Enfim...renasci!

 

 

Das buscas inúteis por pastos e relvas,
das mentes inertes, sem sons, decadentes,
dos rostos sem traços, de sombras e trevas,
dos anjos noturnos, de vôos dementes.

Busquei meu abraço em portos de mágoas,
e por valas e fossas meu reflexo vi...
Molhei-me em regatos, cobri minhas chagas
sem moldes, sem marcas, do sonho bebi.

Tua face, entre tantas, foi mera figura
de atores num palco, numa trama pagã...
E o trabalho do mestre, eterna escultura
doou-me, indolente, uma alma vilã.

Embriaguei-me de infindável juventude,
cicuta, alquimia maldita, vinho sagrado,
ousei sorver a vida, mergulhei no teu açude,
enfeitei-me de mim mesma, de momentos já passados.

Ergui montes de ilusões, fui santa, fui noviça,
escrevi mil bíblias de amor mais que utopia.
Morei contigo em castelos de areia movediça,
fui senhora, fui escrava, sem carta de alforria.

Da minha carne...sonhei retirar teu alimento,
da minha alegria...tentei construir teu abrigo,
da minha vontade...teu contentamento,
da minha dor fiz teu troféu...meu castigo.

Navegando por lágrimas, orando em simples lamentos,
houve momentos de luz, em meio ao breu do coração,
em breves lampejos de quem sou, por momentos
reavivei a mais antiga chama de devoção.

E, enfim, renasci para dentro do corpo
num parto difícil, solitário, ao inverso.
Deixarei o cordão que nos une bem solto
como um convite a integrar meu novo universo.

E a nova criatura de pernas e braços
com vontades, desejos, cantares, desditas,
seguirá seu curso, sem bússola ou compasso
como anfitriã herege de uma casa bendita.


 

Fernanda