Textos
Meu Mestre, o Medo Entre uma enormidade de fatores que o tornam único, o que mais desafia minha curiosidade é seu aspecto dual. Não se preocupe, não pretendo tratar de confusas e longas linhas de entendimento filosófico, até porque disso pouco entendo. Essa dualidade pode ser entendida da seguinte maneira, assim como posso ter medo de enfrentar uma ameaça e recuar, posso ter medo de conviver com esse pavor e insuflar-me de uma falsa coragem que só Deus sabe onde posso parar. Felizmente, até para a sobrevivência em grupo, costumamos ter o espírito temeroso da 1ª espécie. Pare e pergunte, o que o faz sentir um estranho e assustador frio na espinha? O que o faz suar gelado, tremer, sentir uma cãibra explosiva tomar conta do seu corpo? Se for colocar exemplos do que nos assusta essa crônica irá disputar em tamanho com uma lista telefônica. O mais desafiante não é reagir ao medo, isso é instintivo, fácil de perceber, eu mesmo tremo de medo em disputas por pênaltis, ou quando a conta do celular chega em um envelope grande; o desafio é saber qual o seu medo. A vida inteira passei por situações que não compreendia direito, que terminava misturando com outros sentimentos de dúvida, que não deixa de ser um subgênero do medo, mas dificilmente percebia que as fugas que busquei eram para esconder o meu pânico, a minha fraqueza, o meu medo. Às vezes damos pistas aos que estão por perto sobre o que tememos, mas estranhamente nem sempre percebemos estas dicas, nem o próprio medo. Quando criticamos demais, quando achamos que tudo está errado, que todo mundo é diferente, que você tem certeza que pode fazer melhor, quando deixamos propositalmente de perceber o carinho que algumas pessoas tentam demonstrar, bem amigo, isso é medo, sim! Meu projeto de vida talvez seja ter medo. E talvez o seu. Penso da seguinte forma, se tenho medo, conheço meu lado fraco e limitações, e isso será um desafio, um objetivo para superar. Não consigo viver sem conquistas, podem ser de qualquer tipo, amorosas, esportivas, familiares, religiosas, laborais, etílicas (nunca tomei uma Guiness). Viver sem medo é não tentar ser dinâmico, não tentar perceber que as coisas podem, e talvez devam, mudar, ainda que nem sempre para melhor. Essa opção de pensamento pode ser bastante útil e prática, mas assim como o próprio medo, ela possui uma segunda face, uma dualidade. Sempre viveremos achando que algo está faltando, ou que deixamos de fazer a escolha certa, por isso não aconteceu, ou que se deu certo e não era o esperado é porque fizemos de forma errada, haverá sempre uma lacuna, um buraco negro atraindo nossas inseguranças. Acho que vou arriscar viver com esse medo, mesmo que ele sempre se renove e fique pensando que estraguei tudo novamente. Nesse momento não me preocupo com a opção de viver no medo, mas sim com a forma que elegi, e que de alguma maneira sinto que terá um longo mandato o medo de magoar os que acreditaram em nós, e que acharam que um dia não teríamos medo, ou que pelo menos entenderíamos esse medo, mas assim não se deu, acho que esse medo será um forte candidato às reeleições de consciência que realizo diariamente e que me sufocam porque percebo que o escolhi como meu Mestre.
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© 2006 Hélio
Leal
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