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Alexandre Matias

20021220iron.jpg (14102 bytes)"Você deve ir até o fim". E é claro que iríamos. Afinal, por mais assustadores que pudessem ser os 100.08 minutos orgulhosamente estampados na contracapa do disco duplo, eles eram preciosíssimos. Era a maior banda de heavy metal do planeta em seu melhor momento fazendo o que fazia de melhor no melhor lugar possível, o palco. Desde que se apresentaram no Rock in Rio, trazendo o mostrengo Eddie e a incrível múmia-esfinge, que cuspia fogo pelas ventas, o Iron Maiden era sinônimo de rock pesado e seus shows eram momentos de catarse coletiva e profissionalismo.

Historicamente, Live After Death, o disco em questão, marca o começo do declínio do Iron. A importância primordial do grupo encontra-se logo em seu início, quando, após o impacto do punk, o grupo liderou a chamada New Wave of British Heavy Metal. Mas no começo, o Iron era uma banda de rock pesado, não uma de heavy metal. Discos como Iron Maiden e Killers estavam repletos de energia e vigor, mas o metal clássico (desenvolvido pelo Led Zeppelin) passava longe dali. Muito por conta do vocal de Paul D’Ianno, uma espécie de Dee Dee Ramone do metal, pela guitarra suja de Dennis Stratton e por sua atitude rebelde: eram a primeira banda desde o The Who a tocar de verdade no tradicional Top of the Pops. Com cacetadas como "Prowler", "Charlott the Harlott", "Running Free", "Killers", "Wrathchild" e "Murders in the Rue Morgue", o Iron de Paul D’Ianno injetava doses pesadas de rock no cansado metal do final dos anos 70 – um gênero que havia se dividido entre o pop (Cheap Trick, BTO), a paródia (Queen, Ozzy Osbourne no começo) e a falta de criatividade (Led Zeppelin, Deep Purple), cambaleando devido ao impacto do punk. O Maiden em seus primeiros anos era uma injeção de adrenalina no metal. Se foi o punch do punk que salvou o metal nos anos 80, a Dama de Ferro em seus primeiros dias era o Buzzcocks do gênero. Só que D’Ianno fazia jus ao espírito rocker da banda e, depois de brigas e bebedeiras, foi chutado pra fora do grupo.

A entrada de Bruce Dickinson (do épico Samson) e do guitarrista Adrian Smith ampliaram a importância do baixista Steve Harris. Principal compositor da banda, Harris descobriu uma fórmula secreta: compunha canções sobre o cavalgar de seu baixo, deixando campo livre para os dois guitarristas (Smith e o fundador Dave Murray) trabalharem riffs em duas vozes (as famosas terças e quintas, o pit-shifter humano) trotando por sobre o baixo, que guiava a canção ao lado da bateria (de Clive Burr, que entrou no lugar do fundador Doug Sampson). O vocal berrado de Bruce era mais versátil que o de D’Ianno e às vezes descambava para o operístico. O tempero era acrescido pelo tema mais clássico do heavy metal, o que faz o vínculo do gênero com o blues – o satanismo. E The Number of the Beast (com clássicos como "Hallowed Be Thy Name", "The Prisioner", "22 Acacia Avenue" e "Run to the Hills", além da faixa-título) transformava o Iron em uma banda de metal clássico.

Piece of Mind continuava a linha ascendente da carreira do grupo (e dava espaço para a entrada do baterista Nicko McBrain, com estandartes do gênero como "The Trooper", "The Flight of Icarus", "Where Eagles Dare" e "Revelations"), que prosseguiria em Powerslave. O disco do Egito, com o mascote Eddie feito faraó na capa, cortesia do genial Derek Riggs (talvez o principal motivo pros fãs do Iron entrarem no culto à banda), e a presença de hinos como a faixa-título, "The Rhyme of the Ancient Mariner", "2 Minutes to Midnight" e "Aces High" mostravam que a banda chegava à maturidade. A instrumental "Losfer Words" (ou "Big’Orra") mostrava que a banda estava mais precisa e segura que nunca, e qualquer som que eles tocassem juntos teria a cara do Iron Maiden.

Começava então o declínio. Somewhere in Time, o disco futurista, mostrava a banda muito mais preocupada com um conceito do que com as canções, desperdiçando boas sacadas melódicas e instrumentais maduros com um tema forçado, como "Caught Somewhere in Time", "Heaven Can Wait" e "Deja-Vu". Embora menos inspirado, o disco ainda traz bons momentos do grupo, como a olímpica "The Loneliness of a Long Distant Runner" e a literária "Stranger in a Strange Land" mostravam que o grupo ainda podia produzir bons momentos em conjunto. A bela balada "Wasted Years" (a única que fugia do padrão de todas as outras baladas da banda) mostrava que Adrian Smith sabia compor e que queria seu espaço na banda.

O último bom momento do Iron vem com Seventh Son of a Seventh Son. Aqui, o conceito toma conta do disco de vez e Steve Harris enfrenta um momento de megalomania semelhante ao que Roger Waters enfrentou em The Wall. As melhores faixas do disco ("Can I Play With Madness", "Only the Good Die Young") são justamente as que fogem do tema central, que trata, novamente, de satanismo (o sétimo filho do sétimo filho será o anticristo, segundo algum lugar da Bíblia), só que épico e preciosista.

