MAIS POESIA


Pois é!
Talvez você tenha gostado do "Sem Bandeiras"...Pode ser que você esteja me dando uma segunda chance.
Pode ser que você encontre aqui um tipo de poesia que não te diz nada.
Mas se você gosta de poesia...
Mas se você se identificar com uma destas poesias que seja...
Valeu à pena!

Teatrinho


Um personagem
Um cenário
Um fato.

O personagem, no cenário, personifica o fato.

Espetáculo.
Assistentes.

Um lado se forma.
Um lado forma o outro.
Dois lados...
No meio, o personagem.

O personagem:
Dois lados:
Um a favor.

Um lado a favor forma outro
contra.

No meio, o objeto:
o personagem.

Nem de um lado, nem de outro:
é meio.

O lado contra.
(o personagem sem partido)
O lado contra, o personagem.
O lado contra forma outro: a favor.
(o personagem sem partido)

O lado a favor
(o personagem sem partido)
O lado a favor, a partido do personagem sem partido
O lado a favor do personagem forma outro:contra

Três lados que são quatro:
Um a favor
que forma um contra
Um sem ser: o personagem.
O lado sem ser forma dois:
o lado a favor ao lado contra
o lado contra o lado a favor.
O personagem em seu lado
Três lados que são quatro formam cinco.
Um lado: o personagem.

Os lados se resumem:
O lado a favor
O lado contra
O outro lado.
Lados demais...
--Dois lados, só dois lados!
Ou a favor, ou contra
Guerra!

Dois fogos, cruzados
No meio, o personagem.
Não é dessa guerra.
O fogo, fátuo.
O personagem, inteiro.
O fogo cessa, recomeça, cessa.

Um tiro, dois, recomeça
Um tiro fere.
O personagem, inteiro.
Outro tiro o personagem fere.
Cambaleia
Um tiro.Cessa.Recomeça
Outro, outro e outro.
Dois fogos inteiros, cruzados, cruzam o personagem
Cambaleia, vacila, desaba.
Os donos do tiro avançam.
avançam, avançam, avançam.
Chegam.

--É meu.
--É teu.

O dono do tiro leva.
O personagem morre
e com ele os lados.
A guerra termina.
Na platéia, um lado só.
Só viu, torceu, aplaude.

A Caça


Parou,
olhou para os lados e ouviu a primeira buzina.

Olhou: farol vermelho.
Dez minutos: amarelo.
Fez menção
de ir, quase foi. Parou.

As bestas foram soltas
antes.
Antes e iam com jeito de quem está à caça.

As armas, as mais diferentes possíveis.
(Modelos novos, antigos e até mesmo alguns com tais inovações que faziam às vezes de uma incursão ao futuro.)
Mas não foi desta vez que a caçada terminou bem sucedida para eles.
(Ele continuou lá, vendo os caçadores desfilarem suas armas em parada cívica.)
Esperou pelo amarelo. Outra vez.
(O vermelho anunciava para o outro lado que os caçadores deveriam esperar um pouquinho mais para reiniciar a caçada.)
Regras muito rígidas tinha esta caçada.
E o ritual mais uma vez foi respeitado.
A primeira buzina.
E como se fora o sinal
esperado, outra secundou aquela.
E depois outra.
E outra.
E mais uma.
Os caçadores faziam suas armas uivarem.
A caça assustou-se.
Levou as mãos aos ouvidos.
Ensurdecia. Ensandecia.
Voltou a esperar a trégua amarela.
Ela veio, com o esmaecer do vermelho aos seus olhos.
Com as mãos nos ouvidos,
nada mais viu, nem ouviu.
Dali queria sair, cercado,
acuado por todos os lados pela matilha dos caçadores.
E dali sairia...
não fosse um caçador bem sucedido.
Foi assim que morreu:
como caça, em poça de sangue.
Poça de sangue diferente:
com as mãos nos ouvidos.

Cizabels

Belinhas


Cabelos de ouro
pequena
tatibitateando
falante.

Olhinhos azuis
(com estrelinhas dentro)
com nome de quem liberta escravos
como programa de fim-de-semana.

Izabel
Zabé
Bebel
Bel
Bela
BelezaBelinha

Irmã da outra
Belinha
Cibel
Sideral, Cibel, Cibele, Si Belle
Bel, Belinha, Beleza, Belza,
Bel, Bebel, Zabé, Zabel, Izabel.

Bela a vida
com resultados destes
Belvida
Bels ver
Beldades
Verdades
Bels, Cibels, Cizabels.
Vida: Cizabelinhas.

Leozinho

Leozinho

Leonardo, Leo, Leozinho.
Homenagem a quem não precisa de homenagens:
Da Vinci.
Ciberespacial bebê, apontando novas eras.
Tão criança e vai cruzar um milênio.
-Sou do século passado, do milênio passado, dirá.
Ou então:
-Sou desse século, desse milênio.
O sol brilhava em Áries.

