A NOVA ARCA DE NOÉ

(O OBJETIVO, ESSE DESPREZADO)

(*)         Texto de Autor desconhecido, com adaptações por desconhecidos.

O artigo original é da “Overall Corporation - Management and Business”.

 

COMENTÁRIO: É muito sabido que Jesus Cristo, também como CARPINTEIRO, deve ter vivido de forma mais próxima da atuação profissional de NOÉ, como retratado neste documento literário: “mordaz”. Por certo o SENHOR sabia exatamente qual era o OBJETIVO, que nunca DESPREZOU, e para alcançá-lo não se cercou das pessoas mais competentes/instruídos possíveis (como os DOUTORES DA LEI e SACERDOTES). Sim, se cercou de pessoas perfeitamente HUMILDES, até ignorantes, e que efetivamente “VESTIRAM A CAMISA” e se comprometeram em alcançar o OBJETIVO que lhes ia sendo apresentado por JESUS CRISTO. Por certo Jesus Cristo aceitou as coisas como são, cheias de imperfeições e isso se reflete na natureza muito diversificada das pessoas que foram chamadas, em geral pessoas consideradas sem valor. Até recentemente teriam sido o equivalente a negros e indígenas dos EUA chamados a Presidir a Igreja ou construir a ARCA DE NOÉ, mesmo não tendo uma formação exemplar e um passado familiar nada glorioso na Igreja. Vê-se que a construção de um grande estaleiro (e coisas muito grandiosas e de pouca utilidade) teria sido um provável acontecimento neste relato, se tivesse havido generosa prorrogação de prazos para construção do “barco”, adianto a “enchente”. O fato é que o essencial é o investimento de todas as forças e recursos para se alcançar os objetivos. Postergando-se/cortando-se tudo o que é supérfluo, como o tal leite de cabra ou querer utilizar-se somente do que é perfeito demais (em termos humanos e materiais, ao invés de utilizar às vezes uma madeira carunchada e aplicar um revestimento de betume, usando uma mão de obra nada qualificada, como a que o Senhor utilizou). É possível que tenhamos esquecido o REAL OBJETIVO e DADO ATENÇÃO DEMAIS AO SUPÉRFLUO e AO QUE PODE SER SIMPLIFICADO ou ELIMINADO. Quem sabe o orgulho nos levou a ser inscritos nos Livros de Recordes: satisfazem as vaidades e glórias humanas.

 

 

Creio que devia haver bastante trabalho para carpinteiros, como José e Jesus Cristo, nas imediações de Nazaré e de Jericó. Quem sabe para construir algum grande palácio e/ou cidade militar Romana? Jesus e José devem ter trabalhado de forma humilde, sem os excessos de planejamentos e de sofisticados procedimentos relatados a seguir, e que foram a causa da Ruína. Por certo uma frondosa figueira pode ser grandemente penalizada se vive de forma sofisticada mas não cumpre adequadamente seus objetivos. Neste caso, o grande machado pode ser originado de comentários e ensinamentos, como os de Jesus Cristo e de pessoas como Paulo, este guiado/agindo através de revelações pessoais, e que levou a porção Nazarena da Figueira, extremamente Frondosa, vir a definhar e ser absorvida pela débil porção Cristã da figueira bem adaptada aos gentios.

 

 

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *

 

Absalão era um homem que se podia conceituar como justo. Era um estudioso e quando repetia os sábios dizendo que os lados de um quadrado eram iguais, realmente tornava-se difícil entendê-lo. Dos seus 65 anos de idade, a maior parte havia dedicado à arte da guerra, onde conceitos técnicos e científicos eram aplicados. Particularmente, era apaixonado pela organização das forças de com­bate e o uso de armas avançadas, tais como lanças de grande alcance, setas orientadas e na última novidade bélica: o lançador de pedras. Era um verdadeiro genera1. Com o avanço da idade e o aumento correspondente da sabedoria, Absalão também se preocupava com assuntos humanos, os quais, porém, o perturbavam um pouco. O Criador não era reverenciado, como no seu tempo, os filósofos eram ridicularizados, havia uma inversão completa na política, acre­ditava-se mais na energia e na estultice dos jovens, do que na ponderada e na segura orientação dos mais velhos.

