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A Molécula
Transportadora de Oxigênio : Hemoglobina
A vida dos seres multicelulares tornou-se
viável pela existência de uma estranha molécula vermelha que
batizamos de Hemoglobina.
A hemoglobina combina-se reversivelmente
com o oxigênio; quando ligada ao oxigênio, a hemoglobina é um
pigmento vermelho brilhante, responsável pela coloração rósea da
pele e mucosas. Em sua forma desoxigenada, a hemoglobina tem cor
azul-escura, de modo que misturas de hemoglobina oxigenada com
desoxigenada (reduzida) exibem gradações de cor entre os extremos
vermelho-vivo e azul-escuro.
O transporte dos gases respiratórios
ocorre graças às propriedades únicas dessa molécula de hemoglobina.
Graças a ela, o sangue é capaz de transportar mais de 20 ml de O2
e de 60 ml de CO2 em cada 100 ml de sangue, em combinações
químicas que se dissociam rapidamente em decorrência de pequenas
alterações nas tensões parciais desses gases.
A dissolução física de O2 e
CO2 na água plasmática é insuficiente para funcionar como
meio de transporte desses gases respiratórios. A quantidade de
oxigênio que pode dissolver na água plasmática a 37 ºC, numa PaO2
normal de 95 mmHg, é de apenas 0,3 ml em cada 100 ml.
Um débito cardíaco normal de 5 l/min
levaria apenas 15 ml de O2/min aos tecidos, que consomem no
mínimo 250 ml/min.
Desta forma, se não houvesse nenhum outro
mecanismo para fornecer oxigênio aos tecidos, no repouso, um consumo de
oxigênio de 250 ml/min exigiria um débito cardíaco de mais que 83
l/min – não há coração humano que consiga isso (o máximo obtido
por atletas altamente treinados, mesmo assim por curtos períodos de
tempo, é de 30 l/min).
Durante esforço físico, o consumo de
oxigênio pode se elevar para 4 l/min – isso exigiria um débito
cardíaco de 1 333 l/min, caso a única forma de transporte de oxigênio
fosse sua dissolução no plasma.
As necessidades de oxigênio podem ser
cobertas pelo O2 dissolvido apenas se a PaO2 fosse
extremamente elevada, superior a 3 000 mmHg (mais 3 atm de pressão);
sob essas pressões de oxigênio todas as células do organismo
(inclusive as da bomba cardíaca) seriam imediatamente oxidadas
(queimadas) pelo oxigênio altamente reativo. Portanto, a hemoglobina
não apenas aumenta a capacidade d transporte de oxigênio (de 15 ml de
O2/min para 1 000 ml/min) como torna desnecessárias elevadas
pressões de oxigênio (o o-xigênio nas tensões encontradas em nosso
organismo, sempre abaixo de 100 mmHg, não são tóxicas).
A eliminação do gás carbônico é menos
problemática. O CO2 é 21 vezes mais solúvel no plasma que
o O2, e difunde rapidamente pelos fluidos corporais numa
velocidade 20 vezes maior que o oxigênio. Apesar disso, a hemoglobina
é essencial para a correta eliminação do gás carbônico, como se
verá adiante.
Hemoglobina como
Pigmento de Transporte de gases
A propriedade da hemoglobina servir de
transportador de oxigênio entre os pulmões e os tecidos depende de 2
notáveis características dessa estranha substância:
1) A capacidade de se converter do estado
desoxigenado para o oxigenado com velocidade muito alta (0,01 Seg. ou
menos), nos níveis de PO2 existentes nos alvéolos;
2) A capacidade de dissociar-se do O2
de modo igualmente rápido ao nível dos tecidos, e na exata medida das
necessidades metabólicas individuais de cada tecido e de acordo com o
estado metabólico (na realidade, em função da redução na pO2,
que se dá quando o sangue atinge os tecidos periféricos).