O Lago


Quando olho para o lago interior
olho fundo:
As águas são claras, a impressão, de raso.
(Parece que só de braço alcanço o fundo)
Mas é um engano.
Parece que as águas são claras, mansa a superfície.
Apenas impressão.
Só com a força do olhar
(como fosse ventania)
a água vira turbilhão, inunda as margens.
Até da limpidez da água desconfie.
Basta arranhar a superfície, o lodo sobe.
Sem contar que a vegetação é carnívora.

Mas perto do lago mora um sapo
que coaxa a vida inteira.
(sapo martelo, por certo)
que coaxando vai esperando
chegar alguém para despertar o encanto.

E o sapo vai virar, amor, amor.
E toda a impressão se tornará definitiva.

Imensidões


Construímos imensidões,
espaços conquistamos...
e sós estamos.

Conseguimos diminuir espaços,
não sentimentos.

Mesmo quem está ali,
ao alcance da mão ou da palavra
é um universo inteiro,
desconhecido, incompreendido,
ser.
E sós somos.

Até no universo imenso de nós mesmos,
insondáveis abismos
inescrutáveis pazes
nos encerram.

E sós somos.
Até no falar mudo dos afetos
até no olhar mudo que se pretende entender...
sós somos.

E somos sós
mesmo juntos, todos
no meio do silêncio do Universo
na poeira cósmica
dos astros, dos outros,
dos rastros de nós mesmos.

Só somos
E somos sós.

Harmonia


Em seu lugar, cada vida,
não parada, em movimento,
vida fluente ou contida,
no tempo, no pensamento.

O interesse da vida,
na própria vida se esgota.
E não há vida perdida,
a vida não se derrota.

Cada ser deste planeta,
azul, bonito, perfeito,
passa feito um cometa,
voltando a vida ao seu leito.

Milhares de anos vidas,
milhares em sofrimento
não são perante a vida
senão um fugaz momento.

Cada vida é um segundo
da vida do universo.
Há universos no fundo
do momento mais diverso.

É o Universo que importa,
é cada vida que vive
e mesmo quando está morta
na própria vida revive.

Problemas?


Problemas?
Só existem nos meios termos da vida.
Entre o viver com o problema
Entre resolver o problema
é aí o endereço do problema.
Pode-se morar na mesma casa do problema.
Comendo da mesma comida
alimentando o problema
sendo alimentado pelo problema.
Por isso os problemas são mornos
deixando pessoas mornas
nos meios termos da vida.

Perguntas e Respostas


Dê-me suas respostas
e eu te darei perguntas.
As certezas tuas serão minhas dúvidas.
E ficarás em débito comigo.

Um ponto de interrogação serei...
e para respostas tolas
farei perguntas mais tolas ainda.

No final do balanço
das perguntas e respostas
só perguntas sobrarão.
(porque não há respostas para minhas perguntas)

Perguntas tão tolas,
para respostas tão sábias,
o que é mesmo que estou fazendo aqui?

Orvalho


Lente de aumento feito de água
aumenta os veios da folha.
O beija-flor vem, bebe.
E bebe a borboleta e a joaninha.
E o louva-deus, qual água benta.
É um lago no meio da verde folha.
Da verde árvora,
no verde campo.
Beija o orvalho
o sol
reverberando.
O orvalho seca
a folha seca
o beija-flor morre
e a borboleta e a joaninha
e o louva-deus.
A lua traz de novo o orvalho.

Absolutos


Qual o aboluto das palavras?
Qual o absoluto das situações?
E o absoluto das absolutas verdades?

Entre nós medeia o absoluto abismo dos absolutos.

Como conviver com absolutos
em vida tão curta
em verdades tão passageiras
e, situações tão mutáveis
e mesmo pessoas tão efêmeras?

Mil anos transcorrerão
mil vidas
mil mortes
mil tudo separarão
o conhecimento do absoluto do sentimento de absoluto.
Entre absolutos buscados
Relativismos vividos
nada mais, nada menos que a vida.


Comunicação


Não era o que queria dizer
mas eu já disse.


Não é o que devia responder
mas respondeu.

Não era o que eu sentia
mas eu disse.

Não era o que sentia,
mas ouvi.

Eu podia deixar passar,
mas não deixei

Você poderia perdoar,
mas não perdoou.

Mas eu poderia beijar,
e não beijei.

Você poderia abraçar
mas não abraçou

E eu poderia falar,
mas não falei.

Você poderia perguntar,
mas se calou

Eu poderia ficar,
mas não fiquei

Você poderia chamar,
mas não chamou.

Eu poderia voltar,
mas não voltei.

Você poderia ter ido,
mas não foi.

Tudo poderia ter sido
mas não foi
Tudo poderia ter sido
mas não foi.