 

Um dia Absalão andava pela ravina, imerso em seus pensamentos, quando, de repente – “PUFF” - uma nuvem de fumaça apareceu, acompanhada de uma voz tronitoante:

 

                          ABSALÃO!

 

Absalão prostrou-se apavorado. Só podia ser o Criador, pensou.

 

E era. Em Pessoa!

 

                                     ABSALÃO - voltou a voz - NÃO ESTOU CONTENTE COM OS HOMENS. ESTÃO POLITIZADOS; GUERREIAM ENTRE SI E SÓ DEFENDEM INTERESSES PESSOAIS. O TRI­NÔMIO “ADÃO – EVA -COBRA”, DEU NISSO AÍ...  FA­REI CHOVER POR 40 DIAS E 40 NOITES, ATÉ COBRIR A TERRA DE ÁGUA. ISSO SERÁ CONHECIDO COMO “O DI­LÚVIO”. VOU MATAR TODO O MUNDO. MAS QUERO UM NOVA HUMANIDADE, NASCIDA DE UM HOMEM INTE­LIGENTE, PRÁTICO E COM OBJETIVOS. E CONSTRUA UM BARCO PARA VOCE E SUA FAMÍLIA E COLOQUE DENTRO UM CASAL DE CADA SER VIVO. VOCE TERÁ 4 MESES PRA ESTE EMPREENDIMENTO. MEU CONTATO COM VOCÊ SERÁ DORAVANTE O ARCANJO GABRIEL, QUE COSTUMAM CHAMAR “MINISTRO DE DEUS”.  PUFF!... e a nuvem se foi.

 

Absalão levantou-se lívido. O Criador elegera-o gerador da nova Humanidade! Todas as suas idéias seriam propagadas para o futuro!

 

Mas, Absalão nada conhecia de barcos, nem de navegação, porém não discutiu para não perder a grande oportunidade dada pelo Criador. Absalão era um sexagenário e estava difícil ganhar a vida com o status de que se achava merecedor. Porém ... . 4 meses  ... era muito pouco tempo. Era preciso resolver um problema técnico - construir um barco enorme. Que objetivo! Absalão provaria que era capaz de salvar a Humanidade com a sapiência dos mais velhos, usando a energia dos mais jovens!

 

Absalão rebuscou a memória. Conhecia um engenheiro naval chamado Neul, não - Noé! Sim, era este o nome. Noé poderia construir-lhe o barco. Absalão seria o coordenador do EMPREENDIMENTO e Noé seria o elemento técnico. Tão logo pensou, tão logo já conversava com Noé.

 

- “Meu caro, disse Absalão, quero encomendar um barco,  e dos grandes!”

 

         ”Sim, senhor, mas qual o tipo, para qual carga, para que navegação?”... .

“—  ”Sim, sim, Noé, isto são detalhes. É um barco para grande carga e águas pesadas. Quero fazer uma longa viagem com a família e levarei tudo.”

 

             ”Está bem, senhor. Aqui mesmo temos floresta com madeira de densidade 0,8 g/cm3, com quantidade suficiente. Se a carga é grande, faremos o centro de gravidade baixo e o centro de empuxo alto, de modo a obter grande estabilidade. .Acho que com 10 bons carpinteiros, que consigo arranjar, e mais 1 mês de trabalho duro, estaremos com o barco pronto...”

 

          - “Perdão, caro Noé, não quero interrompê-lo, mas como pode ter certeza desta cadencidade da madeira? E se os homens são realmente competentes? E se trabalharão com eficiência?”

 

                           ”Senhor, a unidade a que me referia chama-se densidade e os homens são carpinteiros, meus velhos conhecidos...” .

 

 ”Não, não, Noé - disse Absalão com um sorriso de condes­cendência - este EMPREENDIMENTO é grande e a coordenação é minha. Serei como que um Presidente e você será o técnico. Combinado?”

 

“—  ”Combinado, Senhor Presidente, o barco é seu e quem manda é o Senhor”, retrucou Noé, dando de ombros. Levantou-se para cumprimentar Absalão e retirou-se.

