BOLETIM DA DIRETORIA DE CRIAÇÃO NÚMERO 66 MARÇO 98

1- HISTÓRIA (ESTÓRIA) DE LOBO MAU.

Após 14000 anos, a American Society of Mammalogists’Mammal Species of the World aderiu ao Code of the International Commission of Zoological Nomenclature e cães e lobos passaram a fazer parte oficial de uma mesma espécie, o Canis lupus. O seu cão seria um Canis lupus familiaris, sendo familiaris uma subespécie de lobo. Os lobos seriam Canis lupus X, sendo X as diversas subespécies de lobo. O wolfdog, mestiço de cão e lobo e usado na caça aos lobos, após grandes discussões é classificado como Canis lupus familiaris, de acordo com o United States Department of Agriculture.

Pertencer à mesma espécie é poder gerar produtos férteis no cruzamento entre os seus elementos. Para muitos, todos os cães são wolfdogs (cães lobos), sendo as diferenças entre as raças caninas (em aparência e temperamento) determinadas pelo número de gerações desde os lobos puros. Citam que, no original do German Shepherd studbook, Zuchtbuch fur Deutsche Schäferhunde (SZ), é mostrado que muitos lobos puros foram usados para "criar"o nosso pastor há somente 90 anos. Teria acontecido o mesmo com os Alaskan Malamutes, Siberian Huskies, Belgian Sheperds e raças mais raras. Segundo os defensores dessa tese,o capitão Von Stephanitz, no clássico The German Sheperd in World and Picture, documenta a hipótese pedindo para os criadores não adicionarem mais sangue de lobo nas suas criações pois ele já havia conseguido a combinação ideal. Estaria escrito na edição inglesa do livro., de 1930, transcrita literalmente da edição alemã, que pode ser conseguida por salgados 350 dólares na Fang@howling.com. Numa edição de 1932, revisada e aumentada, na realidade sanitizada segundo os defensores da tese, foram removidas todas as referências à herança lupina.

E vão mais fundo. Em suas andanças nos anos finais dos 1800 e iniciais de 1900, Stephanitz comprou cães pastores em toda a Europa. Dessas compras destacaram dois animais, Hektor Linksrein, mais conhecido por Horand v. Gafrath, o primeiro cão do stud book, e seu irmão de ninhada Luchs (Sparwasser). Defendem que Horand, o cão favorito de Stephanitz, teria ¼ de sangue de lobo. Mores Plieningen, SZ 159, seria neta de um lobo do Stuttgart Zoo/Gardens e, acasalada com Horand, gerou Hektor von Schwaben que, como Horand, figurou fortemente na ancestralidade dos pastores alemães atuais. Afirmam que, do SZ 41 até o SZ 76, existiriam quatro cruzamentos com lobos. Citam diversos autores para mostrar ser perfeitamente possível chegar às qualidades dos cães atuais através de cruzamentos anteriores com lobos.

Afinal, aceitando-se a tese, quais os lobos seriam ancestrais dos cães ? Primariamente a partida seria a domesticação do Old World Southern Wolf (alguns acham que teria havido um início com o cruzamento lobo/chacal), pequenos animais cinzentos, menos orientados para a formação de grupamentos sociais, que viviam há alguns séculos no deserto da Ásia, na América do Norte e Europa, sendo os últimos exemplares vistos na Índia. A ele poderia ser juntado o lobo do deserto do Oriente Médio. Desses lobos teriam surgido algumas raças de cães. Outras espécies teriam surgido dos cruzamentos desses produtos primários com Northern Wolves até tão próximo como há 90 anos (segundo eles, documentado nos pastores alemães).

Por que haveria tanta dificuldade da chamada "sociedade do grande lobo mau" (Big Bad Wolf Society) aceitar a tese que, para os seus defensores, é tão clara e documentada ? Por que existem ursinhos de pelúcia, mesmo sendo o urso um animal nada amistoso, e não lobinhos de pelúcia ? Na realidade, o homem não passaria na mesma ponte com os lobos por serem muito semelhantes nos seus atos: o sentido hierárquico e cooperativo mantido graças a indivíduos dominantes, compartilhamento dos cuidados com os filhotes (aliás, mais comuns entre os lobos que entre os homens), a defesa territorial arraigada, o uso de sinais para manter o silêncio durante as caçadas, algumas vezes matar mais que o exigido pela fome (muito raro entre outros animais), capacidade de matar os da própria espécie, grande inteligência e resistência e habilidade para juntar-se em grupo para matar um animal muito maior. E cargas elétricas semelhantes se repelem... Também haveria uma pontinha de inveja: no início, o homem e os lobos viviam erraticamente, caçando e mantendo uma liberdade que os aproximava. No momento que passou de caçador para fazendeiro/agricultor, o homem necessitou fincar os pés na terra e perdeu a sua grande mobilidade e liberdade. Enquanto o homem ficava olhando para o tempo e planejando o aumento da produção, os lobos continuavam livres e uivando na lua cheia. Apesar dos lobos constituírem pouca ameaça, havendo muito poucos casos de mortes humanas provocadas por eles, o homem via no seu domínio o domínio da natureza. Pura inveja. O antigo companheiro passou a vilão, comedor de vovozinhas, encarnação do lobisomem, anunciador de maus agouros nos seus uivos noturnos (notaram como os uivos dos cães trazem um mal estar às pessoas?), devorador das ovelhas (esquecendo os homens de quando invadem reservas e campos alheios e matam covardemente animais somente para exibi-los como troféus), configurador da figura do diabo nos filmes de terror, etc.

No centro dessa discussão, a raça pastor alemão foi a mais prejudicada e, curiosamente, também a mais beneficiada em determinados aspectos. O seu fenotipo, o mais parecido ao dos lobos entre a maioria das raças caninas, levaram o pastor alemão a receber a maior carga de rejeição de muitas pessoas. A mudança do nome, em certa época e em alguns países, para cão lobo alsaciano (alsatian wolf dog), para fugir do nome alemão e por ser a Alsácia não totalmente alemã, contribuíram para a reticência ao animal. O uso do pastor alemão na guarda dos hediondos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial também agravou o problema.

Felizmente, as excepcionais qualidades do pastor alemão, a tenacidade dos criadores e divulgadores da raça e a tendência do homem a passar a amar e respeitar com maior intensidade aquilo que antes lhe incutia medo, levaram a raça a ser uma das mais criadas em todo o mundo. Afinal, os inimigos de olhar oblíquo evoluíram para o olhar amigo e franco.

Ainda teremos muita lenha para queimar nessa fogueira. Acompanho com olhos neutros e observadores. E você ?

Dr. José Carlos Pereira, Diretor de Criação.

 

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