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Mitológica
A Carroça
Uma das grandes preocupações de nosso pai,
quando éramos pequenos, consistia em fazer-nos compreender o
quanto a cortesia é importante na vida.
Por várias vezes percebi o quanto lhe desagradava o hábito que
têm certas pessoas, de interromper a conversa quando alguém
está falando.
Eu, especialmente, incidia muitas vezes nesse erro. Embora
visivelmente aborrecido, ele, entretanto, nunca ralhou comigo por
causa disso, o que me surpreendia bastante.
Certa manhã, bem cedo, ele me convidou para ir
ao bosque a fim de ouvir o cantar dos pássaros. Acedi com grande
alegria e lá fomos nós, umedecendo nossos calçados com o
orvalho da relva.
Ele se deteve em uma clareira e, depois de um
pequeno silêncio, me perguntou: - Você está ouvindo alguma
coisa além do canto dos pássaros? Apurei o ouvido alguns
segundos e respondi: - Estou ouvindo o barulho de uma carroça
que deve estar descendo pela estrada.
- Isso mesmo... - disse ele. É uma carroça vazia...
De onde estávamos não era possível ver a estrada e eu
perguntei admirado:
- Como pode o senhor saber que está vazia?
- Ora, é muito fácil saber que é uma carroça vazia. Sabe por
que?
- Não! Respondi muito intrigado. Meu pai pôs a mão no meu
ombro e olhou bem no fundo dos meus olhos, explicando:
- Por causa do barulho que faz. Quanto mais vazia a carroça,
maior é o barulho que faz.
Não disse mais nada, porém deu-me muito em
que pensar.
Tornei-me adulto e, ainda hoje, quando vejo uma
pessoa tagarela e inoportuna, interrompendo intempestivamente a
conversa de todo o mundo, ou quando eu mesmo, por distração,
vejo-me prestes a fazer o mesmo, imediatamente tenho a impressão
de estar ouvindo a voz de meu pai soando na clareira do bosque e
me ensinando:
- Quanto mais vazia a carroça,
maior é o barulho que faz!