Esqueça tudo o que você já ouviu falar sobre rádio (inédito)    

Marco Antonio Ribeiro   (1/9/2000)

Esqueça o que já você já ouviu sobre rádio: que é um veículo que paga mal seus profissionais, que não é valorizado pelos grandes anunciantes, que a verba a ele destinado é pouco, etc... Isso tudo é verdade, mas não é sobre isso que quero falar nesse texto.

Quero dar a minha versão para a minha, digamos, estréia no rádio. Sou jornalista, atualmente trabalho no meio impresso, mas comecei minha "carreira" de jornalista no rádio. Aliás, virei jornalista por causa dele. Como era um ouvinte fanático do veículo, achei que seria uma boa idéia trabalhar como radialista. Mexia com computadores, mas não via graça alguma nisso naquela época. Mas enfim isto é outra história....

Vou contar como comecei no rádio e no jornalismo também. Numa bela tarde de setembro de 1991, estava eu, técnico de manutenção residente, trabalhando em um cliente no bairro do Jabaquara, na zona sul de São Paulo. Era uma quarta feira tranqüila sem nenhuma ocorrência grave. Resolvi ir para casa mais cedo, aproveitando que a condução era mais vazia antes das 4 e meia da tarde. Ao chegar em casa fui avisado de que uma pessoa de nome Cássia havia me procurado, oferecendo uma vaga de radio escuta no jornalismo da recém-inaugurada Rádio CBN (ex-Excelsior). Dois meses antes eu havia feito um teste lá. Cássia me falou sobre o tal teste e que a vaga era para início imediato. O salário era muito menor, - mal dava para pagar a faculdade - mas tinha vale transporte, vale restaurante, etc. Não tinha muita escolha, afinal foi a única chance que tive para entrar no meio, aceitei na hora.

No dia seguinte, fui até a rádio logo cedo e falei direto com o Zallo (Comucci), que era um dos chefes da redação. Ele estava acabando de levar ao ar o Jornal da CBN, que produzira durante a madruga. Enquanto ele ia e voltava do estúdio com todo os apetrechos do jornal, fiquei-o esperando em uma mesa logo na entrada da sala. Sem nada para fazer, fiquei observando como era uma redação de rádio de verdade.

Depois de arrumar tudo o que trouxe do estúdio, ele se sentou do meu lado e disse:

- O negócio é o seguinte. A gente tinha um rapaz que trabalhava de madrugada. Ele também estudava à noite. Mas só que ele faltava muito e você sabe que de madrugada tem pouca gente e muito serviço. Se alguém falta, sobrecarrega o resto. O que eu preciso é de um cara que seja assíduo e não falte no serviço porque o jornal que a gente produz vai ao ar de segunda a sábado e dura 3 horas. E, além disso, tem o Globo no Ar de hora em hora durante toda a madrugada, tem a programação da CBN também de madrugada, tem o programa de esporte do Dalóia, o Eli Correia às 5 da manhã, o Samuel Gonçalves, o repórter na rua, a Rádio X. Enfim, é muita coisa entendeu? Se a pessoa faltar, sou obrigado a abrir mão dele, como fiz com esse rapaz. E aí, você aceita?

- É comigo mesmo.

- Você já falou com o Celso (Celso Antonio de Freitas, o diretor da época) sobre salário, registro, etc..?

- A Cássia (secretária) já me disse como é que era.

- E quando você pode começar?

- Quando vocês quiserem!!!!

- Pode ser no plantão de sexta para o sábado?

- Sim.

- Então, vai lá,  fala com o Celso e boa sorte.

Essa altura nem precisava de sorte. Depois de falar com o Celso, saí pela rua das Palmeiras afora todo irradiante. Havia acertado na loteria, na loto e na sena juntos. Não queria nem saber da cara que meu chefe da Compuhelp iria fazer ao saber que eu estava prestes a pedir a conta. Desta parte do dia, ou seja, quando cheguei ao meu serviço, me lembro muito pouco. Só me lembro que o meu chefe me chamou. Me chamou de canalha, de anti-profissional, de covarde...Mas eu não estava nem aí. Primeiro porque a empresa em que trabalhava jamais me dera treinamento para aprimorar o meu serviço. Segundo, porque estava de saco cheio de consertar computadores. E o principal de tudo: iria fazer o que realmente gostava e estudava: trabalhar com comunicação. Afinal estava no 4º ano de jornalismo da Metodista e - parodiando Flávio Cavalcanti - essa era a Minha Grande Chance.