Depois era a lama. No Prayer for the Dying tentava voltar ao espírito rock’n’roll do grupo, com músicas risíveis (como "Holy Smoke" e "Bring Your Daughter to the Slaughter"), o pavoroso Fear of the Dark (com aquela capa horrível e bobagens como "Afraid to Shoot Strangers", "Wasting Love", "Be Quick or Be Dead" ou "From Here to Eternity"). A segunda pior fase da banda conta com o versátil Janick Gers no lugar de Adrian Smith, mas a mágica já havia passado. Os últimos discos com Bruce são ao vivo (A Real Live One e A Real Dead One) e a banda mostra que sabe o que os fãs já sabiam: as músicas velhas eram bem melhores que as novas. A entrada do pífio Blaze Bayley empurra a banda no esquecimento.

Por isso, Live After Death é o melhor disco do Iron. Se ser adolescente à época de seu lançamento significava curtir o melhor que a vida podia lhe dar, ter doze anos mostrava o mundo que lhe esperava. Do discurso de Wiston Churchill no início até o fim apocalíptico de Phatom of the Opera, o disco era uma viagem a uma dimensão paralela, um paraíso de energia, barulho, som e testosterona chamado "show do Iron Maiden". Pra quem viu o show da banda no Rock in Rio, o disco era ‘o’ souvenir; pra quem não pôde ir, era ‘a’ compensação.

Talvez este disco seja o responsável por algumas notas vermelhas no boletim da sexta série, pelos cadernos acabarem mais cedo (cheios de desenhos nas últimas páginas), pelas minhas primeiras camisetas pretas (usadas sob o uniforme do colégio), por uma vontade de deixar o cabelo crescer e pelo meu primeiro porre (lembro a cena direitinho, ao redor de uma fogueira, num terreno baldio, com Velho Barreiro e "2 Minutes to Midnight" tocada pontualmente). Foi o primeiro disco que meus pais pediam pra tirar - e olha que meus pais me agüentaram ouvindo 12 horas por dia Thriller, quando tinha oito anos, e a coletânea New Wave Mamão com Açúcar (com Pretenders, Billy Idol, B-52’s, Prince, Devo, Wham!, Depeche Mode e Huey Lewis and the News), aos dez. Foi o meu primeiro disco duplo, que quase perdi quando troquei com um amigo meu por um disco da Sinéad O’Connor (dá pra acreditar?).

Comprei o CD, mas qual decepção ao ouvir que faltava um lado inteiro do disco (o quarto, com "Wrathchild", "22 Acacia Avenue", "Children of the Damned", "Die With Your Boots On" e a versão definitiva de "Phantom of the Opera"). Nem o encarte, com informações completíssimas (turnê completa, letras, equipamento completo e o escambau) compensava. Corri feito um desesperado atrás da lendária versão japonesa (que contava não só com o lado perdido, mas com dois lados inéditos, num sonhado CD duplo), mas acho que não passava de uma lenda urbana. O fato de alguém (um amigo de um dos meus irmãos) ter roubado o CD me levou a bater na porta do dono do disco da Sinéad (um cara com quem eu não falava há anos) atrás do meu disco.

Hoje, graças a deus, ele está aqui, na minha frente, rodando enquanto digito este texto no computador. Sulcos que alimentaram minha fome por uma adolescência decente, que me fizeram ter vontade de parar de deixar de ser criança e cair num universo inseguro de farra, problemas e irresponsabilidades. Parte crucial do meu desenvolvimento como ser humano (mais "na moita" que isso, impossível), Live After Death é a minha porta de entrada num mundo de sonhos, meu rosebud. Não tenho vergonha de admitir isso.

(Este texto foi escrito para a coluna Na Moita, sobre discos que a gente não tem vergonha de gostar, do falecido e-zine The Bambas, do Tomate e do Camilo, e publicado no segundo semestre de 1998. Aqui você encontra apenas sua última edição)

20.12.02
Live After Death
Iron Maiden
1985
1. Intro: Churchhill's Speech
2. Aces High
3. Minutes to Midnight
4. The Trooper
5. Revelations
6. Flight of Icarus
7. Rime of the Anicent Mariner
8. Powerslave
9. The Number of the Beast
10. Hallowed by Thy Name
11. Iron Maiden
12. Run to the Hills
13. Running Free
14. Wrathchild
15. 22 Acacia Avenue
16. Children of the Damned
17. Die With You Boots On
18. Phantom of the Opera

20021219jo.gif (9705 bytes)19.12.02
Plunderphonics

John Oswald
1989


18.12.02 (dia livre)

20021217britney.jpg (57727 bytes)17.12.02
Boys

Britney Spears
2002



Die Another Day

Madonna
2002



Dirrty

Christina Aguillera
2002

20021216pf.jpg (5531 bytes)16.12.02
IsThere Anybody Out There?

Pink Floyd
2000

15.12.02 (dia livre)

20021214duran.jpg (14757 bytes)14.12.02
Decade

Duran Duran
1989


20021213fela.jpg (12623 bytes)13.12.02
The '69 Los Angeles Sessions
Fela Kuti

1994

20021212hm.jpg (17042 bytes)12.12.02
Pills'N'Thrills and Bellyaches
Happy Mondays

1990

GOBLIN11.12.02
Smoker's Delight
Nightmares on Wax
1995

10.12.02 (dia livre)

GOBLIN09.12.02
Kung Fu Meets the Dragon
Lee Perry & The Upsetters
1975

08.12.02 (dia livre)

GOBLIN07.12.02
Suspiria
Goblin
1977


20021122ledzep.jpg (10464 bytes)06.12.02
Outubro ou Nada!
Bidê ou Balde
2002

20021122ledzep.jpg (10464 bytes)05.12.02
Houses of the Holy
Led Zeppelin
1973

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