O polêmico Luiz Mott, doutor em antropologia, Secretário de Direitos Humanos da Associação Brasileira de Gays e Lésbicas e fundador do Grupo Gay da Bahia, recebeu ameaças de morte, teve a casa pichada e o carro depredado. É admirado por muitos e odiado por outros. Sereno na personalidade e explosivo em suas idéias, ele concedeu esta entrevista para o Brazilian Voice de Boston.
1. BV - É verdade que voce veio a NY exclusivamente
para depor a favor de um gay brasileiro que pediu asilo politico nos EUA?
Mott: Esta é a segunda vez que venho aos USA para testemunhar no Juri
de Imigração a favor de gays brasileiros solicitando asilo político
devido a homossexualidade. A primeira vez foi em SF, acho que em l995, a favor
de um carioca chamado Marcelo Tenório e agora em janeiro/99, em NY, a
favor de Sergio de Freitas, de minas gerais.
2. BV - Ele conseguiu?
Mott: Nos dois casos, felizmente, fomos vitoriosos. No primeiro caso, o gay
alegou ter sofrido violência fisica ao sair de uma boite gay no Rio, mostrando
inclusive um cicatriz de uma facada nas costas. Neste ultimo caso, Sérgio
deixou o Brasil quando tinha 17 anos, há 18 anos passados. Só
se assumiu gay nos USA e sua alegação, que eu apoiei e reforcei,
é que um gay assumido há tantos anos, voltar ao Brasil, sobretudo
a Minas Gerais, iria representar como que uma volta à idade das fogueiras
da inquisição, pois ele dificilmente encontraria um emprego do
mesmo nível, se descobrissem que era gay poderia ser mandado embora e
teria de viver enrustido.
3. BV - O Brasil é um pais violento para
gays e lésbicas?
Mott:Infelizmente o Brasil é o campeão mundial de assassinatos
de gays, lésbicas e travestis. A cada 3 dias os jornais divulgam a morte
de mais um homossexual, vitima da homofobia, vitima de crimes violentos. O Brasil
é um pais contraditório pois ao mesmo tempo que exporta travestis
para a Europa, que aplaude no carnaval os transformistas, no dia a dia, discrimina,
humilha e mata os gays.
4. BV - Qual seria a solução para
acabar com a violência praticada contra os
homossexuais no Brasil?
Mott: Três medidas poderiam diminuir a homofobia e os crimes contra homossexuais
no Brasil: aprovação de leis que castiguem a discriminação
baseada na orientação sexual; maior rigor por parte da justiça
e da policia na averiguação, julgamento e punição
dos criminosos; maior consciência política dos próprios
homossexuais, denunciando sempre quando vitima da violência, evitando
se expor em situações de risco. O Grupo Gay da Bahia já
publicou e divulgou em todo o Brasil um guia, "Como evitar ser assassinado",
ensinando os gays a se proteger contra os opressores.
5. BV - O que mudou no Brasil desde a Fundação
do Grupo Gay da Bahia em 1980?
Mott: Principais vitórias: conseguimos que o Conselho Federal de Medicina
retirasse o homossexualismo da lista de doenças em l985; aprovação
em 74 municípios de leis que proibem a discriminação por
orientação sexual; financiamento por parte do Ministério
da Saúde de dezenas de projetos dos grupos gays, lésbicos e de
travestis para prevenção de aids junto a estas populações;
apresentação do projeto de parceria civil registrada no Congresso
Nacional.
6. BV - Quais as dificuldades do movimento homossexual
no Brasil?
Mott: No Brasil os gays e lésbicas de classe média e alta não
sofrem muita discriminação por isto não participam do movimento
homossexual; não existe uma comunidade gay no Brasil, não tendo
os homossexuais grande poder de pressão nem economica nem politica; os
empresários de estabelecimentos gays não apoiam o movimento homossexual;
a pobreza dos participantes do movimento homossexual e o fato de que muitos
gays vivem com suas familias impedem que tenham participação mais
efetiva no moviento.
7. BV - Você é a favor da Parceria
Cívil entre pessoas do mesmo sexo?
Mott: Sim, eu acho que os homossexuais devem ter absolutamente os mesmo direitos
e deveres dos demais cidadãos. Sou a favor do casamento e não
apenas da parceria civil, embora considere que no momento só há
espaço para parceria e depois, nos proximos anos, lutaremos pelo casamento
integral. Muitos gays e lésbicas querem selar seu amor e cometimento
afetivo com seu/sua parceiro, de modo que o casamento gay nao é uma cópia
do casamento heterossexual mas um padrão universal de organziar a vida
afetiva, econômica e social.
8.BV - De que maneira os gays brasileiros que vivem
nos EUA podem contribuir para fortalecer o movimento gay, de um modo geral?
Mott:Creio que os homossexuais brasileiros que vivem no exterior deviam seguir
o mesmo exemplo dos nossos irmãos hispano-americanos, que mantem fortes
laços com a comunidade gay de origem. Gay brasileiro nos USA só
pensa em si, no consumo, na realização afetiva e sexual. Esquecem-se
que lá no Brasil, um bando de homossexuais corajosos e dedicados estão
dando tempo, dinheiro e energia para lutar para que também no Brasil
os gays e lésbicas sejam respeitados como seres humanos e não
morram vítimas da homofobia. Espero que Gays, lésbicas e simpatizantes
sejam mais solidários com o movimento homossexual brasileiro, enviando
material informativo (revistas , jornais, posters gays) e visitando tais grupos
quando viajam ao Brasil.