Estrela Vermelha

 



Por Yukina-chan



 

Era uma noite calma e silenciosa pelas floresta. Tudo estava quieto na toca da raposa, nem
mesmo uma formiga fazia barulho. O vento soprava bailando por entre as árvores e rochas,
conseguindo chegar até os parceirinhos quese escondiam no fundo, muito no fundo da toca.

O céu azul escuro,límpido, reluzia em estrelas que mais pareciam brilhantes em todo aquele
veludo. Uma nuvem ou outra passava muito lentamente, navegando pelo ar.

A raposa moveu-se em meio às folhas secas que recobriam seu corpo para aquecê-la, o roedor
também se moveu , encomodado com alguma coisa levantou-se sem que a raposa percebesse,
dormia profundamente perdida em seus sonhos.

Sem rumo foi até a entrada da pequena caverna. Sentou-se logo ali. Ficou pensando durante um
tempo. De repente aquele lugar pareceu apertado, precisava de mais espaço.

Era um coelhinho, tinha umas partes de seu corpo cinzentas, entretanto, era todo manchadinho de
preto e branco, seus olhos flamejantes, bem vermelhos. Seu corpo era pequeno e delicado, não
tinha uma aparência de ser bom em caça ou qualquer outra atividade que exigisse um pouco
mais de foça ou velocidade, definitivamente, afinal, coelhos não caçam, roubam hortaliças.

Entretanto, aparências enganam... adorava uma caçada, principalmente em companhia de sua
companheira, a raposinha havia ensinado-lhe alguns truques de caça, ela possuía um jeitinho
todo especial para lhe dar com algumas situações mais exasperantes que o resmungão arrumava
com seu mau humor, às vezes exagerado.

Com alguns poucos passos chegou na beirada junto ao abismo, sentou-se. A toca ficava bem
escondidinha no alto de uma colina rodeada por algumas árvores e arbustos, tudo para tornar o
esconderijo mais seguro. As vezes aquela parte da floresta poderia ser muito perigosa, lobos e
outros animas adoravam uma refeição fácil .

Muito melhor naquele lugar. A lua prateada parecia um fio no céu. Seus olhos conseguiram
acompanhar um rápido brilho cortando o azul. O que era aquilo? Nunca tinha visto nada assim
em lugar algum, mas era bonito, não podia negar...

- Kiru... – sussurrou bem no ouvido do coelho.

Se não tivesse tanto auto-controle provavelmente teria caído da beirada de susto, entretanto
ficou imóvel, nem pareceu importar-se, então sentiu-se sendo envolto pela raposa. A noite
estava fria... Não era para ele estar lá fora. Ainda estava se recuperando de um resfriado, a
raposa certamente brigaria por seu descuido.

Ambos ficaram em silêncio durante um bom tempo, estava tudo tão agradável que uma conversa
ou mesmo palavra poderia estragar todo aquele momento. No momento em que seu parceiro
estivera doente a raposa mal teve tempo para sair à procura de alimento de tantos cuidados que
seu roedor necessitava.

- O que aconteceu? Não deveria estar aqui...

- Nada... Não conseguia dormir direito.

- Hum... Entendo – parou olhando em volta – a noite está bonita não acha?

- Eu vi um brilho estranho cortando o céu!

- Foi? Fez um desejo?

- Desejo?

-  Sim... – sorriu com cara de quem acha tudo uma gracinha – era uma estrela cadente, a gente
faz um desejo quando vê uma... dizem que se realiza...

- Você já tentou?

- Não... tente agora!

- ... – suas orelhas alongadas moveram com o pensamento – eu dese...

- NÃO! Você tem que pensar, não pode contar...

- Ah! Está bem...

- E não fique na beirada, me enerva, odeio quando você fica aí...

A raposa puxou seu parceiro e sentou-se na entrada da toca, aconchegou-o em seu colo. A
entrada era pequenina e nela havia muitas plantas, jasmins, flores de cores variadas, tinha
também, um pouco mais afastada, uma hortazinha que ajudava muito em dias mais difíceis de
caça e tempo de neve.

O roedor encostou a cabeça no peito quente da raposa...

- Desculpe...

- Pelo quê?

- Por hoje de tarde... você queria ajudar e eu gritei com você...

- Ah! Esquece... eu nem levei a sério, você estava com “denguinho”... – riu-se um pouco – eu
nem escuto o que você diz quando está assim, sabe?

- Eu não estava com “denguinho” -  repetiu fazendo voz enjoada para imitá-lo.

