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proibido pela censura
Correio da Manhã, 16.04.1961

Foi abruptamente retirado de cartaz, às 16 horas de segunda-feira, o filme O Último Delator. Mais uma violência da censura da Guanabara, aproveitando desta feita em impertinente protesto do Encarregado de Negócios da Itália – qualquer pretexto serve, não há dúvida. Mas em Niterói, Capital de um Estado mais democrático do que este, o filme inglês continuou sendo exibido normalmente. Foi visto pelo crítico Walter Lima Júnior, assessor da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio, e a nosso convite escreveu a crítica que abaixo publicamos.
(Antonio Moniz Viana)

o último delator / Danger Within

Walter Lima Jr.

Não são apenas os filmes de qualidade que nos chamam a atenção. Muitos, por terem um saudável elemento feminino, outros por vários motivos: escândalo, censura etc. Como tudo que é proibido é desejado, o filme censurado atrai logo a atenção de todos, cinéfilos ou não. É o caso de O Último Delator (Danger Within), que a censura do sr. Pedro José Chediak aprovou e a do sr. Ascendino Leite proibiu. Fato tão inédito quanto curioso. O motivo é mais curioso ainda: “desrespeito a uma nação amiga”, no caso a Itália, cuja Embaixada pediu a interdição. Não queremos analisar a proibição (absurda) e sim o filme (sofrível).

Danger Within conta uma história de prisioneiros ingleses num campo de concentração na Lombardia, Itália, durante a segunda guerra mundial. Como em todo campo de concentração, há os que tentam fugir e os que não precisam disso, pois desfrutam de uma situação confortável: são os delatores. E, também, como em todo campo de concentração, os algozes, os corruptores, isto é, o inimigo que dirige o campo. Dentro desse ambiente, o que existe realmente é a fórmula: opressor, na maioria das vezes sádico, e oprimido. A fuga estabelece a equação. É tão-somente uma circunstância na aquisição do maior de todos os direitos do homem, a liberdade. Isso entendem os ingleses deste filme, o fugitivo de O Condenado à Morte Escapou, os prisioneiros americanos de O Inferno nº  17, o Von Berra do recente A Águia Fugitiva, os soldados direitistas de Kanal, que morrem (uma conveniência soviética) tentando fugir e todos aqueles que entendem a liberdade como o único terreno onde se pode erguer o edifício da dignidade humana. Somente aqueles que não vêem as coisas por este ângulo é que se entregam ao inevitável.

Em Danger Within, que poderia  ter resultado muito superior se o diretor Don Chaffey não tivesse visto O Inferno n° 17, a fuga é inédita. Nada mais nada menos do que 400 homens, isto é, todos os prisioneiros do Campo de Concentração no.127, fogem nas barbas de um sádico oficial italiano, fato que deve ter aborrecido em demasia o pessoal da Embaixada Italiana aqui no Rio.

O diretor Don Chaffey, que a revista “Films and Filming” vem promovendo, merece ser observado de agora em diante, muito embora sua direção seja pálida no que diz respeito à observação dos tipos e inábil quanto à progressão dramática. O filme resulta desequilibrado e nos dá a aparência de uma série de “sketches”muito bem montada. Na realização deste seu segundo trabalho importante, Chaffey contou com a colaboração de Bryan Forbes como co-cenarista. Forbes, elemento jovem que faz parte do sangue-novo, que vem sendo injetado no cinema britânico ultimamente, é fundador da Beaver, produtora de The Angry Silence, que vem merecendo elogios de grande parte da crítica internacional. Seu trabalho, ao lado de Frank Harvey, é destituído de grande importância. O tom cínico dos diálogos é mal assimilado pelo ritmo apressado da direção e pela conduta do elenco. O resultado, como se vê, não poderia satisfazer.

Falhando no ritmo, a direção também falha com o elenco (numeroso e com bons nomes): Richard Todd, por exemplo, que quase sempre convence, está apático do começo ao fim do filme; Bernard Lee funciona como sempre e Richard Attenborough (que triunfaria mais tarde no já citado The Angry Silence) não se compromete. A fotografia é trabalho limpo e sem grandes vôos e a música é mais do que sofrível.

Fica no ar a pergunta: “Por quê a proibição?”, ao término da projeção. Nada vimos que ofendesse os brios peninsulares. A não ser que a mentalidade italiana hodierna se identifique com a mentalidade mussolinista retratada no filme.
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