O Pan vem aí. O Pan que nós queremos e o que eles querem

 

O neoliberalismo dá sinais claros de esgotamento e faz “água” ao redor do mundo. Ninguém mais acredita que a redução do Estado e que as privatizações solucionem os problemas econômicos: perdeu-se a fé no deus mercado. Ainda bem, pois a aplicação do receituário só levou a estagnação e aumento da desigualdade. Entretanto, os beneficiados dessa onda querem beber as suas últimas gotas por meio dos preparativos para os Jogos Pan-Americanos de 2007 no Rio.

O jogo está começando: de um lado nós, a cidadania ativa e de outro eles, os aproveitadores de plantão.

No Pan que nós queremos a construção das moradias dos atletas serviria para atenuar o imenso déficit habitacional para a população de baixa renda. Aliás, essa postura foi bastante comum em várias edições passadas e é a do projeto Londres/2012. No Pan que eles querem a Vila do Pan é um pote de ouro. A prefeitura faz a urbanização de um terreno pantanoso, o dinheiro do trabalhador financia a construção dos prédios para a classe média alta e o lucro fica com a imobiliária.

No Pan que nós queremos a Marina da Glória seria reformada para aumentar a capacidade de recebimento de barcos e com isso impulsionar o turismo marítimo. No Pan que eles querem conceder o direito a atual concessionária de explorar – e lucrar – esse serviço público até 2036!

No Pan que nós queremos o Estádio de Remo da Lagoa seria finalmente reformado e destinado ao esporte que dá nome ao estádio, revitalizando um esporte que já foi o mais popular da cidade. No Pan que eles querem periga aparecer mais um shopping com salas de cinema em área pública, agravando ainda mais o congestionamento local. Em tempo: fecha-se a vista de um dos lugares mais bonitos do Rio.

No Pan que nós queremos o Riocentro seria reestruturado como um grande centro de convenções. No Pan que eles querem depois das obras de adaptação aos jogos, feitas com dinheiro público, o Riocentro será “privatizado” por 50 anos!

No Pan que nós queremos os contribuintes seriam respeitados. No Pan que eles querem um proprietário de imóvel, localizado em área valorizada da cidade, fica isento de pagar o IPTU até 2008 por sediar o Comitê Organizador do Pan.

No Pan que nós queremos a segurança pública seria reforçada sim e em proveito de todos. No Pan que eles querem uma empresa australiana, já contratada, é a responsável pelo plano de segurança para e apenas dos visitantes. Será que os australianos tratarão os habitantes dos morros cariocas como cidadãos? Será que compreendem as peculiariades da nossa cidade?

No Pan que nós queremos a construção de um estádio olímpico serviria para estimular a prática dos esportes, principalmente pelas crianças da rede de ensino público. A história seria preservada com a manutenção do Museu do Trem. Os moradores do entorno teriam obras de urbanização e a estação da via férrea seria revitalizada de forma a garantir o transporte coletivo. No Pan que eles querem o poder público gasta mais de 200 milhões na sua construção para privatizá-lo depois, sem contar os erros de projeto como foi o caso da raia não pedida pela organização internacional de atletismo.

No Pan que nós queremos um sistema de transporte coletivo seria um legado importante. No Pan que eles querem se investe no transporte individual motorizado e corre-se o risco de colapso no trânsito, com as vias seletivas para o Pan durante o evento.

No Pan que nós queremos as obras do Autódromo preservariam o seu uso para as corridas de velocidade de automotores, sobretudo pelo bom senso, pois foi gasto U$60 milhões em obras recentes. Os moradores da Vila Autódromo receberiam saneamento e urbanização. No Pan que eles querem se acaba com a única pista para o automobilismo do Rio e se remove moradores de baixa renda por enfearem a paisagem. O consórcio que pretende fazer a obra no Autódromo tem a garantia dos cofres municipais para um empréstimo junto ao BNDES, ou seja, dinheiro público.

O Rio precisa do Pan servir de estímulo na alteração da trajetória de cidade partida e excludente. Mesmo sabendo que tudo que for feito de bom para essa cidade em nome dos jogos poderia ser feito sem Pan nenhum.

O Rio quer o Pan. Mesmo ciente do caráter mercantilista que os eventos esportivos tomaram e de não ter sido consultada no momento da candidatura o carioca tem orgulho de sediar o Pan/2007.

Se é verdade que as rapinas de sempre estão esfregando as mãos, por outro lado a sociedade está de olho. O Comitê Social do Pan que congrega pesquisadores de universidades, moradores das áreas afetadas e representantes do movimento social está atuando. A preocupação primordial é saber em que cidade estamos vivendo durante os preparativos e sobretudo qual cidade herdaremos após a realização deste grande evento.

O Rio merece elevar a sua auto-estima tanto por fazer um mega-evento com competência quanto por tratar seus cidadãos com dignidade e respeito.

 

Luiz Mario Behnken

Economista, 45 anos

Comitê Social do Pan