muscular, lesão de ligamento, de tendão, traumatismos
diversos, entorse, comoção, etc. Isto é indispensável porque estes
acidentes com freqüência deixaram apenas uma vaga lembrança. Deve-se
conhecer também o tratamento realizado após estes incidentes. Tudo isto
orientará as pesquisas do terapeuta e lhe permitirá evitar certos
movimentos ou solicitar manobras perigosas.

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