
Os axiomas e as leis da matemática são muito úteis para
certas atividades. Sabemos com absoluta certeza, por exemplo, que 2+2=4 e que os ângulos
de um triângulo somam 180° -- isso é o que necessariamente se deduz dos axiomas. A
matemática também é útil quando aplicada a grandezas físicas constantes. Einstein
usou a matemática para mostrar que nada pode ser mais rápido que a velocidade da luz,
que é uma grandeza constante. Apostadores como Blaise Pascal inventaram a estatística
para calcular as probabilidades de resultados precisos -- que um dado, digamos, venha a
cair mostrando o quatro. Os meteorologistas na TV usam números para prever se vai, ou
não, chover amanhã.
Você poderia rotular todos esses
cálculos como um produto da "lógica exata" que, em última análise, deve sua
metodologia à Aristóteles. Recentemente, entretanto, um pequena comissão de engenheiros
e físicos, puseram a lógica exata de lado, em favor do que chamam "lógica
imprecisa", a ciência das quantidades indeterminadas. Segundo os lógicos da
imprecisão, é correto dizer que existe uma probabilidade de sessenta por cento de chuva,
na medida em que se possa definir o que se considera "chuva". Para os
metereologistas existem duas opções: ou chove ou não chove.
Mas, de fato, o próprio conceito de
"chuva" é difuso. Se dois pingos de água caem do céu, isso é chuva? E o que
dizer de cinqüenta pingos? E de mil? Suponhamos que a neblina esteja espessa e baixa, e
você sinta gotas de água em seu rosto. Isso é chuva? Onde passa a linha divisória?
perguntam os lógicos difusos. Quando a não-chuva se torna chuva?
Se isso soa para você como um enigma
Zen, você não está sozinho. Realmente, os teóricos do pensar difuso, como o professor Bart
Kosko, promovem sua nova ciência como se fosse uma síntese do tipo
"Oriente encontra-se com Ocidente". E embora nos Estados Unidos a lógica difusa
seja mais ridicularizada que festejada, ela virou uma verdadeira mania na indústria
japonesa. Você já deve ter ouvido sobre as "máquinas inteligentes" que chegam
do Japão: máquinas de lavar inteligentes, máquinas inteligentes de vender
refrigerantes, microondas inteligentes, câmeras de vídeo inteligentes. São aparelhos
programados para lidar com estados intermediários entre "Liga" e
"Desliga", com quantidades que se podem graduar de forma mais sutil que o
simples "alto", "médio" ou "baixo", com respostas que não
são apenas "sim" ou "não", mas também um meio-termo.
Se a "lógica difusa" tem
uma origem, esta reside na tentativa da Lógica de se adaptar aos paradoxos de Russel e à
incerteza de Heisenberg. O lógico polonês Jan Lukasiewicz desenvolveu uma lógica
"multivalente" nos anos de 1920, refinando a lógica binária do sim-não, da
física newtoniana, para permitir estados indeterminados. Em 1965, o matemático Lotfi
Zadeh, de Berkeley, aplicou essa nova lógica à teoria dos conjuntos, em seu artigo
"Conjuntos Difusos", que depois emprestou seu nome à lógica.
Os conjuntos que você aprendeu no
colégio eram bem definidos. Ou uma coisa pertencia a um conjunto ou não pertencia. O
número 2 pertence ao conjunto de números pares e não ao conjunto de números ímpares,
e os dois conjuntos têm uma "intersecção vazia" -- ou seja, nenhum número é
ao mesmo tempo par e ímpar. (Por convenção, o número 0 não é nem par nem ímpar). Os
conjuntos de Zadeh, entretanto, são indefinidos,são...como dizer? -- difusos. Algumas
coisas pertencem a estes conjuntos e outras não pertencem, mas existe uma terceira classe
de coisas que pertencem até certo ponto.
O conjunto de números pares e o
conjunto de números ímpares são conjuntos precisos. O conjunto de homens e o conjunto
de mulheres são virtualmente precisos -- existe uma ligeira indefinição sobre
hermafroditas e transexuais. Mas o que dizer da série de pessoas altas? Ninguém chamaria
um homem com 1,50m de "alto" mas qualquer um chamaria uma mulher de 1,80m de
"alta". Onde você traçaria o limite? Um homem de 1,70m de altura estaria na
série de homens altos, ou não? Um asiático iria concordar, nesse ponto, com um europeu,
ou um italiano com um sueco? Altura é algo subjetivo e contínuo, então é impossível
fixar um determinado padrão de altura e excluir as demais pessoas que estejam fora dele.
Se 1,80m é alto, 1,79m o que é? Uma vez que começamos a pensar sobre essas questões,
sobre questões de gradação, nosso pensamento começa a ficar difuso.