 

Absalão pensou: puxa, não havia pensado nisso! São precisos carpinteiros para cortar as árvores e construir o barco.

 

E preciso selecionar bem estes homens pois o EMPREENDI­MENTO não pode fracassar.

 

Ah! Já me lembro. Meu auxiliar na cruzada santa de TRÊS PEDRAS fez ótima seleção de lanceiros. Roboão é o seu nome.

 

Hoje está selecionando beterraba para as indústrias egípcias, mas virá trabalhar comigo, por um salário um pouco maior.

 

 

                                                                 *   *   *

 

 

 

 

                -   “Mas, Chefe, se o técnico disse 10 carpinteiros, precisamos no mínimo de 15. O Senhor sabe, faltas, doenças, férias, ‘turn­over’... .. E para selecionar bem 15 homens temos que explorar um Universo de pelo menos 150 a 200 homens. Levarei algum tempo para isso e precisarei de auxiliares.”

 

                 -  “Confio em você, Roboão. Já fez um bom trabalho para mim e tem grande experiência com Pessoal. Realmente, achei Noé muito simplista. Convide quem você achar melhor para realizar o recrutamento e a seleção dos homens para a tarefa. Mantenha-me informado!”

 

“— “Certo, Chefe. Obrigado pela confiança. Sairei em campo imediatamente.”

 

Temos assim 5 recrutadores e 10 examinadores para a fase de seleção, menos do que 10% dos candidatos esperados!”

 

     -   “E quanto ganharão?”

 

     -    “O salário desta equipe varia de 8 a 12 dinheiros, por serem especialistas. Chefe, um probleminha a mais. Não quero res­ponsabilidades com o Numerário e não sou bom em contas. O trabalho com o pessoal é bastante. Não acha melhor termos um homem para a gerência financeira do EMPREENDIIMENTO?”

 

     -  “Bem lembrado Roboão! Mas não conheço nenhum e deve ser um homem de confiança!”

 

     - Chefe, se me permite, quero lembrar-lhe o Judas, aquele nosso velho Capitão, que se ocupava dos dinheiros da força de combate.”

 

     -  “Não, não, Roboão. Este negócio de dinheiro, com o pes­soal das armas não dá certo. Pensemos em outro, deve ser espe­cializado na coisa... . Você me compreende...”

 

     - “Então, Chefe, podemos fazer uma seleção entre candidatos. Sairei em campo!”

 

          O EMPREENDIMENTO crescia de vento em popa. As equi­pes de recrutamento e seleção estavam em plena operação. As finanças tinham um responsável.

 

          Mas, onde colocar este pessoal! Absalão partiu, com seu habitual ­dinamismo e logo adquiriu uma grande cabana de madeira, já com divisórias e tapetes e contratou imediatamente o pessoal de Zeladoria e Segurança, convidando alguns antigos conhecidos das forças de combate. Iniciou-se assim a operação em grande escala.

 

*   *   *

 

 

 

 

 

-       “Senhor Presidente, falou timidamente a graciosa recepcionista, está aqui o Dr. Noé com alguns desenhos e ... “

-      

    -    “Minha filha, lhe disse para não me interromper. Diga ao Dr. Noé que

falo com ele após o almoço.”

 

 

Esta noite Absalão dormiu satisfeito. Após a missão do Se­nhor, em menos de 24 horas tinha o técnico e o especialista em pessoal.

 

Dormiu embalado ainda pela algazarra de sua família (20 mem­bros) na festa de inauguração do lançamento do EMPREENDI­MENTO.

 

O  2º dia amanheceu tranqüilo e claro.

 

O  Presidente foi acordado por Roboão, com boas notícias.

 

     -  “Chefe, já tenho 5 homens anunciando no povoado. É a fase do recrutamento. De acordo com o mercado, estamos ofere­cendo 5 dinheiros!”

 

       -    “Mas, Roboão, minha mulher ganha 9 dinheiros cosendo para fora...; não será pouco?”

