Entrevista original concedida a Folha de São Paulo


Acompanhe aqui as respostas originais, por extenso e sem cortes, às questões do repórter Antonio Gois.

1 - Por que o debate entre os defensores do método fônico e os construtivistas é tão acirrado no Brasil?

Descobertas revolucionárias relacionadas a novas tecnologias como as de neuroimagem funcional da década do cérebro refutaram a maior parte dos pressupostos construtivistas e levaram à revolução fônica que mudou a alfabetização mundial na década de 1990. Contudo, os construtivistas latino-americanos, obtusos à ciência de que se desligaram assim que agarraram o poder de ditar as políticas públicas de ensino na década de 1980, continuaram nos últimos 25 anos advogando práticas anacrônicas e daninhas, e ditando regras completamente contraproducentes. Isso se tornou ainda mais sério no Brasil, em que o establishment construtivista passou a dominar com mãos de ferro as principais publicações distribuídas ao professorado às custas do erário público para impor a sua doutrina construtivista. Depois de gozar de poder absoluto durante todo o último quarto de século e de limitar as leituras de gerações de professores à pobre dieta de autores defuntos ou senis, o establishment construtivista acabou sufocando quase toda forma de vida inteligente, estabelecendo nas terras tupiniquins a uniforme unanimidade (de que nos advertia Nelson Rodrigues) em torno do construtivismo. Na década de 1990, à luz das pesquisas da Unesco, países como França, Inglaterra e Estados Unidos se deram conta do profundo dano que o construtivismo havia cometido a suas populações escolares desde a década de 1980 e mudaram radicalmente para o método fônico, como documentado oficialmente pelo Ministério da Educação da França, pelo Departamento de Educação da Inglaterra, pelo Observatório Nacional da Leitura da França, e pelo Instituto Nacional de Saúde Mental e Desenvolvimento Humano dos Estados Unidos. Nossos livros documentam bem toda essa história recente internacional de alfabetização. De modo tragicamente paradoxal, na contramão da História, no mesmo ano que o mundo rejeitava o construtivismo e abraçava o fônico, encastelados no auge de seu poder tupiniquim absoluto, os construtivistas brasileiros decretaram os PCNs em alfabetização, uma coletânea de noções pré-científicas tortas e preconceituosas que vem servindo desde então, há mais de uma década, para desorientar as práticas do alfabetizador brasileiro e arruinar as chances e alguma eficácia além da sofrível. Como documentamos em nossos diversos livros, os PCNs brasileiros em alfabetização são frontalmente contrários aos PCNs em alfabetização dos Estados Unidos, França, e Inglaterra. Comparando os PCNs brasileiros aos do mundo civilizado, constatamos que os PCNs brasileiros equivalem a uma obra prima de obtusidade, ao advogar práticas que a pesquisa científica internacional descobriu como perniciosas à aprendizagem, e ao criticar exatamente as práticas que a mesma pesquisa científica internacional descobriu como eficazes. Em conseqüência, e conforme comprovamos em diversos experimentos controlados, quanto mais obedientes aos PCNs brasileiros forem os professores alfabetizadores, tanto mais baixas as competências de leitura e escrita de seus alunos ao final do ano letivo. E quanto mais desobedientes os professores, tanto mais competentes seus alunos, o que faz pensar na sabedoria de um Gandhi e seu projeto de desobediência civil. Claro, ao longo dos anos, os melhores professores, os mais sensíveis ao rendimento de seus alunos (e à ausência dele), perceberam isso com clareza: que se fizerem o que os PCNs determinam, seus alunos não aprendem. Contudo, esses professores estavam manietados por coordenadores pedagógicos e diretores, os quais também estavam manietados por autoridades das secretarias de educação, que, batendo continência ao MEC, fiscalizavam as atividades do professorado (por meio de inspeções dos cadernos dos alunos) para garantir que ele não se desviasse das diretrizes dos PCNs. O resultado dessa cadeia do poder é que os PCNs penetraram fundo na escola, determinando o que o professor podia ou não fazer em sua prática da sala de aula. Assim, no último quarto de século assistimos a um espetáculo no mínimo estranho: movimentos organizados de pais