Tomando outro exemplo: o conjunto de
pessoas felizes é difuso, porque muitos de nós somos felizes em um certo grau -- talvez
em um grau maior ou em um grau menor, mas quase nunca absolutamente felizes ou
absolutamente infelizes. Uma pesquisa de opinião com perguntas do tipo: "você está
satisfeito com a atuação do presidente?" é falha, já que muitas pessoas estão
satisfeitas ou insatisfeitas somente até certo ponto. Usar uma escala de 1 a 10 apenas
ajuda um pouco, mas ainda estamos lidando com uma faixa de números precisos para definir
uma gama de opiniões. Nem todas as notas "cinco" vão ser iguais.
Os conjuntos difusos são a chave para
as máquinas difusas. A maioria dos artefatos com os quais você está familiarizado são
"burros" isto é, rigidamente programados. Sua televisão ou está ligada
ou não está; o brilho está em 6 e o contraste em 3. Um sistema de aquecimento
controlado por termostato é o exemplo clássico da máquina burra. Quando a temperatura
cai abaixo de determinado ponto, o calor é ligado; quando ela ultrapassa essa
temperatura, o calor é desligado. O mecanismo é binário: o calor está
"ligado" ou "desligado", e quando está ligado, está sempre no mesmo
grau.
As máquinas difusas, por outro lado,
usam conjuntos difusos para produzir respostas mais flexíveis. Os termostatos
"pensam" apenas que está quente ou frio e, em resposta, mandam instruções
para desligar ou ligar. Instruções difusas, entretanto, permitem que se estabeleça um
determinado grau de quente ou frio. Se decidimos que 20° é a temperatura perfeita,
podemos dizer a um "aquecedor/condicionador de ar para modular seu comportamento,
dependendo de quanto a temperatura atual difere de 20° . O aparelho nunca estaria só
ligado ou desligado ele estaria sempre ligado em um grau variável, misturando e
combinando instruções.
A famosa máquina de lavar difusa
trabalha no mesmo princípio, mantendo um olho eletrônico em uma gama de variáveis,
calculando médias ponderadas e ajustando suas instruções em resposta. Que tipo de
tecidos temos aqui? Estão muito ou pouco sujos? Estamos lidando com graxa, ketchup,
café, barro, suor? A carga é grande? Todas essas variáveis se expressam de forma
gradativa e a máquina de lavar inteligente calibra suas respostas interativamente. De
maneira semelhante, câmeras de vídeo inteligentes ajustam com precisão seu foco e sua
abertura; aparelhos de TV inteligentes acompanham e ajustam o brilho e o contraste de uma
imagem instável.
Segundo os lógicos difusos, todo o
universo dos fatos -- como a altura das pessoas ou as imagens de TV -- é difuso. Para
David Hume, as proposições se classificam como "relações de idéias" ou
"fatos positivos". As primeiras são necessariamente verdadeiras, enquanto os
últimos podem ser verdadeiros ou falsos. Segundo o modo difuso de pensar, nada
empírico é absolutamente verdadeiro ou absolutamente falso, mas simplesmente verdadeiro
ou falso até certo ponto. Os cientistas modernos reconhecem que suas teorias e deduções
nunca são absolutamente certas, são apenas altamente prováveis. A resposta da lógica
difusa para isso é que a probabilidade ainda se baseia em suposições injustificáveis
como, por exemplo, a de que uma partícula está ou não está onde a probabilidade prevê
que ela estará. Os cientistas não dizem que uma partícula está 70% aqui e 30% ali, mas
apenas que existe 70% de probabilidade de que ela esteja 100 % aqui. Isso não é difuso.
Difuso é isso: o mundo é cinza. Nada
é totalmente preto e nada é totalmente branco. Quando aplicamos um raciocínio
preto-no-branco para explicar um mundo cinzento, temos que tratar algo que é verdadeiro
em uma certa medida (por exemplo, que um copo está um tanto cheio) como se fosse ou
inteiramente verdadeiro (o copo está cheio), ou inteiramente falso (o copo está vazio).
Cada passo em um processo racional requer uma simplificação desse tipo e, portanto,
adiciona outra camada de arbitrariedade e erro. Quanto mais raciocínio você usar a
respeito de alguma coisa, mais você se afastará do caso real, em vez de se aproximar.
A que leva tudo isso, depende de a
quem você pergunta. No mínimo, no mínimo, a lógica difusa, de fato, constrói
máquinas melhores; a pergunta é se ela realmente chega a ser uma revolução
matemática. Os proponentes dessa lógica se vangloriam com uma veemência que pode chegar
a ser irritante, especialmente porque a lógica difusa ainda apela para a álgebra e a
geometria convencional, e as máquina difusas ainda usam os chips de computador que
processam dados digitais binários. Por essas e outras razões, muitos matemáticos e
engenheiros ocidentais consideram a lógica difusa apenas como palavrório dos anos
noventa, vinho velho em garrafa nova. |