Parte da entrevista concedida por Ursula Blattmann para Fernanda Fernandes fernanda@tribunademinas.com.br referente ao incentivo da leitura

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Juiz de Fora, sexta-feira, 23 de abril de 2004 - Caderno Dois       

Dia Mundial do Livro

Formação de leitores é o grande desafio


Fernanda Fernandes - fernanda@tribunademinas.com.br
repórter

Poucos espaços públicos para leitura, acervos inadequados, falta de estímulo e de trabalho em conjunto nas escolas são alguns dos fatores que dificultam a formação de leitores no Brasil. Afinal, o letramento não basta. É preciso criar o hábito de ler até para saber onde buscar conhecimento. No país, a média anual de livros lidos por pessoa não chega a dois, enquanto em nações mais desenvolvidas esse índice fica em torno de sete.

Professora de biblioteconomia e ciência da informação da Universidade Federal de Santa Catarina, Ursula Blattmann lamenta esta situação. Não só há pouca quantidade de bibliotecas no país, como faltam estrutura e profissionais para esses espaços. A formação de acervo é outro ponto crítico. "Há bibliotecas que recebem, freqüentemente, doações, porém grande parte é lixo. O que requer seleção adequada por pessoas treinadas", diz. Segundo ela, a Lei Mundial do Livro destaca que este não é mais material permanente e pode ser excluído do acervo quando não é pertinente. Porém é preciso profissionais capacitados para fazer tal triagem.

Ideal x realidade

Na biblioteca ideal, o leitor é o centro das atenções. Ursula explica que o acervo deve ser rico em qualidade e não necessariamente em quantidade, disposto em um ambiente agradável e acolhedor, além de disponibilizar computadores com Internet.

A Biblioteca Municipal Murilo Mendes atende a vários desses aspectos mas, para a diretora da instituição, Lygia Toledo, ainda há muito o que fazer. Prestes a completar 107 anos desde sua criação, a contratação de profissionais de biblioteconomia para a instituição aconteceu no ano passado. Outras melhorias recentes foram a implantação do projeto Biblioteca Digital Multimídia, do Instituto Embratel e da Biblioteca Nacional, e a criação da Associação de Amigos da Biblioteca Municipal, além de ações de incentivo à leitura realizadas na Praça Antônio Carlos.

"Uma área de 1.760 metros quadrados impressiona. O prédio é, inclusive, uma referência nacional, mas o espaço já está sendo considerado insuficiente em vista do número de usuários, cerca de 15 mil por mês", diz Lygia. Entre as ações que ainda precisam ser implementadas na opinião da diretora, estão projetos de marketing e educação do usuário, organização de encontros entre autores e leitores e ampliação do número de computadores.

Experiência comunitária

Para Wanderson Castelar, presidente da SPM do Monte Castelo, que mantém a Biblioteca Comunitária Pedro Nava, a boa vontade está acima de tudo. "Nossa experiência mostra que não é preciso muita coisa para manter a biblioteca funcionando bem", garante. O espaço foi criado há dois anos e está sempre lotado. O principal público é o escolar, mas a procura também se dá por adultos dos bairros da região por motivos diversos. A busca por periódicos, por exemplo, é grande e tem leitores cativos. O mesmo acontece na Biblioteca Municipal, onde há uma fila antes mesmo de abrir para a seção de jornais e revistas.

O sucesso da Pedro Nava, entretanto, está na integração com a comunidade. O espaço abre fora de hora para grupos estudarem para concursos, promove recitais de poesia, contação de histórias e está prestes a inaugurar uma sala multiuso para abrigar exposições, palestras e outros eventos. Com tantas atividades, as pessoas são estimuladas a usar o espaço e acabam pegando livros para ler. "Com um mínimo de investimento, é possível montar uma biblioteca como esta em cada bairro", acredita Castelar. Mas o que faz a diferença mesmo é a atuação dos voluntários, que trabalham junto com uma estagiária cedida pela Funalfa para manter o local aberto.

Para gostar de ler

Não existe idade para começar a gostar de ler, mas na infância certamente é mais fácil criar este hábito. Estimular a leitura é um dos objetivos do pedagogo Luiz Antônio da Cunha, que trabalha com formação de professores. Ele criou a disciplina fábulas e confabulações no curso de especialização em educação infantil da UFJF apostando em uma técnica de formação baseada em histórias. "Confabular é conversar sobre. É isso que deve ser a base entre educador e criança e entre pais e filhos também", afirma. "São crianças que tiveram uma educação desse tipo que lotam bienais", diz, lembrando o sucesso de público desta edição da Bienal do Livro de São Paulo, que recebeu mais de 70 mil pessoas apenas no feriado da última quarta.

Cunha garante que o livro serve para muito mais que o simples letramento, porém, em muitas escolas, esta é sua única finalidade. "Na TV já vem tudo pronto. É com a literatura que a criança cria, pensa, imagina e por isso o livro é insubstituível para a educação infantil", alega. No entanto, este momento crucial para fazer da leitura uma prática prazerosa costuma ser deixado de lado. "Às vezes pode ser melhor ter um grupo de contadores de histórias do que uma biblioteca que só amontoa livros", compara o pedagogo.
 
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