batendo às portas das escolas para pedir às autoridades (professores, diretores, coordenadores pedagógicos) para que reprovem seus filhos para dar a eles uma nova chance de aprender mesmo que alguma coisa da escola (tão grande é a importância da escola para a vida de seus filhos, e tão desprovidos os pais de condições para ajudar seus filhos de outro modo). Ainda que muito humildes a ponto de continuar acreditando que seus filhos possam conseguir aprender alguma coisa nas mesmas escolas públicas que os aprovaram sem nada saber se eles tiverem uma nova chance, esses pais são suficientemente sensíveis aos seus filhos para constatar que eles nada sabem, que nada têm aprendido na escola. Enquanto isso, paradoxalmente, como tias Polianas Panglos, do lado de dentro dos muros da escola, as construtivistas de plantão agem como se não tivessem nada a ver com a história... como se vivessem no melhor dos mundos, como se fosse natural aos pais pedir que as escolas reprovem seus filhos. Exatamente como os construtivistas (ir)responsáveis pelos PCNs em alfabetização agem quando os dados das avaliações anuais do próprio Saeb mostram que o desempenho das crianças não apenas foi muito prejudicado pelos 15 anos iniciais de construtivismo como também que não parou de despencar sob o construtivismo nos últimos 25 anos (com exceção da última avaliação... afinal, mesmo o poço mais fundo tem um fundo).
Na última década conheci diversos professores brasileiros (muitos dos melhores) que foram demitidos por ousar ensinar à revelia do patrulhamento construtivista. Dedurados pelos olheiros construtivistas, esses professores foram punidos pelos seus crimes hediondos de sensibilidade, idealismo e solidariedade aos educandos. Seu sacrifício público serviu de exemplo aos demais, que passaram a ter duas escolhas claras: ou ver seus alunos fracassarem completamente, ou passar a contrabandear o fônico para dentro das escolas. Ao longo dos anos, essas punições exemplares foram amplamente empregadas por autoridades construtivistas (contra os professores incautos que ousaram usar o fônico às claras) como parte de seu patrulhamento destinado a abafar toda forma de crítica inteligente, manter o professorado na linha, e sustentar à força a atmosfera rarefeita, pobre e artificial do construtivismo. Sob o construtivismo, a alfabetização é ineficaz, as crianças não aprendem e, em conseqüência, se avaliadas, fracassam. O resultado foram taxas de evasão escolar e de reprovação assombrosas, que afogaram a educação num gargalo, sobrecarregando todo o sistema. Para manter as aparências frente ao fiasco da alfabetização construtivista, o establishment tentou de tudo, a começar pela forte e sistemática redução dos critérios de aprovação escolar. Mesmo depois de baixar os critérios de aprovação para a linha do ridículo, os construtivistas não puderam se furtar de constatar que, ainda assim, se avaliadas, sob o construtivismo, as crianças fracassam. Como os construtivistas não sabem ensinar, as crianças não aprendem e, como não sabem, se avaliadas, são reprovadas. Em vez de passar a aprender a ensinar, os construtivistas preferiram mascarar os resultados, varrendo o fracasso para debaixo do tapete. Em 2001, contudo, o cheiro era forte demais, e a Unesco desmascarou o truque: o Brasil foi classificado como 40o. país dentre um todo de 41 países avaliados, 14 dos quais em desenvolvimento!
Nesses anos todos de tentativa de escamotear o fracasso, as estratégias foram muitas, desde o rebaixamento dos critérios de aprovação, passando pelo sistema de ciclos, até chegar à aprovação automática. O fato básico é que, sob o construtivismo, a criança não aprende e, se avaliada (quer pelo Saeb, pelo Saresp, depois pelo Enem, pela OCDE, pela Unesco, depois pelo Exame da OAB, e assim por diante por toda a sua vida), como ela não sabe, é fatalmente reprovada. A estratégia dos ciclos é outra história para inglês ver. Cortando pela metade a freqüência de avaliação, obtém-se a aparência de cortar pela metade a taxa de fracasso. Mais ou menos como um hipertenso que decide se livrar da evidência de pressão alta simplesmente atirando o manômetro pela janela. Assim como um infarto ou AVC, cedo ou tarde, trazem à tona a evidência de que o problema não foi resolvido, também a farsa da estratégia simplória de