JOGOS PAN-AMERICANOS 2007: REARRANJOS
SÓCIO-ESPACIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
Graduanda em Geografia Isabela
L. P. Pasini (Uerj – FFP)
Graduando em Geografia Jeferson
Alexandre P. Pontes (Uerj)
INTRODUÇÃO
Este trabalho pretende
contribuir para uma análise dos grandes eventos esportivos urbanos, tendo como
fito investigar os impactos sócio-espaciais dos Jogos Pan-americanos de 2007
que terá como sede a cidade do Rio de Janeiro.
A CIDADE E O PAN
A Cidade do Rio de
Janeiro atravessa uma fase de modificações espaciais relacionadas à
implementação do Pan-2007. Entretanto, a lógica das ações não incide propriamente
sobre o conjunto da cidade, nem priorizam o lazer e o esporte. Atuando em
pontos específicos / isolados, abrem-se novas oportunidades para a acumulação
do capital, principalmente ao setor imobiliário, se instalando a partir disso
uma política despótica que ignora as diferenças sócio-espacias no tecido urbano
em favor de um plano neoliberal de projeção internacional da cidade que alguns
autores preferem denominar de City Marketing.
De modo geral, o
arcabouço de ações e idéias (intervenções pontuais, falta de transparência nas
decisões, desapropriações de comunidades carentes etc.) despertou a
insatisfação de diferentes segmentos da sociedade civil, sobretudo daqueles que
residem em áreas atingidas direta ou indiretamente pelas obras do
Pan-americano.
Um exemplo desta
insatisfação é a existência do Comitê Social do Pan[1] que
é um movimento que une representantes de associações de moradores, profissionais
ligados à cidade e sua gestão (arquitetos, economista, geógrafos, assistentes
sociais, entre outros) e de outros movimentos / segmentos. Todos possuem um
objetivo em comum – o de atuar criticamente nas questões relacionadas aos Jogos
Pan-Americanos de 2007, através de debates com a sociedade civil organizada,
pensando sobre a cidade nos preparativos, na realização e no legados do Pan. Sobre
este legado e sua geografia, uma breve análise a seguir.
UMA GEOGRAFIA DO PAN
A Geografia dos Esportes
consiste essencialmente no estudo da dimensão espacial da atividade esportiva (Atlas
do Esporte no Brasil, 2005). Neste sentido, consideramos as atividades
relacionadas aos Jogos Pan-Americanos (construções, fluxos de capitais públicos
e privados, fluxos de pessoas, impactos no transporte, meio ambiente, entre
outros) como promotoras de rearranjos espaciais na cidade, criando novas
dinâmicas e funcionalidades, modificando a paisagem geográfica. As instalações
esportivas (estádios, ginásios, centros desportivos, etc), por exemplo,
constituem importantes equipamentos urbanos, pois são duráveis de grande porte.
Ou seja, são construções que permanecem na cidade, adquirindo uma outra função
após a execução dos jogos.
A Vila Pan-Americana pode
ser interpretada como uma dessas instalações duradouras. Ela abrigará os
atletas e a imprensa durante o evento. Depois do mesmo ela servirá de moradia.
Considerando a localização (bairro da Barra da Tijuca[2]) e
o preço dos imóveis[3] fica
claro o direcionamento deste empreendimento às classes média e alta e não às
comunidades de baixa renda que sofrem com o déficit habitacional da cidade, reproduzindo
uma contestada tendência neoliberal de produção
das vilas olímpicas (Mascarenhas, 2005). Além disso, o capital investido nesta
obra é proveniente do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, através de um
financiamento feito pela Caixa Econômica Federal direcionado a Agenco
(empreendedora privada).
A construção do estádio
João Havelange, orçado em R$ 229 milhões, é uma outra instalação esportiva que
gera polêmicas, tendo em vista que a cidade já possui um outro grande estádio
(Mário Filho) que inclusive passa por reformas. Um
outro ponto é em relação à lei[4],
sancionada pelo prefeito César Maia no dia 04 de julho de 2005, que declara o
entorno deste estádio Área de Especial Interesse Urbanístico (AEIU). O gabarito
das construções obedecia ao limite de dois andares, passando neste momento para
o limite de 11 andares. Esta medida visa claramente a valorização e a
regularização do uso do solo na área a fim de beneficiar o capital imobiliário.
