Controle e Vigilância da Malária - Uma proposta de descentralização

William Henrique Stutz - Médico Veterinário Sanitarista, Centro de Controle de Zoonoses, SMS Uberlândia

Thogo José Lemos dos Santos - Médico Infectologista Coordenador das Ações de Controle de Zoonoses, SMS Uberlândia

Rosuita Fratari Bonito - Médica Sanitarista - Diretora Divisão de Vigilância em Saúde - SMS e docente da UFU.

INTRODUÇÃO

Considerado um dos maiores problemas de saúde coletiva do mundo, a malária vem fazendo em média 500.000 novos casos por ano apenas no Brasil. A implantação de laboratórios para o diagnóstico de malária estrategicamente distribuídos pelo país possibilita o diagnóstico precoce e tratamento imediato em regiões não endêmicas o que reduz o risco de introdução da malária nessas áreas. Neste trabalho procuramos evidenciar a importância da descentralização e da municipalização destes laboratórios de diagnóstico e tratamento da malária dentro dos princípios que norteiam o Sistema Único de Saúde ( SUS).

MATERIAIS E MÉTODOS

Foram analisadas as fichas de pacientes que procuraram o serviço por apresentarem sintomatologia compatível com malária e que apresentaram diagnóstico positivo correspon-dentes ao período de 1.992 a janeiro de 1.998. A método diagnóstico utilizado foi o de gota espessa sendo que, a partir de abril de 1.997, passou-se a utilizar como triagem o método ParaSightâ-F. As drogas utilizadas foram aquelas preconizadas pelo Ministério da Saúde, quais sejam : Cloroquina, Primaquina, Artemether, Artesunato, Mefloquina, Quinino, Clindamicina e Tetraciclina.

RESULTADOS

Dos 1.096 pacientes que procuraram o serviço, 158 (14.41%) foram positivos para malária; destes, 115 (72,8%) foram causados por P.vivax, 41 (25,95%) por P.falciparum, um (0,6%) por P.malariae e uma forma mista (falciparum + vivax).

Quanto à evolução dos casos atendidos pelo Centro de Controle de Zoonoses, pode-se notar que 59,1% dos pacientes não retornaram para verificação de cura (abandono), 34,4% evoluiram para cura e 6,5% tiveram recaida. Com relação ao sexo dos pacientes, houve predominância absoluta de pacientes do sexo masculino 130 (82,28%) contra 28 do sexo feminino 23 (17,72%). O grupo etário predominante situava-se entre 21 e 40 anos ( 84 pacientes ou 53,2%), seguido daqules com idade entre 41 e 60 anos (41 ou 25,9%), 0 a 20 anos ( 24 ou 15,2% ) e finalmente os pacientes entre 61 a 80 anos ( 9 ou 5,7% ). Quanto à profissão (ocupação), destacam-se motoristas (15,6 %), do lar (10,9%) e garimpeiros (8,8%). Constatou-se também que 91,7% (145 pacientes) provinham da região amazônica, sendo um do Suriname. Três pacientes eram procedentes do continente africano. Em dez prontuários não constava a informação.

DISCUSSÃO

Segundo Chaves e Zumpano em “ Manual de Malária” - Fundação Nacional de Saúde/Belo Horizonte - 1.996, “57,7% do estado de Minas Gerais são considerados áreas maláricas”. Neste aspecto, destaca-se o triângulo mineiro dada sua posição geográfica estratégica, entroncamento de rica malha viária interligando o norte do país (região endêmica ) às regiões sudeste e sul do Brasil. No período de 1.980 a novembro de 1.996, ainda conforme Chaves e Zumpano, foram notificados 9.392 casos de malária em Minas Gerais sendo que 95,2% dos mesmos eram procedentes de outros estados e 4,8% do próprio estado de Minas Gerais. Uberlândia tem registro de malária autóctone. Até 1.987, todo caso suspeito de malária em Uberlândia era encaminhado para a sede Fundação Nacional de Saúde ( FNS ) em Uberaba ou atendido pela rede hospitalar municipal, que não dispunha de laboratórios nem técnicos devidamente capacitados para tais procedimentos. A rede pública, representada pela Hospital Escola da Universidade Federal de Uberlândia, sofria freqüente discontinuidade no recebimento de medicação anti-malárica. Entre 1.988 e meados de 1.992, as colheitas e leituras de lâminas eram realizadas por laboratorista da então SUCAM (atual FNS) que se deslocava esporadicamente de Uberaba a Uberlândia. A partir de maio 1.992, com a implantação do laboratório no próprio Centro de Controle de Zoonoses Uberlândia, buscou-se a capacitação de técnicos junto à FNS, garantindo diagnóstico e tratamento permanente à população. Em setembro de 1.993, os procedimentos relativos a malária foram definitivamente transferidos para o CCZ. Até 1996, Minas Gerais contava com 20 laboratórios de referência, sendo 13 da Fundação Nacional de Saúde e 7 ligados a municípios (Chaves,KM-comunicação pessoal,1998). O Triângulo Mineiro conta com três, nas cidades de Uberlândia, Frutal e Ituiutaba. Atualmente o CCZ-Uberlândia em parceria com a FNS realiza o treinamento e capacitação de recursos humanos de cidades da região. No restante do estado, o diagnóstico e o tratamento são realizados nos Postos de Notificação instalados, em sua maioria (67%), em postos e/ou Unidades Básicas de Saúde, sob coordenação restrita da FNS.

Os resultados obtidos espelham a situação epidemiológica nacional e do estado de Minas Gerais no que se refere à predominância de casos de malária por P. vivax sobre aqueles causados por P.falciparum. A grande maioria dos casos eram oriundos da região amazônica, principalmente dos estados Mato Grosso, Pará e Rondônia. O grande número de motoristas acometidos resulta do intenso tráfego de cargas entre as duas regiões. O predomínio do sexo masculino, da mesma forma, reforça a atividade profissional como determinante na aquisição da doença. A transitoriedade dos pacientes que procuraram este centro impossibilta, muitas vezes, o seguimento e o controle de cura.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos pelo CCZ-Uberlândia reafirmam a necessidade e factibilidade da descentralização de laboratórios para o diagnóstico e tratamento da malária contribuindo significativamente para um melhor controle da doença, reduzindo os riscos de introdução ou reintrodução em áreas não endêmicas, assim como aumentando as possibilidades de sucesso terapêutico a partir de um diagnóstico preciso e da pronta instituição de tratamento específico. As ações acima descritas deverão, a nosso ver, ser acompanhadas de monitoramento entomológico também executado pelos CCZs.

BIBLIOGRAFIA

___ Chaves KM, Zumpano JF , Manual de Malária -Fundação Nacional de Saúde/Belo Horizonte - 1.996

___Ministério da Saúde, Manual de Terapêutica de Malária - Brasília,1990