A segunda propriedade decorre do fato de
que a quantidade de oxigênio ligada à Hb varia em função de todos os
acompanhantes normais do metabolismo tecidual (PO2, PCO2,
acidez local e tempe-ratura).
A hemoglobina é considerada um
transportador ideal de oxigênio para os seres vivos pluricelulares, uma
vez que reúne características curiosas: tem afinidade extrema ao
oxigênio nos níveis de pO2 vigentes nos alvéolos e capta
oxigênio desse gás alveolar de tal modo que, com pO2 de 100
mmHg, a saturação é de 97,5% e com pO2 de 60 mmHg, a
saturação é de 95% (praticamente a mesma).
Desse modo, grandes variações na pO2
alveolar não afetam su-bstancialmente a saturação da oxi-Hemoglobina.
Isso representa proteção contra hipoxemia que ocorreria nas grandes
altitudes ou numa despressurização (como pode ocorrer dentro de
aviões).
Já no capilar sistêmico, a hemoglobina
apresenta uma incrível queda na sua afinidade pelo oxigênio,
entregando com facilidade o O2 tão necessário ao
metabolismo celular.
Como veremos adiante quando do estudo da
curva de dissociação da oxi-Hemoglobina, esta é capaz de entregar
grandes quantidades de oxigênio, reduzindo sua saturação, mas
mantendo uma pO2 elevada – e isso é fundamental para que
seja mantido sempre um gradiente de pressão entre o capilar sistêmico
e as células. Se a pO2 caísse proporcionalmente à
diminuição da saturação da oxi-Hb, a difusão de oxigênio a partir
do capilar para a célula estaria prejudicada.
Aspectos bioquímicos
A capacidade da hemoglobina se ligar ao
oxigênio reside no ferro ferroso (Fe++) que existe em seu
núcleo Heme. Quando esse ferro é oxidado até férrico (Fe+++),
essa propriedade é perdida. Isso ocorre quando há
meta-hemoglobinemia, por exemplo.
A hemoglobina se distingue de outras
moléculas que também possuem o núcleo Heme, como a mioglobina e os
citocromos da cadeia respiratória. Num citocromo, a passagem do
estado de saturação associa-se a uma mudança na valência de
ferroso para férrico; a perda de oxigênio associa-se a uma mudança
de férrico para ferroso.
Ambas as alterações n o citocromo
dependem das atividades das enzimas específicas. A hemoglobina, ao
contrário, absorve ou perde o O2 em função
exclusivamente da pO2 a que está submetida, sem que haja
mudança de valência do ferro e sem a intervenção de qualquer
enzima específica.
A captação de oxigênio pela
hemoglobina é chamada de oxigenação (e não oxidação, como nos
citocromos, em que o ferroso torna-se férrico).
Uma molécula de hemoglobina tem, ao
todo, 10 000 átomos, dos quais apenas 4 são de ferro. O oxigênio
liga-se à hemoglobina na razão de 1,34 ml/g de Hb. Esta relação
eqüivale a 22,4 l (1 mol) de O2/mol de ferro presente na
hemoglobina. Nesta base, uma molécula de O2 reage com um
átomo de ferro e uma molécula de hemoglobina reage reversivelmente
com 4 moléculas de oxigênio.
Estrutura da
Hemoglobina
No interior da Hb, o átomo de ferro
representa o ponto central de ligação de 4 grupos pirrólicos,
constituindo o já citado grupo Heme.
Quatro grupos Heme, cada um contendo um
átomo de ferro, ligam-se ao maior componente da hemoglobina – a
molécula de globina. A globina fornece elementos que permitem ao
ferro ferroso apresentar a propriedade de oxigenação sem oxidação,
já que o ferro hemático perde a capacidade de se combinar
reversivelmente com o oxigênio se for separado da cadeia da globina.
Desconhece-se o modo pelo qual a globina
específica confere ao grupo hemático a capacidade de reação
reversível com o oxigênio; no entanto, a combinação do O2
com o ferro da Hb é considerada uma ligação covalente, sem haver
portanto transferência de cargas elétricas.
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