ciclos desacompanhados de programas efetivos de ensino durante o ciclo revela-se fracassada quando, cedo ou tarde, não se consegue evitar que a Unesco ou a OCDE ou outra entidade qualquer decida avaliar as crianças. E o pior é que, ao mascarar o problema, a estratégia de ciclos posterga sua solução para o dia 31 de fevereiro de cada ano. Quando se percebe, só ao cabo da escolarização, que a massa de alunos quase nada aprendeu, já é tarde demais para fazer qualquer coisa. Com efeito, a história mostra que a adoção de ciclos desacompanhada de diretrizes eficazes do que fazer com a criança durante o ciclo só piorou a situação. A medida seguinte de desespero do establishment foi instaurar a aprovação automática (eufemisticamente vendida como “progressão continuada”), por meio da qual chegou-se a produzir o surpreendente fenômeno de crianças já falecidas passando de ano. E o folclore continua.
O fato essencial é que não há substituto para o trabalho competente. Ou a escola pública reaprende a ensinar com competência ou o seu aluno continuará não aprendendo.
Em meados da década de 1990, quando os construtivistas já estavam no poder havia mais de uma década, o MEC oficializou e publicou na Internet os PCNs construtivistas que já vinha adotando havia vários anos. Felizmente, ao mesmo tempo, o MEC instituiu o Saeb que, mostrou que, quase 15 anos depois de os construtivistas estarem ditando as regras no Brasil, o desempenho do brasileiro estava muito abaixo do mínimo estabelecido pelo próprio MEC! Com sua inépcia em dirigir a educação brasileira os construtivistas haviam aberto um rombo na quilha, que se tornou evidente em 1995 e 1997. O pior é que, como ainda estavam na torre de comando, nada fizeram senão aprofundar os erros. Em conseqüência, a nau da educação não cessou de afundar até bater no fundo do oceano em 2003 quando, aparentemente, estabilizou-se. Os números oficiais do próprio MEC de 1995 a 2001 dizem tudo. Segundo critério estabelecido pelo próprio MEC, na 4ª. série, os alunos deviam obter de 200 a 250 pontos, no mínimo. Contudo, em 1997 esses alunos obtiveram apenas 186! Em 1999 caíram para 179! E em 2001 caíram ainda mais para 162! O mesmo ocorreu na 8ª. série e na 3ª. série do ensino médio. Na 8ª. série, segundo o critério do próprio MEC, os alunos deviam obter de 250 a 300 pontos, no mínimo. Em 1997 esses alunos obtiveram o mínimo de 259, em 1999 caíram para 232, e em 2001 caíram ainda mais para 225. Na 3ª. série do ensino médio, segundo o critério do próprio MEC, os alunos deviam obter de 300 a 350 pontos, no mínimo. Em 1997 esses alunos obtiveram 283! Em 1999 caíram para 266! e em 2001 caíram para 262.
À medida que os construtivistas foram acumulando poder de desmontar e desorganizar sistematicamente as políticas públicas de alfabetização desde a década de 1980, o desempenho escolar no ensino básico brasileiro só faz por despencar. Desde 1995, quando foi instituído o Saeb, suas pesquisa bianuais vêm mostrando fracasso alarmante e crescente queda. Em 2001 o Brasil foi classificado como um dos recordistas mundiais de incompetência de leitura.
Desde início da década de 1990 conduzimos centenas de grandes estudos de avaliação e intervenção em todo o país que provaram a extraordinária eficácia do método fônico. Nossos procedimentos foram formalmente aprovados por expoentes de universidades como as de Harvard, Leeds, Bruxelas, Rennes. A convite da Comissão de Educação do Congresso Nacional, compusemos uma Comissão Internacional de Especialistas que publicou um relatório conjunto apontando os problemas do país e a sua solução, o Método Fônico, oficialmente adotado pelos governos da França, Inglaterra e Estados Unidos, bem como de todo o mundo desenvolvido. Os construtivistas, contudo, permaneceram obtusamente arraigados a teses hoje completamente desacreditadas em todo o mundo e insistindo em macaquear as políticas tortas de países que a Unesco classifica como vice-recordistas mundiais de incompetência (o México de Emília Ferreiro e a Argentina de Teberosky). O preço dessa obtusa irresponsabilidade recaiu nesses anos todos (um quarto de século!) sobre as costas da população escolar brasileira (em especial dos 91% dos escolares que não têm alternativa senão a de estudar em escola pública) que vem amargando um intolerável fracasso.