 

     -  “Deixe comigo, Chefe. No recrutamento da última batalha pagamos 8 dinheiros para valentes combatentes. Estes são apenas carpinteiros, que não podem ser comparados com a sua senhora.

 

Absalão continuou a entrevista com o futuro gerente de Mate­rial – Jacob, também seu velho conhecido de carreira, dos tempos da campanha do Sinai.

 

       -    “Pois é, amigo Jacob, preciso cercar-me de gente de con­fiança para o sucesso do EMPREENDIMENTO. Material é uma área delicada; não tolerarei desvios de estoques e má especialização dos itens.”

 

      -   “Certo, Chefe! Sabe que pode confiar em mim. Nunca sumiu uma flecha ou lança no meu tempo. Mas o armazenamento de madeira necessita de um almoxarifado adequado e de um bom almoxarife. Para o controle, necessitarei de alguns arquivos Kardex, prateleiras e pessoal de apoio.”

 

      -   “Justo, Jacob. Encomende as prateleiras na carpintaria do povoado e fale com o Roboão para o recrutamento do pessoal ne­cessário.”

 

Neste momento entrou Job, o secretário executivo do Presidente. Jacob afastou-se discretamente.

 

     -  ”Senhor Presidente, acaba de chegar um relatório da Segu­rança, indicando certos nomes que não devem ser contratados. Há suspeitas de que alguns não sejam bem confiáveis.”

 

     - “Ótimo trabalho do Gau - jamais lhe faltou a intuição. Precisamos estar alerta!”

 

      -   “Ah! outra coisa, Sr. Presidente, o Dr. Noé telefonou no­vamente. Parece aflito para aprovação de alguns desenhos.”

 

        -   “Ora, este Noé! Sempre querendo me confundir com ci­dades de madeira, centros de fluxos, etc. Ele acha que não posso, sozinho, me responsabilizar pela aprovação desses desenhos. Diga-lhe que nomearei um grupo de trabalho: O GT BAR, grupo de trabalho do barco, para dar-me um parecer. O rapaz é bom de projeto, mas nada entende de custos ou de administração por obje­tivos! Mas teremos tudo nos eixos, tão logo chegue o meu chefe de Administração; vai colocar ordem e método nessa turma. Quero ver produção!”

 

 

*    *    *

 

15 dias se passaram e o cronograma proposto já estava na mesa do Presidente. Uma Diretoria das Coisas (DC), uma dos Investimentos (DI), e uma de Barco (DB).

 

A DB havia montado um laboratório especializado para a medida de densidade da madeira, análise de fungos e cupins e já estavam instalados os equipamentos para medida de elasticidade e flexibilidade.

 

A Administração, em apenas 15 dias, havia elaborado as novas provas de seleção para arquivistas de desenho naval, provas de se­leção do pessoal de seleção e recrutamento, pessoal de apoio, etc.

 

Roboão, como cumprimento ao Chefe, havia mandado comprar uma charrete, último tipo de 6 rodas e boléia separada, já acompanhada do charreteiro. Naturalmente houve pequeno atrito com Jacob (Chefe do Material) mas, como eram antigos companheiros de armas, o incidente foi esquecido e contornada a Auditoria.

 

            Naquela noite Absalão estava cansado, mas não pode esquivar-se de receber Noé em sua residência.

 

     -   “Sr. Presidente, desculpe-me interromper o seu descanso, mas o projeto está pronto e as pessoas do CT - BAR ainda não foram nomeadas.”

 

          “O material está especificado, porém o laboratório ainda não emitiu o laudo de aprovação da madeira e não conseguiu os carpinteiros para o corte... . Se o Sr. Presidente pudesse autorizar-me a trazer os carpinteiros conhecidos do povoado...”

 

     -  “Não se preocupe, Noé. Falarei amanhã com o DB, e apressarei a contratação do pessoal. Você sabe, apesar de ser Presidente, não posso mudar as normas da organização, autorizando diretamente seus carpinteiros. Se o fizesse não precisaria delas. Da chefia vem o exemplo do cumprimento das normas. Não se preocupe que o EMPREENDIMENTO está nas mãos de profissionais –os melhores. Boa noite Noé...”

