1)A orientação sexual tem influenciado
menos as relações sociais nos últimos anos?
Mott - Os seres humanos se distribuem basicamente em três orientações
sexuais: 60% heterossexual, 30% bissexual e 10% homossexual. Nossa cultura sexual
de inspiração judaico-cristã separa e antagoniza excessivamente
os sexos: condenava à morte o travesti e homossexual, determinava que
as mulheres usassem cabelo comprido, etc. Nos últimos 50 anos, com a
revolução sexual, feminista e gay, com a moda unissex e androginia,
com a descriminalização e afirmação da homossexualidade,
as pessoas passaram a ser mais bissexuais, mais unissex, mais andróginas,
os homens assumindo seu lado feminino, as mulheres usando calça e tornando-se
mais masculinas, tudo isto colaborando efetivamente para diminuir o antagonismo
dos sexos e dos gêneros . Ainda não chegamos ao ponto de olharmos
e nos relacionarmos com as pessoas independentemente de sua orientação
sexual, mas caminhamos em direção à menor antagonismo de
sexo e gênero.
2)A relação de amizade entre homossexuais
e heterossexuais tem evoluído de alguma forma ao longo dos últimos
anos?
Mott - Durante séculos, o Rei, o Bispo e os Inquisidores obrigaram os
heterossexuais a odiarem os homossexuais, divulgando mentiras sobre "o
amor que não ousava dizer o nome": que provocava a ira divina contra
a humanidade, que os gays violentavam criancinhas, que os homossexuais eram
pervertidos, imorais, pecadores, e mais recentemente, que causaram a aids. Havia
prêmios para quem denunciasse os homossexuais para serem queimados na
inquisição. Após a revolução gay - 1969,
Stonewall, NY - à medida que lésbicas e gays saíram cada
vez mais da gaveta, os "straights" ("caretas") passaram
a ver e compreender mais as minorias sexuais, que como todos as demais segmentos
sociais, tem muitos anjos e alguns diabos. A destruição dos preconceitos
contra os homossexuais tende a se normalizar com a convivência.
3)O homossexualismo deixou de ser uma coisa de gueto?
Mott - O gueto gay, hoje chamado de cena gay, foi a estratégia utilizada
pelas minorias sexuais para desenvolver mecanismos de sociabilidade e auto-proteção
sem correr o risco da violência da sociedade hetossexista - ou melhor,
heterror-sexista! Não foi imposto pelos donos do poder, como ocorreu
com as judiarias e mourarias medievais, mas uma solução dos próprios
homossexuais que se reuniram em espaços especiais para enfrentar a adversidade.
Hoje, cada vez mais, nos países livres, a tendência é a
mistura, à bissexualidade, à pansexualidade. Na Islândia,
por exemplo, fecharam-se os bares e boites exclusivamente gays, pois agora heteros
e homossexuais dançam juntos, cada um na sua e todo mundo numa boa. Defendo
o gueto/cena gay como estratégia temporária de afirmação
homossexual, mas quero ser respeitado em todos os ambientes e conviver com todo
mundo, sem discriminar nem ser discriminado.
4)Há diferença entre relações
de amizade entre homo e hetero e relações apenas hetero? Em que
a relação entre homo e hetero pode acrescentar à evolução
humana?
Mott - Num mundo ainda tão hostil aos homossexuais, num país onde
pais e mas repetem preferir ter um filho ladrão ou uma filha prostituta,
do que gay ou sapatão, a amizade entre heteros e homossexuais é
importantíssima para quebrar o tabu, para normalizar o que muita gente
ainda acha que é perversão, doença, descaração.
Nós, gays e lésbicas, temos muito a ensinar aos heterossexuais:
fazer do amor e tesão o critério principal das uniões "conjugais"
(e não o patrimônio ou a procriação), questionar
a rigidez da divisão e antagonismo dos papéis de gênero,
incluir a alegria e uma certa irreverência como ingredientes fundamentais
de nossas vidas. E sobretudo, acreditar na utopia de uma sociedade regida pelo
arco-iris, onde não apenas o preto e o branco, mas todas as cores, tenham
o direito de brilhar.