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LAURA DE VISON
BIO BY PEDRO STEPHAN
Laura de Vison faz parte de um grupo de artistas transgêneros artistas que viveram e sobreviveram nos últimos 50 anos na condição de travestis fazendo espetáculos. Inicialmente para o grande publico e depois para o público gay. Não se marginalizaram, não ficaram pobres nem desamparados. Muito pelo contrário: ficaram famosos e construíram um patrimônio com a renda que obtiveram com esse trabalho artístico. Suas histórias se confundem com a do mercado e a do empresariado de entretenimento gay brasileiro no último meio século.

Laura de Vison se destaca por sua persona “larger than life”, que nunca coube em nenhum rótulo. Não era linda, não tinha um corpo bonito, era gorda (pesava 200kg), mas era sexy e fazia um dos mais incríveis stripteases já apresentados nos palcos do Rio. Era travesti, tomava hormônio, pôs silicone, mas mantinha uma identidade masculina tanto como o professor Norberto que ministrava aulas de geografia e história para ensino secundário quanto na sua vida privada, em que era chamado de “betinho” pelos amigos. 

Vem de uma tradicional família classe média suburbana, teve estrutura familiar, estudou, fez curso superior e tinha um trabalho off-gueto. Isso lhe deu uma consciência política e foi uma das poucas, senão a única de sua geração, que apoiaram todas as atividades de prevenção e de promoção da cidadania feitas pelos grupos de ativismo gay. 

Trabalhou no sindicato dos artistas avalizando os currículos das trans que trabalhavam em shows para obter a carteira de profissional do sindicato dos artistas. Durante muito tempo, esse era o único documento de identidade possível de ser usado pelos travestis, pois trazia o seu nome original, o número da carteira de identidade, o nome artístico e uma foto com o visual feminino. 

É impossível falar sobre os anos 80 no Rio sem lembrar os lendários shows da Laura de Vison no Cabaré Boêmio. Com certeza, foi uma das coisas mais incríveis da vida cultural da cidade maravilhosa naquela época. Seu show apresentado de quinta a domingo, sempre com a casa lotada, bateu todos os recordes do show business, com o espetáculo que mais tempo ficou em cartaz na história do Brasil e do Rio. Era considerado “trash” porque foi ficando cada vez mais escatológico, mas, na verdade, a produção do seu visual era sempre cara a impecável (inúmeros vestidos - pelo menos, 4 em cada show -, perucas mil, inúmeros adereços de cena), e o Boêmio era uma casa imensa com serviço de restaurante, dois andares, som possante etc. O que o fazia ser popular era o fato de se localizar no centro da cidade, não ter uma decoração bacana e o público ser majoritariamente do subúrbio e da zona norte. Mas muita gente chique e famosa da zona sul batia ponto por lá, sabendo que era o lugar mais divertido na cidade.

As performances inacreditáveis de Laura lhe valeram fama até no exterior, onde foi capa comemorativa dos 2 anos da “Out Look”, badalada revista gay norte-americana. Com 50 anos de palco, Laura tem um currículo de fazer inveja a muita gente. Participou de, pelo menos, 6 filmes, entre os quais “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Julio Bressane, e “Noite”, de Gilberto Loureiro. Fez uma participação na famosa minissérie “Incidente em Antares” e foi jurada no programa do Gugu Liberato. Ganhou o “Candango de Ouro” de melhor ator de curta no Festival de Brasília e o “Sol de Prata” no Fest Rio, ambos pelo trabalho no curta “Mamãe Parabólica”, de Ricardo Favilla. Ganhou também uma medalha de ouro no festival de curtas e vídeos de Bruxelas, pelo vídeo “O Bigode da Aranha”. Recentemente, atuou nos filmes “Cazuza” e “O Outro Lado da Rua”. 

Laura morreu em junho de 2007 e deixou órfãos seus milhares de fãs num mundo cada vez mais conservador, careta e capitalista. Que seu exemplo libertário, irreverente e anarquista fique para as novas gerações.
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