Eu existo!

 

Porque me buscas para além dos mundos
que teus sonhos criaram,
se eu estou presente nos abismos fundos
e na altura que as asas conquistaram?
Porque perdes, aos poucos, a coragem
de encontrar novas diretrizes,
se eu vivo nos acordes da folhagem
e no silêncio das raízes?

Porque interrogas, em palavras vãs,
pesadas como açoites,
se me encontras no riso das manhãs
e no pranto das noites?
Porque vacilam, entre tantas mágoas,
os teus passos incertos,
se permaneço no rumor das águas
e na secura dos desertos?

Porque te crucificam mil anseios
em cada hora mais tenazes,
se eu canto em todos os gorjeios
e até nos versos que te faço?
Porque te negas a seguir a viagem
no pavor dos escombros,
se eu estou no fundo de qualquer paisagem
e até no fundo dos teus próprios olhos?
Porque hás de desistir da caminhada
julgando o fim já perto,
se eu caibo numa pétala fechada
e num vulcão aberto?

Porque pensas que não hás de encontrar-me
por mais que acendas o farol,
se eu moro na brancura do luar
e no rubor do sol?
Levanta bem os sonhos que são teus
e que a descrença naufragou,
que me encontrarás no mar, na terra e até em Deus,
a quem perguntas quem sou...