SONHANDO COM UM ANJO



 
 

Escrito Por Maria de Jesus
Traduzido por Shiva


Touya dormia tranqüilamente na escuridão de seu quarto, como todas as noites, envolvido pelo tímido calor primaveril. De repente, sentiu um toque em seu ombro, semelhante a carícia de uma mão. Entreabriu as pálpebras com sobressalto e voltou-se. Seus sentidos não o haviam enganado, uma mão estava apoiada em seu ombro , e imediatamente reconheceu o inesperado visitante, que o fitava com seus olhos incrivelmente claros e cuja pele pálida emanava uma tênue luz... da lua. A pessoa estremeceu e sem dizer uma palavra para Touya, levou seus dedos ao rosto que continuava observando-o deitado no travesseiro, e que ficou vermelho pela primeira vez.

* * *

Acordou. Rodeado pelas sombras, olhou ao seu redor e notou que estava sozinho, que tudo havia sido um sonho." Por que todas as noites tenho o mesmo sonho? Por que ele aparece? E-eu ... não entendo por que reajo deste modo. " Deixou-se cair bruscamente sobre o colchão e comprovou que pela janela não entrava luz alguma, tudo estava absolutamente negro. "Não há lua esta noite" , murmurou. " É normal que sinta por ele certo afeto, pois lhe dei meus poderes, ele é a verdadeira foram de Yuki e além disso sempre protege a Sakura, mas ... este sonho não é normal. Sei que gosto de Yuki, mas ...o que está acontecendo comigo e Yue? Não entendo mais nada. " Fechou os olhos e voltou a dormir, com a mesma imagem projetando-se em sua cabeça pelo resto da noite.

No dia seguinte, domingo, Touya levantou-se um pouco mais tarde que o habitual e desceu à sala. Viu Sakura conversando com seus Guardiões. Ela estava visivelmente entusiasmada e suspendia nas mãos seu bastão.

- Ele mudou novamente! Veja! - exclamou a garota.

O bastão havia aumentado de tamanho e em seu extremo luzia a mesma estrela de antes, mas agora acompanhada de um sol e uma lua pequenos e brilhantes.

- Mas somo nós – disse Kerberos

- Quando você transformou as últimas cartas e te ajudamos dentro do bastão, ele tinha este mesmo aspecto? – quis saber Yue.

- Era parecido, maior talvez, mas ... este está tão bonito! É maravilhoso saber que sempre de uma maneira ou de outra, vocês estão aqui comigo.

Eles a amavam também, e sabiam que, por trás desse doce sorriso, ela sentia-se desolada pela viagem de Shaoran, que partira há somente duas semanas.

Eles viram a aproximação de Touya, que sorriu levemente aos Guardiões em sinal de saudação e perguntou :

- Ei, monstrenga, você já tomou café da manhã?

- Preste atenção, eu não sou nenhuma monstrenga! Eu já comi, acordei cedo. Você toma seu café da manhã na cozinha. Papai deixou um bilhete dizendo que havia surgido algo urgente e que voltaria amanhã à noite.

Mas Touya estava apenas provocando-a e nem prestava atenção ao que ela dizia. Tinha os olhos fixos em Yue e voltou a sentir-se confuso, quase fascinado ante sua sobrenatural beleza. Ele lhe devolveu o olhar, aparentemente sereno, mas em seu interior pulsavam sensações novas e intensas. " Que esta acontecendo comigo? Recuperei meus poderes graças a ele e estou muito agradecido, mas estou... não sei o que é " . Finalmente o rapaz desviou o olhar e se dirigiu silenciosamente à cozinha.

* * *

O sonho continuava se repetindo todas as noites sem cessar, e Touya estava cada vez mais preocupado e confuso. Por sua parte, Yue havia adquirido o costume de sair depois do sol se pôr e ninguém podia ve-lo em sua forma original. Meditava longo tempo sobre o galho de alguma árvore ou em seu telhado.

Daquela vez se encontrava no parque do pingüim, no meio de uma verde árvore repleta de flores. " Tenho dificuldade de me manter tranqüilo quando nos encontramos e este sentimento me lembra ... Não" – fechou os olhos – "Não quero sofrer mais. Amo Clow, se ele nunca tivesse partido me sentiria de outra forma, com certeza. Tudo esta se tornando complicado demais. Yukito gosta de Touya, mas isso nada tem a ver comigo, nossas personalidades são independentes inclusive agora que sabe ele que não é humano, e sim uma identidade falsa - apenas uma criação. "

Teve uma idéia. Havia uma pessoa a quem podia pedir um conselho, alguém que somente a duas semanas atrás se pusera a sua disposição quando precisasse conversar. E agora ele necessitava. Se dirigiu então a uma grande casa que antes fora seu lar e bateu à porta. Abriu uma sonolenta Nakuru, de pijama, que não fez exatamente uma cara feliz ao ve-lo. Não conseguira Touya por sua culpa, e isso ela não esquecera.

