Videogames e "O Crime"

Última atualização em 23/05/1998 / Volta para home page

"O Crime" é o título provisório para um vídeo interativo que está sendo desenvolvido na cadeira de Linguagem de Vídeo do curso de pós-graduação da PUCRS.

Este ensaio oferece comentários sobre as semelhanças e diferenças entre "O Crime" e videogames.

Acompanhe na home page relatos do processo dia a dia da produção deste projeto.

A história de "O Crime" adota uma postura tradicional quanto à maneira de contar os eventos da trama. Enquanto espectadores, seguimos na maioria do tempo o olho da câmera como narrador silencioso da história. Em alguns planos temos a visão dos personagens, seu ponto de vista. Vemos o desenrolar com os olhos dos criadores, e não das criaturas.

Ao contrário de jogos como "Doom" ou "Duke Nukem", onde o jogador está sempre imerso no papel de protagonista da história. Se ele não matar os demônios, quem o fará? Se ele não matar, além disto, será morto num piscar de olhos. Este conflito rasteiro (para a dramaturgia) combinado ao envolvimento do ponto de vista pessoal em 100% do tempo faz destes jogos um passatempo intenso e envolvente.

Jogos como Super Mario 64 ou Tomb Raider oferecem um protagonista em tela, e enquadramentos feitos por uma câmera fluida, centrando onde está a ação. O envolvimento vem das respostas rápidas aos controles do usuário, fazendo o que está na tela parecer uma extensão de seu corpo. Independente de seu sexo ou idade, é difícil não gostar da exploração dos mundos de Lara Croft (protagonista de Tomb Raider) ou Mario.

As "locações" dos videogames refletem exatamente as possibilidades expressivas dos jogos. Em "Quake", por exemplo, você tem corredores, salas fechadas, demônios ocultos, armas de bônus, etc. Correr, pular, abaixar e atirar são as possíveis ações do protagonista frente às legiões do inferno. Uma linguagem essencialmente não verbal.

No cinema, por exemplo, a cena de Indiana Jones correndo da bola gigante no "Caçadores da Arca Perdida" poderia bem ser parte de um videogame se refletisse apenas a ação. Lara Croft, assim como Indiana Jones, é ambiciosa e caça tesouros. Parecido com Indy, Lara também se vê em armadilhas e apuros. O que os diferencia é que o Dr.Jones mostra ao espectador medos e conflitos (ganhar o tesouro ou salvar a mocinha? entre eles) enquanto que Lara é limitada pelo seu número de vidas e munição, resolvendo sua natureza de personagem através de conflitos físicos ou puzzles.

Os dispositivos com que controlamos os jogos oferecem a possibilidade de informar ao computador ou videogame basicamente informações direcionais e aperte isto ou aquilo. A linguagem verbal, assim como a não verbal, é bem mais ampla do que isso. E este é um problema que vem recebendo muita atenção de desenvolvedores de jogos e designers de interfaces.

Idealmente, o espectador (ou jogador, se preferir) deveria poder escolher mais de uma maneira de como resolver um problema em um jogo. Se você não sabe lutar, fuja. Ou tente ganhar tempo. Ou chame um amigo para não apanhar sozinho. Muitos reclamam contra a violência nos videogames por que eles educariam (NOTE BEM: EDUCARIAM) as crianças a saberem reagir apenas com agressão para resolverem suas vidas.

Em "O Crime" temos um primeiro contato com estas muitas possibilidades de resolver a trama. O homem pode matar a mulher. Ou o contrário. Ou podem se beijar e tudo acaba bem. Ou o homem pode ser atropelado. Ou vermos a reação do vizinho um dia depois do assassinato. Pegar a história em seu começo permite mudar seu gênero enquanto se desenvolve, e, portanto, mudar os "verbos" pertinentes a ela.

"O Crime" não é um videogame basicamente porque o envolvimento com a trama e seus personagens se dá em com um ritmo e características de uma narrativa tradicional. A proposta de trabalhar com seqüências pré-gravadas em vez de mundos inteiramente exploráveis também aproxima o olho do espectador do olho dos autores, ao invés de deixá-lo a seu gosto. Os caminhos por onde a trama pode se desenvolver foram cuidadosamente planejados, produzidos, gravados e editados. Pouco foi deixado ao acaso.

Mas será que isto é evidente para os espectadores? Será que eles não vão se embaralhar com diferentes possibilidades de uma trama? Como um trabalho experimental, "O Crime" não tem a obrigação sagrada de acertar em cheio todos os alvos. Mas sim de estabelecer um primeiro passo e levantar mais questionamentos sobre o tema. Perguntar talvez seja até mais importante do que responder neste estágio.



Desenvolvido por Roberto Tietzmann (rtietz@zaz.com.br)