"Repousarei em ti
Como as estrelas nas grandes águas
Muito antes do último silêncio."

       Estes são versos de Mauro Sampaio, que um dia chamei de poeta das estrelas, dada a insistência com que elas povoaram os seus versos. Versos que conheço muito bem, pois  ele gostava que eu os criticasse, e também que os passasse a limpo, porque   era um péssimo datilógrafo.

       Só nos víamos uma vez por mês, nas sessões da Academia Campinense de Letras, mas  permanecíamos em contato pelo telefone ou pelo correio. Mesmo quando fui morar em Serra Negra, continuamos assim. Mais que poeta, o Mauro tem representado para mim a bondade, a meiguice, a fé. Algumas vezes, poucas,  não nos entendíamos por causa de sua teimosia. Tanto que uma vez eu lhe disse:

        - Mauro, você me faz lembrar uma mula que aluguei certa vez, e que resolveu empacar no meio de uma estradinha...

        Riu, mas sabia ser humilde quanto aos seus versos, e submisso à vontade  de Deus. De tal submissão tenho mais certeza agora, quando ele, vítima de um câncer incurável,  serenamente aguarda o seu fim.

        Ontem houve sessão solene na Academia Campinense de Letras, que comemora o seu 45º aniversário de fundação. A academia  funciona num prédio erigido especialmente para ela, uma réplica de templo grego, cujas colunas dóricas nos infundem um certo senso de responsabilidade ao passar entre elas. No  topo do edifício, uma Fênix,  esculpida pelo famoso Coluccini, simboliza a imortalidade.

        Até há pouco tempo, eu subia as escadas, atravessava as colunas e encontrava Mauro Sampaio, e o abraçava. Era o presidente, o primeiro a chegar, de modo que nunca deixei de encontrá-lo ali. Ontem, quando o Reverendo Nathanael se levantou para justificar o título de Presidente de Honra, que estava sendo conferido ao Mauro, não pude conter as lágrimas.

           Não queria chorar, não queria mesmo,  porque ninguém ali imagina  o quanto é estreita a minha ligação com o Mauro.  Uma ligação todinha embasada na poesia, na admiração  e no respeito mútuos. Mas foi ele mesmo, poeta das estrelas e da saudade, quem um dia afirmou em lindos versos:

           "Há sempre um dia de sol.

Há sempre uma noite de antigas estrelas.

   Há sempre uma saudade repetindo a vida."
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Repousarei em ti
Como as estrelas nas grandes águas
Muito antes do último silêncio.