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É permitida a reprodução desde que citada a fonte. Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem, 31/01/2000, www.oocities.org/fecharfebem)
SUMÁRIO

Dr. Clilton Guimarães dos Santos, Promotor de Justiça dos Direitos da Cidadania do Ministério Público Estadual

Em 07 de maio de 1998, a CPI ouviu o depoimento do Dr. Clilton Guimarães dos Santos, Promotor de Justiça dos Direitos da Cidadania do Ministério Público Estadual.

Antes de dar a palavra ao depoente, a Deputada Maria Lúcia Prandi fez um pronunciamento que reproduzimos este Relatório, pela sua importância para as conclusões desta CPI:

“Sr. Presidente, Srs, Deputados e integrantes desta CPI, os vários depoimentos colhidos por esta CPI, assim como as inspeções realizadas por ocasião das rebeliões, os documentos apresentados pela própria Fundação e por organismos de controle social, entidades não governamentais e Movimentos de defesa dos direitos da criança e do adolescente, têm-nos mostrado que a atual política de atendimento ao adolescente autor de ato infracional executada pelo Governo do Estado não corresponde às expectativas da sociedade nem às necessidades da população atendida, além de estarem em total desacordo com o ECA, aliás fato já comprovado anteriormente, mas que ainda não mereceu total empenho das autoridades responsáveis, no sentido de serem imprimidas efetivamente as mudanças estruturais que a situação requer.

Em notícia divulgada pelo Jornal Nacional do dia 24 de abril passado, apesar da brevidade característica de matéria deste teor, pudemos constatar como vem se desenvolvendo o atendimento a essa população no Rio Grande do Sul, mais especificamente no município de Porto Alegre.

Para nossas surpresa e satisfação, constatamos que é possível dar cumprimento à legislação e garantir ao adolescente em conflito com a lei, a oportunidade de reintegração social.

A implantação de um sistema que garante atendimento integrado em um único local dos órgãos do Executivo e Judiciário, a operacionalização de um sistema chamado de justiça instantânea e a implementação das medidas sócio-educativas em meio aberto, previstas no ECA, têm abreviado o atendimento à população, favorecendo a real conscientização sobre as conseqüências do delito cometido e possibilitando a reintegração social desses adolescentes e sua formação como cidadãos comprometidos com o desenvolvimento em nossa sociedade.

Exemplos como esses confirmam que o Estatuto não é uma utopia e que pode e deve se tornar realidade mesmo numa área tão complexa como a do ato infracional, bastando a vontade política do Executivo, unida a um Poder Judiciário comprometido com a questão,

Com o objetivo de conhecer de forma mais aprofundada a experiência que vem sendo desenvolvida no Rio Grande do Sul, propomos a esta CPI que solicite cópia da gravação da matéria junto à Rede Globo, veiculadas através do Jornal Nacional, bem como convite aos profissionais responsáveis por este exemplar programa para prestarem depoimento nesta CPI.

Entendemos que já ouvimos muitas denúncias. Presenciamos muitas infrações e penso que a CPI, apesar de algumas contribuições que já temos, como a da OAB, para reordenamento institucional da FEBEM, seria interessante que ouvíssemos também uma outra experiência que vem dando resultados positivos em outro Estado do país.”

Depois disso, passou-se ao depoimento propriamente dito. O Promotor enfatizou que sua posição poderia ser antagônica a outros que o antecederam, pois sua visão sobre a questão do ato infracional é estritamente vinculada à concepção que se deve ter do direito como um objeto de transformação da realidade social.

O direito pode ser utilizado tanto para fazer fluir o desenvolvimento social, como para estancá-lo. Para ele, o Estatuto da Criança e do Adolescente tem como princípio ideológico uma visão transformadora da realidade, por isso, muitas vezes, ele é combatido ou incomprendido.

Hoje se fala muito no rebaixamento da idade penal para que atinja adolescentes na faixa de, pelo menos, 16 anos, com a justificativa de que isto seria o melhor a se fazer para combater a violência urbana, que atualmente apresenta índices absolutamente elevados, uma vez que há índices alarmantes da presença do adolescente em cometimento de crimes.

Recentemente, a Associação de Advogados Criminalistas de São Paulo alardeou na imprensa que 78% dos casos criminais envolviam adolescentes infratores. Entretanto, não se sabe os fundamentos científicos desta pesquisa, nem onde foi feita ou a metodologia utilizada; mas os resultados pairam como verdade absoluta, inclusive justificando a necessidade da redução da imputabilidade penal, com o argumento sedutor de que os adolescentes estão sendo utilizados na prática criminosa.

