A ilegalidade dos crucifixos na escola pública

por

Paulo Malaquias




Foi com uma enorme satisfação que soube da intenção do Ministério da Educação em repor a legalidade no que diz respeito à situação abusiva em que a Igreja Católica se encontra, pelo menos no que diz respeito à sua relação com o ensino escolar estatal. Fez-me crer que um dia chegaria em que, finalmente, acabasse a promiscuidade existente entre o Estado e a Igreja Católica, reflectida não só na presença de crucifixos em determinadas escolas, como nas aulas de Religião e Moral, presença em cerimónias oficiais, protocolos para a abertura de capelas em Universidades Públicas, transporte de andores com símbolos religiosos por Militares fardados e em equipamento militar, etc., etc., como se se tratasse da “Religião Oficial“ de Portugal.

Já seria de esperar que, por parte da Igreja Católica, e de muitas outras instituições haveria uma reacção violenta – veja-se a reacção da Igreja Católica no caso de Timor, em que se conseguiu impor à decisão de um governo legitimamente eleito por sufrágio.

Foi por isso que fiquei absolutamente revoltado quando ouvi na televisão, a Sra. Ministra da Educação a afirmar que a retirada dos crucifixos ficaria dependente da decisão autónoma das escolas. Vamos, assim, deixar a quem não cumpre a lei – e é fazer cumprir a lei de que aqui se fala, e não alterá-la – a decisão sobre se passarão a cumprir ou não.

Alega quem se opõe à retirada que à lei se deve sobrepor à tradição e que a maioria da população é católica. Será que este facto não se deve à relação que sempre existiu entre o Estado e a Igreja e às facilidades que sempre lhe foram concedidas? Para quando a presença de símbolos do PSD nas escolas da Madeira, propaganda do Benfica nas repartições de Finanças e Comícios do Partido mais votado dentro das esquadras de polícia … - são tudo maiorias incontestáveis.

Nem de propósito, li hoje no Vosso Jornal que a diocese de Fátima, tinha organizado um concurso de desenho, relativo às “aparições”, ao qual o Agrupamento de Escolas e Jardins de Infância de Fátima tinha obedientemente aderido. Esta e outras situações que para muita gente já parecem atitudes normais, tratam-se de ilegalidades a que se torna necessário pôr um ponto final. A religião, qualquer que seja, é vivida nos locais de culto, nas casas de cada um e dentro de si mesmos. Defendo que a Igreja Católica, bem como qualquer religião, tem o direito de difundir a sua mensagem, sem qualquer interferência positiva ou negativa do Estado. Cada coisa no seu lugar. A religiosidade é um direito individual. Assim como defendo que não se devem impor símbolos religiosos a ninguém, independentemente do grau de implementação da sua religião, também sou contra a proibição, como a francesa, da utilização individual desses símbolos – crucifixos, véus, etc. - matéria que se deve deixar à consciência de cada um.

Publicado no «Diário de Leiria» em 5 de Dezembro de 2005.