- Yue! Por que você está aqui? Diga, sabe que horas são? A gente já ia dormir – Franziu o cenho.

Ele conhecia os motivos para a atitude de Rubi Moon. Ela Tinha o costume de pendurar-se em Touya na frente de Yukito, que se sentia magoado. Por sua parte, a garota não havia gostado do fato de Touya ter lhe dado seus poderes. Assim Yue no momento decidiu ignorar o gesto de enfado com que ela o olhava. Definitivamente, não poderiam dar-se bem.

- Posso ver seu Mestre?

- Ah, creio que ainda esta acordado - Nakuru bocejou. - Entre.

À medida em que avançavam pelo corredor, Yue sentia o poder do Mago Clow. Conhecia cada canto da casa e, às vezes, ao contemplar os objetos que nela haviam, sentia reabrir antigas feridas em seu coração.

No salão principal, sentado em sua grande poltrona, estava Eriol lendo um livro enorme. Percebeu Yue e se levantou para recebe-lo, fazendo um gesto a Nakuru para que os deixasse a sós; ordem que ela obedeceu sem nada dizer em absoluto.

- Yue, até que enfim te decidiste a vir – fitou-o com seus olhos profundos e carregados de inteligência, tão impróprios para um garoto de onze anos

- Sabia que eu viria? - surpreendeu-se Yue.

- Sim. Vieste me pedir um conselho? Não estou certo?

- Como o senhor sabia que...

- Fico feliz que estejas aqui - sorriu

Eriol voltou a sentar-se na poltrona, enquanto que Yue ficava à sua frente e começava a explicar-se.

- Ultimamente estou sentindo algo que não compreendo bem.

- Ou que não queres compreender porque te assusta. – falava com suavidade, mas de um modo firme e convicto.

- Não sei o que é

- Diga-me : O que é o amor para você?

Yue arregalou os olhos; não esperava uma pergunta assim

- Eu não tenho certeza. Suponho que o senti no passado. Foi a única vez que ...

- Digo em geral, como o defines?

- É em particular um tipo de emoção muito forte, que pode trazer muita dor.

Eriol sabia onde estava se metendo, mas era o caminho que deveria seguir para compensar um pouco as coisas que deixara de lado em sua outra vida

- Não é só isso, não é apenas dor. Suponho que de certo modo tenho talvez culpa de que penses assim. Merecias ser correspondido, Yue, de verdade você merecia, mas... ele não era a pessoa adequada, a pessoa que podia dar-te o que precisavas. Sofreste muito e durante muito tempo

- A culpa não foi dele, se não sentia o mesmo... foi melhor assim. Mas depois de todo este tempo, agora sinto algo diferente, algo que não consigo entender.

- Este sentimento pode te fazer feliz outra vez. Era só o que desejava o Mago Clow, que você não fechasse seu coração e que algum dia iria encontrar alguém melhor que ele.

O mago se inclinou e acariciou a face de Yue.

- Se este momento chegou, tens que fazer algo a respeito. Desta vez não vale a pena permaneceres em silêncio, porque ele é humano e não tem toda a eternidade para esperar

- Não posso me arriscar a sentir esta dor de novo – olhou para o chão

- Se o amas de verdade, tens que dizer-lhe. Tudo dará certo desta vez.

- Está bem.

- A propósito, como está a Sakura? Ultimamente ela está tão triste ...

- Se Shaoran não tivesse partido...

- Nós pensaremos em algo. Isto não pode ficar assim, não concordas?

Yue assentiu.

- E o senhor...

- Chame-me de você, por favor.

- E você? Sabe o que é o amor?

- Talvez. Mas no momento é um segredo, logo saberás - ele sorriu : também tinha alguém dentro de seu coração.

Yue se pôs de pé. Iria embora agora mesmo, havia decidido. Agradeceu a Eriol e foi embora animado, porque estava seguro de que tudo daria certo.

Voltou a sentir a cálida brisa noturna acariciando seu rosto. Uma radiante lua cheia iluminava suas asas brancas e parecia querer infundir-lhe força. Olhou pela última vez a fachada da casa onde deixava suas lembranças e se foi, sem pensar, apenas como se levado por um impulso mais poderoso que sua razão e que o fazia sentir-se capaz de enfrentar qualquer problema. Mas no fundo estava com medo.