Este argumento não pode prevalecer por algumas razões:
é verdade que o adolescente é usado, mas não em todos os casos;
o adolescente autor de ato infracional é um ser humano como todos nós; não ser pode imaginá-lo como se fosse uma pessoa capaz de se sentir envolvido nas menores situações; ele é também usado, mas por traficantes, pelo crime organizado, e não em todos os casos;
o adolescente muitas vezes pratica ato infracional por várias circunstâncias de sua vida ou inicia uma vivência infracional não necessariamente por estar sendo usado, mas pela própria realidade social cáustica na qual vive;
se o adolescente está sendo usado, o grande problema criminal não é o adolescente, mas quem se utiliza dele; o problema está na falta de medidas eficazes para conter esta estrutura criminosa que se abate perigosamente sobre o adolescente, ou seja, o crime organizado.

Este argumento é utilizado apenas para desviar a atenção da impotência que a segurança pública tem enfrentado para lidar com o crime organizado em si e com as grandes estruturas criminosas.

Os que querem criminalizar a conduta do adolescente desde 16 anos, ou até 14, ou 12 ou 13 anos, afirmam que isto resolveria a questão porque vamos fazer ingressar este adolescente no sistema penal que está aí. Todos os grandes juristas e penalistas da atualidade têm a pena de prisão sob severas críticas e estudam-na com grande profundidade, sugerindo medidas alternativas cada vez em maior número.

A primeira referência dos penalistas brasileiros é a falência do nosso sistema prisional em que tratamos ou continuamos a tratar pessoas como bichos. Prova disto é que o Ministério Público, inclusive que atua estritamente na área criminal e não na Promotoria de Cidadania, promoveu uma ação civil contra o Governo do Estado, que hoje está compelido, por uma decisão liminar, a retirar presos dos distritos policiais, porque a situação é absolutamente insustentável.

É permitida a reprodução desde que citada a fonte. Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem, 31/01/2000, www.oocities.org/fecharfebem)
SUMÁRIO

O sistema penal que temos está em frangalhos e aquela última possibilidade de utilidade da pena, de recuperação social, dentro de um sistema como este, é uma possibilidade que não passa de sonho, de quimera. Se o adolescente infrator for para este sistema, a sociedade terá que arcar com mais este ônus: de atirar neste sistema falido o adolescente autor de ato infracional, criminalizando antes, ou seja, marginalizando alguém numa faixa etária tão baixa.

Muitos juristas justificam sua posição, afirmando que na Inglaterra, nos Estados Unidos e em outros países da Europa, crianças e adolescentes podem até ser condenados à cadeira elétrica. Entretanto, este argumento cai por terra quando analisamos que estes países têm uma cultura radicalmente diferente da nossa e enfrentam esta questão pisando em brasas, com muito menos profundidade do que deveriam.

Mesmo nos episódios mais recentes, nos Estados Unidos, que envolvem morte de crianças por outras crianças, fortes setores da sociedade argumentaram que, ao invés de criminalizar ou punir as crianças, era preciso pensar sobre o nível da podridão de uma sociedade que ensina e estimula crianças de pouca idade a utilizar armas. Mais do que reprimir, é preciso refletir sobre as causas que podem levar crianças a usarem armas da maneira como foi visto na mídia.

A própria diferença que está presente nesta comparação e que é uma questão de justiça, é a questão social do Brasil: a questão do atendimento que se oferece ao adolescente aqui, o quanto as políticas sociais são hoje objeto de largo desprezo por parte das autoridades governamentais. Principalmente na área da Infância e Juventude há deficiências crônicas conhecidas e reconhecidas há décadas e há uma grande impotência, diante dos parcos investimentos nesta área, geralmente feitos de maneira equivocada.

O ponto de partida para o enfrentamento da questão de adolescente infrator e do ato infracional é reconhecer que o Estatuto fixou elementos, princípios e medidas suficientemente eficazes para combater a questão, especialmente quando fala de medidas sócio-educativas em meio aberto.

No Artigo 112, o Estatuto da Criança e do Adolescente fala de providências como a obrigação de reparar os danos ou a prestação de serviços à comunidade, que são extremamente importantes, até medidas que permitem uma supervisão da vida pessoal do infrator de uma maneira estreita, como é o caso da liberdade assistida, e que são esquecidas da administração pública.

