AMOR AOS 113 ANOS
Por: jaime nunes mendes

Em uma de suas deliciosas crônicas, o escritor Machado de Assis conta o caso de um casal cearense, cujo marido, com 113 anos de idade nutria grande ciúme da mulher, que orçava pelos 104. Vejamos o que diz o escritor: “Que um homem de 113 anos tenha ciúmes, concebe-se; não é vulgar, mas pode-se admitir. Agora, que uma mulher de 104 os inspire, esse é, na verdade, um dos prodígios do século e do país”. Tal casal, segundo o cronista, estava unido há 80 anos. Leiam bem: há 80 anos!
Andei pensando neste caso e não pude concluir que se tratava de um fenômeno próprio do Ceará. Que me provem o contrário os cearenses! A minha conclusão, embora grosseira e vulgar para alguns, há de fazer sentido para outros. Sinceramente vejo nesse episódio um vívido sinal de um verdadeiro amor. Vá lá com suas melosidades, dirá alguém! E vou...
Sim, porque o lídimo amor não existe ou deixa de existir com os anos. A cronologia é desconhecida para os que amam. Não falo, é óbvio, de um amor hipocondríaco, e melancólico, e carnal, e superficial, e outras cousas mais que ficam a critério da imaginação dos que me lêem. Vá lá, o amor não precisa de filosofias nem de poesias.
O caso acima prova que o amor é realmente um fenômeno, não obstante para alguns ser um fato banal, algo como comer um cachorro quente num meio-dia de inverno.
O amor, como já opinei, não muda com o tempo. Ou será que muda? Desculpem-me, esqueci de dizer que a crônica acima foi escrita em 15 de julho de 1876. Ainda não se havia proclamado a República. Tínhamos imperador. Prevalecia a escravidão. Não havia Coca Cola. Leiam bem: 1876!
Sejamos sinceros, quantos de nós presenciamos, hoje, um casal, não necessariamente com 80 anos, mas apenas com uns 20 anos de casados, os dois de mãos dadas comendo pipocas e assistindo TV?
Parece uma contradição. Mas é que o amor também é contraditório. Às vezes.



...VOLTAR