Eriol não pôde resistir a tentação de observar o que iria ocorrer, e traçou no solo da sala com seu bastão o círculo mágico que lhe permitia ver o que se passava na casa de Sakura ( nota : versão esotérica do Grande Irmão ). Não devia faze-lo, ele sabia, mas sentia curiosidade demais. Yue, que havia amado com toda sua alma o Mago Clow, o seu criador, havia se apaixonado, desta vez pelo irmão mais velho de sua nova mestra, um rapaz realmente atraente e nobre. " Espero que Touya compreenda que Yue e Yukito são na verdade uma mesma pessoa", pensou Eriol.

* * *

Touya acordara diversas vezes, sempre por causa do mesmo sonho. Como todas as noites, acordou sobressaltado e instintivamente se levantou e olhou pela janela. A silhueta redonda que luzia no alto do firmamento lhe deu uma sensação de estranha tranqüilidade. Deitou novamente para voltar a dormir. Yue se aproximou da janela em silêncio, e sentiu um calafrio ao ver que ele estava acordado. Touya teve um pressentimento e se virou, descobrindo a figura cuja luz se confundia de um modo quase divino com o da lua.

- Yue?

Ele entrou voando e por fim deteve-se no meio do quarto, fitando-o com expressão serena.

- Não dormes? – perguntou Touya

- Não consigo. E parece que você tampouco.

- Freqüentemente tenho um sonho bastante incomum que me faz acordar.

- Talvez seja uma premonição.

- Sim, quem sabe – disse. " Eu gostaria que fosse" , pensou.

- Bem – Touya sorriu – parece que temos o mesmo problema.

Yue não sabia o que dizer. Sentia-se extremamente vulnerável e, absorto em seus pensamentos, não se deu conta de que o rapaz estava tentando ler em seus olhos, transparentes como espelhos, buscando algo que lhe desse uma prova, uma garantia ao menos. Assim permaneceram vários minutos, sem se atreverem a avançar nem de afastarem seus olhos.

- To-ya –murmurou, proporcionando a pista que este buscava.

Ao escutar seu nome pronunciado de tal forma, com tanta suavidade, Touya se aproximou e rodeou com seus braços a cintura de Yue, não encontrando nenhuma resistência. Yue sentiu uma corrente cálida correr seu corpo e um aperto em seu coração, que se mostrava pequeno para conter seus sentimentos.

Touya ergueu o queixo de Yue em suas mãos e se inclinou para beija-lo. Sentiu quando ele passou os braços por cima de seu ombros para rodear seu pescoço, cuidando de não romper o beijo.

Era um sensação completamente nova para o Guardião, um momento que havia esperado durante muito tempo.

- Não podia dormir... por isto - sussurrou-lhe Touya ao ouvido

- Te digo o mesmo – murmurou ternamente.

Yue apoiou a cabeça contra o peito de Touya e pôde sentir as batidas rápidas de seu coração. Estendeu suas asas para cobrir com elas o abraço dos dois corpos no meio do quarto iluminado pela lua.

- Sempre te amarei, To-ya. Sempre.

* * *

Touya acordou ao sentir a carícia de uma mão em suas costas, e deu meia volta. Ali estava o rosto de expressão serena , os olhos incrivelmente claros, divinamente belos, que pareciam ler no fundo de suas escuras pupilas.
 
 

Sorriu e acariciou com seus dedos a suave face de Yue, descendo pelo cabelo sedoso e prateado que, solto, se estendia sobre as cobertas como uma cascata. Beijou-o na testa e supôs que desta vez não estava sonhando. Na verdade tinha o mais fascinantes dos anjos dormindo a seu lado e sentiu que, se fosse um sonho, nunca mais desejaria acordar.

* * *

" Eu sinto muito por Rubi Moon, ela não gostara disto", pensou Eriol, sorrindo para si mesmo. " Mas isto era algo que Yue merecia fazia muito, muito tempo"
 
 

FIM



Por Maria de Jesus mjpj@supercable.es
Julho de 2001
 

Notas da Autora :

Me fez muito bem descrever o romance entre Yue e Touya. Espero que vocês tenham gostado, e caso queiram podem enviar suas críticas ou ameaças de morte.
Obrigado por ler

Notas da tradutora : Não tive como resistir a tentação de coloca-lo em português. Caso queiram, enviam suas críticas à autora, ela é da Espanha e terá muito prazer em recebe-las.