2 - O método fônico foi o mais usado no Brasil até a década de 70, antes de a escola de nível fundamental se universalizar. Nossas taxas de repetência na 1.ª série, no entanto, eram altíssimas, como continuam até hoje. Por que voltar a um método que não deu certo?

O método empregado no Brasil até a década de 1970 não era o fônico, mas, sim, o alfabético-silábico. Esse método tradicional era baseado no ensino dos nomes das letras e no ensino repetitivo baseado nas sílabas resultantes da combinação entre as letras. O resultado daquela abordagem era uma leitura menos fluente e mais mecânica e silabada. Por outro lado, o método fônico é baseado no ensino dinâmico do código alfabético (ou seja, das relações entre os grafemas e os fonemas), e na promoção de uma série de atividades lúdicas para levar as crianças a, brincando, aprender a codificar a fala em escrita, e, de volta, a decodificar a escrita, recuperando o fluxo da fala subjacente. Por fortalecer o raciocínio lingüístico, o método fônico é excelente para promover o desenvolvimento de compreensão de leitura e de produção de texto, como comprovado amplamente pelas pesquisas. Os dados do Observatório nacional da Leitura da França e do National Reading Panel dos Estados Unidos deixam absolutamente clara a farta superioridade do método fônico. Por outro lado, como provam os dados do Saeb, do Saresp, da Fundação Carlos Chagas, da OCDE, e da Unesco, 25 anos depois de ter dominado o Brasil, o construtivismo é que, definitivamente, não deu certo. O construtivismo reinou absoluto por um quarto de século e fracassou vergonhosamente. O MEC ainda não deu ao Brasil a oportunidade de experimentar o método fônico e de colher seus maravilhosos frutos. Em meados da década de 1990 as autoridades governamentais de educação da França, Inglaterra e dos Estados Unidos concederam à sua população escolar de seus países a oportunidade de experimentar o método fônico, e os resultados foram tão auspiciosos que as autoridades desses países declararam lamentar terem caído no conto do construtivismo e perdido tanto tempo insistindo até início da década de 1990 na velha e ineficaz alfabetização construtivista. O fônico é o futuro. E se o MEC conceder ao Brasil a oportunidade de experimentá-lo, em menos de uma década o Brasil pode estar entre os campeões de competência de leitura do mundo.

3 - Muitos críticos do método fônico dizem que, por trás da defesa desse método, há o interesse em ganhar dinheiro vendendo cartilhas para o MEC ou para as prefeituras. Como o senhor responde a essas críticas?

Sou professor e pesquisador em tempo integral na USP, onde venho trabalhando 16 horas por dia, seis a sete dias por semana nos últimos 18 anos. Não tenho empresa e nem clínica particular. Meu objetivo único é produzir conhecimento científico relevante em educação e saúde e convertê-lo em tecnologia para melhorar a qualidade de vida da população. Se no último quarto de século muitos construtivistas ganharam muito dinheiro vendendo seus livros e programas ineficazes de treinamento e reciclagem de professores, e se agora eles acusam alguns fônicos de querer fazer o mesmo, deve ser porque têm muito medo de largar o úbere governamental de que vêm desfrutando nesses 25 anos. Fico muito feliz em dizer que todos os recursos provenientes de meus 40 livros até hoje vêm sendo investidos na condução de novos estudos, na produção de novos instrumentos, e na publicação de mais e melhores livros. Como todos os meus livros são fruto de pesquisa sólida para descobrir métodos eficazes de ensinar, seu conteúdo é de forte utilidade para o educador e o clínico, fazendo com que sejam mais eficazes. Como meus livros funcionam em tornar os professores e os clínicos mais competentes, eles vendem muito bem, obrigado. Como vendem bem, e como os recursos das vendas são totalmente empregados para produzir mais e melhores estudos, instrumentos, e recursos, então, num círculo virtuoso, acabo produzindo cada vez mais livros que vendem cada vez mais, e promovem sucesso cada vez maior no ensino-aprendizagem e na reabilitação. Os frutos desse trabalho competente são competência e felicidade. E pelos frutos se conhece a árvore.

4 - De que adianta discutir o método se o professor não estiver bem formado?

