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«Stag and Reindeer», Lascaux,
Dordogne, France
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A procura de nós mesmos é um processo
doloroso, sem fim. O contentamento, a haver, poderá estar
relacionado com o encontrar em nós mesmos características
que, em relação com características de outros
de quem gostamos e estimamos nos façam sentir integrados
e com algo a dizer.
O difícil é estar parado. Se procuramos algo ou
algo nos procura, o mais fácil para qualquer das partes
será estar parado, estacionar num sítio, o sítio
mais provável em que iremos ficar de modo a que, se formos
encontrados, a esse encontro fique associado um factor agradável.
O vazio, esperar por algo ou alguém, faz que, por vezes,
possamos fazer asneiras, tais como o isolamento das pessoas de
quem mais gostamos e que de nós gostam, para não
lhes dar a conhecer o nosso "pequeno inferno pessoal momentâneo".
O estar com essas pessoas e nada do que elas dizem ou fazem fazer
sentido não quer dizer que essas atitudes não o
tenham. Por vezes, nessas alturas, não temos disponibilidade
mental ou espiritual para entender pequenas subtilezas adjacentes
a certos movimentos e momentos que se passam à nossa volta.
Ocasiões há em que nos voltamos para todos como
uma tábua de salvação, um copo de água
no deserto, com tal sofreguidão que assustamos quem de
nós se aproxima: ninguém, por mais sedento que esteja,
chega a um restaurante e pede com ar de extrema aflição
um copo de água ao empregado. Não se aceita. O desespero
de tanto precisar de companhia ou ajuda pode levar a esse tipo
de erros.
A confiança é a única coisa que não
pode ser readquirida na sua totalidade quando perdida, juntamente
com aquelas coisas que tanto gostávamos quando éramos
pequenos. Essa confiança é o mais importante, o
que interessa. Uma vez perdida, ela está tão distante
de voltar a ser adquirida como o topo do Monte Everest ao comum
dos mortais. Por mais fugas no espaço e no tempo que façamos.
E o medo? Temos. Temos que ter medo se procuramos uma mudança,
pois nunca saberemos ao certo onde iremos parar. O medo transforma-nos
numa amálgama de contradições defensivas.
O medo é tão natural quanto a coragem, se usarmos
esta como antítese. Existe, está lá. Mas
é só isso.
"Ao procurarmos a nossa alma", devemos posicionar-nos
o mais próximo possível de onde gostaríamos
de a encontrar. É aí que nós vamos gostar
de ficar e aí será onde ela gostará de nos
encontrar.
Esse encontro não irá ser a perfeição,
muitos atritos irão haver. Por vezes, pessoas que julgam
procurar, já a encontraram sem disso dar conta, sendo essa
a razão da perda do seu equilíbrio.
As discussões interiores agravam-se, ora para o desespero,
ora para o nada. Isso é importante. É importante
que consciencializemos que tudo o que connosco se passa é
de extremo interesse para nós. É vulgar andarmos
tristes sem sequer nos interrogarmos o porquê disso. O grave
não será a nossa tristeza, mas sim o nulo significado
que lhe atribuímos, ao ponto de preferirmos fazer n coisas
estúpidas, como arrumar sapatos ou limpar teias de aranha
de minúsculos sítios que escapam aos nossos olhos
e à nossa felicidade para "não pensar mais
nisso". Em quê? Se nos perguntarmos em que pensamos
nessas alturas, nem nos vem resposta. Se respeitarmos essa tristeza,
bem como todos os momentos de felicidade, o sentirmo-nos felizes
quando disso é caso, as coisas vão começar
a correr melhor.
Temos uma vida de metamorfoses, transformações.
É bom. É melhor ter algo que não ter nada.
O tempo vai ajudar a consolidar o encontro da alma com nós
próprios, o "encontro de nós mesmos".
Uma altura vai chegar em que nos havemos de sentir nós
mesmos de novo. Se pararmos um bocado nessa altura, verificamos
que houve mudanças, mudanças no relacionamento connosco
e com os outros.
Estamos prontos a coexistir novamente com nós próprios,
corpo e alma.
Até à próxima procura.
Marco A. Laureano
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