- Estava! Foi por causa da febre, mas agora você já está muito melhor, não é?

- Estou... – respondeu mau-humorado.

- Não se preocupe, eu amo você demais, não ligo para coisas bobas...

- Demais quanto? – perguntou em tom brincalhão, emburrado.

- Ora... demais infinitamente...

- Infinitamente? Só?

- Só? Infinitamente mais, mais, mais, mais, mais... Melhor?

- Não sei... – esticou-se pedindo um beijo.

O beijo foi lento, doce e carinhoso... O abraço se estreitou entre eles. O calor era tão
aconchegante entre os corpos, o pêlo vermelho da raposa reluzia sob a luz quase inexistente da
lua, seus olhos dourados como duas pepitas, porém mais preciosas, tão belas e raras naquele
momento de extrema doçura e carinho que trocavam com seu coelhinho.

- Acho que meu desejo não pode se tornar realidade... – murmurou levantando-se e entrando na
toca, escondendo-se no fundo dela.

- Aonde vai? Qual desejo? O que está fazendo com as folhinhas do nosso ninho?

- Para o ninho. Não posso contar. Estou pondo mais para a frente.

- Engraçadinho... Conta o seu desejo!

- Fica aqui comigo! Daqui podemos ver o céu... Arredei para nós dois, raposa...

- Só se você contar...

- Certo, eu conto!

A raposa enrolou-se com o coelho mais que depressa, sua cauda movimentava-se de um lado
para o outro impaciente. Estava morta de curiosidade, o que desejaria seu pequeno roedor?

De onde estavam tinham uma ótima vista do céu estrelado. O vento soprava lentamente do lado
de fora, apenas uma brisa alcançava os dois.

- Pode ver aquela estrela avermelhada? – perguntou a raposa acariciando lentamente a
barriguinha do coelho

- Sim... o que tem ela?

- Quando vivia só eu sempre olhava para ela e pedia que mudasse a minha vida.

- Por que?

- Porque eu vivia muito só! Mas quando eu conheci você... eu senti uma coisa no meu peito, uma
calor gostoso e não pude deixar você ir, de jeito algum eu iria querer ficar sem meu pon-pon...

- O que você viu em mim...

- Os olhos... eram da cor da estrela...

- Só por isso, de principio posso dizer que foi... mas eu amo você demais! De verdade!

- Ela é vermelha por você?

- Não... uma vez escutei dizer que era uma planeta, ele é vermelho!

- Planeta?

- Depois eu explico melhor... está muito tarde, acho melhor descansarmos. Amanhã será um dia
bem interessante, um passeio poderia fazer muito bem para você, sabia?

- Ah! eu prefiro ficar aqui...

- Sol também é vital!

- Hn!

- O que desejou mesmo?

- É impossível... que fôssemos imortais...

A raposa ficou pensativa durante um tempo. Imortais... para quê? Por outro lado pensando,
melhor pensando, viver para sempre do lado de seu coelho seria realmente uma existência
maravilhosa. Feliz para todo o sempre.

Deu um beijo bem estalado na bochecha do roedor. Abraçou-o com muito amor, que pensamento
mais lindo ele teve...

Seus olhos ficaram toldados por lágrimas, seus braços apertaram ainda mais seu pequeno
parceiro.

- Raposa... está apertando... não posso respirar assim...

- Desculpe, amor, mas que coisa linda você disse... Seríamos muito felizes!

- É... acredito que sim...

O coelho riu alto quando as unhas da raposa começaram a provocá-lo, fazendo cócegas em sua
barriga...

- Pare! Ha! Ha! Ha!... não faça isso...

Smack!!

A raposa beijou-lhe bem estalado e parou com sua brincadeira... não era muito bom ficar
fazendo barulho àquela hora, algum animal perigoso poderia estar atrás de comida e um
coelhinho e uma raposa eram ótimos pratos.

- Você... cansou-me agora.

- Está bem, está bem... vamos dormir agora... certo?

Não demorou nada para a raposa adormecer, o roedor permaneceu olhando para o céu, mas
especificamente para a estrela vermelha que sua parceira indicara.

- Você não se move, porém deve ser capaz de realizar este desejo meu; quero amar esta raposa
ate o último dia da minha vida...

O coelho beijou o rosto de sua raposinha, aninhou-se mais e depois dormiu convicto de que seu
desejo seria atendido. Na verdade acreditava, não na estrela, e sim, no poder que o unia àquela
criatura que o aquecia neste instante...
 
 
 



Por Yukina-chan, setembro/2000.
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