Quando se pode dizer que um professor é bem formado? Quando ele é competente na execução de seu trabalho! Ou seja, quando seus alunos atingem níveis elevados de proficiência acadêmica. É o desempenho da criança (tal como avaliado por organismos independentes e isentos e com todo controle científico) que prova se o professor é ou não competente e bem formado. É preciso avaliar a competência das faculdades de educação brasileiras em formar alfabetizadores. Nossas pesquisas de opinião junto às secretarias de educação mostram que elas não consideram que as faculdades de educação estejam fazendo um trabalho aceitável. E não é apenas opinião: é fato. Pesquisas mostram que o desempenho dos alunos de professores alfabetizadores formados por faculdades de educação é apenas e tão somente 10% apenas no ensino médio. Pelo simples efeito de anos de escolarização, seria esperado um resultado muitíssimo melhor. Isso é prova cabal de que as faculdades de educação perderam a competência de formar alfabetizadores. Para compreender isso, basta inspecionar a bibliografia adotada pelas Faculdades de Educação em disciplinas envolvendo alfabetização: essa bibliografia é quase sempre 100% construtivista, de cabo a rabo. Porque adotam livros infundados e anacrônicos que propõem noções e práticas hoje completamente desacreditadas em todo o mundo civilizado (leia-se pelos recordistas de sucesso segundo a Unesco), não surpreende que formem alunos que não têm idéia do que fazer, e cuja competência de ensino, anos depois, ao se diplomar, pouco ou quase melhorou em comparação de quando ainda eram simplesmente calouros. De novo, pelos frutos é que se conhece a árvore. E é essencial examinar de modo mais crítico e lúcido os efeitos da formação acadêmica de professores, desde a formação nas faculdades de educação até a formação continuada nos cursos de treinamento e de reciclagem mantidos às custas do erário, do contribuinte, de quem está lendo esta matéria agora mesmo. É preciso avaliar em que medida os cursos de treinamento e reciclagem de professores melhoram a proficiência acadêmica dos alunos desses professores. Quando esses cursos se revelam inócuos, como tem sido o caso com esses cursinhos tradicionais construtivistas, então torna-se preciso reciclar os recicladores. Por outro lado, nossos cursos de treinamento de professores na aplicação do método fônico têm produzido extraordinários efeitos sobre a proficiência acadêmica dos alunos desses professores, como comprovado por medidas científicas, e é isto que importa. É pelos frutos que se conhece a árvore. Só se pode dizer que um professor é, de fato, bem formado se ele obtiver muito bons resultados. E é isso que o método fônico produz: ensino e aprendizagem competentes. Um bom professor é aquele cujos alunos efetivamente aprendem. O método fônico é tão cristalinamente lógico e eficaz que é fácil de ser ensinado aos professores, e fácil de ser apreendido e empregado por eles para produção de rendimento acadêmico elevado em seus alunos.

5 - O uso de cartilhas elaboradas com textos com único objetivo de levar a criança a associar letras e sons não é muito limitador? Não corremos o risco de formarmos analfabetos funcionais, que são capazes de decodificar o alfabeto, mas incapazes de compreender ou escrever um texto um pouquinho mais complexo?

Como especialista em desenvolver instrumentos para avaliar a competências metalingüísticas subjacentes à compreensão e produção de textos, sinto-me bem à vontade para responder essa questão. Um grande número de estudos nacionais e internacionais mostra que o modo como o professor decide distribuir as atividades de ensino ao longo do ano letivo é vital para determinar o grau de competência de compreensão e produção de textos por parte de seus alunos. Se o professor fizer o que os obtusos PCNs construtivistas em alfabetização recomendam, ou seja, introduzir textos complexos desde o início sem qualquer preparação fônica, seus alunos terão muito maior dificuldade em atingir os níveis esperados de compreensão e produção de textos. Em contraste, o programa de alfabetização fônico é tão eficaz porque ele constrói sistematicamente as competências do simples ao complexo. Partindo do ensino do código alfabético, ou seja, das correspondências entre grafemas e fonemas, ele ensina a codificar e a decodificar como processos reversíveis. Assim, ele leva a criança a colocar a escrita sob controle de sua fala externa e interna (ou seja, de seus pensamentos), a recuperar a fala a partir do texto, desenvolvendo, assim o pensar. Quando a seqüência de atividades fônicas e metafonológicas que compõe o método fônico é implementada pelo professor, em cerca de 4 meses o aluno se torna fluente na codificação e decodificação, e passa a receber e a produzir textos cada vez mais complexos em termos de vocabulário, extensão, complexidade sintática, e assim por diante. Ao cabo de cerca de 8 meses, a quase totalidade dos alunos se encontra muito bem alfabetizada. Os textos que começaram a ser introduzidos logo quando da aquisição de fluência passam a ser agora o centro do processo. Nesse ponto textos das mais diferentes naturezas e de considerável e crescente complexidade são introduzidos em seus portadores originais. Nesse ponto se dá o segundo grande momento de avaliação para identificar as crianças que necessitam de reforço. Fazendo isso, ao final do ano letivo, praticamente a totalidade das crianças estará muito bem alfabetizada. Fazendo assim, as crianças de nível socioeconômico baixo acabam adquirindo desempenho tão bom que, apenas pelo desempenho, se torna muito difícil distingui-las de seus colegas de nível socioeconômico médio e alto. Como a alfabetização fônica é cientificamente programada para produzir aprendizagem eficaz, as crianças aprendem a ler e escrever, a extrair significado do texto, e a produzir textos plenamente legíveis e com significado. Como a escola fônica é eficaz em ensinar, ela é instrumento de justiça social, reduzindo a disparidade entre as crianças de nível socioeconômico baixo e as demais.