 

Noé afastou-se sem entender muito bem. Havia sido convidado para construir um barco. Agora estava às voltas com normas, instruções, exames de seleção... Balançando a cabeça -  as coisas devem ser complicadas mesmo e o Presidente é um homem capaz, senão, não seria Presidente. Partiu otimista para sua cabana. Se o presidente disse, é porque tudo vai indo muito bem.

 

                                                   *   *   *

 

 

                   25º  dia. Manhã linda. Job  anuncia a chegada do Roboão.

 

      -   “Entre logo, meu velho, sente-se. Aceita um leite de ca­bra?”

 

            -  “Sim. Chefe, obrigado. Por falar nisso, segundo a lei, man­dei distribuir leite de cabra pela manhã e pela tarde, para todos. Já está até codificado o material, para o controle pelo computador. Mas para isso foi necessário adquirir 200 cabras, alugar um pasto e contratar 5 pastores. Jóia, Chefe! Veja só: dá 40 cabras por pastor e os pastores só ganham 10 dinheiros!”

 

       -  “Você é um bicho na administração de pessoal. Roboão. Falarei ao seu Diretor para propor sua promoção na próxima vez. Como vai a sua avaliação pessoal?”

 

      -  “Realmente não sei, Chefe. É confidencial.”

 

     -  “Darei um jeito para que seja boa, afinal temos 500 pessoas no efetivo e todas passaram por você. E você ainda con­seguiu comprimir o quadro, que era 800 pessoas! Quanto eco­nomizamos em média?”

 

    -  “Nessas 300 pessoas, cerca de 4.000 dinheiros, Chefe!” respondeu Roboão com um sorriso de modesta satisfação. Talvez fosse aumentado para 30 dinheiros, pensou.

 

     -  “Roboão, não quero incomodá-lo e nem por sombra desfazer do belíssimo trabalho de sua equipe, mas Noé me disse que ainda não foram contratados os carpinteiros para o corte.”

 

      -  “Ora, Chefe, Noé é um sonhador. Só pensa nos seus bene­fícios. Já lhe expliquei a complexidade da contratação. Por exem­plo: aumentamos a oferta para 6 dinheiros porém todos os car­pinteiros candidatos foram reprovados no 1º psicotécnico. Não adianta contratar pessoal sem aptidão psico-profissional para o corte da madeira. Se não passam nem neste exame, imagina nos outros.

 

Além disso, o psicotécnico deve ser o primeiro exame para eliminar logo os agressivos. O Sr. sabe, com toda essa madeira para cortar, pode haver acidentes muitos sérios...”

 

          -  “Realmente, você tem razão, Roboão. Noé desconhece o que é uma boa organização. Toque como você achar melhor. Se o contratei é porque tenho total confiança no seu trabalho. .

 

                                                                                                                                                                                                                                                                  *   *   *

 

 

 

 

 

                 40º  dia. Finalmente a primeira reunião da Diretoria.

 

       Era o momento solene das grandes decisões de cúpula do EMPREENDIMENTO. Todos com seu melhor terno, sentados à mesa de reunião com suas pastas tipo 007.

 

O Presidente -  satisfeito -  relatava que o EMPREENDI­MENTO era o orgulho do povoado.

 

Havia muito trabalho e emprego para todos.

 

Aproveitando o clima de satisfação, o DC informou que havia feito um convênio com a Escola de Carpinteiros, pois a mão-de-obra necessária estava aquém do treinamento necessário.

 

Além disso, havia criado o Departamento de Recursos Huma­nos com a missão de retreinar os carpinteiros para a técnica naval e também treinar datilógrafas, secretárias, auxiliares para adminis­tração. Havia também criado um Departamento de Segurança e Higiene do Trabalho, por força de lei. O ambulatório atendia 20 pessoas por dia.

 

O   DB, aproveitando uma brecha do DC, ponderou timidamente que faltava papel para desenho e que a eficiência dos carpinteiros era baixa: havia só um e que cortou 3 árvores, sendo duas bichadas, de acordo com o último relatório do Controle de Qualidade. Noé, o técnico, estava tentando suprir a falta, desenhando em folhas de bananeiras e cortando árvores à noite, após o expediente.

