Crítica a julgamento de Aveiro
por
Carlos Esperança
Em Junho de 2002, a União Europeia recomendou aos países membros cuja legislação criminaliza o aborto para se absterem de punir as mulheres que a ele recorram. Portugal foi alvo da recomendação. Com o julgamento da Maia ainda na memória repete-se contra sete mulheres, na cidade de Aveiro, um julgamento que lhes sujeita as vidas à devassa e as arrisca a uma pena que as pode levar ao cárcere até três anos. A libertação do direito do jugo da ideologia é uma conquista negada pela Associação de Defesa e Apoio à Vida (ADAV) que conta com forte influência no aparelho de Estado. Tem como objectivo a prevenção do vício e a promoção da virtude. Claro que o aborto é um mal que o Estado deixou de perseguir mas o respeito pela natureza secular das instituições democráticas impõe as alterações legais necessárias para que deixem de ser perseguidas as mulheres. Os partidários da despenalização apenas pedem que não se acrescente a perseguição criminal à tragédia que é para uma mulher ver-se obrigada à prática do aborto. Já os adversários podem ir mais longe como mostraram os assaltos a clínicas nos Estados Unidos da América, em que bandos de fanáticos da defesa da vida (dos embriões, entenda-se) não hesitaram em tirá-la a médicos e enfermeiros. Foi uma grande campanha de ódio e perseguição que lembrou as fogueiras da Idade Média. A ADAV não irá tão longe.
Publicado no Diário de Notícias de 16-12-2003.