Padre Oscar Quevedo
Uma Farsa Plena de Arrogância


 


Transcrevemos aqui, de forma adaptada, um artigo assinado pelo médico e advogado Sr. Guaracy Lourenço da Costa que questiona a validade científica de um curso de Parapsicologia, ou que assim prometia ser, ministrado pelo famoso Padre Oscar Quevedo, publicado no jornal O Imparcial, de Araraquara, em 18 de julho de 1999.


    Durante dois longos dias, das 14 às 21 horas, juntamente com cerca de 300 pessoas, fiz um curso de Parapsicologia, pelo qual paguei trinta reais. Minha decepção começou quando, entremeando nos termos técnicos, o conhecido professor já foi logo dizendo que a maior parte das universidades estão imersas em erro, chamando-as de "ignoréticas", talvez para significar  que todos os que militam nelas são ignorantes, provavelmente por não discutirem o "quevedismo"... De forma imprevista, ele criticou fortemente todas as religiões existentes, que ele afirmou serem 11 mil, e disse claramente que muitos dos que militam no próprio Catolicismo, incluindo muitos padres, menos ele, é claro, deveriam estudar, aos invés de ficarem dizendo "bobagens" aos fieis. Disse, em especial, que o Espiritismo não é religião e que Allan Kardec, com culpa ou sem culpa, enganou o povo.

    Dos milagres ele nos disse que somente ocorrem entre os que militam no Catolicismo, mas isto não sei com que base, pois assim ele passa por cima dos estudos e registros etnográficos e antropológicos que dizem o contrário. O "professor" parece não querer ver que estes podem ocorrer para todos, indistintamente. Sobre a Bílblia, ele afirmou que todos os que interpretam ou estudam os fatos nele relatados o fazem de maneira errada, na base do que ele chamou jocosamente de "achologia" (ou ciência do "acho que"...), todos menos ele, é claro! Ele fez questão de se expor como um grande estudioso, mas a maioria dos alunos do curso o consideraram mais irreverente e "espetaqueiro" que estudioso.  E para que, ao invés de nos ensinar apenas a ciência da Parapsicologia, tinha ele que dar um pequeno show vulgar de mágica enfiando a haste dos óculos no próprio nariz? E o outro show já conhecido de vendar os olhos e advinhar os objetos que estavam no chão, fazendo depois uma demonstração de memória, na chamada Mnemotécnica, que não tem nada a ver com Parapsicologia?

    Também não teve cabimento forçar os alunos a comprarem pelo menos um de seus livros para ajudar - sob pena de uma "maldição" dele - justamente a ele e seu chamado Centro Latino Americano de Parapsicologia, CLAP, logo a ele que passou horas num discurso massante dizendo que os "feiticeiros" e "curandeiros" são todos falsos, mentirosos e criminosos. Ele foi taxativo ao dizer que curandeiros não conseguem curar, mas apregoou o poder da mente sobre o corpo e, para tanto, teve a ousadia de repetir uma velha técnica conhecida dos hipnólogos há muito tempo ao atravessar o braço de uma jovem com uma agulha... com o adicional de que, para dar um maior impacto sensacionalista, a tinha esfregado antes na sola do sapato, desafiando a natureza viva dos micróbios!  Se ele, diante de nós, cometeu tal nojeira, como poderia ter afirmado que outros homens ou mulheres não podem induzir alguém à cura de certas enfermidades através da sugestão sobre sua mente, em especial se existe fervorosa fé? Contradição pura!

    Os brasileiros (ou seja, nós todos) foram todos rotulados de "achologistas" e o povo mais ignorante do mundo. Talvez o fato de ser espanhol o tenha feito mais sábio que os demais mortais. Talvez por isso os alunos não tiveram oportunidade de apresentar seus depoimentos pessoais. Exigüidade de tempo? Acho que não, porque houve tempo para que o "professor" apresentasse os mencionados shows. E com que direito pode um palestrante atirar a tampa de sua caneta na cabeça dos alunos que, compreensivelmente, cochilavam? Ainda bem que não cochilei, pois se fosse atingido, na certa revidaria...

    O show final do "professor" foi horrível! Lá no palco, ele provocou catelepsia num dos jovens alunos (facilmente conseguida através de sujestão hipnótica), mas não falou em hipnose, apenas disse que irira "matá-lo" e "ressuscitá-lo". Repetindo outro velho e batido truque de hipnose, ele esticou o jovem "cataléptico" sobre duas cadeiras, apoiado apenas na cabeça e nos pés, mandando que outro jovem, pesando mais de cem quilos, sentasse sobre o corpo desse rapaz. Para ficar ainda mais "interessante", martelou e quebrou várias pedras e tijolos sobre a barriga do paciente, cujo rosto cobriu, para evitar que alguém mais escalrecido pudesse detectar o evidente transe hipnótico... A catalepsia é um estado de contratura e rigidez dos músculos, semelhante ao estado de um morto. Ela ocorre espontaneamente em pessoas com graves afecções neurológicas ou em raros casos de histeria. Pode-se provocá-la através do hipnotismo em seu grau mais profundo,  conforme o explanou classicamente o grande neurologista Jean Martin Charcot, da famoso clínica de Salpêtriere, na França.

    Se o jovem aluno entrou em catalepsia é porque foi induzido a tal por sugestão, hipnotizado, embora o "professor" tenha dito que não se deve dar espetáculos hipnóticos. Hypnos, do grego, quer dizer sono, mas há manifestações hipnóticas que podem ocorrer sem sono aparente, embora o "professor" tenha mandado o moço fechar os olhos... Ela é obtida no estágio mais profundo do transe hipnótico, podendo, em dois casos especiais, ser obtida rapidamente. Primeiro, se o paciente já foi hipnotizado antes,  a catalepsia poderia ser provocada por meio de uma sugestão pós-hipnótica. Segundo, se o paciente, tendo uma estrutura de personalidade apropriada, tiver sido "preparado" pela sugestão coletiva explicitamente feita pelo "professor", naquilo que os pesquisadores americanos chamam de "horses" (cavalos de sugestão), incutindo na mente dos jovens que eles teriam capacidades especiais. Acontece que qualquer pessoa pode ter a capacidade de hipnotizar outrem, mediante o conhecimento das técnicas e o devido treino, não carecendo de possuir estranhos "poderes" ou ter sido agraciado com um "dom" especial dos céus. Por isso é recomendável, e até mesmo exgidio por lei, que o hipnotizador seja médico, odontólogo ou psicólogo.

    O fato foi que, médicos presentes, tivemos que nos calar diante de um espetáculo ridículo de hipnotismo velado, que ele próprio confessou publicamente ser proibido por lei!... Ao final de tudo isso, ganhei um certificado onde veio escrito: "Curso de Parapsicologia e Religião"!...

Guaracy Lourenço da Costa

com adaptações

Outro Link de Interesse: A Igreja, a Mídia e a Parapsicologia