 

Quando o DB propôs aumentar o salário - de Noé para 15 dinheiros, o DC explodiu, seguido de perto do DI.

 

                  -  “Estes tecnocratas paisanos não funcionam e ainda querem aumento! Sr. Presidente, sou de opinião que devemos aumentar a equipe de recrutamento e apertar as provas de seleção. Nossa equi­pe técnica deixa muito a desejar!”

 

        -  “Perdão, retrucou o DB - O laboratório funciona! Veja como detectou as árvores bichadas. Acontece que não temos o necessário. O Sr. está desviando recursos para a área de Operação do barco, recrutando timoneiros, taifeiros, etc.”

 

      -   “Mas é lógico, -  interveio o Presidente -  temos que agir com antecedência no treinamento. Treinar é investir no futuro!”

 

 

*   *  *

 

 

 

 

80º dia. Absalão passeava na ravina. Estava orgulhoso. Era Presidente de um EMPREENDIMENTO que já contava com 1.200 pessoas.

 

As preocupações de Noé eram infundadas.

 

Não passava de um tecnocrata pessimista.

 

Felizmente já havia o Diretor Técnico para despachar com Noé, menos um aborrecimento.

 

Subitamente - “PUFF” -  uma nuvem de fumaça.

 

O MINISTRO DO SENHOR! murmurou Absalão prostran­do-se.

 

      -  “ABSALÃO, PONHA GENTE DE MAIS PESO NO TOPO, CASO CONTRÁRIO O EMPREENDIMENTO AFUNDARÁ”. “PUFF”.

 

Absalão correu à cabana de Noé.

 

        -  “Noé, Noé, ponha um convés no alto do mastro. Vou colo­car as pessoas mais pesadas em cima.”

 

       -  “Mas Presidente, isto é impossível. . . Sempre o convés é em baixo e o mastro aponta para cima. Se aumentarmos a  massa no topo, o barco vai embora.”

 

         -  “Não discuta alimentação agora comigo Noé!”

 

         -  “O MINISTRO mandou colocar homens pesados no topo e é isto que vou fazer ... . e cumpra as minhas ordens!”

 

Noé não retrucou. O Presidente estava nervoso.

 

Talvez Job pudesse fazê-lo ver mais claro...

 

            Noé correu à Secretaria Geral, mas lá encontrou o Coman­dante de Operações do Barco, que esperava há duas horas. Com ele estavam o Sub-comandante nível 3, o imediato, o pré-imediato, dois assistentes e três assessores.

 

        -  “Noé -  disse o Comandante -  o seu projeto não anda! Como vou treinar meus homens sem barco”? Vou pedir aprovação do Presidente para adquirir um simulador de barco, caso contrário não me responsabilizo. O DI diz que minha razão de Operação está horrível, mas alocou custos só na minha área! Já reparou quantas pessoas de apoio tem o Departamento de Apoio?”

 

Noé balançou a cabeça e retirou-se vagarosamente. Realmente, o que ele conseguira? Uma meia dúzia de desenhos e alguns em folha de bananeira. Isto em 80 dias. Ele havia prometido que faria o barco em 120 dias ao Presidente! Estava acabrunhado e sentia-se um incompetente. Mas, o que estaria errado?

 

 

*    *    *

 

 

 

 

O  Presidente entrou furioso, desabafando em Job.

 

       -  “Veja só! Faltam apenas 40 dias e a Divisão de Impor­tação diz que há crise de transportes e a madeira só chegará no prazo média de 10 dias! O pessoal de PO, mais o de O&M junto com o CPD já fez tudo para diminuir o caminho crítico de um tal de PERTO -  mas tou vendo tudo longe!”

 

       -  “Quero um reunião de emergência com os Diretores. Vou despedir o Setor de Carpintaria e contratar outro.

 

       -  “Se não fosse o Roboão com a equipe de Recrutamento, não sei o que seria...”

 

         -  “Mas Presidente, perguntou Job, faltam 40 dias para quê”

 

        -  “Para o dilúvio, meu filho, para o Dilúvio!”

