A Tríade dos Imóveis (21-04-2001) Saldanha Sanches* «A obrigação legal de ocultar o IVA num país com os nossos hábitos tem custos no IRS, no IRC na taxa social única e em tudo o mais. É um incentivo fiscal à clandestinidade. Pode manter-se por mais algum tempo mas com um custo cada vez maior. Idem para a Contribuição Autárquica: como estamos a chegar ao fim do primeiro período de 10 anos sem inflação desde os anos 50, todos os anos, mais algumas dezenas de milhares de proprietários de casas novas e modestas são informados que devem pagar 100 ou 200 contos por ano.» A SISA, o IVA e a contribuição autárquica: é à volta deste trio que tudo tem de ser decidido na zona do imobiliário. A sisa tem de acabar; já se sabe. Chegou a um tal estado de inaplicabilidade e cresceu à sua volta uma tal expectativa de morte próxima que já ninguém a quer pagar. E quem diz sisa diz imposto de registo na compra e venda de imóveis. A sisa ou o imposto de selo que são uma e a mesma coisa. A sisa chamava-se imposto de registo até à reforma de 58/65 e o selo cobrado na escritura é o típico imposto de registo. Poderá manter-se a uma taxa reduzida, quase simbólica, mas não mais do que isso. E o IVA tem que passar a ser expressamente imputado ao comprador final: manter a situação como está com a ausência de dedutibilidade dos custos suportados a empurrar o construtor para a areia sem IVA, para tudo o que se puder arranjar sem IVA e para os subempreiteiros que não querem passar recibo é convidar o sector a procurar a economia paralela e a manter a ineficiência. Que consegue, apesar da mão- -de-obra ser mais barata, ter custos mais elevados do que na Espanha. Por causa dos terrenos, dos municípios, das taxas municipais… Também ajudam. Mas o impulso do IVA e o modo como favorece os marginais é uma espécie de crime público continuado. E IVA a que taxa? Actualmente com excepção dos terrenos e da parte que é a produção directa do construtor o IVA está a 17%. Que o construtor tem de repercutir integralmente sobre o comprador para não ver a sua taxa de lucro diminuída. Se deixasse de estar isento (não há nada mais capcioso do que estas isenções do IVA) chegaria a um momento da venda com um crédito igual a todo o IVA que tinha suportado. Os 17% adicionais iriam recair apenas sobre a percentagem do seu valor acrescentado, da sua quota de produção directa. Igual a 20%, 30%? Não mais. Em vez dos 10% da sisa que deveriam recair até sobre o IVA já suportado. Por razões também psicológicas a taxa de 12% seria útil. E num acórdão de 8 Março deste ano o Tribunal de Justiça das Comunidades em que, por queixa da Comissão Europeia, veio condenar o Governo português por causa da taxa de 5% sobre o vinho, veio afirmar que taxas reduzidas só para os bens do Anexo H da VI Directiva. Entre os quais A «a entrega,construção, renovação e modificação das habitações fornecidas ao abrigo das políticas sociais». Conceito suficientemente largo para que nele caibam todas as casas hoje isentas, total ou parcialmente, de sisa. No caso do vinho, Portugal está desde há longos anos em infracção indiscutível. Em 1996 a Comissão informou disso o Governo português, em 1998 interpôs a acção e em Março deste ano Portugal foi condenado: levando o eng. Luís Pato a afirmar na televisão que o IVA a 17% e o aumento de preços é ruína certa para o sector. O que se compreende dado o preço muito baixo por que comercializa os seus vinhos. Voltando do vinho para as casas, com taxa de 12 ou de 17% o IVA é indispensável. A obrigação legal de ocultar o IVA num país com os nossos hábitos tem custos no IRS, no IRC na taxa social única e em tudo o mais. É um incentivo fiscal à clandestinidade. Pode manter-se por mais algum tempo mas com um custo cada vez maior. Idem para a Contribuição Autárquica: como estamos a chegar ao fim do primeiro período de 10 anos sem inflação desde os anos 50, todos os anos, mais algumas dezenas de milhares de proprietários de casas novas e modestas são informados que devem pagar 100 ou 200 contos por ano. Uma autárquica bem distribuída (ou não tão mal distribuída) deveria ser a fonte de receitas principal das câmaras. Em vez da sisa e do enxame de taxas cobradas na altura da construção. Desde que haja coragem de aumentar as baixíssimas taxas sobre prédios antigos não arrendados. Talvez quando metade da Baixa de Lisboa forem ruínas sejam finalmente aumentadas as taxas da Contribuição Autárquica sobre prédios desocupados em áreas privilegiadas das cidades.Em tudo isto que escolhas haverá? Que margem para a decisão política? Nas questões centrais praticamente nenhumas: mexer neste vespeiro ou deixar tudo como está adiando todas as decisões. Sempre com base nestes três impostos. A situação é muito parecida em que se vivia antes de 1989: ou passar da confusão dos impostos múltiplos sobre o rendimento para o IRS e o IRC (o que iria ser, afinal, apenas o começo da reforma) ou deixar tudo como está. Não há nenhuma outra opção. *Jurista ssanches@mail.telepac.pt