TEIXEIRA DE PASCOAES

(1877-1952)


ANTIGA DOR

O subtil, o reflexo, o vago, o indefinido,
Tudo o que o nosso olhar só vê por um momento,
Tudo o que fica na Distância diluído,
Como num coração a voz do sentimento.
Tudo o que vive no lugar onde termina
Um amor, uma luz, uma canção, um grito,
A última onda duma fonte cristalina,
A última nebulosa etérea do Infinito...
Esse país aonde tudo principia
A ser névoa, a ser sombra ou vaga claridade,
Onde a noite se muda em clara luz do dia,
Onde o amor começa a ser uma saudade;
O longínquo lugar aonde o que é real
Principia a ser sonho, esperança, ilusão;
O lugar onde nasce a aurora do Ideal
E aonde a luz começa a ser escuridão...
A última fronteira, o último horizonte,
Onde a Essência aparece e a Forma terminou...
O sítio onde se muda a natureza inteira
Nessa infinita Luz que a mim me deslumbrou!...
O indefinido, a sombra, a nuvem, o apagado,
O limite da luz, o termo dum amor
Tornou o meu olhar saudoso e magoado,
Na minha vida foi minha primeira dor...
Mas hoje, que o segredo oculto da Existência,
Num momento de luz, o soube desvendar,
Depois que pude ver das Cousas a essência
E a sua eterna luz chegou ao meu olhar,
Meu infinito amor é a Alma universal,
Essa nuvem primeira, essa sombra d’outrora...
O Bem que tenho hoje é o meu antigo Mal,
A minha antiga noite é hoje a minha aurora!...


CANÇÃO MONÓTONA

Monotonia...
Sempre a imagem das coisas que nos pesa...
As mesmas tintas da Alegria,
O mesmo claro escuro da Tristeza...

Sempre no mesmo corpo a mesma doença: a vida!
Sempre a mesma elegia em sílabas de mágoa...
Sempre o mesmo perfil de serra empedernida,
Onde o inverno, a chorar, desenha espectros de água.
Nuvens de tédio abrindo a boca sobre o mundo...
Uma noite perpétua, emudecida e calma...
Negro pego de lágrimas profundo,
Estagnação da Dor em ermos longes de alma...
A memória em planície estéril e deserta.
Ouvir, de noite e dia, o choro duma fonte...
Sempre a mesma janela eternamente aberta
Sobre o mesmo horizonte...
Nos olhos sempre a mesma indefinida imagem...
Sempre a mesma roseira a florescer por mim...
Sempre o mesmo silêncio em formas de paisagem;
Ave sempre a cantar, dia de sol sem fim!
Um perpétuo sorriso à flor do mesmo rosto...
Num gélido cristal a mesma face absorta...
Sob um eterno sol-posto,
Eterna planície morta...
Em sons de espuma e névoa a eterna voz do Mar,
A morrer, a viver nos ariais de além...
Um eterno sepulcro à luz de eterno luar...
A mesma vida, em nós, vivida por ninguém...
Constante calmaria, eterno mar parado...
Este íntimo Alentejo em que se perde a gente...
Em nosso próprio ser o Tempo desmaiado...
O mesmo, o mesmo, o mesmo, em nós, perpetuamente!


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