6 - Na maioria das escolas de elite, pelo menos no Rio e em São Paulo, o método utilizado não é o fônico. No máximo, essas escolas usam alguns elementos do método, mas ele não é o principal. Por que os alunos de escolas públicas devem aprender por um método que não é priorizado pelas melhores escolas particulares?

Nas escolas de elite, estudam crianças de nível socioeconômico médio-alto e alto, filhos de pais cultos que dispõem dos recursos necessários para estimular seus filhos desde a mais tenra infância, para prover tutoria particular no caso de dificuldade escolar, para prover tratamento de reabilitação por meio de fonoaudiólogos e psicopedagogos, e assim por diante. Usualmente essas crianças são filhas de pais com níveis de escolaridade mais elevados e que valorizam o ensino, e que freqüentemente se sentam com elas nos fins de semana para ajudar nos deveres da escola e, mesmo, para ensiná-las a ler. De cada 100 crianças brasileiras no ensino fundamental, 91 estudam em escola pública, e essas vivem em um mundo bem diferente. Filhas de pais trabalhadores com menos condições para ensiná-la ou de prover alguém que as ensine, essas crianças dependem de uma escola que saiba ensinar. Se a escola não souber ensinar, elas não terão mais muitas outras oportunidades para aprender. Por outro lado, as escolas de elite não precisam ensinar, já que os pais podem fazer isso por elas com a ajuda de uma equipe de tutores, fonoaudiólogos, psicólogos, psicopedagogos, etc. Dito isso, deve-se considerar que, embora as crianças de escola particular aparentem ter um desempenho muito superior ao daquelas de escola pública, essa superioridade é vã e ilusória quando se compara a criança brasileira com a criança da maioria dos países do planeta, independentemente do tamanho da economia desses países. As escolas de elite brasileira podem conquistar considerável sobriedade se compararem o nível de proficiência que instalam em seus alunos com os níveis de proficiência instalados pela escola média regular dos países desenvolvidos. Nenhuma escola de elite brasileira pode se considerar o máximo se fizer essa comparação. As escolas de elite brasileira, definitivamente, não servem de parâmetro de excelência para a escola pública brasileira. Definitivamente não. Na pesquisa da Unesco e da OCDE de 2003 em que o Brasil ficou em 40o. lugar dentre 41 países (14 deles em desenvolvimento), participaram 5 mil estudantes brasileiros de 15 anos, (des)educados pelo construtivismo desde sempre, provenientes tanto da escola pública quanto da particular, sendo que 56% dos quais obtiveram o nível mais baixo de toda a escala, mostrando que não têm a mais pálida idéia do que tentam ler, mesmo depois de 7 a 8 anos de escola (pública E particular).

Em suma, porque a criança que estuda na escola pública só tem a escola como recurso para aprender a ler e escrever, ela precisa que sua escola seja competente para ensiná-la. Por isso, é tão mais importante que a escola pública seja fônica. Quanto à assim chamada escola de elite, que se dá ao luxo de ignorar o mundo civilizado e permanecer limitada ao construtivismo, o fato é que ela recebe uma criança com preparo e condições muito superiores e, mesmo assim, não consegue competir em qualidade de ensino com as escolas regulares de outros países. É claro que quem deveria estar preocupado com o que essas assim chamadas “escolas de elite” construtivistas estão fazendo não sou eu, mas sim os pais que custeiam as elevadas mensalidades e que querem o melhor para seus filhos. Que pesquisas recentes provem que a maioria esmagadora dos egressos dessas escolas de elite nem sequer tente ingressar em universidades como a USP, a UNICAMP e a UNESP por considerar-se despreparados para tanto é um fato digno de nota.
Ainda assim, nosso foco deve ser a política pública de ensino. E, para ela, como descobriram os governos das nações civilizadas que a Unesco e a OCDE revelaram como história de sucesso, o único caminho viável é o fônico.