 

Envie o seguinte TELEX (* hoje seria o E-MAIL):

 

 

De:      Absalão Presidente (AP)

 

Para:  Senhor Criador (SC)

 

SOLICITO PRORROGAÇÃO PRAZO RESTANTE 40 DIAS. DIFICULDADES TRANSPONÍVEIS CRISE INTERNACIONAL DE MADEIRA. PROSTRAÇÕES. ABSALÃO.

 

O  ruído monótono da teleimpressora deixava Absalão ansioso mas a resposta veio finalmente.

 

 

Do:     Senhor

 

Para:   Absalão

 

CONCEDIDO PRAZO MAIS CINCO DIAS IMPRORROGÁ­VEIS. ELEVAÇÃO DE ÁGUAS EM ANDAMENTO.

 

Absalão desesperou-se e partiu para a reunião. Job pelo tele­fone interno iniciou a telefofoca do Dilúvio.

 

*   *   *

 

 

 

82º    dia. Gau adentra o Gabinete do Presidente.

 

       -  “Chefe, tenho aqui um relatório de que há desvio de cipó de amarração no almoxarifado. A listagem do computador não bate com a Auditoria.”

 

        -  “Que inferno, Gau! Coloque sua equipe em campo. Jacob está fora de suspeita por ser meu antigo companheiro de batalha. Verifique o pessoal da carpintaria.”

 

           -  “Mande um memorando ao Roboão para aumentar a equipe de segurança.”

    

                           -  “Job, ponha o Roboão na linha...”

 

               -  “Roboão? Aqui é o Presidente. Já recrutou os carnin­teiros?”

 

-         “Infelizmente não passam nos testes psicotécnicos, meu chefe.”

 

      -  “Já até afrouxamos essas provas, mas o exame de reconhe­cimento de tipos genéticos de cupim reprova todo mundo. E por isso que a madeira do estoque está bichada. conforme o relatório do Departamento de Material.”

 

                     -  “Presidente! interrompeu Job é urgente: dois pas­tores na ante-sala dizendo que há crise de leite nas cabras e não está havendo distribuição aos funcionários por uma semana. O Suprimento parece que não providenciou capim no secado pasto... Qual a sua decisão?”

 

                                                    *   *   *

 

 

 

 

 

100º dia. Reunião da Diretoria.

 

       -  “Sr. Presidente falou o DI dentro de uma semana vencem nossos empréstimos internacionais, com os povoados vizi­nhos e a caixa não é suficiente. Nosso EMPREENDIMENTO econômicamente vai muito bem, mas financeiramente estamos à beira de uma crise de insolvência de caixa forçando uma redução de pessoal!”

 

       -  “Toda vez que se fala em reduções, todos olham para mim - explodiu o Comandante de Operações. Sem meus homens não operação do barco, que nem sairá do porto. E meu simulador ainda não foi aprovado!”

 

        -  “Sr. Presidente, -  timidamente tentou o DB -  acho que o Comandante tem razão, mas não prometemos ao MINISTRO que o barco estaria pronto em breve? Mas ... . sem material.”

 

            -  “Como posso fabricar madeira? -  gritou o DC -  meu laboratório não acha a madeira local e há crise de transporte! Os carpinteiros são incompetentes... . .; e este tal de Noé! Que fez ele até agora? E ganha 10 dinheiros.... !” . .

 

           -  “Senhores” falou gravemente o Presidente.

 

Todos olharam esperançosos.

 

           -  “A situação do EMPREENDIMENTO é razoável, mas te­mos que tomar uma atitude mais séria quanto ao projeto do barco...”

 

               -  “Presidente, não quero interrompê-lo, mas em nossos arqui­vos não constam os exames de admissão de Noé e nem sabemos se ele é mesmo Engenheiro Naval...” .

 

                 -  “Sim, a culpa é minha, falou o Presidente, mas quando contratei Noé ainda não existiam as normas do EMPREENDI­MENTO.”

 

“—   ”Tudo era muito improvisado naqueles dias, Sr. Presidente, e  a culpa não pode ser somente aceita por V. Exa., acrescentou a DI...”