Dois dias depois, lá estava eu na porta da rádios às 11h20 da noite na porta da Rádio Globo (pra quem não sabe, a Globo e a CBN são da mesma empresa - Sistema Globo de Rádio - e ficam no mesmo prédio - o famoso sobrado cinza, da rua das Palmeiras, 315, em Santa Cecília). Depois de muita insistência, consegui fazer com que o porteiro chamasse o Acácio Nascimento, chefe da redação no horário da noite, para que eu pudesse entrar.

Subi dois lances de escadas, passei pelo corredor dos estúdios, desci mais um lance de escada ao fundo, passei entre os dois estúdios da FM, caminhei pelo corredor que ficava entre a discoteca da Rádio X e a redação da equipe esportiva e eis que surge a grande porta de vidro da redação da CBN. Ao abri-la, encontrei um grupo de destemidos jornalistas contando os minutos para poderem ir embora. Era sexta-feira, e a semana certamente havia sido estafante.

Em um canto da sala, numa grande mesa de madeira estavam Acácio Nascimento, chefe de redação da noite, Cleide Fozer e Newton José, os locutores do jornalismo à noite e a telefonista da rádio (cujo nome não me lembro até hoje, se por acaso ela estiver nos lendo agora....). Havia 3 redatores ainda terminando o seu turno: Eliana Caetano, Miriam Modesto e Sílvio Campos. Na central técnica da redação o Ademar Gonzaga (contemporâneo de Maurício Kubrusly na Nova Excelsior FM).

Por volta da meia-noite, ousei pedir usar um dos telefones para ligar para um colega meu de faculdade desmarcando um trabalho para o dia seguinte. Neste instante, o relógio dava sua décima segunda badalada. O pessoal do turno da noite acabara de ir embora. Quando desliguei o telefone, eis que surgem os plantonistas da madrugada - Benê Rodrigues e Cid Barboza - além dos locutores José Dalóia, Wilson França e a turma da equipe técnica - Jonas Rosa, Claudinho Lovatti, Israel de Freitas e o Pascoal Júnior.

A primeira madrugada não foi muito difícil. O Benê me explicava como tudo funcionava e eu ia fazendo. Se pintasse algo extraordinário na rua eu o avisaria e ele faria a matéria. No resto era fazer as checagens de rotina, atender os telefones, ficar de olho nas impressoras das agências noticiosas, levantar a previsão do tempo, editar os boletins da equipe de esporte para o jornal da CBN, fazer as cabeças das matéria que a gente enviava para o Eli Correia e....ouvido ligado no espião ( na verdade, um rádiorreceptor que "monitorava" várias freqüências de serviço).

Tinha tudo para ser um início de sábado normal não fosse um telefonema que Cid recebera pouco antes de colocar o Jornal da CBN no ar. Era um guarda civil, amigo dele, que estava lhe informando a respeito de um acidente na Avenida Radial Leste, perto do Tatuapé. Coisa horrível. Tive de sair atrás do Benê e pedir ir voando ao local do acidente: um ônibus lotado estava passando por um viaduto na altura do Metrô Tatuapé, bateu numa pedra, perdeu o controle e caiu de uma altura de uns 25 metros na Avenida Salim Farah Maluf. Uma tragédia e eu ali sem saber o que fazer já que o Cid já estava no estúdio com o jornal no ar e o Benê estava a caminho. Por sorte, chegou à redação o bom e velho Chico Perez, chefe da redação à tarde, que vinha cumprir o seu plantão e me disse o que fazer já que o André Torquato, escuta da manhã estava estourando por ali a qualquer momento.

Assim que o André chegou, eu arrumei minhas coisas e me mandei pra casa morrendo de sono. Caí na besteira de ligar o rádio - ora na CBN, ora na Bandeirantes. O Benê ainda estava no local e as cenas que descrevia eram dantescas. Fui dormir assim mesmo. Acordei às 4 da tarde, almocei, fui ver um pouco de tevê até a hora que o São Paulo Já (hoje SP TV), da Globo, passou a notícia, desliguei a tevê ( afinal, era muita desgraça para um dia só).

Se você tiver alguma história sobre rádio, escreva para a nossa redação.

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