O grande problema é que, decorridos 8 anos após a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a grande luta continua sendo a implementação da lei na realidade brasileira.

A primeira grande deficiência em relação ao tratamento do ato infracional é a deficiência do despreparo dos operadores do Estatuto frente à realidade do ato infracional, ou seja, os profissionais que atuam na área da infância e juventude, com relação ao ato infracional, não têm preparo suficiente de ponto de vista técnico para o seu enfrentamento. Isto envolve desde o policial militar, responsável pela apreensão do adolescente infrator, passa pela autoridade policial, pelo Promotor e chega ao Juiz que atua na área de ato infracional. Toda cadeia de operadores de direito são altamente versados, muitas vezes na própria matéria jurídica, mas não têm preparo ou atenção adequada e necessária à questão social, que está no fundo da matéria que, por eles, será efetivamente apreciada.

A questão do ensino jurídico é outro ponto muito grave, porque o direito de infância e juventude não é matéria curricular nas Universidades, de maneira geral não é visto, como uma série de outros direitos que são componentes essenciais da cidadania, e que apenas agora começam a ingressar no círculo de currículos universitários, como é o caso de direito do consumidor e meio ambiente.

Uma outra questão fundamental é a dos Conselhos: o ECA estruturou o atendimento à criança e ao adolescente de uma maneira democrática, criando uma convivência harmônica entre a democracia representativa e a democracia participativa, de tal maneira que, hoje, as políticas públicas são instituídas não só pelo poder público formal e oficialmente posto, mas também por representação da própria coletividade que, em conjunto com o poder público, delibera sobre estas políticas.

Os Conselhos são muito importantes, mas geram a necessidade de adaptação, porque quem exerce o poder público não quer dividir este poder, acha que há uma intromissão indevida dos representantes da sociedade no desempenho do seu papel; por outro lado, os representantes da sociedade acham que devem estar em permanente oposição ao administrador público; e esta convivência impossível acaba se voltando contra o próprio ECA.

Os Conselhos Tutelares são importantes, porque reduzem a tarefa do Juiz da Infância e Juventude, assumindo toda questão social propriamente dita. Mas são também uma experiência nova, se deparam com dificuldades naturais, nem todos os Conselheiros estão preparados, nem todos sabem como funciona a máquina administrativa. Eles precisam absorver cada vez mais conhecimentos e no processo eleitoral, toda coletividade vai exigir cada vez mais dos Conselheiros Tutelares.

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Os Conselhos de Direitos, Nacional, Estadual e Municipal cumprem um papel importante na assessoria da administração pública e devem ser pertinazes nesta convivência, mas não precisam ser sempre opositores; e os administradores públicos precisam respeitar estes Conselhos e seus integrantes que cumprem um papel social relevante.

É preciso trabalhar o administrador público para que ele aceite o Estatuto, para que ele aceite a co-gestão da sociedade civil. E é preciso conscientizar a população antes da implementação da política, principalmente no que se refere ao adolescente autor de ato infracional, através de um trabalho permanente de acompanhamento aos problemas que possam surgir.

Em nível estadual, há um Fundo Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, com destinação orçamentária de 800 mil reais em 1997, valor irrisório para um Estado gigantesco como São Paulo. Na medida em que o próprio Poder Público desprestigia os Fundos, a sociedade civil, através do empresariado, também acaba desprestigiando. E, no final das contas, a própria comunidade, a criança e o adolescente é prejudicada.

A efetividade do Estatuto também precisa ocorrer no Judiciário, porque muitos Juízes ainda aplicam o Código de Menores de 1979.

Não dá para resolver o problema da criança e do adolescente, sem resolver o problema de sua família. É preciso investir em um trabalho de reestruturação familiar e uma proposta para isto é o programa de renda mínima que tramita na Assembléia Legislativa.

A CPI deveria estudar como proposta a abertura das escolas nos finais de semana, para estreitar a convivência com a comunidade.

O Deputado Vanderlei Macris enfatiza que poderia ser uma grande proposta desta Comissão de definir uma ação uniforme do Legislativo, Executivo e Judiciário, para criar condições da FEBEM não continuar a receber crianças da forma como vem recebendo, ou seja que garantisse um atendimento integrado e rápido ao adolescente autor de ato infracional.

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