A indenização dos moradores não lhes permitirá adquirir novo imóvel no bairro
onde possuem vínculos enraizados.
Através dos exemplos
supracitados, em meio a vários outros[5]
que não poderemos abordar nesta ocasião, queremos elucidar que a lógica dos
Jogos prioriza a “privatização” dos bens produzidos em detrimentos de um legado
voltado para a sociedade. Ou seja, perde-se a oportunidade de investir em áreas
deficientes da cidade, dando prioridade a interesses empresariais.
Toda a lógica deste
planejamento urbano só se torna viável pelo fato de que hoje[6] a
cultura (considerando o esporte uma manifestação cultural) é um grande negócio
que movimenta grandes fluxos de capitais[7]. O
Pan 2007 é um exemplo, provocando, além disso, uma grande visibilidade para a
cidade. Arantes (2002) chama atenção para este tipo de gestão que prioriza a
iniciativa privada e se apropria de expressões culturais, tornando-as
mercadorias. Ela chama esta leva de planejamento urbano de “terceira geração
urbanística” (pg.12) que assume a gestão da cidade como se fosse uma empresa e
tem a cultura como novo setor a ser mercantilizado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É
preciso esclarecer que o tema que tentamos desenvolver neste trabalho é de uma
riqueza muito grande, sendo impossível estender uma discussão que abarque todos
os aspectos e suas respectivas repercussões do mesmo. Com isso, abordamos
apenas alguns pontos a fim de ilustrar o tipo de gestão que têm sido
implementada e que se mostra voltada a interesses mercantis, tendo conseqüências
diretas no legado dos Jogos.
BIBLIOGRAFIA
Arantes, Otília. “Uma estratégia
Fatal. A cultura nas Novas Gestões Urbanas”. In.: A Cidade do Pensamento Único.
2002 -3ªed.. Petrópolis, RJ: Vozes.
DaCosta, Lamartine (org.). Atlas do Esporte no Brasil, 2005. Rio de
Janeiro: Shape 2005.
Mascarenhas, Gilmar. A Cidade e os Grandes Eventos Olímpicos: Uma
Geografia pra quem? 2004, Rio de
Janeiro.
_________________. Para Muito Além do
Esporte: o urbanismo olímpico e seu legado social. Globalização e solidariedade, (ISBN 58-89366-17-0), num 4,
pp.20-35. Rio de Janeiro, PACS, agosto de 2005.
[1] Criado em abril de 2005, o CSP nasceu na união de dois fóruns populares - Fórum Popular do Orçamento do Rio de Janeiro/ FPO e Fórum Popular de Acompanhamento do Plano Diretor do Rio de Janeiro/ FPAPD. Para mais informações sobre o CSP, acessar http://www.oocities.org/br/fporj/ .
[2] A Barra da Tijuca, como é sabido, é um dos bairros mais valorizados da cidade, possuindo imóveis e serviços de alto custo.
[3] O preço varia de R$ 97 mil a R$ 337 mil (Fonte: Jornal O Dia, 12/08/05).
[4] Lei nº 4125/2005, de autoria do Poder Executivo, como informa o portal eletrônico da Câmara Municipal (http://www.camara.rj.gov.br/noticias/leis%20antigas.htm, acessado em 27/04/06).
[5] A privatização do Rio Centro, as obras e descaracterização do Autódromo de Jacarepaguá e do Estádio de Remo da Lagoa, as desapropriações previstas e vários pontos, etc.
[6] Este processo ocorre a algum tempo, mas se intensificou no pós- II guerra (Mascarenhas, 2004).
[7] Como exemplo podemos citar a venda dos direitos das Olimpíadas de 2012 à rede americana NBC por 1 bilhão de dólares.