 

“—  “Esse Noé é um oportunista sem escrúpulos, querendo se fazer passar por Engenheiro Naval sem ter freqüentado nenhum curso regular...”

 

                                           -  ”Ele é um bom homem -  concedeu o Presidente.”

 

          -  “Mas está desviado de função, Sr. Presidente...” -  redarguiu o Comandante de Operações.

 

            - “Não podemos permitir que o mau exemplo prolifere! Que vou dizer ao meu pessoal? Como vou manter a moral da equipe, permitindo que eles pilotem um barco construído por um arrivista qualquer, que nem Engenheiro é?”  acrescentou o Comandante.

 

                -  “Não há outra solução, Sr. Presidente...”

 

Todos se entreolharam. Alguns começaram a rabiscar flechas nos blocos de anotações. ABSALÃO calado. Por fim decidiu:

 

          -  “Noé está despedido!”

 

E virando-se para Roboão:

 

-  “Providencie a anotação em sua Carteira de Trabalho...”

 

            -  “Mas, Chefe, nem Carteira ele tem...”

 

             -  “É isso! Um desorganizado total! Cada vez mais me con­venço do erro de tê-lo convidado! Notifique-o então que ele esta sendo despedido “No interesse do EMPREENDIMENTO...” .

 

Noé realmente ficou furioso com a notificação. Nem exi­giu a fração do 13º salário que lhe cabia. Estava disposto a sair daquela terra e o caminho mais fácil era pelo rio. Partiu para a floresta e reuniu 5 companheiros

 

          -  “Amigos, vamos cortar estas árvores bichadas mesmo, cons­truir um barco e sair daqui!”

 

            -  “Mas Noé, nem somos carpinteiros e nem sabemos fazer barcos - -

 

           -  “Não importa. Ensinarei a cortar a madeira e já tenho OS desenhos. Faremos uma equipe motivada com o objetivo de cons­truir um barco para uma vida melhor em outras terras! Levaremos uns bichos a bordo para comer na viagem. Só falta meter mão àobra.”

 

A madeira começou a ser cortada. Lascas por todo lado. As partes mais bichadas eram isoladas e jogadas de lado. Mosquitos voavam ao tombar das árvores.

 

Em poucos dias, o casco do barco já tomava forma.

 

 

*    *    *

 

 

 

 

125º dia. O presidente acordou preocupado. A madeira ti­nha chegado, mas só havia 3 carpinteiros no Setor de Carpintaria. Sua charrete tomou o caminho mais rápido para o Escritório, para evitar o mau tempo. Nuvens pesadas cobriam os céus.

 

Absalão foi direto ao telex (E-MAIL) mas Job só chegava às 10 hs.

 

Absalão correu ao CPD (MICRO-COMPUTADOR).

 

           -  “O que há aqui? Não começou o expediente? Quem e você?”

 

           -  “Sou uma perfuradora, senhor. Há dias não há ninguém. Dizem que pelo Plano de Classificação de Cargos e Salários e pela política de promoções, não fica ninguém...”

 

Absalão voltou ao escritório. No caminho encontrou com Gau, que lhe disse preocupado haver um zum-zum acerca de um tal Dilúvio que poderia ser um terrorista, mas que sua equipe...”

 

Absalão ficou branco e correu ao telex.

 

           -  “Job, rápido!”

 

 

De:   Absalão Presidente (AP)

 

Para:    O Senhor Criador (SC)

 

             DIFICULDADES INSUPERÁVEIS COM PROJETISTA ATRASARAM EMPREENDIMENTO. SOLICITO PRORROGA­ÇÃO PRAZO.

 

A resposta foi imediata.

 

Do: Senhor

 

Para: Absalão

 

PRORROGAÇÃO NEGADA.

 

E começou a chover... Absalão correu para fora, seguido de Jacob. A chuva era forte, mas Jacob gritou:

 

-         “Chefe, há um barco descendo no rio. Veja na proa... está escrito ... está...”           

-          ARCA DE NOÉ!

 

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Caro leitor (SUD, possivelmente): sorria, discretamente, se você vestiu a carapuça durante a leitura!